ÍNDICES HEMATIMÉTRICOS E BIOQUÍMICA SANGUÍNEA NO
CAVALO DE CAVALGADA EM CONDIÇÕES TROPICAIS
Stephânia Katurchi Mendes Melo1, Liliane Batista de Lira2, Telga Lucena Alves Craveiro de Almeida1, Eneida Willcox Rego2, Helena Emilia Cavalcanti da Costa Cordeiro Manso1, Hélio Cordeiro Manso Filho1
1Núcleo
de Pesquisa Equina, Departamento de Zootecnia. Universidade Federal
Rural de
Pernambuco, Recife, PE, Brasil.
2Laboratório
de Patologia Clinica, Departamento de Medicina Veterinária,
Universidade
Federal Rural de Pernambuco, Recife,PE, Brasil
RESUMO
Objetivou-se por meio deste ensaio
determinar as
variáveis hematológicas (contagem de glóbulos vermelho, hemoglobina,
hematócrito, volume corpúscular médio, hemoglobina corpuscular média,
concentração hemoglobínica corpuscular média e coeficiente de variação
da curva
de distribuição das hemácias) e a bioquímica (proteínas plasmáticas
totais,
fibrinogênio, ureia, creatinina, ácido úrico, colesterol total e
triglicérides)
no sangue de cavalos de cavalgada. Para tanto, 46 equinos da raça
Mangalarga
Marchador, sendo 32 machos e 14 fêmeas, de idades diferentes (6,83±0,65
anos)
foram avaliados. Os animais eram mantidos estabulados em diferentes
centros de
preparo de cavalos de cavalgada que apresentavam programa alimentar e
regime de
condicionamento similares. Avaliaram-se o grupo sexual (machos e
fêmeas) e os
grupos etários (menores de cinco anos, entre cinco e dez anos, maiores
de dez
anos). Os resultados indicaram diferenças na concentração hemoglobínica
corpuscular média referente ao grupo sexual (P<0,05) e diferença na
variação
da concentração das proteínas plasmáticas totais referente aos grupos
etários
(P<0,05). Os resultados permitem concluir que não há diferenças
importantes
nos parâmetros bioquímicos e hematológicos em cavalo de cavalgada em
relação ao
sexo e à faixa etária, com exceção da concentração hemoglobínica
corpuscular
média e da concentração das proteínas plasmáticas totais, as quais,
entretanto,
não comprometem a performance física dos animais.
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HEMATOLOGICAL PARAMETERS
AND BLOOD
BIOCHEMISTRY IN PLEASURE HORSES IN TROPICAL REGION
ABSTRACT
The objective of this study
was to determine haematological variables (red blood cell count,
hemoglobin,
hematocrit, mean corpuscular volume, mean corpuscular hemoglobin, mean
corpuscular hemoglobin concentration and coefficient of variation of
the
distribution curve of red blood cells) and blood biochemistry (total
plasma
proteins, fibrinogen, urea, creatinine, uric acid, total cholesterol
and
triglycerides) of pleasure horses. Therefore, we evaluated 46
Mangalarga
Marchador horses, 32 males and 14 females at different ages (6.83±0.65
years).
The animals were kept stabled at different pleasure horses training
centers,
which presented similar nutritional management and conditioning
regimen. We
evaluated the sex group (male and female) and age groups (younger than
five
years, between five and ten years, over ten years). The results
indicated
differences in the mean corpuscular hemoglobin concentration related to
sexual
group (P<0,05), and in the variation of total serum protein
concentration
(P<0,05) related to the age groups. The results suggested that there
are
important differences in biochemical and hematological parameters in
horse
riding toward sex and age group, except for mean corpuscular hemoglobin
concentration and total plasma proteins concentration, which do not
compromise
physical performance of these animals.
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INTRODUÇÃO
O hemograma e os exames bioquímicos são exames
complementares e constituem importantes ferramentas para o auxílio no
diagnóstico de enfermidades na clínica médica equina (KANEKO, 1997),
além de
também serem úteis para avaliar aspectos da capacidade atlética dos
equinos. O
conhecimento dos constituintes sanguíneos constitui a base para a
avaliação das
alterações patológicas facilitando o diagnóstico de diferentes tipos de
problemas nos animais (HARVEY et al., 1984). É sabido que os resultados
dos
exames laboratoriais podem sofrer alterações devido à idade, sexo,
atividade
física do animal, localização, entre outros fatores (MEYER &
HARVEY, 1998;
ZHANG et al., 1998).
Diante do exposto, o objetivo deste ensaio foi
determinar as concentrações das variáveis hematológicas e bioquímicas
de
cavalos condicionados para cavalgada em condições tropicais
relacionando-as ao
sexo e idade.
MATERIAL E MÉTODOS
O presente trabalho foi aprovado pelo Comitê de
Ética da Universidade Federal Rural de Pernambuco, sob o número 23082.007851/2007.
Foram utilizados 46 equinos da raça Mangalarga
Marchador, sendo 32 machos e 14 fêmeas, de idades diferentes (6,83 ±
0,65 anos)
e estabulados em três diferentes centros de preparação de cavalos de
cavalgada
na região metropolitana do Recife - PE (8o3'0"S; 34o53'44"O).
Os animais recebiam programa alimentar similar, constituindo-se do
fornecimento
de concentrado comercial (aproximadamente 5,0kg/dia/animal; 14,0% de
protína
bruta, 3,5% de extrato etéreo e 2,9 Mcal de energia digestível), capim
elefante
(Pennisetum purpureum Schumach) in natura e picado em
forrageira (aproximadamente 20,0kg/dia/animal), sal mineralizado (Coequi
Plus - Tortuga®) e água ad
libitum. Os animais apresentavam
regime de condicionamento físico similar, o qual consistia de pelo
menos três
cavalgadas semanais ao passo e à marcha (picada ou batida), com
distâncias de
10 a 15km, em pisos variados e em terrenos com altitude variando de 50
até 150
metros acima do nível do mar. A carga transportada (massa do cavaleiro
mais a
dos arreios de montada e condução) não ultrapassava 100kg.
Para análise, os animais foram agrupados em grupo
sexual (masculino, castrados e intactos, e feminino) e grupo etário
(grupo I:
animais com menos de cinco anos; grupo II: animais entre cinco e dez
anos; e
grupo III: animais com mais de dez anos).
Para a determinação do escore corporal dos animais
utilizou-se o método descrito por COSTA et al. (2001), que possui
escala de 1
até 7, sendo 1 o animal caquético e 7 o animal obeso.
Amostras de sangue foram colhidas por venóclise na
julgular, em tubos a vácuo (BD Vacuntainer®) com anticoagulante, com os
animais
em repouso, sendo acondicionadas sob refrigeração e enviadas ao
laboratório
para a realização das análises. O sangue total foi utilizado para a
realização
das análises hematológicas: contagem de glóbulos vermelhos (CGV),
hemoglobina
(HB), hematócrito (HT), volume corpuscular médio (VCM), concentração
hemoglobínica corpuscular média (CHCM) e amplitude de
distribuição dos
eritrócitos coeficiente de variação (RDW-CV),
sendo determinadas em analisador hematológico automatizado (Analisador
Hematológico Veterinário pocH-100iV Diff, Sysmex®). Posteriormente, as
amostras
foram centrifugadas (3000 rotações por minuto durante cinco
minutos)
para a obtenção do plasma e realização das análises bioquímicas: ureia (UREIA), creatinina (CREAT), ácido úrico
(AcURI), colesterol total (COLE-T) e triglicérides (TRIG), sendo
determinadas por
meio do uso de kits comerciais (DOLES® Reagente) em equipamento de
bioquímica
semi-automático (Doles D250, DOLES®). A
determinação da proteína plasmática total (PPT) foi realizada por meio
da
refratometria manual e a determinação do fibrinogênio (FIBRI) foi
realizada por
meio da técnica de precipitação pelo calor em banho-maria a 57ºC
durante três minutos
(KANEKO et al., 1998).
Para a análise estatística, todos os resultados
foram submetidos ao teste T ou ANOVA com P estabelecido em 5% e, quando
necessário, ao teste Holm-Sidak como post doc com P também estabelecido
em 5%
(SigmaStat® 3.0).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os valores encontrados no presente estudo
assemelham-se aos valores descritos na literatura para animais sadios
em
diferentes condições (KANEKO et al., 1998; PERRY, 2009), mesmo estando
os
animais estudados em região tropical e sendo manejados de modo
particular.
Deve-se ressaltar que esses resultados representam um grupo específico
de
cavalos de trabalho que está amplamente difundido no país. Esses
animais, todos
da raça Mangalarga Marchador, não são utilizados em provas regulares de
marcha
e sim em cavalgadas, que exigem dos animais um condicionamento para
exercícios
de baixa a média intensidade e longa duração.
As variações observadas neste experimento tanto
nas comparações entre os grupos sexuais como entre os grupos etários
entre os
parâmetros analisados não eram esperadas, corroborando com o estudo
realizado
por NEVES et al. (2005), pois todos os animais avaliados eram animais
adultos e
possuiam programa alimentar e regime de condicionamento similares. É
importante
ressaltar que os valores médios observados para as variáveis analisadas
encontravam-se no intervalo de normalidade para equinos (KANEKO et al.,
1998;
PERRY, 2009). Tais achados confirmam o bom estado de saúde dos animais
avaliados e poderão servir como referência para equinos de sela em
condições
semelhantes.
As avaliações feitas neste experimento revelaram
diferenças no CHCM (P<0,05), sendo o maior valor observado nas
fêmeas,
discordando de VEIGA et al. (2006), que analisaram os valores
hematológicos de 142 equinos da raça Crioula e
observaram CHCM maior nos machos. Todavia, os resultados concordam com
VEIGA et al. (2006), que verificaram maiores valores de CHCM para
animais de
corrida, o que é explicado pela necessidade de maior aporte de
oxigênio
aos tecidos em elevado metabolismo, e divergem dos achados de CONCEIÇÃO
et al.
(2001), que estudou equinos da raça Quarto de Milha.
Os valores do CHCM associam-se à maior ou menor
percentagem do hematócrito, cujas variações, de acordo com diferentes
autores,
relacionam-se com a realização de atividade física, como resultado da
mobilização de reservas do sangue do baço e também da desidratação que
se
desenvolve nos exercícios de longa duração, como as cavalgadas
(TEIXEIRA NETO,
2004; PICCIONE et al., 2007; PUOLI FILHO et al., 2007; BELLI, 2008).
Valores
mais elevados para
hemoglobina e hematócrito foram apresentados pelos cavalos do Grupo I,
com
menos de cinco anos, quando comparados aos demais grupos etários, mas
sem
diferenças estatísticas, apesar de os
animais deste experimento serem frequentemente manejados e estarem em
ambiente
calmo. De acordo com DUNCAN et al. (1994), animais muito jovens, por
serem mais
excitáveis, podem apresentar alguns valores hematológicos mais
elevados. Por
outro lado, vários estudos (HARVEY et al., 1984; DINEV & KHUBENOV,
1986;
ALMEIDA & SILVA, 1995; MEYER & HARVEY, 1998; VEIGA et al.,
2006)
detectaram redução na percentagem do
hematócrito e na concentração da hemoglobina de animais jovens quando
comparados com animais adultos. Credita-se essa variação à maior
hemodiluição
nos animais jovens. No atual estudo, o volume plasmático não foi
avaliado, o
que poderia ser importante para se determinar o real valor dos índices
hematimétricos pesquisados nos cavalo de cavalgada.
Não
foram verificadas
diferenças significativas nos valores do hematócrito quanto ao sexo,
concordando com resultados descritos por DINEV & KHUBENOV (1986),
mas
opondo-se aos achados de VAN HEERDEN et al. (1990), que observaram maior valor de hematócrito nas fêmeas. CEBULJ-KADUNC et al. (2002) também
detectaram maiores valores de hemoglobina para machos, o que não foi
verificado
neste trabalho, corroborando VEIGA et al. (2006).
Observa-se
que os valores do
RDW, que avalia o grau de heterogenicidade dos eritrócitos, foi
semelhante ao
descrito por EASLEY et al. (1985), porém inferior aos descritos para
cavalos em
treinamento e para potros da raça Puro Sangue Inglês (BALARIN et al.,
2006),
tanto quando comparados com os animais agrupados pelo sexo como pela
faixa
etária. No presente estudo não foram observadas diferenças entre os
grupos
sexuais, corroborando o estudo de BALARIN et al. (2001).
Foram detectadas diferenças na concentração das
proteínas plasmáticas totais quando os animais foram comparados
conforme o
grupo etário, sendo os valores mais elevados encontrados nos cavalos
com mais
de 10 anos (aproximadamente 71,5 g/L). Os resultados relacionam-se com
a
senilidade, pois é largamente conhecido que animais mais jovens
apresentam
maior quantidade de água corporal e que, com a senilidade, esse acúmulo
vai
reduzindo e com isso pode haver modificação na concentração das
proteínas
plasmáticas totais (MANSO FILHO et al., 2008). Também é importante
recordar que
estudos envolvendo exercícios de longa distância e diferentes graus de
intensidade revelaram aumentos de proteínas do plasma após exercícios
(SANTOS
et al., 2001; SANTOS, 2006; PUOLI FILHO et al., 2007). Analisando-se a
concentração das proteínas plasmáticas totais presentes no sangue, não
foram
observadas diferenças na concentração do fibrinogênio, indicando um bom
estado
de saúde dos animais, já que variações na concentração plasmática do
fibrinogênio podem contribuir de forma positiva e precoce para o
diagnóstico de
estados inflamatórios e infecciosos (DI FILLIPO et al., 2009).
Avaliações das concentrações de ureia e creatinina
podem ser utilizadas para avaliar o metabolismo proteico e também a
função
renal dos animais. Apesar da sua importância, poucos trabalhos na
literatura
avaliam a influência dos fatores sexuais e idade sobre tais parâmetros.
Foi
observado que as concentrações da ureia, creatinina e ácido úrico
encontravam-se no intervalo de valores de normalidade para a espécie, e
se
assemelham aos resultados descritos na literatura (KANEKO et al.,
1998).
Estudo realizado por WANDERLEY et al. (2010) com
animais da mesma raça revelou concentrações médias de ureia (4,0
mmol/L) e
creatinina (94 mmol/L) nos animais em jejum, similares às descritas
neste
estudo. ROSE et al. (1979), BAUER et al. (1984) e EDWARDS et
al. (1989), apesar de terem utilizado
delineamentos diferentes para avaliar a influência do fator etário
sobre as
taxas de creatinina, observaram a influência da evolução da idade sobre
a
variabilidade dos teores desse componente. Finalmente deve-se recordar
que o
tipo de manejo e alimentação pode influenciar nos valores desses
marcadores do
metabolismo proteico nos animais. Além disso, deve-se ressaltar que os
resultados deste estudo assemelham-se aos de NEVES et al. (2005), que
estudaram
equinos da raça Mangalarga Paulista, clinicamente sadios e separados
conforme
faixa etária e sexo. Os valores encontrados em ureia e creatinina
conforme o
grupo sexual e o grupo etário foram semelhantes.
As
reservas de lipídios no
sangue dos cavalos podem ser avaliadas pela determinação da
concentração de
triglicérides e colesterol total; todavia, o triglicérides é o mais
importante
deles, pois é fonte de energia para os animais atletas e em outras
condições.
Os valores encontrados para a concentração do colesterol total e
triglicérides
assemelham aos descritos tanto como valores de referência, independente
da raça
(KANEKO et al., 1998; PERRY, 2009), como para cavalos da raça Mangalarga Marchador
(WANDERLEY et al., 2010). Os
cavalos de cavalgada não recebiam nenhum tipo de suplemento ou de
concentrado
com elevada percentagem de gordura, mas estavam com índice de escore
corporal
em torno de 4, indicando um boa reserva corporal de gordura.
Os lipídeos presentes no sangue são importantes
para os animais que realizam exercícios de baixa intensidade e com
duração de
baixa a média, que levam a uma significante utilização das gorduras
como fonte
de energia para o trabalho muscular.
Os resultados obtidos para a concentração do
triglicérides são semelhantes aos de equinos em repouso pós-exercícios,
conforme reportado por WANDERLEY et al. (2010); todavia, os
valores da
concentração do colesterol total apresentam-se maiores, discordando do
estudo
descrito por SLOET VAN OLDRUITENBORGH-OOSERBAN et al. (2002), que
observaram
que a concentração do colesterol total reduziu significativamente após
o
exercício em cavalos alimentados com dietas contendo 1,5% de extrato
etéreo.
Em
estudo realizado por
HYYPPÄ (2005), a recuperação das concentrações séricas do triglicérides
foi
lenta pós-exercício. Segundo o mesmo autor, uma hora após o término do
exercício ocorre aumento na liberação de insulina, que, por sua vez,
inibe a
lipólise num momento em que as concentrações séricas de lipídeos já
estariam
baixas em função de seu uso como fonte energética. Esse aumento da
concentração
do triglicérides é esperado em consequência do bloqueio na ação da
insulina e
do efeito hiperglicemiante gerado pelas catecolaminas e cortisol
circulantes frente
ao esforço físico. Com isso, ocorre um balanço energético negativo,
semelhante
ao que ocorre quando um equino é submetido a jejum alimentar, havendo
lipólise
e mobilização de outras fontes energéticas (DURHAM, 2006; DUGAT et al.,
2010).
CONCLUSÕES
Aos criadores e proprietários do
cavalo Mangalarga Marchador de Pernambuco, à GUABI Nutrição Animal,
Goiana-PE,
e à AJINOMOTO do Brasil, São Paulo-SP, pelo apoio financeiro a este
projeto.
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