DOI: 10.5216/cab.v14i4.16576
AVALIAÇÃO SOROLÓGICA DE Parainfluenzavirus Tipo 1, Salmonella spp., Mycoplasma
spp. E Toxoplasma gondii
EM AVES SILVESTRES
Guilherme Augusto Marietto Gonçalves1, Silvia Maria de Almeida2,
Lucilene Granuzzi Camossi3, Hélio Langoni4, Raphael
Lucio Andreatti Filho4
1Médico Veterinário, Doutor, Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Medicina
Veterinária e Zootecnia de Botucatu, Botucatu, SP, Brasil.
gmarietto_ornito@fmvz.unesp.br
2 Médica Veterinária autônoma, Botucatu, SP, Brasil.
3Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho,
Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia de Botucatu, Botucatu, SP,
Brasil.
4Professores Doutores da Universidade Estadual Paulista Júlio
de Mesquita Filho, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia de
Botucatu, Botucatu, SP, Brasil.
RESUMO
A doença de Newcastle, salmonelose e
micoplasmose são enfermidades importantes para a avicultura e a
toxoplasmose é uma zoonose comum no ambiente urbano. No presente estudo,
pesquisaram-se evidências sorológicas dessas enfermidades em aves cativas
e de vida livre com a aplicação das técnicas de soroaglutinação rápida em
placa, inibição da hemaglutinação e aglutinação direta modificada. Em 117
amostras de soro sanguíneo, 20 apresentaram anticorpos para algumas das
enfermidades avaliadas, sendo constatada a presença de anticorpos para Toxoplasma gondii, Mycoplasma gallisepticum
e Salmonella spp. A espécie Amazona aestiva foi a que apresentou
o maior número de indivíduos soropositivos no estudo (13/20). Além disso,
verificamos a primeira detecção de anticorpos para T.
gondii em aves de rapina das espécies Mivalgo
chimachima e Rupornis
magnirostris.
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PALAVRAS-CHAVE: Doença de Newcastle; micoplasmose; saúde aviária;
sorologia; toxoplamose.
SEROLOGICAL EVALUATION OF Parainfluenzavirus
Type 1, Salmonella spp.,
Mycoplasma spp., And Toxoplasma
gondii IN WILD BIRDS
ABSTRACT
Newcastle disease, salmonellosis and
mycoplamosis are the most important infectious diseases in poultry.
Toxoplamosis is a common disease in urban environment. The present study
investigated serologic evidence of these diseases in captive and wildlife
birds, with rapid plate agglutination test, haemagglutination
inhibition test, and modified agglutination test. In a total of 117 blood
serum samples, 20 showed the presence of Toxoplasma
gondii, Mycoplasma gallisepticum, and Salmonella
spp. antibodies. Amazona
aestiva was the specie with the highest number of positive
individuals (13/20). We also verified the first detection of T.
gondii antibodies in birds of prey from Mivalgo
chimachima and Rupornis
magnirostris species.
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KEYWORDS: Avian health; mycoplasmosis; Newcastle disease; serology;
toxoplamosis.
INTRODUÇÃO
O exame sorológico é um método
laboratorial que visa ao estudo da presença e/ou mensuração das reações
antígeno-anticorpo por meio da presença de imunoglobulinas no soro
sanguíneo após a exposição do hospedeiro a um determinado agente estranho,
ou seja, mede uma resposta específica do organismo frente a um antígeno. O
objetivo de sua realização é a identificação de lotes positivos para
infecções propondo medidas de controle e erradicação.
A doença de Newcastle, também conhecida como pseudo-peste-aviária, é
causada por um vírus do gênero Avulavirus
(Parainfluenzavirus), pertencente à família Paramyxoviridae,
sendo o Parainfluenzavirus tipo 1 (APMV-1) o mais importante (CATOLLI et
al., 2011). É uma doença de grande impacto econômico na avicultura
mundial, fazendo parte da lista de notificação obrigatória da Organização
Mundial de Saúde Animal (OIE). A transmissão se dá principalmente por
aerossóis, podendo ser disseminada por longas distâncias (LOMINICZI et
al., 1998; CATOLLI et al., 2011).
Toxoplasma gondii é um coccídeo
da família Sarcocystidae causador
da toxoplasmose (ELMORE et al., 2010). É um parasita intestinal de
felídeos e um grande número de animais domésticos e selvagens foram
descritos como hospedeiros intermediários (inclusive humanos). A infecção
já foi registrada em aproximadamente 200 espécies de mamíferos,
contaminados principalmente pela ingestão de bradizóitos de T.
gondii (SILVA et al., 2006). Em aves, a infecção sintomática é
incomum, sendo normalmente inaparente ou latente (DUBEY, 2002), porém é
uma doença zoonótica muito importante para o ser humano.
Salmonella enterica subespécie enterica é uma bactéria da família
Enterobacteriaceae que, em aves, pode causar três doenças
distintas: pulorose (sorotipo Pullorum), tifo aviário (sorotipo
Gallinarum) e paratifo aviário (causado pelos demais sorotipos que não
sejam os anteriores). De aproximadamente 2500 sorotipos conhecidos de S. enterica subs. enterica, cerca de
90 são comuns em casos de infecções em humanos e em animais, incluindo as
aves, podendo ou não causar sintomatologia de paratifo aviário (TINDALL et
al., 2005; LUTFUL KABIR, 2010).
A micoplasmose é uma enfermidade causada por bactérias do gênero Mycoplasma
pertencentes à classe Mollicutes, que causam os quadros de doença
respiratória crônica (M. gallisepticum)
e sinovite infecciosa (M. synoviae),
sendo M. gallisepticum a espécie
de maior importância econômica. Pode ser transmitida por via horizontal,
através de fômites, aerossóis, ração e água contaminada, ou vertical
devido à proximidade do ovário com os sacos aéreos (LEVISOHN & KLEVEN,
2000).
A monitoria de doença de Newcastle, Salmonella
e Mycoplasma é uma
necessidade da indústria avícola brasileira, sendo requerida e
regulamentada no Brasil por meio do Programa Nacional de Sanidade Avícola
(MAPA, 2009), que inclui também a influenza aviária. A toxoplasmose não
faz parte das doenças monitoradas pelos órgãos brasileiros de defesa
sanitária em aves, mas, pelo seu potencial zoonótico, a participação das
aves no ciclo epidemiológico dessa enfermidade merece um pouco mais de
atenção pelos órgãos de defesa sanitária animal e humana.
O presente trabalho avaliou a presença de imunoglobulinas referentes à
Parainfluenzavirus APMV 1, T. gondii,
Salmonella spp., Mycoplasma
gallisepticum e M.
synoviae em aves silvestres com o objetivo de identificar a
circulação dos referentes agentes etiológicos.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram estudadas 117 aves, durante os anos
de 2008-2009, pertencentes à fauna brasileira em processo de reabilitação
para a vida-livre alojadas no Projeto Centroflora e também atendidas no
Laboratório de Ornitopatologia da Faculdade de Medicina Veterinária e
Zootecnia da Universidade Estadual Paulista, ambos localizados no
município de Botucatu, estado de São Paulo (Brasil),
Para a realização dos testes, utilizaram-se amostras de soro sanguíneo. As
coletas foram realizadas entre 8:00 e 10:00 horas, por meio de contenção
física, respeitando-se um limite de 15 minutos entre
contenção/coleta/liberação das aves e, nesse período, dedicou-se no máximo
5 minutos para coleta do sangue para cada ave, dentro dos viveiros onde as
mesmas estavam alojadas.
O sangue foi coletado por punção da veia jugular com agulha hipodérmica
0,45x13-26G½ estéril e seringa de 1,0 mL estéril, sendo que a quantidade
de sangue variou conforme a espécie e o porte de cada ave (0,4 a 1,0 mL).
Após a coleta, o sangue foi condicionado em microtubos de polipropileno de
1,5 mL e, após a formação de coágulo (em temperatura ambiente), foi
mantido e encaminhado sob refrigeração a 5 °C até o processamento
laboratorial.
Após a chegada ao laboratório, o material foi processado imediatamente,
sendo todos os testes realizados no mesmo dia da coleta de sangue.
Inicialmente, o soro foi separado do coágulo por centrifugação a 5.000 rpm
por cinco minutos em temperatura controlada de 5 °C.
A pesquisa para Salmonella foi realizada por meio do método de
soroaglutinação rápida em placa (SAR). Para Mycoplasma,
utilizou-se o SAR, confirmando-se os resultados com a técnica de Inibição
da Hemaglutinação - método beta (HIβ), conforme SANTOS (2009). Para
parainfluenzavirus APMV 1, utilizou-se o HIβ e para T.
gondii, aplicou-se a técnica de aglutinação direta modificada
(MAT), com antígeno fixado pela formalina, conforme técnica descrita por
DESMONTS & REMINGTON (1980).
Para a detecção de anticorpos IH específicos contra o PMV-1, utilizou-se o
teste de inibição da hemaglutinação (IH). O vírus usado no teste de IH
constitui-se de estirpe La Sota derivada de vacina comercial passada em
ovos embrionados. Os soros monoespecíficos utilizados como controles
positivo e negativo foram preparados em aves SPF (galinhas livres de
patógenos específicos). Foram utilizadas microplacas de poliestireno,
contendo 96 cavidades, com fundo em “V”. O ensaio foi desenhado de acordo
com o método beta, no qual diluições seriadas do soro são misturadas com
concentrações fixas e constantes de vírus. Os soros foram diluídos com um
volume padrão de PBS (0,05 mL) variando entre 1:2 a 1:2048. A cada
diluição, foram adicionados 0,05 mL de antígeno contendo quatro unidades
hemaglutinantes (UHA). Os níveis de anticorpos foram expressos como sendo
a recíproca da mais alta diluição na qual a hemaglutinação foi inibida em
100%.
No exame para anticorpos contra T.
gondii, as amostras de soro foram diluídas em microplacas de
fundo chato, com adição de 150 μL de PBS 0,01M pH 7,2 em todas as
cavidades utilizadas. Na primeira cavidade foram adicionados 10 μL de soro
(diluição 1:16) e, após homogeneização, transferiram-se 50 μL para outra
cavidade, equivalendo a diluição 1:64, procedendo-se assim até diluição
1:1024. A seguir, 25 μL de cada diluição do soro foram transferidos
para as respectivas cavidades de microplacas com fundo em “V” e 25 μL de
2-mercaptoetanol 0,2 M diluídos em PBS 0,01 M pH 7,2 e 50 μL do antígeno
diluídos em solução tampão borato pH 8,7 foram adicionados às cavidades.
As placas foram seladas com filme plástico, homogeneizadas por um minuto e
incubadas à temperatura ambiente por 12 horas, procedendo-se à leitura da
reação. O teste foi considerado positivo quando houve formação de uma
película cobrindo pelo menos metade do fundo da cavidade e negativo quando
houve a formação de “botão de fundo”.
Para a triagem das amostras de sorospositivos para Salmonella,
utilizou-se o método de soroaglutinação rápida em placa (SAR), sendo a
confirmação do teste realizada por meio de detecção do genoma pela técnica
de reação em cadeia da polimerase (Polymerase Chain Reaction – PCR). No
teste de SAR, utilizou-se um antígeno colorido disponível no comércio.
Para isso, 50 µL de soro foi misturado com 50 µL de antígeno, sendo
homogeneizado com bastão de vidro em placa de leitura para SAR. As
amostras que apresentaram formação de grumos uniformes e homogêneos
durante o período de dois minutos foram consideradas positivas. Para cada
teste realizado, utilizaram-se soros controle positivo, produzido em aves
SPF, e negativo, obtido de aves (Gallus gallus domesticus),
comprovadamente livres de salmonelas.
Para Mycoplasma gallisepticum e
M. Synoviae, utilizou-se a SAR,
confirmando-se os resultados com a técnica de Inibição da Hemaglutinação -
método beta. O teste consistiu em adicionar partes iguais de antígeno e
soro, homogeneizando-se a mistura e, após dois minutos, verificou-se a
presença de grumos, indicando a formação da reação de antígeno-anticorpo.
Para confirmação dos resultados positivos no SAR, aplicou-se a técnica de
HIβ, utilizando-se amostras vacinais vivas Cevac® MG-F (Ceva, Paulínia,
Brasil), aplicando-se a mesma metodologia e critérios de avaliação da
técnica empregada para APMV 1.
RESULTADOS
Foram avaliadas 117 aves, de 13 espécies
diferentes, pertencentes a cinco ordens distintas (
Tabela 1): Papagaio verdadeiro (
Amazona aestiva), Papagaio do mangue
(
A. amazonica), Arara canindé (
Ara ararauna), Periquitão-maracanã (
Aratinga leucophtalmus) e Maitaca
verde (
Pionus maximilianus) da
família Psittacidae [ordem Psittaciformes]; Tucano toco (
Ramphastos
toco) da família
Ramphastidae
[ordem Piciformes]; Coruja buraqueira (
Athene
cunicularia) da família Strigidae e Suindara (
Tyto
alba) da família Tytonidae [ordem Strigiformes]; Gavião carijó (
Rupornis magnirostris) da família
Accipitrinae, Falcão de coleira (
Falco
femoralis), Chimango (
Mivalgo
chimango), Gavião carrapateiro (
M.
chimachima), Gavião carcará (
Caracara
plancus) da família Falconidae [Ciconiiformes]. Das espécies
analisadas, somente as pertencentes à ordem Psittaciformes eram
provenientes de cativeiro (oriundos de tráfico animal), as demais eram de
vida livre.
Das 117 aves avaliadas, 20 (17.1%) indivíduos apresentaram soroconversão
positiva para algum dos agentes pesquisados. Desses, 65% pertenciam à
espécie
A. aestiva (13/20), 20%
à
T. alba (4/20), 10% à
M.
chimachima (2/20) e 5% à
B.
magnirostris (1/20), sendo detectados anticorpos para
T.
gondii em 60% (12/20),
M.
gallisepticum em 40% (8/20) e
Salmonella
spp. em 10% (2/20). Não foram detectados anticorpos para APMV 1 e
M. synoviae neste estudo (
Tabela 1).
A espécie A. aestiva foi soropositiva para os três agentes avaliados,
prevalecendo um maior número de indivíduos com sorologia para
T.
gondii (7/12). Dois exemplares de
T.
alba foram soropositivos para dois agentes distintos (
T.
gondii e
M. gallisepticum).
As contra-provas realizadas nas aves positivas no SAR para
M.
gallisepticum também foram positivas no teste de IH.
DISCUSSÃO
A região noroeste do estado de São Paulo,
Brasil, é grande produtora de produtos avícolas, sendo que a fauna
silvestre pode contribuir na manutenção de doenças para aves de produção.
A monitoria da sanidade de aves silvestres pode contribuir na avaliação da
presença de enfermidades de interesse econômico, pois as aves silvestres
se contaminam devido à aproximação com aves industriais doentes (através
do contato direto com os agentes etiológicos) ou, no caso das aves
carnívoras, pelo fato de se alimentarem de presas previamente contaminadas
(por um contato indireto), servindo como aves “sentinelas” com grande
potencial para uma leitura epidemiológica das doenças estudadas.
As aves avaliadas eram mantidas em viveiros coletivos amplos (2 m² por
ave), sendo separadas por espécie e com concentração máxima de 12
indivíduos por viveiro. Das 20 aves positivas, os dois exemplares de A. aestiva positivos para Salmonella
spp., como também os quatro exemplares de T.
alba, compartilhavam o mesmo viveiro. Os demais estavam alojados
em viveiros diferentes.
Após a constatação de resposta imunológica, refizeram-se três vezes (com
intervalo de 15 dias) todos os exames das aves positivas para Salmonella
spp. e M. gallisepticum
e também das aves contactantes (que compartilham o mesmo viveiro),
tendo-se observado a manutenção da positividade entre as aves já
registradas anteriormente e a ausência de soroconversão das aves
contactantes, caracterizando assim a não circulação dos agentes entre as
aves durante o estudo. Antes, durante e após os exames, todas as aves
positivas apresentavam ausência de sintomatologias compatíveis com quadros
de salmonelose, toxoplasmose e micoplasmose, como também não houve
histórico de óbitos por essas doenças.
A não observação de anticorpos para parainfluenza APMV 1 está de acordo
com o observado na literatura, em que não há relatos da doença de
Newcastle no Brasil com envolvimento de APMV 1 desde o ano de 2001 em aves
comerciais (FRANZO, 2007). A ausência de reação solorógica para M.
synoviae também confere com a literatura, pois esta espécie de Mycoplasma acomete especificamente
aves da ordem Galliformes, não havendo registro de infecção natural em
outras ordens aviárias.
O uso da técnica de SAR com antígeno para S. Pullorum é comumente
empregado em aves de produção para pré-triagem de sorotipos de Salmonella
enterica pertencentes ao sorogrupo D, pois há uma soroconversão cruzada
com os demais sorotipos pertencentes a esse sorogrupo (BERCHIERI JÚNIOR
& OLIVEIRA, 2007), que abriga os sorotipos de maior interesse avícola.
Em Psittaciformes, já foi descrita a ocorrência dos sorotipos Pullorum
(EHRSAM, 1985) e Enteritidis (OROSZ et al., 1992; MARIETTO-GONÇALVES et
al., 2010) pertencentes ao sorotipo D. Os sorotipos pertencentes a outros
sorogrupos descritos em Psittaciformes são o Typhimurium (WE JÚNIOR &
HATKIN, 1978; SAWA et al., 1981; MENÃO et al., 2000), Houtenae (WERNERY et
al., 1998), Arizonae (ORÓS et al., 1998), Braenderup (ALLGAYER et al.,
2009) e Rissen (JANG et al., 2008). No presente estudo, não houve detecção
de Salmonella pertencente ao
sorogrupo D em aves de rapina, mas na literatura há relatos de isolamento
de S. enteritidis (POVEDA et al., 1994), além de S.
typhimurium e S. montevideo
(ZIEDLER et at., 1995; SMITH et al., 2002), pertencentes aos outros
sorogrupos.
M. gallisepticum é um patógeno
aviário que pode ser encontrado tanto em aves domésticas como selvagens
(LEVISOHN & KLEVEN, 2000). A presença de antígenos contra M.
gallisepticum em A. aestiva
e T. alba pode ter ocorrido
devido ao contato desses exemplares com outras espécies aviárias. No
ambiente antrópico, o contato de aves silvestres com aves sinantrópicas
portadoras clássicas de M.
Gallisepticum, como o pombo doméstico e o pardal (HARTUP et al.,
2001; KLEVEN & FLETCHER, 1983), é frequente, muitas vezes inevitável.
A utilização de SAR como forma de diagnóstico sorológico para Mycoplasma
é insuficiente por não ser um teste muito específico
(MARIETTO-GONÇALVES et al., 2008), sendo recomendável sua utilização
apenas para triagem. O teste de inibição da hemaglutinação, como o ensaio
imunoenzimático de absorção em fase sólida (enzyme-linked immunosorbent
assay – ELISA), é um método sorológico confirmatório recomendado, embora a
confirmação definitiva implique o isolamento do agente.
Psittaciformes são altamente susceptíveis a infecção por M.
gallisepticum, estando o agente comumente envolvido em casos de
óbitos por infecções respiratórias em exemplares cativos (ADLER, 1857;
BOZEMAN et al., 1984; GOMES et al., 2010). Outra espécie importante para
avicultura reportada em psittacídeos é o M.
iowa (BOZEMAN et al., 1984). A ocorrência de M.
gallisepticum em aves de rapina foi descrita por ZIEDLER et al.
(1995) e MORISHITA et al. (1997). A ocorrência de M.
meleagridis também já foi observada em rapinantes (LIERZ et al.,
2000), em que são descritos o M.
falconis, M. gypis e M.
buteonis como espécies específicas (POELMA & ZWART, 1972),
não havendo até o momento estudos relatando a existência de reação
sorológica cruzada dessas espécies com M.
gallisepticum (falso positivo).
A presença de anticorpos para T. gondii
foi encontrada em quatro espécies, sendo observada a titulação de 1:16 nos
exemplares de A. aestiva, T. alba, R.
magnirostris e de 1:64 nos dois exemplares de M.
chimachima. A ocorrência de toxoplasmose em Psittaciformes é
incomum, sendo relatada em espécies australo-asiáticas (POELMA &
ZWART, 1972; HARTLEY & DUBEY, 1991; HOERT et al., 1991), em
diagnóstico post-mortem, não havendo registro de titulação sorológica na
literatura.
Aves de rapina são consideradas refratárias ao T.
gondii (DUBEY, 2002), porém é descrita a ocorrência de
toxoplasmose em Strix varia
(MIKAELIAN et al., 1997) e Haliaeetus
leucocephalus (ZIEDLER et al., 1995). Em um estudo realizado por
LINDSAY et al. (1993), exemplares do gênero Buteo apresentaram titulação
de 1:80, não havendo presença de sinais clínicos. Em outro estudo,
KIRKPATRICK et al. (1990) encontraram titulação de 1:50 em T.
alba. AUBERT et al. (2008) também relataram a titulação de 1:25
em exemplares de Buteo e T. alba.
Logo, os títulos de 1:16 encontrados em R.
magnirostris e T. alba
foram considerados baixos. Não foi encontrada titulação ou notificação de
T. gondii em M.
chimachima e R. magnirostris
na literatura, sendo este o primeiro relato de anticorpos contra T.
gondii nessas espécies.
Dois exemplares de T. alba
apresentaram soroconversão para T.
gondii e M. gallisepticum.
Ambos os agentes não apresentam qualquer tipo de correlação biológica, não
sendo encontrada na literatura atual a descrição de casos de toxoplasmose
associada à micoplasmose, atribuindo-se o fato observado como ocasional.
Atribuiu-se o fato de a espécie A.
aestiva apresentar o maior número de indivíduos com anticorpos
para alguns dos agentes neste estudo pela quantidade de exemplares
estudos. Isso se dá por ser uma espécie comumente encontrada no comércio
ilegal de animais no Brasil devido à grande procura como um animal pet
alternativo.
Conforme os resultados observados, compreendemos que aves silvestres podem
ser utilizadas como sentinela para estudos epidemiológicos que visam à
monitoria da circulação ambiental de agentes biológicos de interesse
avícola como também para a saúde pública, sendo que o emprego da monitoria
sorológica em centros de recuperação animal é uma ferramenta útil para
prevenir a disseminação de diferentes agentes patogênicos no meio ambiente
por aves reintroduzidas.
CONCLUSÃO
A análise sorológica das aves estudadas
demonstrou que há a circulação de
Salmonella spp., M.
gallisepticum e T. gondii
em aves provenientes de tráfico e a circulação silvestre de
M. gallisepticum e T. gondii
em aves de rapina da região noroeste do Estado de São Paulo, notificamos
também pela primeira vez a ocorrência de sorologia positiva para
T. gondii em Mivalgo chimango
e Rupornis magnirostris.
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Protocolado em: 15 dez. 2011 Aceito em: 09
set. 2013.