DOI: 10.1590/1089-6891v17i325415

MEDICINA VETERINÁRIA

BIOPSIA RETAL EM OVINOS E CAPRINOS PARA MONITORAMENTO E DIAGNÓSTICO ANTE MORTEM DE SCRAPIE: NÚMERO DE FOLÍCULOS LINFOIDES EM DUAS COLHEITAS CONSECUTIVAS


RECTAL BIOPSY IN SHEEP AND GOATS FOR MONITORING AND ANTE- MORTEM DIAGNOSIS OF SCRAPIE: NUMBER OF LYMPHOID FOLLICLES IN TWO CONSECUTIVE COLLECTIONS


Helen Caroline Raksa1

Liv Cristina Miara1

Dhéri Maia1

Adriane Holtz Tirabassi1

Cristina Santos Sotomaior1*


1Escola de Ciências Agrárias e Veterinárias da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, São José dos Pinhais, PR, Brasil.

*Autora para contato - cristina.sotomaior@pucpr.br


Resumo

Este estudo teve por objetivo avaliar a quantidade de tecido linfoide associado à mucosa retal obtido pela técnica de biopsia retal e a possibilidade de se realizarem duas biopsias consecutivas, em diferentes intervalos de tempo, para monitoramento e diagnóstico ante mortem de scrapie. Para isso, foram estudados 56 ovinos e 32 caprinos. No dia zero, todos os animais foram submetidos a biopsias e, posteriormente, divididos em grupos. As colheitas foram realizadas aos dias sete, 14, 21 e 28 para os ovinos, e 14, 21 e 28 para os caprinos. De 176 amostras, 151 (85,8%) foram colhidas da mucosa retal e, em 25 (14,2%), houve falha de colheita. Considerando-se as amostras colhidas da mucosa retal (151), em 56,86% das amostras de ovinos e 51,61% de caprinos, no dia 0, havia ≥3 folículos linfoides (FL). Na segunda colheita, 58,97% das amostras de ovinos possuíam ≥3 FL e, para caprinos, 33,33%. Na comparação do número de FL entre a primeira e a segunda colheitas houve diferença (p<0,05) entre os dias 0 e 7 (com mais FL no dia 0) e 0 e 28 (com mais FL no dia 28) para ovinos, e entre os dias 0 e 28 (com mais FL no dia 0) para caprinos. Comparando-se as duas espécies, não houve diferença no número de FL nos dias 0, 14 e 21. No dia 28, a proporção de amostras com ≥3 FL foi maior nos ovinos (p<0,05) que nos caprinos. Concluiu-se que a técnica de biopsia retal compreende método útil para a obtenção de tecido linfoide associado à mucosa para avaliação imuno-histoquímica voltada ao monitoramento e diagnóstico ante mortem de scrapie em ovinos e caprinos. Porém, a colheita inadequada e a obtenção de número insuficiente de FL podem ocasionar a necessidade de repetição da técnica, o que pode ser realizado após 14 dias da primeira colheita, sem redução no número de FL.

Palavras-chave: doença priônica; encefalopatias espongiformes transmissíveis; imuno-histoquímica; pequenos ruminantes; tecido linfoide associado a mucosa retoanal.


Abstract

This study aimed to evaluate the amount of lymphoid tissue associated with the rectal mucosa obtained by rectal biopsy and the possibility of two consecutive biopsies at different time intervals, for monitoring and ante-mortem diagnosis of scrapie. Rectal mucosa samples were collected from 56 sheep and 32 goats in two steps. In the first step, on day 0, all animals were tested and, for the

second step, the animals were divided into groups and each group was subjected to collection on

different dates: for sheep 7, 14, 21, and 28 days after the first one and, for goats, on days 14, 21, and

28. From 176 samples, 151 (85.8%) were collected from the rectal mucosa, and in 25 (14.2%) there was a collection failure. Considering the rectal mucosa samples (151), 56.86% of the sheep samples and 51.61% of the goat samples, on day 0, had more then ≥3 lymphoid follicles (LF). In the second collection, 58.97% of the sheep samples showed ≥ 3 LF and 33.33% of the goat samples. Comparing the number of LF of the same animals between the first and second collections, there was a significant difference (p <0.05) between days 0 and 7 for sheep (with more FL on day 0) and days 0 and 28 (with more LF on day 28) and days 0 and 28 for goats (with more FL on day 0). There was no significant difference in the number of FL assessed on dates 0, 14, and 21 when comparing the different species, sheep and goats. On day 28, sheep samples showed a higher number (p <0.05) of LF than goats. It was concluded that rectal biopsy technique involves useful method for obtaining lymphoid tissue associate to mucosa for immunohistochemistry assessment to monitoring and ante-mortem diagnosis of scrapie in sheep and goats. However, inappropriate sampling or insufficient numbers of FL can generate the necessity to repeat the technique, which could be done 14 days after the first collection, without reduction in the number of the FL.

Keywords: immunohistochemistry; prionic disease; recto-anal mucosa associated lymphoid tissue; small ruminants; transmissible spongiform encephalopathies.


Enviado em: 14 julho de 2013

Aceito em: 20 abril de 2016


Introdução


Encefalopatias espongiformes transmissíveis (ETTs) ou doenças priônicas são desordens neurológicas, progressivas e fatais que afetam animais e humanos. Associam-se ao acúmulo de proteína priônica alterada no sistema nervoso central (SNC) e as lesões histológicas compreendem principalmente vacuolização e morte neural(1). São muitas as enfermidades que compõem o grupo das ETTs, incluindo encefalopatia espongiforme bovina (EEB) em bovinos, scrapie em pequenos ruminantes e a doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) em humanos(2).

Segundo Detwiler e Baylis(3), a scrapie tem sido relatada em diversos países do mundo e está presente em muitas regiões produtoras de ovinos. É endêmica em vários países da Europa, Canadá e Estados Unidos, porém Austrália e Nova Zelândia são consideradas livres da doença(3,4). À semelhança do que ocorre nas demais EETs, na scrapie há acúmulo da isoforma anormal (PrPSc) da proteína priônica celular (PrPC) não apenas no SNC, mas também no sistema linforreticular (SLR) e, variavelmente, em outros tecidos e fluidos corporais(1).

O acúmulo da PrPSc em tecidos linfoides levou ao desenvolvimento de procedimentos de biopsia para o diagnóstico ante mortem da scrapie em ovinos, utilizando tecidos acessíveis como a tonsila(5) e terceira pálpebra(6), e a técnica de imuno-histoquímica (IHQ). Por outro lado, a grande área de folículos linfoides presente no reto de ovinos(7) tornou a biopsia retal uma possibilidade de diagnóstico ante mortem da scrapie. Amostras da mucosa retal têm sido colhidas e analisadas por meio de provas de IHQ para avaliar a presença de PrPSc no tecido linfoide associado à mucosa retoanal (RAMALT, do inglês Recto-Anal Mucosa Associated Lymphoid Tissue)(8,9).

No Brasil, o primeiro relato de scrapie foi em 1978, em um ovino Hampshire Down, importado da Inglaterra(10). Segundo a OIE, de 2008 a 2014 foram sacrificados 41 animais no país, em surtos de scrapie(11). Desde 2008, o diagnóstico de scrapie é realizado por meio da técnica de IHQ a partir de amostras do SNC e tecidos linfoides(12). Porém, no caso de tecidos linfoides associados à mucosa retal, pode haver necessidade de novas colheitas em curtos intervalos de tempo devido à escassez de tecido para o diagnóstico da doença que, segundo Leal et al.(13), deve ser de no mínimo três folículos linfoides (FL) por amostra.

Visando ao reconhecimento de boas técnicas para o monitoramento e o diagnóstico ante mortem da scrapie, o presente estudo teve por objetivo avaliar a quantidade de tecido linfoide associado à mucosa retal obtido pela técnica de biopsia retal e com vistas à avaliação imuno-histoquímica, bem como a possibilidade de se realizarem dois procedimentos de biopsia consecutivos, em diferentes intervalos de tempo, em ovinos e caprinos.


Material e Métodos


Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética no Uso em Animais (CEUA) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), sob número 452. Foram selecionados 88 animais do rebanho da Fazenda Experimental Gralha Azul (FEGA) da PUCPR, sendo 56 ovinos e 32 caprinos, submetidos à biopsia retal em duas etapas. Na primeira etapa para ovinos (0) foram colhidas amostras dos 56 animais e, na segunda, estes foram divididos em quatro grupos (n=14) e as colheitas realizadas aos dias 7, 14, 21 e 28 após a primeira (0). Procedimento semelhante foi adotado para os 32 caprinos, submetidos à primeira colheita (0) e, em seguida, divididos em três grupos (n= 10, n=10, n=12) e submetidos novamente à biopsia aos dias 14, 21 e 28 após a primeira (0). As colheitas foram realizadas com o intuito de se avaliar a presença e o número de FL obtidos pela técnica de biopsia retal, e a segunda teve o objetivo adicional de avaliar a possibilidade de novas colheitas do mesmo animal em curtos intervalos de tempo.

Para as colheitas, realizadas segundo González et al.(14), os animais foram submetidos à contenção física e anestesia local com pomada de xilocaína a 2%. Um espéculo, individual e vazado na parte inferior (Moredun RecSpec; Veterinary Instrumentation), foi introduzido no reto dos animais para ampliar o campo de visão da área de colheita, favorecendo uma melhor obtenção das amostras e menor agressão ao tecido (Figura 1). Assim que localizada a área da colheita, situada a aproximadamente 1cm da junção mucocutânea, uma amostra de tecido foi colhida com o auxílio de pinça e tesoura. Os fragmentos obtidos foram conservados em frascos individualmente identificados e contendo formalina tamponada neutra a 10%.



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Os fragmentos de tecido fixados em formalina a 10% foram processados e incluídos em parafina, cortados a 4 µm, corados por hematoxilina e eosina (HE) e avaliados microscopicamente. Amostras contendo epitélio cilíndrico, encontrado na mucosa retal, foram consideradas como colhidas da área desejada e as demais, contendo epitélio estratificado característico do canal anal, foram consideradas como falha de colheita. As amostras colhidas adequadamente foram avaliadas quanto ao número de

FL, classificando-as em amostras com quantidade de FL igual ou maior que três (≥3 FL), e amostras com menos de três FL (<3 FL). Segundo Leal et al.(13), três é o número mínimo de FL em amostras de mucosa retal para posterior realização de IHQ para diagnóstico de scrapie. Após classificação das amostras, tabulou-se a quantidade de FL de acordo com a idade dos animais.

A análise estatística foi realizada pelo método de qui-quadrado (x²) (utilizando-se o software Statgraphics plus for Windows) para se avaliar o número de amostras colhidas da mucosa retal, (utilizando-se a correção de Yates), comparar a quantidade de FL entre a primeira e segunda colheita de cada animal, a quantidade de FL entre as diferentes datas da segunda colheita, a quantidade de FL encontrados em ovinos e caprinos nos dias 0, 14, 21 e 28, avaliando-se se houve influência da espécie, além de se analisar se a idade dos animais influenciou na adequação das amostras. A H0 foi que o número de FL fosse igual para todas as comparações e a H1 que o número de FL tenha variado significativamente, considerando-se nível de significância de 5%.

 


Resultados


Do total de 176 amostras, 151 (85,8%) foram colhidas da mucosa retal (Figura 2A) e em 25 (14,2%), houve falha de colheita (Figura 2B). Considerando-se as 56 amostras de ovinos na primeira colheita, 51 (91%) foram de mucosa retal e, das 32 amostras de caprino, foram 31 (96,9%). Na segunda colheita, para ovinos, 39 (69,6%) amostras foram colhidas da área desejada e, para caprinos, 30 (93,7%). Para ovinos houve diferença significativa entre a quantidade de amostras de mucosa retal e amostras em que houve falha na 1ª e 2ª colheita (p=0,01); para caprinos, não houve diferença significativa (p>0,05).



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Para ovinos, o número de FL encontrados variou de zero a 15, sendo que, na primeira colheita, em 29 (56,86%) das 51 amostras de mucosa retal, foram observados ≥3 FL e, considerando-se todos os grupos da segunda colheita, em 23 (58,97%) das 39 amostras havia a presença de ≥3 FL. Na Figura 3, é possível visualizar a porcentagem de amostras que continham 0, 1 a 2, 3 a 10 e >10 FL para os diferentes dias de colheita.

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A Tabela 1 mostra a comparação do número de FL entre a primeira e segunda colheita para os animais de cada grupo (0-7, 0-14, 0-21 e 0-28) em que ambas as colheitas foram do local correto. Houve diferença significativa no número de FL entre os dias 0 e 7, com maior porcentagem de amostras com ≥ 3 FL, no dia 0 do que no dia 7 (66,67% x 33,33%) e entre os dias 0 e 28, com maior proporção de amostras com ≥ 3 FL no dia 28 (50,0% x 83,33%). Entre os dias 0-14 e 0-21 não houve diferença significativa entre o número de FL.


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O número de FL, para caprinos, variou de 0 a 35, sendo que das 31 amostras de mucosa retal, na primeira colheita, 16 (51,61%) continham número de FL ≥3 e, na segunda colheita, 10 (33,33%) das 30 amostras continham esse número de FL. A porcentagem de amostras que continham 0, 1 a 2, 3 a 10 e acima de 10 FL pode ser observada na Figura 4.



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Para caprinos, na comparação do número de FL entre as colheitas, para os animais em que ambas as colheitas foram do local correto, não houve diferença significativa entre os dias 0-14 e 0-21. Entre os dias 0-28 houve diferença significativa, sendo que no dia 0 a porcentagem de amostras de mucosa retal com ≥3 FL, dos 11 animais, foi maior que no dia 28 (54,54% x 18,18%) (Tabela 2).


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Comparando-se as duas espécies, ovinos e caprinos, não houve diferença significativa entre o número de FL encontrados nos dias 0, 14 e 21. Somente no dia 28 o número de amostras com ≥3 FL foi maior (p < 0,05) nos ovinos em comparação aos caprinos (Tabela 3).



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Ao compararem-se as amostras contendo ≥3 FL com a idade dos animais, observou-se que a porcentagem de amostras com ≥3 FL foi superior para animais com idade entre 1 e 2 anos. Das 40 amostras de ovinos (2 colheitas de 20 animais) entre um e dois anos, 82,5% apresentaram ≥3 FL e, para caprinos, foram 70,83% das 24 amostras (12 animais). A quantidade de amostras dos animais com idade superior a quatro anos, que apresentaram ≥3 FL, foi inferior, sendo para ovinos 40,0% de 30 amostras (15 animais) e para caprinos 20% de 20 amostras (10 animais). A análise estatística mostrou que houve influência significativa da idade sobre a quantidade de FL (p<0,01), em ambas as espécies.


Discussão


Como o longo período de incubação dificulta o controle da scrapie, as técnicas de diagnóstico ante mortem, como é o caso da técnica de biopsia retal associada à imuno-histoquímica, tornam-se cada vez mais importantes. Segundo O’Rourke et al.(15), a detecção da PrPSc no tecido linfoide pode ser feita meses ou anos antes do desenvolvimento da doença clínica. No Brasil, desde 2008, o diagnóstico ante mortem passou a ser possível, em casos de surtos, para testar os animais suspeitos(12).

Apesar de a biopsia da terceira pálpebra ter sido o primeiro passo para o diagnóstico pré-clínico, não invasivo em ovinos(15), nesta área a quantidade de tecido linfoide é pouca e o tecido não se regenera(16). No caso da técnica de biopsia retal, além de ser um procedimento mais simples, há obtenção de um maior número de FL(14), o que possibilita submeter os animais a novas colheitas caso a quantidade de FL na amostra inicial seja insuficiente, o diagnóstico seja inconclusivo, ou haja a necessidade de acompanhamento de rebanhos.

Durante as biopsias retais, não foram observados efeitos adversos, o sangramento foi mínimo e ocasional, e o desconforto pós-procedimento imperceptível (os animais continuavam se comportando normalmente), corroborando os dados descritos por González et al.(8) . Dennis et al.(17) observaram complicações potencialmente associadas com o procedimento apenas em 3 (1,7%) das 180 ovelhas submetidas à biopsia (prolapso retal, hemorragia retal e perfuração de reto). Espenes et al.(9) não aconselham colher mais de duas amostras por animal de cada vez, devido à eventual ocorrência de hemorragia leve.

No presente estudo, 151 (85,8%) das 176 amostras foram colhidas da área desejada e os 14,2% de amostras colhidas do canal anal evidenciaram que, apesar de ser uma técnica simples, pode haver falha de colheita, o que ocasiona a necessidade de se repetir o procedimento. A diferença significativa na porcentagem de amostras adequadas, na primeira e segunda colheitas dos ovinos, foi observada na colheita realizada no dia sete, quando ainda havia indícios da colheita anterior, dificultando a obtenção de uma nova amostra. Nas demais colheitas, as lesões já estavam macroscopicamente cicatrizadas, como também descrito por González et al.(14), que, avaliando as ovelhas dez a 15 dias após biopsia, observaram que as lesões já estavam cicatrizadas, além de relatar que as biopsias podem ser repetidas no mesmo animal, sem detrimento do seu bem-estar.

Outro fator importante, antes de se submeterem as amostras à análise IHQ, é a avaliação do número de FL. No presente estudo, foi utilizado como critério a presença mínima de três FL, padrão publicado por Leal et al.(13). Gavier-Widén et al.(18), no entanto, relataram a necessidade de no mínimo 4 a 6 FL, por amostra. No estudo de Dennis et al.(17), quando uma amostra de tecido de mucosa retal ou terceira pálpebra com número inferior a seis FL não apresentou imunomarcação específica da PrPSc, os resultados dos testes foram considerados inconclusivos porque havia pouco tecido para se detectar a doença. Portanto, para a IHQ, ainda não há um consenso quanto ao número mínimo de FL por amostra.

Nas amostras avaliadas, a quantidade de FL variou de zero a 15 para ovinos e de zero a 35 para caprinos, sendo que para ovinos, em 71,11% do total de amostras colhidas foram encontrados FL e, para caprinos, em 67,21%. Espenes et al.(9) obtiveram FL em 87% de 84 amostras, variando de um a 30, e Leal et al.(13) obtiveram folículos linfoides da mucosa retal em 263 de 318 biopsias (82,70%). Portanto, a porcentagem de amostras com FL neste trabalho foi inferior às relatadas, assim como a alta porcentagem de amostras com número de FL inferior ao necessário. Considerando o dia 0, em apenas 56,86% das amostras colhidas de ovinos e em 51,61% de caprinos foram encontrados ≥3 FL. Aleksandersen et al.(7) relataram a localização agregada dos folículos linfoides entre pregas longitudinais, na mucosa retal, o que poderia explicar as variações na quantidade de FL. Outra possibilidade, segundo Dennis et al.(17), seria a realização da colheita mais caudal à junção mucocutânea, área onde há menor quantidade de FL. Esses pontos são importantes, pois a colheita inadequada e a quantidade insuficiente de FL são limitadores para a utilização da biopsia da mucosa retal no diagnóstico da scrapie(13).

O número de FL neste trabalho também foi influenciado pela idade dos animais. Segundo González et al.(14) e Monleón et al.(19), o número de FL na mucosa retal diminui com a idade, desta forma, animais jovens apresentam maior número de FL que os animais mais velhos.

Além da idade dos animais, colheitas anteriores da mesma área também podem interferir na quantidade de FL, pois a lesão ocasionada pela colheita não é suficiente para desencadear a formação de novos FL, assim como descrito por O’Rourke et al.(16) em estudo utilizando amostras de tecido linfoide da terceira pálpebra. Neste experimento alguns ovinos e caprinos já haviam sido submetidos à biopsia retal, para treinamento da técnica, sem que houvesse um controle de quais eram estes animais. Uma forma de evitar colheitas da mesma área é a divisão da região da mucosa retal em quadrantes e realização de cada colheita em um quadrante diferente, sendo todas estas informações armazenadas. Segundo Dennis et al.(17), em seu estudo, não houve diferença significativa entre a sensibilidade para IHQ em diferentes áreas colhidas da mucosa retal: região esquerda ventral (10 a 11 horas), esquerda dorsal (7 a 9 horas) e direita dorsal (3 a 5 horas) da mucosa retal.

Analisando-se a possibilidade de colheitas consecutivas, observou-se que, a partir de 14 dias em ovinos, não houve diferença significativa no número de FL, corroborando dados de González et al.(14). A colheita do dia 7, entretanto, apresentou número inferior de FL, não sendo indicado repetir a colheita neste intervalo de tempo. Para caprinos, houve uma redução no número de FL no dia 28, apesar dos dias 14 e 21 não apresentarem redução, o que poderia ter ocorrido por falha de colheita.

Na comparação do número de FL entre ovinos e caprinos, diferente de Monléon et al.(19), que relataram um número de FL maior em ovinos, não foi observada influência da espécie, exceto no dia 28. O número reduzido de FL neste dia 28 para caprinos, conforme explicado anteriormente, poderia ter ocorrido por falha de colheita. Sendo assim, a técnica poderia ser utilizada para ambas as espécies.

No Brasil, a scrapie deixou de ser considerada doença exótica desde o surto ocorrido no rebanho de ovinos da Fazenda Gralha Azul da PUCPR em 2003(20) e, desde então, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) tem trabalhado, dentro do Programa Nacional de Controle da Raiva dos Herbívoros e Controle das Encefalopatias Espongiformes Transmissíveis, em um programa específico de controle da scrapie. Atualmente, são considerados animais com diagnóstico positivo para scrapie ovinos e caprinos com resultado positivo à prova de imuno-histoquímica em amostras de tecido nervoso ou linfoide(12). Leal et al.(13) demonstraram que a utilização de tecidos linfoides, obtidos por meio de biopsias e, posteriormente, submetidos à técnica de IHQ, é um método viável e eficaz para o diagnóstico pré-clínico da scrapie. Devido ao pequeno número de publicações brasileiras sobre biopsias retais em ovinos e caprinos, pesquisas como esta podem auxiliar na correta realização da biopsia retal, evitando-se colheitas inadequadas ou com número de FL insuficiente, fator que torna necessária repetição do procedimento.


Conclusões


Observou-se que, apesar de a técnica de biopsia retal ser um procedimento simples, há possibilidade de falha de colheita e obtenção de amostras com poucos FL, fatores que tornam necessária nova colheita. O estudo também demonstrou que animais jovens apresentam quantidade de FL superior aos animais mais velhos e que é possível realizar colheitas em curtos intervalos de tempo, a partir de 14 dias, com quantidade de FL suficiente para avaliação imuno-histoquímica do tecido linfoide associado à mucosa em ovinos e caprinos.


Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão da bolsa de mestrado (Processo 558268/2010-2).


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