A otite externa é uma enfermidade
comumente observada em cães e gatos encaminhados à clínica veterinária.
A etiologia varia em função de combinações entre os fatores
predisponentes, primários e perpetuantes responsáveis pela enfermidade.
A Malassezia pachydermatis é
considerada um habitante normal da microbiota cutânea e ocasionalmente
pode se tornar patógena oportunista do meato acústico externo de cães e
gatos. Este trabalho teve como objetivo pesquisar a presença de M. pachydermatis
em otite externa canina. Para isso foi pesquisada a presença dessa
levedura em otite externa de 168 cães encaminhados aos Hospitais
Veterinários das Universidades Federais do Rio Grande do Sul e de
Pelotas, assim como em clínicas e canis particulares. A colheita das
amostras foi realizada com swab estéril umedecido em solução salina,
friccionando-o na porção externa do meato acústico. Logo após
realizou-se exame direto a partir de esfregaço do material colhido,
corado pelo método de Gram e observado em microscopia óptica (1.000X).
Também se realizou a semeadura em meio ágar Sabouraud dextrose com
cloranfenicol e incubados a 32°C por até dez dias, quando se procedeu à
identificação das leveduras. Dos 168 casos de otite externa, a M. pachydermatis
foi isolada em 139 (82,7%). Neste estudo, verificou-se também que não
houve diferença em relação ao sexo e idade dos animais. A frequência de
isolamento nas amostras que apresentaram escore positivo no exame
direto foi significativamente maior (p<0,05) que nas amostras que
apresentaram escore negativo, verificando-se uma probabilidade sete
vezes maior de isolar M. pachydermatis a partir de amostras com exame direto positivo. Conclui-se que a M. pachydermatis
é frequentemente isolada em casos de otite externa canina, não se
observando diferença de isolamento em relação ao sexo e idade dos
animais. Os animais com orelha pendular (por ex. Cocker Spaniel Inglês)
são mais acometidos por otite externa, entretanto, proporcionalmente
não existe diferença no número de isolamento da M. pachydermatis entre as raças.
PALAVRAS-CHAVES: Cães e gatos, dermatite, otite externa, malasseziose, prurido, M. pachydermatis.
External otitis is a common auditory
meatus infirmity diagnosed in dogs and cats sent to veterinarian
clinics. The etiology varies according to combinations of predisposing,
primary and perpetuating factors, responsible for the disease. Malassezia pachydermatis
is considered a normal inhabitant of the skin and can occasionally
become an opportunistic pathogen of the external canal of dogs and
cats. This study aimed to investigate the presence of M. pachydermatis
in canine external otitis. The presence of yeast in external otitis of
dogs sent to 168 veterinary hospitals in the Federal Universities of
Rio Grande do Sul and Pelotas, as well as to clinics and private
kennels was investigated. The sampling was performed with a sterile
swab moistened with saline solution, rubbing it in the ear canal.
Direct examination was performed from swabs of the collected material,
stained by Gram method and examined under optical microscopy (1000X).
It was seeded on Sabouraud Dextrose Agar with chloramphenicol and
incubated at 32°C for up to ten days when the yeasts were identified.
From the 168 cases of external otitis, M. pachydermatis was
isolated in 139 (82.7%) cases. In this study, there was no difference
regarding gender and age of the animals. The frequency of isolation in
samples with positive scores on direct examination was significantly
higher (p <0.05) than in samples with negative score. It was
verified that there is a seven times-higher probability of isolating M. pachydermatis from samples with positive direct examination. It was concluded that M. pachydermatis
is commonly isolated in canine external otitis cases, without
significant difference in relation to sex and age. Animals with ear
shifts (eg. English Cocker Spaniel) are more affected by external
otitis; however, there is no difference in proportion of the number of
isolation of M. pachydermatis among the races.
KEYWORDS: dogs, external otitis, malasseziosis, M. pachydermatis.
INTRODUÇÃO
A otite externa é um dos problemas mais comuns apresentados ao clínico
de pequenos animais, com incidência aproximada de 20% em cães e 6,6% em
gatos. Na espécie felina, está relacionada, na maioria das vezes, com
etiologia parasitária. Os casos crônicos muitas vezes levam à otite
média, acometendo metade dos pacientes afetados pela otite externa
crônica (WOOD & FOX, 1987; HARVEY
et al., 2004).
Essa enfermidade pode ser conceituada como inflamação, aguda ou
crônica, do meato acústico externo com o envolvimento de diferentes
agentes etiológicos e fatores predisponentes e perpetuantes que estão
relacionados com a infecção em cães e gatos (WHITE, 1999; MOTTA
et al., 2000; LEITE
et al., 2003; ROSA
et al.,
2006). As alterações mais comuns detectadas na otite externa são:
eritema, edema, descamação, crostas, alopecia e pelos partidos na face
interna do pavilhão auditivo; alterações no posicionamento da cabeça e
dor, principalmente, quando a cartilagem auricular é palpada (HARVEY
et al., 2004).
Os fatores predisponentes, que incluem a anatomia do pavilhão auricular
de algumas raças, pelos em excesso no meato acústico externo, canais
estenóticos, orelhas pendulares, doenças subjacentes, como as alergias,
umidade, doenças sistêmicas ou imunossupressoras e efeitos de
tratamentos anteriores, não causam diretamente a otite, mas aumentam o
risco de seu desenvolvimento, pois podem atuar em conjunto com a causa
primária no estabelecimento da doença clínica (WHITE, 1999; HARVEY
et al., 2004).
Os fatores perpetuantes são aqueles que não permitem a resolução da
otite externa, como, por exemplo, infecções por outros microrganismos,
entre eles, a
Malassezia pachydermatis,
respostas patológicas a otite externa, como hiperplasia epidérmica, que
tende a causar estenose luminal e hiperplasia de glândulas ceruminosas,
resultando em alteração do cerúmen. Em casos crônicos, uma ou mais
variáveis poderão estar presentes. O tratamento da causa primária pode
ser suficiente para controlar a doença nos casos iniciais, porém,
deverá ser direcionado aos fatores perpetuantes quando estes estiverem
presentes. Tais fatores podem ser a principal causa de insucesso na
terapia, independentemente dos fatores predisponentes ou das causas
primárias (HARVEY
et al., 2004).
Os fatores primários podem causar otite externa, com ou sem a presença
de fatores predisponentes ou perpetuantes. Entre as causas primárias
estão as bactérias oportunistas e patogênicas, os ectoparasitas, corpos
estranhos, tumores otológicos, desordens de ceratinização, distúrbios
imunomediados, erupção medicamentosa e hipersensibilidades (WOOD &
FOX, 1987; ETTINGER & FELDMAN, 1997; WHITE, 1999).
Entre as causas de persistência da enfermidade está a presença da levedura
M. pachydermatis. O significado da
M. pachydermatis
na etiologia da otite externa foi durante muito tempo questionado, mas
já se demonstrou seu importante papel na patogênese dessa enfermidade
(CHENGAPA
et al., 1983; MANSFIELD
et al., 1990; NOBRE
et al., 2001).
A
M. pachydermatis é
considerada um habitante normal da microbiota cutânea e ocasionalmente
patogênica oportunista do meato acústico externo de cães e gatos,
também podendo ser encontrada no reto, boca, pele interdigital,
tegumento cutâneo, sacos anais e vagina (BOND & ANTHONY, 1995;
CARLOTTI, 1997; BOND
et al., 2000; NASCENTE
et al., 2004; BRAGA
et al.,
2005). É considerada, por vários autores, um dos mais frequentes
microrganismos associados com otite externa em cães (CHENGAPA, 1983;
NOBRE
et al., 2001) e, nos últimos anos, os estudos também apontam essa levedura como causadora de dermatite canina (PLANT
et al., 1992; NOBRE
et al.,
1998). Esse fungo produz um exsudado marrom-escuro a negro e os animais
demonstram, frequentemente, meneios cefálicos. Entretanto, a
apresentação clínica desses sintomas não é específica e o diagnóstico
deve ser baseado na identificação da levedura, pela citologia do cerume
e cultura do agente (HUANG, 1994).
Vários autores (NOBRE
et al., 1998; NOBRE
et al., 2001; LEITE
et al., 2003; NASCENTE
et al.,
2004), em diversos países, têm publicado trabalhos com levantamentos
etiológicos, em que isolaram a levedura em amostras de otite
externa canina em variações de 20% a 88% das amostras colhidas.
Em vista do exposto, o objetivo deste trabalho foi avaliar a frequência, no período de seis meses, de
M. pachydermatis
em cães encaminhados aos serviços de dermatologia dos Hospitais
Veterinários das Universidades Federais de Pelotas e do Rio Grande do
Sul (HCV – UFRGS/UFPel), assim como em clínicas veterinárias e canis
particulares da cidade de Pelotas.
MATERIAL E MÉTODOS
Os animais foram atendidos nos ambulatórios de clínicas médicas das
instituições supracitadas e aqueles que apresentavam otite externa eram
encaminhados aos serviços de dermatologia dessas instituições. Os
animais então eram submetidos a exame clínico geral e otológico,
procurando verificar a presença de cerúmen excessivo, prurido, eritema
do meato acústico externo e maneios cefálicos. Todos os animais foram
identificados e acompanhados com ficha que continha a data e
procedência da coleta, resenha do animal como idade, sexo e raça e o
exame otológico. Além do exame clínico do ouvido, nos animais que
apresentavam cerúmen excessivo, realizou-se a colheita deste material
com swab estéril umedecido em solução salina, friccionando-o na porção
externa do meato acústico suspeito.
De acordo com a idade, distribuíram-se os animais em quatro classes. Na
primeira classificação, inseriram-se os animais que apresentavam menos
de três anos de idade, na segunda, os animais na faixa de três a seis
anos de idade e, na terceira, foram incluídos aqueles que apresentaram
mais de seis anos de idade. Aqueles animais em que o proprietário
desconhecia a idade foram agrupados numa quarta categoria, com idade
não identificada (NI).
Para o estudo da presença da
M. pachydermatis
nas secreções de meato acústico externo foi realizado exame direto a
partir de esfregaço do material proveniente do cerúmen, colhido com
swab, utilizando-se a coloração pelo método de Gram e observados em
microscopia óptica (1000X) em busca de células leveduriformes com
morfologia compatível a
M. pachydermatis. O exame direto foi avaliado por campo, percorrendo toda a lâmina e contando as células semelhantes a
M. pachydermatis,
considerando-se amostras negativas (-) a ausência de células/campo; (+)
existindo até cinco células/campo; (++) presença de seis a dez
células/campo; (+++) quando encontradas mais de dez células/campo
(KOVALSKY, 1988).
As mesmas amostras de cerúmen de meato acústico externo foram semeadas
em placa de Petri contendo ágar Sabouraud dextrose acrescido de
cloranfenicol e cicloheximida, e incubadas em estufa bacteriológica à
temperatura de 32ºC por até dez dias. Esse meio de cultivo não permite
o crescimento de outras espécies do gênero. Observaram-se diariamente
as características macromorfológicas das colônias, visualizando-se a
morfologia celular através de esfregaço dos cultivos corado pela
técnica de Gram. As características bioquímicas foram avaliadas através
de testes de produção de urease e catalase em todas as amostras.
Os resultados foram codificados segundo os parâmetros das
características dos animais (sexo, idade e conformação do pavilhão
auricular), exame direto e isolamento. Posteriormente, analisaram-se
estes dados pelo programa EPIinfo (Epi Info (TM) software)*, através da
realização de distribuição de frequências com realização do teste de
“qui-quadrado” (STATISTIX, 2000) para comparação.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Neste estudo, verificaram-se 168 casos de otite externa canina, sendo
90 (53,6%) em animais fêmeas e 78 (46,4%) em machos. Já foi relatada
maior frequência de machos com otite externa. Porém a maioria dos
autores confirma não ter observado predisposição relacionada ao sexo
(MOTA
et al., 2000; MACHADO
et al., 2003), estando de acordo com os resultados encontrados neste experimento.
Em relação à faixa etária, 40 (23,8%) animais estavam com menos de três
anos de idade, 47 (28%) estavam na faixa de três a seis anos de idade,
38 (22,6%) animais apresentavam mais de seis anos de idade e em 43
(25,6%) não foi possível a identificação da idade. Assim, observou-se
que a maior parte dos animais acometidos por otite externa era
constituída por fêmeas (53,5%) na faixa de três a seis anos de idade
(28%), embora sem diferença significativa. Na literatura, há grande
diversidade de citações quanto à faixa etária mais acometida (HARVEY
et al., 2004), porém NARDONI
et al.
(2004) observaram maior isolamento na faixa de 1 a 5 anos de idade e
sem diferença entre sexos. A avaliação da faixa etária mais acometida
por otite externa é dificultada, dada a subdivisão, a cada autor, em
diferentes categorias. No presente estudo, em que se dividiram as
faixas etárias em três categorias – animais jovens, adultos e idosos –,
observou-se que a categoria de animais adultos foi a mais acometida.
Essas avaliações não possibilitam a confirmação de alguma predisposição
de gênero ou de faixa etária em casos de otite externa, uma vez que os
fatores predisponentes a otite externa estão relacionados também a
outras questões, como erros de manejo, limpeza inadequada do canal
auditivo, e ainda fatores anatômicos, como orelha pendular.
As raças acometidas por otite externa, observadas neste trabalho, foram
Cocker Spaniel Inglês (37/168), Poodle (25/168), Labrador Retriever
(14/168), Teckel (4/168), Pastor Alemão (4/168), Dálmata (3/168), Shar
pei (3/168), Chow Chow (2/168), Rottweiler (2/168), American Pit Bull
Terrier (2/168), Dogue Alemão (2/168), Simarrom (2/168), Fila
Brasileiro (2/168), Chihuahua (1/168), Boxer (1/168), Buldogue Inglês
(1/168), Husky Sibriano (1/168), Old English Sheepdog (1/168). Os
animais sem raça definida (SRD) responderam por 61 casos. Para
facilitar a análise, essas raças foram distribuídas em dois grupos,
tendo como variável o formato do pavilhão auricular, uma vez que
algumas dessas raças apresentaram apenas um exemplar. De acordo com
essa conformação, consideraram-se de orelha ereta os nove animais das
seguintes raças: Pastor Alemão, Bulldog Inglês, Husky Siberiano,
Chihuahua e American Pit Bull Terrier. Os 98 animais de raças de orelha
pendular foram considerados os seguintes: Cocker Spaniel Inglish,
Poodle, Teckel, Chow Chow, Retriever do Labrador, Fila Brasileiro,
Boxer, Dálmata, Shar pei, Old English Sheepdog, Rottweiler, Simarrom e
Dogue Alemão. Os animais sem raça definida (SRD) também foram agrupados
conforme o formato do pavilhão auricular, sendo 20 animais com pavilhão
auricular ereto e 41 animais com pavilhão auricular pendular. Houve um
total de 139 (82,7%) animais com orelha pendular e 29 (17,3%) com
orelha ereta, o que demonstrou uma diferença significativa em casos de
otite externa em animais com orelhas pendulares.
Esta observação já foi descrita por YOSHIDA
et al.
(2002), que verificaram também que a otite externa canina é uma
enfermidade que ocorre mais frequentemente em animais de raça com
pavilhão auricular pendular (Cocker Spaniel Inglês, Basset Hound),
animais com pelos no interior do meato acústico externo (Poodle,
Yorkshire) e raças predispostas à seborreia (Cocker Spaniel Inglês,
Basset Hound). Trata-se de características anteriormente observadas por
CARLOTTI
et al. (1997) e GIORGI
et al.
(1996). Segundo MANSIFIELD (1990), isso possivelmente se
justifica pela alteração no microclima do meato acústico no caso de
orelha pendular, que, consequentemente, favorece o crescimento de
fungos. Os cães da raça Pastor Alemão têm a conformação da orelha
ereta, porém são considerados predispostos a otite externa em virtude,
provavelmente, das glândulas sudoríparas apócrinas em maior número.
Além desse fator importante, deve ser considerando que os pastores têm
maior facilidade da entrada de água, o que favorece o crescimento de
microrganismos, principalmente os fungos.
No exame direto, verificou-se que 32 (19,1%) amostras apresentaram
escore negativo (-), em que não se observou a presença de células
leveduriformes. De total, 136 (81%) apresentaram escores positivos (
Figura 1). Destes, 63 (37,5%) apresentaram escore +; 45 (26,8%) ++ e 28 (16,7%) +++ (
Tabela 1).
Ao serem consideradas apenas as amostras que apresentaram positividade
no exame direto, ou seja, 136 (100%), observaram-se 63 (46,3%) amostras
com escore +, 45 (33,1%) com escore ++ e 28 (20,6%) com escore +++.
Verificou-se que a levedura apresentava-se com células isoladas ou em
grupos sem hifas ou pseudo-hifas. Os blastoconídeos apresentaram forma
globosa, ovoide ou cilíndrica, adquirindo o “formato de garrafa” quando
em gemulação.
Alguns autores como BOND
et al.
(1996) consideram a presença de numerosas células da levedura por campo
microscópico como indício de atividade patogênica. Entretanto, RIBEIRO
et al.
(1997) também isolaram a levedura em meato acústico de animais hígidos,
encontrando alto número de células leveduriformes no exame direto do
meato acústico externo desses animais. Assim, devem-se associar os
resultados do exame direto aos sinais clínicos. Segundo HUANG (1994),
esse exame deve ser realizado em qualquer situação de otopatia em
caninos, uma vez que esse exame citológico possui grande valor no
diagnóstico de otopatias, além de proporcionar base sólida para o
acompanhamento do quadro clínico e tratamento (GOTTHELF, 2000).
A
M. pachydermatis foi isolada
em 139 (82,7%) amostras de cerúmen colhidas dos 168 cães com otite
externa. Desse total, observou-se que no exame direto 55 (39,6%)
apresentaram amostras com escore +, 41 (29,5%) com escore ++, 26
(18,7%) com escore +++ e 17 (12,2%) amostras com escore -. Nas 29
amostras restantes, em que não se obteve isolamento da
M. pachydermatis,
observou-se que em oito (27,6%) o exame direto foi positivo (+), em
quatro (13,8%) (++), em dois (6,9%) (+++) e nas outras 15 (51,7%) não
foram verificadas células compatíveis com a levedura ao exame.
O isolamento da levedura
M. pachydermatis
em 139 (82,7%) dos 168 casos estudados confirma o envolvimento
oportunista da levedura, que por vários anos foi considerada desprovida
de poder patogênico (MACHADO
et al., 2003) e atualmente é considerada de grande relevância nas otites micóticas e nas dermatites em cães (DUFFAIT, 1983; PLANT
et al., 1992; GIORGI
et al., 1996; NOBRE
et al., 1998; NASCENTE
et al., 2005). No presente trabalho, a frequência de
M. pachydermatis
(82,7%) nos casos de otite externa canina está de acordo com os
resultados obtidos anteriormente por outros autores. Segundo a
literatura consultada, a frequência de isolamento da levedura em otite
externa é variável, atingindo frequências baixas, de 3 a 7% (BONATTO
et al., 1999), chegando de 35% a 55% (GRONO & FROST, 1969; STARONIEWICZ
et al., 1995) e podendo alcançar valores extremos de 80% a 100% (BERNARDO
et al., 1998; NOBRE
et al., 1998; LEITE
et al., 2003; NASCENTE
et al., 2004).
A frequência de isolamentos nas amostras que apresentaram escore
positivo no exame direto (+, ++ ou +++) foi significativamente maior
(p<0,05) que nas amostras que apresentaram escore negativo. Entre as
amostras que apresentaram escores positivos no exame direto, não houve
diferença significativa entre os escores (+, ++ ou +++) em relação ao
isolamento da levedura.
Foi possível demonstrar neste trabalho a relação entre o exame direto e o isolamento da
M. pachydermatis, verificando-se a probabilidade sete vezes maior de isolar
M. pachydermatis a partir de amostras com exame direto positivo, em qualquer escore (OR=7, 6891; IC= 3,1649-18,6805).
Observamos que a otite externa ocorreu em maior parte em animais com
orelha pendular (82,7%), porém, proporcionalmente não houve diferença
entre isolamento da levedura em animais com orelha ereta (77,8%) ou
pendular (78,8%). As amostras de cerume de cães da raça Cocker Spaniel
Inglês com otite externa foram numerosas (37/168) (
Tabela 2). Considera-se essa
raça predisposta à enfermidade. Geralmente, ela apresenta a seborreia
idiopática pruriginosa, que, consequentemente, favorece a multiplicação
desse microrganismo (FEIJÓ
et al.,
1998). No caso de animais com orelha ereta, o pastor alemão apresenta
predisposição, mostrando uma maior secreção proporcionada pelo maior
número de células secretoras nessa raça, com consequente multiplicação
da
M. pachydermatis, dada sua característica lipofílica (MAGALHÃES
et al., 1985; FEIJÓ
et al., 1998). De acordo com FEIJÓ
et al. (1998), a raça mais acometida por malasseziose ótica é Poodle, independentemente do agente etiológico. GIORGI
et al. (1996) também consideram essa raça mais predisposta à otite externa.
A predisposição etária não foi observada nos casos de malasseziose, uma
vez que foi ampla a variação entre as idades de todos os animais
estudados. Ressalve-se porém, que FEIJÓ
et al.
(1998) encontraram maior porcentagem de animais na faixa etária entre
dois meses e três anos de idade, considerando que animais jovens são
mais acometidos que adultos. CHENGAPA
et al.
(1983) descreveram a malasseziose em todas as faixas etárias, porém,
com maior porcentagem até nove meses. E outros estudos relatam uma
frequência em animais com até dois anos de idade (MACHADO
et al., 2003). CHOI
et al.
(2001) relatam a ocorrência de malasseziose em animais com faixa etária
entre um e três anos de idade e DUFFAIT (1983) considera que os casos
ocorrem na maioria em cães com mais de dois anos. Portanto, dada essa
variedade de resultados, até o momento não se pode apontar a
faixa etária mais predisposta aos casos de malasseziose. Provavelmente,
essa falta de predisposição etária para o seu desenvolvimento ocorra em
virtude de seu caráter oportunista, pois são vários fatores que podem
levar essa levedura comensal a tornar-se patogênica, o que não se
relaciona à faixa etária.
O isolamento da levedura ocorreu em porcentagens iguais entre os dois sexos. FEIJÓ
et al.
(1998) observaram maior número de isolados da levedura em machos,
todavia, de acordo com vários autores, não existe predisposição
relacionada ao gênero (DUFFAIT 1983; LARSON
et al., 1988; MACHADO
et al.,
2003). Supõe-se que fêmeas sejam mais predispostas ao desenvolvimento
de otite externa e de malasseziose por causa da imunossupressão durante
o período de cio. Entretanto, essa hipótese ainda não foi confirmada.
O total de cães com otite externa positivos para a
M. pachydermatis
foi de 34 (24,5%) com menos de três anos de idade; 38 (27,3%) na faixa
de três a seis anos de idade; 31 (22,3%) com mais de seis anos de
idade e 36 (25,9%) sem idade identificada (
Tabela 3).
Dos cães com otite externa, dos quais se isolou a
M. pachydermatis, 75 (54%) eram fêmeas e 64 (46%) eram machos (
Tabela 4).
Não houve diferença significativa na frequência de isolamentos da
M. pachydermatis
quando considerados a idade (p=0,6657) e o sexo (p=0,7807) dos animais.
Entretanto, ao se relacionar a idade ao exame direto, constatou-se
maior frequência de animais com faixa etária maior que seis anos de
idade com escore positivo ao exame direto (p=0,179).
Após o período de incubação, observou-se o crescimento das colônias opacas de coloração amarelo-creme (
Figura 1)
com superfície redonda ou em forma de cúpula com textura seca, friável
e granulosa e algumas vezes gordurosa. Todos os isolados de
M. pachydermatis foram positivos para o teste da catalase e todas as amostras foram positivas no teste da urease (
Figura 2).
Trata-se de resultados que corroboram conclusões anteriormente citadas
por BAPTISTA (1986), BOND & ANTHONY (1995), GUILLOT
et al. (1996), NOBRE (1998), DWORECKA & TOKA (1999). Isto ocorreu, possivelmente, pela capacidade da
M. pachydermatis
em hidrolizar e utilizar a ureia como fonte de nitrogênio através da
enzima urease. Testada até 96 horas após o crescimento da levedura, foi
possível verificar positividade em todos os isolados em até 48 horas,
concordando com outros autores (BAPTISTA, 1986; BOND & ANTHONY,
1995; NOBRE, 1998).
CONCLUSÃO
Em vista do exposto, pode-se concluir que a otite externa foi mais
frequentemente observada em cães machos com idade entre três e seis
anos com orelha pendular. Entretanto, em relação ao isolamento de
M. pachydermatis,
nestes casos de otite externa não se observou diferença significativa
do isolamento em relação ao sexo e idade dos animais. E quanto ao
pavilhão auricular, os cães com orelha pendular, destacando-se a raça
Cocker Spaniel Inglês, são mais frequentemente acometidos por otite
externa.
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Protocolado
em: 18 fev. 2008. Aceito em: 16 abr.
2010.