DOI: 10.5216/cab.v13i4.16601
VIABILIDADE ECONÔMICA DA
TERCEIRA ORDENHA EM
SISTEMAS DE PRODUÇÃO DE LEITE COM ORDENHA MANUAL
Marcos Aurélio
Lopes1, Gastão Lemos Barbosa2,
Tatiane Mendonça Nogueira3
RESUMO
Objetivou-se analisar a
viabilidade econômica da terceira ordenha em sistemas de produção de
leite
utilizando ordenha manual, visando fornecer aos técnicos e pecuaristas
informações que os auxiliem no processo de tomada de decisões.
Especificamente,
pretendeu-se, ainda: a) estimar o custo de uma ordenha; b) estimar o
custo da
terceira ordenha utilizando mão de obra contratada e familiar; c)
desenvolver
uma equação matemática que permita estimar a quantidade mínima de leite
produzida em duas ordenhas, a partir da qual será economicamente viável
a
realização da terceira ordenha. Os dados foram coletados em três
sistemas de
produção de leite no período de novembro de
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ECONOMIC VIABILITY OF THE
THIRD MILKING IN SYSTEMS OF MILK PRODUCTION
USING HAND MILKING
ABSTRACT
This study aimed to analyze
the economic viability of the third milking in milk production systems
using
hand milking, aiming to provide information to technicians and farmers
to help
in the decision-making process. Specifically, we intended a) to
estimate the
cost of a milking; (b) to estimate, by means of simulation, the cost of
the
third milking using hired or family labor; (c) to develop a
mathematical
equation that allows estimating the minimum amount of milk produced in
two
milkings, from which it will be economically feasible to carry out the
third
milking. The data were collected in three milk production systems from
November
2010 to March 2011, in a routine of two milkings per day, with three
collections of data in each one, totaling nine. Considering the average
data,
it would be feasible to hold the third milking if the productivity of
daily
average lactating cows would be equal or greater than 157.75 and 9.20kg
of
milk, with hired or family labor, respectively. The mathematical
equation
developed may help the technician and the farmer to estimate quickly
and
precisely the minimum quantity of milk produced by a cow in two
milkings, from
which it will be economically feasible to keep the third milking.
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INTRODUÇÃO
O aumento da produção de leite é, certamente, a
mais consistente e
importante resposta ao aumento da frequência de ordenhas. Entretanto,
outros
efeitos devem ser avaliados antes de se tomar a decisão de adotar, ou
não, essa
prática; entre eles, o mais importante é o custo dessa terceira
ordenha. Surge,
então, uma pergunta: a partir de quantos litros de leite/vaca/dia é
viável,
economicamente, a adoção da terceira ordenha em uma propriedade
leiteira?
Resultados de pesquisas demonstram as vantagens
e limitações da
realização de tal prática, tais como o aumento na produção de leite
(BERNIER-DODIER et al., 2010), alteração na composição do leite (KLEI
et al.,
1997), efeito sobre a saúde e reprodução (MOYA et al., 2008) e no consumo de
alimentos e metabolismo (SMITH et
al., 2002). Entretanto, nenhum estudo abordou efeitos sobre a viabilidade econômica.
Alguns poucos
pesquisadores apenas salientaram
que o aumento na
frequência acarreta mais gastos com alimentação, mão de obra,
maquinário de
ordenha e implementos utilizados na ordenha: soluções desinfetantes,
papel
toalha, água, entre outros (DAHL, 2005). As raras pesquisas que
mencionam algo
sobre os custos, somente citam itens que serão gastos, sem resposta alguma
quanto ao custo de tal prática
e a viabilidade econômica dessa terceira ordenha, deixando, assim, o
produtor
sem parâmetro confiável para tomar a decisão de implantação. Nas
fazendas,
nota-se, muito claramente, essa falta de informação e,
consequentemente, a
implantação da terceira ordenha de forma errônea, levando, muitas vezes, à descapitalização,
em médio prazo, do produtor.
Diante da importância do assunto e da escassez
de informações,
resolveu-se realizar esta pesquisa, cujo objetivo foi analisar a
viabilidade
econômica da terceira ordenha em sistemas de produção de leite,
utilizando-se
ordenha manual, discutindo suas vantagens e
limitações, visando fornecer aos técnicos e pecuaristas informações que
os
auxiliem no processo de tomada de decisões.
Especificamente, pretendeu-se ainda: a) estimar o custo
operacional de
uma ordenha; b) estimar, por meio de simulação, o custo operacional da
terceira
ordenha utilizando mão de obra contratada e familiar; c) desenvolver
uma
equação matemática que permita estimar a quantidade mínima de leite
produzida
por uma vaca em duas ordenhas, a partir da qual será viável
economicamente a
realização da terceira ordenha.
Realizou-se
ainda o
levantamento de todos os materiais e equipamentos utilizados no
processo de
ordenha, tais como: balde de leite, coador de leite, copo para higiene,
corda,
enxada e rodo de ferro (para a limpeza das fezes do local), lâmpadas
das salas
de ordenha e do curral, latão de leite, correia para o motor elétrico,
avental,
vassoura, bota de borracha (para uso do retireiro), luvas de
procedimento, além
de outros gastos que foram específicos de cada sistema de produção de
leite.
Visando analisar o custo da mão de obra, foi
ainda registrado o horário
de início e término do trabalho dos ordenhadores, desde o momento em
que buscaram
os animais no pasto até o término do processo de
ordenha, com a liberação dos animais para o pasto.
O registro dos dados foi realizado em uma
planilha desenvolvida
especialmente para esta pesquisa, na qual consta o nome do produto
utilizado,
sua especificação, valor unitário, quantidade gasta e o total, em
reais, do
gasto com cada produto. A partir da soma de todos os gastos, obteve-se
o custo
operacional total do processo de uma ordenha, em reais (R$), bem como
as médias
e desvios-padrão, por sistema de produção, por animal e por litro de
leite.
Tendo
em mãos o custo
operacional médio por ordenha em tais sistemas, desenvolveu-se outra
planilha
objetivando estimar o custo operacional adicional da terceira ordenha
diária.
Para esse cálculo, foram considerados, além dos gastos normais, o custo
adicional com energia elétrica e mão de obra.
Para a implantação da terceira ordenha, considerou-se a
necessidade de um terceiro turno de serviço (pois uma das
ordenhas será realizada entre 22 e 6 horas) com
pagamentos de horas extras (50% a mais que as normais), repouso semanal
remunerado, férias, feriados, 13º salário, 1/3 de férias, previdência
social,
FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), seguro acidentes de
trabalho,
salário educação, SENAR (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), INCRA
(Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), SEBRAE (Serviço
Brasileiro de Apoio a Micro e Pequenas Empresas), totalizando 36,8% do
custo
com mão de obra, além do pagamento do adicional noturno que, na área
rural, é
de 25% de acréscimo sobre a hora normal (MARTINS, 2008). Sendo assim, o custo
adicional da mão de obra foi
de R$5,64 por hora extra/noturna (o que significa um aumento de 75,3%
da hora
normal).
Nesta pesquisa, o valor total das despesas com o trabalhador
foi realizado com base nos encargos e no FGTS relacionados ao salário
integral
do funcionário e das provisões. O salário base utilizado foi de
R$545,00.
Realizou-se, ainda, uma simulação
considerando que a mão de obra era familiar, não havendo desembolso
pelo
pecuarista (LOPES et al., 2007). Na estimativa dos
custos, adotou-se a metodologia do Custo Operacional, proposta por
MATSUNAGA et
al. (1976).
Para se obter a resposta sobre a viabilidade
econômica da terceira
ordenha nos rebanhos estudados, desenvolveu-se uma equação matemática,
pela
qual se estima a produção mínima necessária para que a terceira ordenha
seja viável
economicamente.
Para a estimativa do aumento na produção de
leite, decorrente da
implantação da terceira ordenha, adotou-se o valor de 16,75%, obtido
por meio
do cálculo da média dos valores citados por vários pesquisadores (VASCONCELLOS,
1975; AMOS et al., 1985; BAR-PELED
et al., 1995; ERDMAN & VARNER, 1995; HOMAN & WATTIAUX, 1995; HEBERT, 2002; CAMINHA & GONÇALVES, 2003;
ALVES, 2004; NEGRÃO, 2004; DAHL, 2005; DIAS, 2005; GAMA & LOPES, 2008).
O custo operacional total para a realização da terceira
ordenha,
utilizando-se técnica manual, foi de R$34,84 (Tabela 3), sendo
R$20,00
referente a custo da ordenha
convencional, praticada diurnamente, e R$14,83 de custo adicional, que correspondeu à soma dos valores
referentes à mão de obra (R$14,75; 99,49%) e energia elétrica (R$0,07; 0,51%).
O gasto com mão de obra teve um
aumento expressivo, pois, com a implantação da terceira ordenha, haverá necessidade de
um terceiro turno, o que implicará maior tempo
de serviço, pagamentos de horas extras (50% a mais que as normais) e
encargos
sociais. Sendo assim, o custo adicional da mão de obra foi de R$5,64
por hora
extra noturna (o que significa um aumento de 75,3% da hora normal).
Caso o pecuarista venha adotar a
terceira ordenha, é
necessário salientar que haverá, também, um aumento no consumo de
alimento
concentrado. De acordo com LOPES et al. (2004), o custo total com
alimentação
pode chegar a até 60% das
despesas operacionais efetivas, o que é de extrema importância. Com a
implantação da terceira ordenha, há um aumento de produção de
leite, com
isso, a exigência da vaca
também aumenta, necessitando de suplementação alimentar. Se a suplementação não
for feita
corretamente, o animal terá que suprir a necessidade gerada pelo
aumento de
produção, retirando de sua reserva corporal, levando a perda de peso e
escore
corporal,
prejudicando todo seu
metabolismo (KELLY et al., 1998; SMITH et al., 2002).
Conhecendo-se o custo operacional
total da realização da terceira ordenha, necessita-se saber se ela é
viável
economicamente. Para a estimativa da quantidade mínima de leite
produzida por
uma vaca, diariamente, em duas ordenhas, de forma que haja viabilidade
econômica da realização da terceira ordenha, desenvolveu-se a equação 1.
Ela é função:
a) da
produção total
de leite/dia do sistema de
produção, em kg;
b) do custo operacional total da
terceira ordenha, em R$, que corresponde ao
somatório de todos os gastos com soluções
pré e pós-dipping,
detergentes ácidos e alcalinos, papel toalha, desinfetantes e demais
produtos
utilizados na ordenha, bem como com mão de obra e
com a depreciação de equipamentos,
ferramentas e utensílios, por terem vida útil superior a um ciclo
produtivo que,
no caso da atividade leiteira, considera-se um ano;
c) do preço recebido por kg de leite,
pelo pecuarista, em
R$;
d) do custo variável médio,
em R$, por kg de
leite, o que corresponde aos gastos com alimentação, mão de obra, sanidade, energia
(elétrica e combustíveis),
reprodução, bem como com despesas diversas;
e) da quantidade de animais
ordenhados
por dia;
f) do aumento de produção total diária de leite/dia, em kg, advindo da implantação da terceira ordenha, que, no caso em questão, considerou-se um aumento de 16,75%, o que correspondeu à média de resultados obtidos por diversos pesquisadores.
PM = Produção mínima de leite
vaca/dia desejada para tornar a terceira ordenha economicamente viável,
em kg;
PF= Produção de total de leite/dia do sistema de produção (fazenda), em kg;
CO= Custo operacional total da
terceira ordenha, em R$;
PL= Preço recebido por kg de
leite, em R$;
CV= Custo variável de um kg de
leite produzido no sistema de produção, em R$;
QA = Quantidade de animais
ordenhados por dia;
AP= Aumento de produção diária total
de leite/dia, em kg, com a
terceira ordenha.
No exemplo em questão,
considerando-se
os dados
médios, coletados em três sistemas de produção de leite, que utilizam
ordenha
manual (Tabela 1), e a
inserção dos respectivos valores na equação 1,
seria viável a
realização da
terceira ordenha se a produtividade média diária,
por vaca
em lactação, fosse igual ou superior a 157,75kg de leite (Figura
1). Nos
sistemas estudados nesta pesquisa, a produtividade diária média, por vaca em
lactação, foi de 9,67kg (±1,99) de leite (Tabela 1). Com o aumento
de 16,75%,
(obtido por
meio do cálculo da
média dos valores citados por vários pesquisadores) advindo da
implantação da
terceira ordenha, a produtividade subiria para 11,29kg/vaca em lactação; valor bem abaixo do mínimo para tornar a
terceira ordenha viável economicamente.
Substituindo, individualmente, os
valores de cada um dos sistemas de produção estudados (Tabela 1), na equação 1,
verifica-se
que não é possível estimar as produções nos sistemas 1 e 3, pois o
valor de
venda do leite é inferior ao custo variável unitário, conforme equações
abaixo,
ou seja, a produção de leite está sendo anti-econômica nesses dois
sistemas de
produção,
o que significa que
a implantação da terceira ordenha implicaria ainda em maiores custos e
prejuízos. Em relação ao sistema de
produção 2, apesar da margem de contribuição ser positiva, não seria
viável a
realização de tal prática, pois a produtividade de 10,68kg de leite/vaca em lactação ficaria
abaixo da quantidade
mínima estimada de 23,62kg.
Embora os grupos genéticos dos sistemas de produção 1 e 3 sejam semelhantes, a produção média/animal/dia foi diferente, devido à melhor alimentação fornecida aos animais do sistema 1, que também foi melhor do que a fornecida aos animais do sistema 2, que possuem maior caracterização da raça holandesa. No entanto, o principal fator que tornou a realização da terceira ordenha viável economicamente foi o valor do kg de leite, recebido pelo pecuarista, que foi superior ao custo variável unitário, tornando a margem de contribuição positiva.
Os
três sistemas de
produção estudados possuem mão de obra familiar para realizar a
ordenha.
Considerando que tal componente foi responsável por 99,49% do custo
operacional
total das despesas adicionais para realização da terceira ordenha e que
ele não
constitui em desembolso para o pecuarista (LOPES et al., 2007 e
MATSUNAGA et
al., 1976), decidiu-se realizar uma simulação desconsiderando-se tal
valor
(Tabela 4). Justifica-se a
realização de tal estudo, pois ele terá uma
boa
aplicabilidade, uma vez que 84,4% dos estabelecimentos agropecuários do
país
possuem esse tipo de mão de obra (IBGE, 2006).
No
exemplo em questão, não
considerando o valor da mão de obra (em caso de mão de obra familiar) e
a
inserção dos valores na equação
1, seria viável a realização da
terceira
ordenha se a produtividade média diária por vaca em lactação fosse
igual ou
superior a 9,52kg de leite (Figura 2). Nos sistemas
estudados nesta
pesquisa, a
produtividade diária média foi de 9,67kg (±1,99) de leite/vaca (Tabela 1). Com
o aumento de 16,75%, (obtido através do cálculo da média dos valores
citados
por vários pesquisadores) advindo da implantação da terceira ordenha, a
produtividade subiria para 11,29kg de leite/vaca em lactação; valor bem
acima
do mínimo para tornar a terceira ordenha viável economicamente. Ou
seja, se o
sistema de produção que representa a média não considerar os valores
referentes
à mão de obra, a realização da terceira ordenha é viável economicamente.
Substituindo, individualmente, os valores do sistema de produção 2 (Tabela 1), na equação 1, verifica-se que não seria viável a realização de tal prática, pois a produtividade de 10,68kg de leite/vaca em lactação ficaria abaixo da quantidade mínima (14,59kg).
Considerando que a produção mínima é função da
produção total de leite/dia do sistema de produção, em kg, do custo operacional total da terceira
ordenha, do preço
recebido por kg de leite, do custo variável médio do leite, da
quantidade de
animais ordenhados e do aumento de produção total
diária de leite/dia, em kg, com a
terceira ordenha (equação
1 e Figura
1), o pecuarista possui algumas alternativas para reduzir a quantidade mínima de leite. A principal alternativa seria aumentar a margem de contribuição, que é a
diferença entre o preço do leite (PL) e o custo variável (CV). O
pecuarista,
por ser um tomador de preços, pouco pode influenciar no preço do leite,
exceto
quando produz maiores quantidades e leite com melhor qualidade,
recebendo
bonificações (LOPES et al., 2008). No entanto, ele pode concentrar
esforços
gerenciais e ou tecnológicos visando reduzir os custos de produção do
leite
(total, fixos, variáveis e operacionais) (LOPES et al., 2008). Reduzindo os
custos variáveis, a
quantidade mínima de leite a ser produzida para custear as despesas da
terceira
ordenha (CO) seria menor, o que influencia
significativamente no valor estimado pela equação.
A segunda alternativa seria trabalhar com vacas
de alta produção, pois
tanto os custos fixos, que representaram 0,80%, como os variáveis (99,20%) (Tabela 2) da realização de uma ordenha
(CO, na equação 1) seriam “diluídos”, reduzindo ainda mais os
custos variáveis
de
produção do leite, aumentando, assim, a margem de contribuição. A maior
produção, em duas ordenhas, implicaria em maior quantidade resultante
do
aumento percentual da produção, cujo valor adotado na presente pesquisa
foi de
16,75%.
Uma terceira
alternativa, no
caso de pequenos produtores, seria a utilização da mão de obra
familiar, pois
as despesas com mão de obra representaram 99,49% das despesas adicionais e 42,35% das despesas
totais da realização da terceira ordenha (Tabela 3),
devido aos
valores referentes à hora extra e ao adicional noturno.
A equação matemática desenvolvida pode auxiliar
o técnico e o
pecuarista a estimar, com
precisão e considerável rapidez, a quantidade
mínima de leite produzida por uma vaca em duas ordenhas, a partir da
qual será economicamente
viável a realização da terceira ordenha.
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