EFEITO DO JEJUM NA GRANJA E CONDIÇÕES DE TRANSPORTE SOBRE O COMPORTAMENTO DOS SUÍNOS DE ABATE NAS BAIAS DE DESCANSO E LESÕES NA PELE

Osmar Antonio Dalla Costa,1Jorge Vitor Ludke,1 Mateus Jose Rododrigues Paranhos da Costa,2 José Vicente Pelosso,3 Arlei Coldebella1 e Nelise Triques4

1. Pesquisadores da Embrapa Suínos e Aves, Cx. Postal 21, CEP 89700-000, Concórdia , SC, Brasil. E-mail: osmar@cnpsa.embrapa.br
2. Departamento de Zootecnia, ETCO, FCAV/UNESP, CEP 14870-000, Jaboticabal, SP, Brasil
3. Sadia S.A., Concórdia, SC, Brasil
4. Acadêmica do curso de Ciências Biológicas da Universidade do Contestado e estagiária da Embrapa Suínos e Aves

RESUMO
O objetivo deste trabalho foi avaliar a influência do tempo de jejum na granja (TJG= 9, 12, 15 e 18 horas) e da posição do suíno no box da carroceria do caminhão (PBO= anterior, central e posterior), no piso da carroceria (PPI= inferior e superior) e lado (PLA= direito e esquerdo) sobre a ocorrência de lesões nos suínos e nas carcaças e no comportamento dos suínos nas baias de descanso no frigorífico. Utilizaram-se 192 fêmeas de abate com peso de abate de 133,1±10,9 kg oriundas de duas granjas. Verificou-se alta porcentagem de suínos com lesão na pele na granja (53,7%), no embarque (80,7%), no desembarque (91,2%) e ao abate (95,8%). Suínos submetidos a TJG de 15 horas apresentaram menor incidência de lesão de pele no embarque e maior incidência de lesão no desembarque e, na carcaça, maior incidência de lesão originada por briga em relação aos suínos submetidos TJG de 12 horas. Os suínos transportados no box da frente apresentaram menor incidência de lesão por densidade na carcaça em relação aos transportados no meio do caminhão. Conclui-se que suínos submetidos a jejum de 15 horas apresentam maior incidência de lesão na pele. Suínos transportados no box da frente apresentam menor incidência de lesão do que os transportados no meio. O tempo de jejum na granja não apresenta efeito sobre o comportamento dos animais nas baias de descanso do frigorífico.
PALAVRAS-CHAVE: Avaliação de carcaças, condições de abate de suínos, escore de lesões, manejo pré-abate, suínos de abate pesados.

ABSTRACT
EFFECT OF FASTING TIME AT FARM AND TRANSPORT CONDITIONS OF SLAUGHTER PIGS ON LAIRAGE RESTING BEHAVIOUR AND SKIN INJURIES
The objective of this study was evaluate the effect of pig fasting time at farm (TJG= 9, 12, 15 or 18 hours) and the pen position into the lorry’s livestock compartment (PBO= anterior, middle or rear), deck (PPI= lower or upper) and side (PLA= left or right) on swine and carcass skin bruises occurrence and swine resting behaviour on lairage pens at abattoir. One hundred ninety two females weighing 133.1±10.9 kg from two finishing pig farms were evaluated. A high percentage of pigs with skin bruises were observed at the farm (53.7%), before loading (80.7%), after unloading (91.2%) and before slaughtering (95.8%). Pigs submitted to a TJG of 15 hours presented lower incidence of skin injuries at loading and higher incidence of injuries at downloading and the carcasses had higher incidence of lesions generated by fights when compared to pigs submitted to TGJ of 12 hours. Pigs transported in anterior lorry’s compartment had lower incidence of skin damage on carcass due to density that those transported in the middle position. It is concluded that pigs submitted to 15 hours of fasting time at farm present higher incidence of skin bruises. Pigs transported in anterior lorry’s compartment had lower incidence of skin damage than pigs hold in middle lorry’s compartment. The fasting time at farm had no effect on pigs resting behaviour in abattoir lairage pens.
KEY WORDS: Carcass evaluation, heavy-weight slaughter pigs, pig skin injuries index, pig slaughter conditions, pre-slaughter management.

INTRODUÇÃO
A presença de lesões localizadas na superfície da carcaça de suínos detectadas após o abate é um problema comercial sério, pois pode prejudicar a classificação e em consequência o valor das carcaças. No Brasil, a comercialização de carcaças e meias-carcaças congeladas destinadas ao mercado internacional corresponde a 28% do volume total de carne suína exportada. Segundo a ABIPECS (2007), isso corresponde a uma exportação anual de dois milhões carcaças com 83,1 kg de peso médio por unidade. Durante o abate, quando são detectadas lesões na carcaça, a retirada da pele é realizada como parte do processamento antes da frigorificação. Em função da retirada do couro, perdas elevadas por desidratação são observadas nos processos convencionais de resfriamento das carcaças e alto grau de contaminação é verificado.
Outro aspecto importante relacionado com as lesões é a presença de hematomas no tecido subjacente e, em consequência, a influência negativa sobre a qualidade da carne, que pode gerar grandes perdas econômicas aos frigoríficos e insatisfação aos consumidores que se confrontam com produtos de qualidade inferior. Quando cortes especiais de carne suína são submetidos a um exame detalhado no frigorífico, nos açougues ou pelo consumidor, pode ocorrer a sua rejeição, gerando dessa maneira perdas econômicas e perdas na imagem do produto, em virtude da concepção implícita de que o produto em alguma fase da sua geração sofreu manejo inadequado.
Um relatório elaborado pelas universidades americanas para o American Meat Science Association (SCANGA et al., 2003) indica que, nos Estados Unidos, das cerca de 2,3 milhões de carcaças de suínos que sofrem, anualmente, condenação total ou parcial pelo serviço de inspeção federal, em torno de 6,5% apresentam problemas de hematomas e 5,1% apresentam problemas de lesão na pele. No Brasil não existem dados publicados que indiquem uma quantificação precisa sobre tipo e intensidade de lesões oriundas do manejo pré-abate presentes nas carcaças de suínos abatidos. Entre os principais fatores responsáveis pela incidência das lesões de pele estão as condições multifatoriais do manejo pré-abate (instalações, rampas, tipos e dimensões das carrocerias, mão de obra, jejum, densidade e descanso) e principalmente a mistura de lotes dos suínos durante o manejo pré-abate.
Estudo realizado por BROWN et al. (1999b), em que se utilizaram 657 suínos de três granjas, mostrou efeito significativo do jejum e da origem dos suínos sobre a incidência de lesões na carcaça. Animais submetidos a jejum no pré-abate, que variava entre doze e dezoito horas, tiveram as carcaças com incidência mais elevada de danos severos da pele em consequência de luta entre os suínos em relação aos animais que foram submetidos a jejum de até uma hora. MURRAY et al. (2001) encontraram efeito significativo do jejum dos suínos durante o manejo pré-abate, caracterizando que animais submetidos a jejum de quinze horas na granja apresentaram maior incidência de lesões e maior porcentagem de carcaças com escore igual ou superior a 2 em relação aos que não foram submetidos a jejum. MURRAY e JONES (1994) não encontraram efeito significativo do manejo pré-abate (ausência de jejum ou jejum de 24 horas) sobre o escore de lesões na carcaça dos suínos.
A incidência de lesões na carcaça tem alta correlação com a qualidade da carne e com o período de descanso no ambiente dos abatedouros (WARRISS et al., 1998a). Como relatado, essa etapa do manejo pré-abate tem como objetivo fornecer um ambiente tranquilo aos animais, para que eles se recuperem do estresse sofrido durante o seu deslocamento da granja até o abatedouro. Se os suínos forem manejados de uma maneira inadequada durante esse estágio, pode ser gerado estresse adicional através do aumento de interações agonísticas entre os animais (GISPERT et al., 2000). Suínos submetidos a longos períodos de descanso no frigorífico apresentaram aumento considerável na intensidade e duração das interações agonísticas, especialmente, quando ocorre a mistura de lotes (GEVERINK et al., 1996; WARRISS et al., 1998a).
O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito do tempo de jejum dos suínos na granja e de sua posição na carroceria do caminhão sobre o comportamento nas baias de descanso no frigorífico e nas lesões de pele ao abate quando os suínos são transportados até o abatedouro por períodos de curta duração.

MATERIAL E MÉTODOS
Utilizaram-se 192 fêmeas oriundas de cruzamentos industriais com peso vivo médio de 134,51±9,75 kg no inverno e de 131,75±11,80 kg no verão e um período de alojamento médio de 144 dias, para as fases de crescimento e terminação. Os animais deste experimento foram identificados 48 horas antes do carregamento, na orelha, com brincos plásticos dentro de cada tempo de jejum e tatuados na paleta e pernil. O estudo considerou duas granjas UES (Unidades de Engorda de Suínos), uma delas no verão (fevereiro de 2002, com temperaturas mínima e máxima absoluta de 13,0 e 33,5oC, respectivamente, e médias das temperaturas mínimas e máximas de 19,9 e 27,2oC, respectivamente) e outra no inverno (julho de 2002, com temperaturas mínima e máxima absolutas de 0,0 e 29,0oC, respectivamente, e as médias das temperaturas mínimas e máximas de 12,8 e 18,8oC, respectivamente).
As granjas tinham capacidade média de engorda de quinhentos suínos e, em cada baia, eram alojados dez animais. Nas granjas avaliadas foram escolhidas aleatoriamente quatro baias (repetições) por tempo de jejum dos suínos e seis animais/baia, totalizando dezesseis baias/granja e 96 suínos por experimento. Os procedimentos do carregamento e transporte dos animais foram definidos pelo frigorífico.
No manejo pré-abate, os suínos receberam os seguintes tempos de jejum na granja antes do carregamento: 9, 12, 15 ou 18 horas. O tempo gasto para o embarque desses animais foi de 29 e 45 minutos no inverno e no verão, respectivamente. A granja utilizada no experimento realizado no inverno estava a 23 km de distância do frigorífico, resultando em uma jornada de 31 minutos, enquanto que a granja utilizada para a realização do experimento no verão estava a 45 km do frigorífico, distância esta que foi percorrida em 75 minutos. No desembarque dos suínos no frigorífico utilizou-se uma rampa móvel, sendo que os animais receberam um período de descanso médio no frigorífico de três horas. No deslocamento dos suínos durante o embarque e desembarque não foram utilizados choques elétricos, sendo que os animais foram conduzidos com o auxílio de uma tábua de manejo.
O transporte dos suínos foi realizado em um modelo de carroceria metálica dupla Triel–HT, com capacidade de transporte de 96 suínos e uma densidade média durante transporte de 0,45 m2/animal ou 294,33±18,50 kg/m2. Nesse modelo de carroceria foram considerados os efeitos de piso (inferior e superior), do lado (direito e esquerdo) e posição (frente, meio e atrás). Empregou-se o mesmo veículo de transporte e modelo de carroceria nas duas granjas avaliadas.
A avaliação para determinar a incidência de lesões na pele foi realizada na meia-carcaça esquerda dos suínos, sendo registrada através de avaliação visual, realizando-se a contagem do número de lesões no lado esquerdo dos animais dentro de cada parcela experimental. Tomou-se essa medida também em três momentos: antes do abate (1- um dia antes do carregamento, 2- na descarga dos suínos no frigorífico e 3- na baia de descanso, imediatamente antes do abate) e também na carcaça, vinte e quatro horas após abate, quando foram registradas a incidência de lesões por carcaça e a origem das lesões, classificando-as em: a) manejo, b) densidade e, c) briga. Para todas as avaliações visuais realizadas nos animais foi calculada a frequência de animais que apresentavam lesões. Para caracterizar as lesões (índice, frequência e tipo) adotou-se a metodologia descrita por ITP (1996).
As análises da porcentagem de suínos com lesão na pele, avaliadas 24 horas antes do jejum (FLS-G), no embarque (FLS-E), no desembarque (FLS-D) e na baia de descanso do frigorífico (FLS-A) foram realizadas com a aplicação do Teste de Qui-Quadrado. Os dados referentes a frequências de lesões na pele por suíno, com avaliações na granja 24 horas antes do jejum (FLS-G), no embarque (FLS-E), no desembarque (FLS-D) e na baia de descanso do frigorífico (FLS-A) e frequências de lesões na pele da carcaça, classificadas em função da origem em: manejo (FLC-M), densidade (FLC-D), brigas (FLC-B) e total (FLC-T), foram transformados para a raiz quadrada de (x+1).
Para a frequência de lesões por suíno na granja (FLS-G), antes do embarque (FLS-E) e na baia de descanso do frigorífico antes do abate (FLS-A), adotou-se o procedimento GLM (SAS, 2001), utilizando-se o seguinte modelo estatístico: Yijk = μ + BLi + TJGj + (BL×TJG)ij +COV + eijk, em que: Yijk = frequência de lesões por suíno na granja (FLS-G), antes do embarque (FLS-E) e no desembarque (FLS-A); μ = média geral; BLi = bloco (estação do ano, i = 1 inverno e 2 verão); TJGj = tempo de jejum dos suínos na granja antes do carregamento, j = 1 (jejum de 9 horas), 2 (jejum de 12 horas); 3 (jejum de 15 horas) e 4 (jejum de 18 horas); (BL×TJG)ij = interação entre bloco e tempo de jejum dos suínos na granja; COV = covariável de interesse (FLS-G na análise da variável dependente FLS-E e FLS-D na análise da variável dependente FLS-A); eijk = erro aleatório.
Na análise das variáveis FLS-D, FLC-M, FLC-D, FLC-B e FLC-T, foi utilizado o seguinte modelo estatístico: Yijklmn = μ + BLi + TJGj + (BL×TJG)ij + PBOk + PPIl + PLAm +COV + eijklmn, em que: Yijklmn = FLS-D, FLC-M, FLC-D, FLC-B e FLC-T μ = média geral; BLi = bloco (estação do ano, i = 1 inverno e 2 verão); TJGj = tempo de jejum dos suínos na granja antes do carregamento, j = 1 (jejum de 9 horas), 2 (jejum de 12 horas); 3 (jejum de 15 horas) e 4 (jejum de 18 horas); PBOk = posição do animal na carroceria, k = 1(frente), 2 (meio) e 3 (atrás); PPIl = piso da carroceria, l = 1 (inferior) e 2 (superior); PLAm = lado da carroceria, m = 1(direto) e 2 (esquerdo); (BL×TJG)ij = interação entre bloco e tempo de jejum dos suínos na granja antes do carregamento; COV = covariável de interesse (FLS-E na análise da variável dependente FLS-D e peso dos suínos na granja na análise da variável dependente FLCS-M, FLCS-D, FLCS-B, FLCS-T); eijklmn = erro aleatório.
Registrou-se o comportamento dos suínos mediante avaliação de seis animais por baia e dezesseis baias (4 baias/tratamento) em cada época do ano, durante o período de descanso no frigorífico, na baia de espera, considerando-se as seguintes categorias: deitado, em pé, sentado, caminhando, brigando, fugindo, bebendo água e montando um sobre o outro. Os registros das observações foram realizados de forma direta através do método de contagem (GONYOU, 1993) em quatro momentos: quinze minutos do desembarque, e mais três observações a cada trinta minutos. Para a análise dos dados foi aplicado o Teste de Qui-Quadrado, calculando-se a porcentagem de animais em pé (PSPE), deitados (PSDEI), em outras atividades (PSUA): sentado, caminhando, brigando, fugindo, bebendo água e montando um sobre o outro.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O presente experimento foi desenvolvido em condições normais de produção de suínos e, dessa forma, reproduz parcialmente as condições naturais adotadas no manejo pré-abate, exceto a um único fator de variação incluído, que é o TJG. Nessas condições as atividades desenvolvidas para a coleta dos dados podem interferir na magnitude das respostas obtidas, porém considera-se que todos os animais avaliados foram submetidos ao mesmo conjunto de avaliações.
As porcentagens de suínos com alguma lesão de pele na granja (53,7%), no embarque (80,7%), desembarque (91,2%) e antes do abate na baia de descanso (95,8%) foram altas. Trata-se de valores que podem ser decorrentes da utilização de fêmeas com um peso de abate elevado (133,18±10,83 kg), do sistema de alojamento em baias coletivas com piso de concreto sem cama, com paredes de alvenaria rebocada, bebedouro do tipo concha (ecológico) e comedouro linear, paralelo ao corredor, com 9,69±0,70 suínos/baia no inverno e 9,37±0,88 suínos/baia no verão e área por animal de 1,07±0,08 e 1,14±0,13 m2/suínos e de 126,79±10,0 e 115,96±10,9 kg/m2 no inverno e no verão, respectivamente. Observou-se aumento na ordem de 27,0% na porcentagem de animais com lesões quando do início do experimento (identificação dos animais na granja) até antes do embarque dos suínos no caminhão.
Houve aumento médio de 15,1% no número de suínos com lesão de pele desde o embarque até o descanso no frigorífico. Desse aumento, 69,5 % corresponderam aos processos compreendidos entre a retirada do animal do ambiente habitual (baia na granja) até a instalação nas baias no frigorífico e 30,5 % corresponderam ao período de descanso dentro das baias no frigorífico.
Considerando-se os procedimentos normais de produção e manejo pré-abate, pode-se observar que 80,5% das lesões de pele dos suínos ocorrem na granja antes de o animal deixar a baia, e 19,5% ocorrem no período compreendido entre a retirada do animal da baia até o abate.
O tempo de jejum dos suínos na granja não influenciou significativamente a FLS-A (p=0,1320). Contudo esse tempo de jejum influenciou significativamente a FLS-G (p=0,0061), FLS-E (p=0,0352) e FLS-D (p=0,0314).
Observou-se efeito significativo (p=0,0061) do tempo de jejum dos animais na granja sobre a FLS-G: suínos que receberam jejum de 9 horas apresentaram menor FLS-G em relação aos animais que foram submetidos a jejum de 12, 15 e 18 horas. Como os suínos dentro dos tempos de jejum foram escolhidos aleatoriamente, este efeito não será considerado no presente estudo.
Suínos que receberam jejum de 15 horas na granja apresentavam menor incidência de lesões na pele quando do embarque (FLS-E), porém não diferiram significativamente (p>0,05) dos suínos que receberam jejum de 18 horas conforme apresentado na Tabela 1. Esses animais apresentaram maior frequência de lesões na pele no desembarque, e não diferiram dos suínos que receberam jejum de 9 e 18 horas. Animais que receberam jejum de 12 horas apresentaram menor incidência de lesão na pele por suíno no desembarque.
A posição do box dentro da carroceria dupla (frente, meio e atrás) no caminhão influenciou (p=0,0012) a FLS-D. Suínos transportados na posição anterior da carroceria apresentaram menor FLS-D em relação aos transportados no meio e atrás. Animais transportados no meio e atrás da carroceria do caminhão apresentaram valores de FLS-D semelhantes entre si (p>0,05). Não foi observado efeito significativo do piso (p=0,9248) e do lado direito e esquerdo (p=0,6542) da carroceria sobre a FLS-D. Suínos transportados nos box do meio e atrás estão sujeitos a uma maior trepidação oriunda do sistema de tração do caminhão (6 x4).
O tempo de jejum dos suínos na granja não influenciou significativamente a FLC-M (p=0,9056), FLC-D (p=0,2324) e FLC-T (p=0,0878). Entretanto observou-se efeito significativo do tempo de jejum dos suínos na granja sobre a FLC-B (p=0,0261). Suínos que foram submetidos a jejum de 15 horas na granja apresentaram maior incidência de lesões na carcaça provenientes de briga, porém não diferiram significativamente (p>0,05) dos animais que receberam jejum de 9 horas. Ao avaliar a frequência de lesões na carcaça proveniente de briga foi constatado também que suínos que foram submetidos a um jejum de 9 horas não diferiram significativamente (p>0,05) daqueles que receberam jejum de 12 e 18 horas conforme apresentado na Tabela 2.
O sistema de alimentação adotado nas granjas avaliadas era o de fornecimento controlado de ração três vezes ao dia (de manhã, ao meio-dia e ao anoitecer). A adoção dos diferentes tempos de jejum pré-embarque possibilitou que o último fornecimento de ração fosse às 10:00; 13:00; 16:00 e 19:00 horas para os tempos de jejum de 18, 15, 12 e 9 horas, respectivamente. Os TJG de 9 horas e 15 horas representam a manutenção dos arraçoamentos no padrão usual praticado pelas granjas avaliadas, enquanto que os TJG de 18 horas e 12 horas representam uma antecipação do horário de arraçoamento. Verifica-se que a antecipação do arraçoamento (TJG de 12 e 18 horas) e a manutenção do último arraçoamento às 18 horas (para um TJG de 9 horas) condicionaram para um baixo índice de lesões na carcaça originadas por brigas. Embora os TJG de 9 horas e de 15 horas não apresentem diferença estatística entre si, é possível verificar que, ao se excluir o último arraçoamento (o fornecimento de ração às 18 horas) para obter o TJG de 15 horas, a frequência de lesões aumentou 41 % em relação ao TJG de 9 horas.
A porcentagem de carcaças com lesão de escore=3, ocasionadas por problemas de manejo (13,68%), briga (0,53%) e densidade (5,79%) no presente estudo, foi baixa, todavia verificou-se alta porcentagem de carcaças com baixa incidência de lesões (escore=1) provenientes de problemas ocasionados por manejo (68,95%), briga (94,21%) e densidade (94,21%). Essa maior incidência de suínos com escore 1 pode ser parcialmente atribuída ao período de 3 horas de descanso dos animais adotado pelo abatedouro para o presente experimento. A ausência de lesões e o escore de lesões na carcaça podem ser considerados como um dos inúmeros possíveis indicadores de bem-estar dos suínos durante o período pré-abate. Assim, considera-se que, quanto maior a porcentagem de carcaças com ausência de lesão ou quando da presença de lesão, quanto menor for o escore de lesão para um maior número de animais, tanto mais adequada foi a condição geral de bem-estar dos suínos durante o período pré-abate.
Os resultados obtidos no presente trabalho confirmaram os obtidos por MURRAY & JONES (1994) e BROWN et al. (1999b), que não observaram efeito da realização do jejum na granja sobre o escore de lesões na pele. Porém diferem dos resultados encontrados por MURRAY et al. (2001), que encontraram efeito do tempo de jejum sobre o escore de lesões. Suínos que receberam jejum na granja ou no frigorífico apresentaram maiores escores de lesões e uma maior porcentagem de animais com escores maior do que 2, em comparação aos animais que não receberam jejum.
Nos estudos realizados por BROWN et al. (1999a), avaliando o escore de lesões de 657 suínos de três granjas, foi verificado que os suínos que receberam jejum ≤ 1 hora apresentaram menor porcentagem de animais com escore ≥ 3 em relação aos que foram submetidos a jejum de 12 ou 18 horas, e a origem dos suínos (granja) influenciou no escore de lesões e na porcentagem de suínos com escore ≥ 3.
Verificou-se efeito significativo (p=0,0174) da localização do animal dentro da carroceria (frente, meio e atrás) sobre FLC-D. Suínos transportados no meio e atrás apresentaram maiores valores de lesões na carcaça oriundas por densidade, não diferindo significativamente (p>0,05) entre si. Os animais transportados na frente apresentaram um menor FLC-D diferindo (p<0,05) somente dos transportados no meio da carroceria do caminhão. Não foi observado efeito significativo da posição na carroceria sobre FLC-M (p=0,4062), FLC-B (p=0,2451) e FLC-T (p=0,01937) e do piso (inferior e superior) sobre FLC-M (p=0,0710), FLC-D (p=0,0816), FLC-B (p=0,9780) e FLC-T (p=0,1367) e do lado (direito ou esquerdo) da carroceria sobre FLC-M (p=0,3705), FLC-D (p=0,3961), FLC-B (p=0,9817), e FLC-T (p=0,3673), conforme apresentado na Tabela 2. O efeito significativo para FLC-D em função da posição do suíno na carroceria pode ser atribuído a três causas principais que têm influência simultânea. Dois deles referem-se à dimensão e lotação da carroceria e o terceiro é vinculado à reação do suíno ao transporte.
A caracterização da carroceria usada nas avaliações indica duas condições importantes. No presente experimento a altura característica apresentada em cada piso na carroceria é de 90 cm e é adequada apenas para animais com peso vivo com até 100 kg. Mesmo assim a FLC-M e FLC-D tiveram nível de significância de p=0,0710 e p=0,0816, respectivamente. Adicionalmente, segundo BROOM et al. (2002), deve ser considerado um padrão de área útil (A, m2) por suíno transportado a curtas distâncias que segue a equação A = 0,0192 W0,67 , em que W é o peso médio do suíno em kg. Nestas condições a área média disponível nas presentes avaliações deveria ser de 0,5085 m2 por suíno, ou seja, uma área cerca de 13 % maior. A área total calculada indica a possibilidade de alojar no máximo 261,83 kg/m2. A densidade de 294,33±18,50 kg/m2 (considerando a área total) adotada no experimento está acima da recomendação para suínos com o peso vivo indicado.
No modelo de carroceria, em cada piso, estão alocados oito compartimentos. Se for considerada uma perda de área de 10%, em função das subdivisões internas da carroceria, a densidade efetiva utilizada no presente experimento passa para 328,7 kg/m2. WARRISS (1998) relata que uma densidade próxima a 250 kg/m2 é considerada adequada para suínos na faixa de peso de 90 a 100 kg e o valor de 322 kg/m2 foi apontado como indicativo claro de estresse físico. A recomendação adotada visa garantir a área necessária para que todos os animais no compartimento de transporte possam descansar simultaneamente deitando livremente e sem obstáculos em posição de decúbito esternal. Atualmente, não existe uma classificação padrão adequada, para enquadrar as diferentes condições de transporte, levando em consideração distância percorrida (curta, média e longa) e/ou duração (curta, média e longa). Adicionalmente, não se diferenciam, em termos de recomendações técnicas, os padrões específicos a serem adotados em cada situação para suínos de abate leves (entre 80 e 100 kg), intermediários (entre 100 e 120 kg) e pesados (acima de 120 kg), consideradas as categorias de interesse específico nos frigoríficos.
A carroceria (modelo monobloco, em dois pisos, lateral fechada em 1/3 da extensão a partir da base de cada piso e os restantes 2/3 da lateral de cada piso aberta e com divisórias internas) adotada no experimento não representa um ambiente uniforme e os diferentes pontos de localização apresentaram condições mais ou menos propensas ao desconforto físico dos suínos. Os suínos em peso de abate, quando enfrentam a situação de transporte, apresentam reação definida em função do nível (duração e intensidade) de vibração e de impactos a que são submetidos. A vibração é um aspecto do movimento que se caracteriza pela direção (horizontal ou vertical), pela aceleração e pela frequência.
PERREMANS et al. (1998) definem o provável limite crítico (expresso em RMS) dos suínos para a vibração vertical em 3 m/s2. A vibração é afetada pelo tipo de suspensão, pela condição das estradas, pela velocidade do veículo e pela carga total. No presente estudo, o transporte foi realizado em caminhão utilizando suspensão pneumática, em estradas secundárias não pavimentadas, com uma velocidade média de 40,3 km/hora e uma carga total média de 12.780 kg de suínos/viagem. Segundo NODDEGAARD & BRUSGAARD (2004), exceto para o eixo de deslocamento, a taxa de vibração para um caminhão carregado com suínos é condição característica do motor em funcionamento e está abaixo do limite crítico definido. Impactos, ao contrário das vibrações, são definidos pela forma de ocorrência (extemporânea, incerta e sem padrão estabelecido) e pela sua consequência (baixa intensidade com a manutenção do equilíbrio do animal ou alta intensidade com queda do animal). Diversos relatos definem o comportamento dos suínos nas carrocerias em função de estarem localizados próximos (no meio da carroceria) ou distantes (na posição anterior ou posterior na carroceria) ao eixo de sustentação sobre o rodado do caminhão. Mesmo com um curto período de viagem (31 minutos no inverno e 75 minutos no verão), o efeito da localização dos suínos na carroceria foi significativo para a frequência de lesões na carcaça por densidade segundo o índice estabelecido pelo ITP (1996). Os suínos localizados na posição central e posterior da carroceria apresentaram, respectivamente, uma FLC-D duas vezes e 78% superior quando comparados com os localizados na posição anterior.
Admite-se que os suínos da posição anterior ficaram mais tempo deitados que os animais das outras posições, o que pode ocorrer, porque o tempo necessário para o carregamento (31 minutos no inverno e 45 minutos no verão) foi elevado quando comparado ao tempo utilizado para transportar os animais ao frigorífico. Os animais na posição central e posterior da carroceria, diante de maior exposição a impactos, devem ter permanecido mais tempo em pé e, dessa forma, a alta densidade e a altura entre pisos contribuíram para a maior expressão de FLC-D. Segundo WARRISS (1998), os suínos preferem ficar em pé durante viagens de curta duração, em condições de alta intensidade de vibração e de impactos e quando o piso é desconfortável. Os resultados obtidos no presente trabalho expressam condições diferentes de pré-abate daqueles relatados por BARTON-GADE et al. (1996) e, em consequência, diferem daqueles relatados. BARTON-GADE et al. (1996) encontraram um efeito significativo do piso (inferior ou superior) sobre o escore de lesões maior que 2, em que os suínos transportados no piso inferior apresentaram uma maior incidência em relação transportados no piso superior. Quanto à posição, os animais transportados atrás apresentaram maiores valores de escores de lesões em comparação aos transportados na frente e no meio da carroceria.
Os dados referentes ao comportamento dos suínos na baia de descanso no frigorífico estão representados na Figura 1. O tempo de jejum dos suínos na granja não influenciou significativamente a PSDEI (p=0,8048), PSPE (p=0,0956) e a PSUA (p=0,1583). Independente do tempo de jejum a que os suínos foram submetidos na granja, 60,5% desses suínos permaneceram deitados na baia de descanso do frigorífico, e 30,0% permaneceram em pé e apenas 9,5% dos suínos exerceram outras atividades.
Na categoria de outras atividades (9,50%) verificou-se que os suínos apresentaram apenas três atividades: sentados (4,42%); caminhando na baia (4,30%) brigando (0,78%), e não foram observados suínos exercendo as atividades de montar um sobre o outro, beber água e fugindo das brigas. Os resultados obtidos no presente estudo estão de acordo com os obtidos por BROWN et al. (1999 a, b) que, estudando o efeito do jejum dos suínos na granja (≤ 1, 12 e 18 horas), verificaram que os suínos submetidos a jejum de 12 e 18 horas apresentaram comportamentos similares de beber água, deitar, montar sobre outro suíno e brigar junto à baia de descanso do frigorífico e que os suínos submetidos a jejum menor que uma hora aparentemente brigam menos, principalmente após 40 minutos de descanso. Entretanto, os resultados obtidos diferem dos obtidos por FERNANDEZ et al. (1995), ao observarem alguma evidência de que os suínos submetidos a jejum tendem a lutar mais em relação aos suínos que não foram submetidos a jejum durante o manejo pré-abate.
BROWN et al. (1999b), avaliando o efeito da duração do transporte (0, 8, 16 e 24 horas) sobre o comportamento dos suínos durante o período de descanso (6 horas) no frigorífico, observaram um efeito significativo do tempo do transporte sobre o comportamento dos suínos na baia de descanso do abatedouro, e que os animais que foram transportados por 8 e 15 horas têm períodos mais longos de alimentação e de beber água durante o tempo de descanso antes do abate. Suínos transportados durante 8 horas alimentam-se mais e tomam mais água no início e no final do período descanso e os animais que foram transportados durante 16 horas alimentam-se e tomam água com mais frequência, sendo observado o comportamento em três períodos (no início, meio e final do descanso).

CONCLUSÕES
A carroceria não representa um ambiente uniforme e os diferentes pontos de localização apresentaram condições mais ou menos propensas ao desconforto físico dos suínos durante o transporte. O principal efeito ocorre com relação à distância ao eixo de sustentação do rodado, sendo a posição central (acima do rodado) e posterior da carroceria as localizações que têm maior impacto sobre a frequência de lesões quando as condições de densidade excessiva se apresentam. Os diferentes tempos de jejum têm efeito sobre a frequência de lesões na carcaça ocasionadas por brigas, porque o jejum pode alterar a rotina de alimentação estabelecida. Menos lesões nas carcaças em virtude de brigas são observadas quando o último arraçoamento é antecipado ou quando são mantidos os horários de alimentação, e maior índice de lesões ocorre quando o tempo de jejum é estabelecido através do não fornecimento da última refeição. O tempo de jejum na granja e a localização do animal na carroceria, em condições de alta densidade de transporte, afetam a qualidade das carcaças oriundas de suínos de abate pesados, mesmo que transportados durante curto período e a curtas distâncias.

REFERÊNCIAS
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Protocolado em: 31 ago. 2007. Aceito em: 30 maio 2008.