DOI: 10.5216/cab.v14i4.15067
TOPOGRAFIA VÉRTEBRO-MEDULAR
EM SAGUI-DE-TUFO-BRANCO (Callithrix
jacchus, LINNAEUS 1758)
Luana Célia Stunitz da Silva1, Camila Ercolini Barroso1,
Valdir Pavanelo Junior1, Pedro Primo Bombonato2
1Pós-Graduandas da Faculdade de Medicina
Veterinária da Universidade de São Paulo, São Paulo SP, Brasil.
luanastunitz@gmail.com
2Professor Doutor da Faculdade de Medicina Veterinária da
Universidade de São Paulo, São Paulo SP, Brasil.
RESUMO
Devido à importância do estudo da
morfologia da medula espinhal, tendo em vista a sua aplicabilidade na
clínica veterinária na punção de líquido cefalorraquidiano, na localização
de lesões nervosas em níveis vertebrais e nas anestesias epidurais,
objetivou-se analisar e descrever a medula espinhal e a topografia
vértebro-medular em primatas da espécie
Callithrix
jacchus (sagui-de-tufo-branco). Para tanto, foram utilizados dez
espécimes adultos, 5 fêmeas e 5 machos, entre 170g a 300g procedentes de
um criadouro de animais selvagens e que vieram a óbito por causas
naturais. Após fixação em solução de formaldeído 10%, os animais foram
incisados na linha mediana dorsal, do forame magno até a base da cauda,
com retirada da musculatura epaxial e dos arcos vertebrais para a
exposição da medula espinhal. Em seguida efetuaram-se as mensurações do
comprimento total da medula espinhal, do cone medular e das duas
intumescências, a cervical e a lombar, realizando-se também a esqueletopia
de tais estruturas. Com o material analisado e a técnica empregada,
pode-se concluir que a medula espinhal do sagui-de-tufo-branco (
Callithrix
jacchus) possui um padrão morfométrico e morfológico
característico e, mediante a descrição morfológica do cone medular,
localizado entre L2-L5, sugere-se que a anestesia epidural nesta espécie
seja realizada na região lombosacra.
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PALAVRAS-CHAVE: Anatomia veterinária; Callithrix jacchus, medula espinhal;
sistema nervoso.
VERTEBRO-MEDULLARY TOPOGRAPHY IN WHITE-TUFTED-EAR-MARMOSET (Callithrix
jacchus, LINNAEUS 1758)
ABSTRACT
Due to the importance of spinal cord
morphological studies, their applicability in clinical veterinary during
cerebrospinal fluid punction, location of nervous injuries in spinal
levels, and epidural anesthesia, this study aimed at analyzing and
describing the spinal cord and vertebral-medullary topography in the
primate Callithrix jacchus
(common marmoset). Ten adult specimens, 5 females and 5 males, with
170g-300g were used. The animals came from a wildlife breeding center and
died of natural causes. After fixation in 10% formaldehyde solution, the
animals were incised at the dorsal midline, from foramen magnum to the
tail base, with removal of epaxial muscles and vertebral arches to expose
the spinal cord. Total length measurements from the spinal cord, medullary
cone and cervical and lumbar intumescences were performed, as well as
skeletopie of all structures. Based on the analyzed material and the
technique apllied we concluded that the spine of the common marmoset (Callithrix jacchus) presents standard
morphometric and morphological characteristic, and through the medullary
cone morphological description, between L2-L5, we suggest that epidural
anesthesia in this species should be performed at lumbosacral region.
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KEYWORDS: Callithrix jacchus;
nervous system; spinal cord; veterinary anatomy.
INTRODUÇÃO
Os primatas encontrados dentro do gênero
Callithrix possuem grande
importância na área da pesquisa não somente por sua ocorrência nos
ecossistemas da América do Sul e Central, mas também devido ao seu pequeno
porte, facilidade no manejo, biossegurança e peculiaridades fisiológicas.
Todas são espécies pequenas e arborícolas do Novo Mundo e são considerados
os animais mais recentes evolutivamente de sua família (ABBOTT et al.,
2003). Dentre todos esses, o sagui-de-tufo-branco (Callithrix
jacchus) destaca-se tanto por sua utilização histórica em prol da
biomedicina como por sua crescente manutenção como animais de cativeiro,
seja doméstico, como animal de estimação advindo de criadouros comerciais
legalizados pelo IBAMA, ou em zoológicos e criatórios (MANSFIELD, 2003).
Os animais desta espécie possuem tufos circum-auriculares brancos, mancha
branca em região frontal e nasal e cauda não-prêensil com faixas
transversais (STEVENSON et al., 1988). Possuem pequeno porte, de 350 a 450
g de massa corpórea e habitam a caatinga e o cerrado brasileiro em
formações arbóreas baixas (STEVENSON et al., 1988). São considerados
insetívoros-gumívoros, alimentando-se de insetos e de grande variedade de
matéria vegetal, como resinas arbóreas, sementes, flores, frutos e néctar
(CASTRO, 2003). Vivem cerca de 10 anos em vida livre, 16 anos em cativeiro
e atingem a maturidade sexual aos 18 meses. As fêmeas apresentam uma
gestação de aproximadamente 140 dias e os filhotes nascem com 20 a 35
gramas, sendo amamentados em média por 100 dias, mas já com duas semanas
os filhotes começam a experimentar algumas frutas maduras, porém sem
deixar a amamentação que finda aos dois meses de idade (STEVENSON et al.,
1988).
O estudo da morfologia da medula espinhal é imprescindível na clínica
veterinária, tanto para procedimentos, como punção de líquido
cefalorraquidiano e localização de lesões nervosas em níveis vertebrais,
quanto para subsidiar a prática de anestesias epidurais (CARVALHO et al.,
2003; GREGORES et al., 2010), nas quais o local para aplicação do fármaco
irá variar conforme a espécie animal manejada, sendo mais segura quando
realizada em região caudal no ápice do cone medular, evitando-se assim
lesões na medula espinhal (MACHADO et al., 2009a; MACHADO et al., 2009b;
GREGORES et al., 2010).
O objetivo deste trabalho foi analisar e descrever os segmentos da medula
espinhal, bem como a topografia vértebro-medular em primatas da espécie Callithrix jacchus.
MATERIAL E MÉTODOS
Para a avaliação, foram utilizados dez
espécimes adultos de Callithrix jacchus,
sendo 5 fêmeas e 5 machos, com massas corpóreas entre 170g e 300g, os
quais vieram a óbito por causas naturais e que não comprometeram a
morfologia medular. Os animais eram provenientes de um criadouro comercial
de animais selvagens localizado na cidade de Atibaia-SP (Brasil) e foram
doados para o Laboratório de Anatomia dos Animais Domésticos e Silvestres
da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São
Paulo (FMVZ-USP) para estudos anatômicos. Após seu recebimento, os animais
foram fixados em solução de formaldeído 10% por um tempo mínimo de 72
horas para a sua posterior dissecação. Os animais foram denominados de E1
até E10 consecutivamente para uma melhor compreensão das tabelas.
Após a fixação, realizou-se uma incisão e rebatimento da pele na linha
mediana dorsal, do forame magno até a base da cauda, com posterior
retirada da musculatura epaxial e dos arcos vertebrais permitindo, assim,
o acesso à medula espinhal e suas meninges, que foram rebatidas.
Mensuraram-se, então, o comprimento da medula espinhal (ME) dos animais
com um paquímetro digital (Starrett 799®), do forame magno ao início do
filamento terminal, e os comprimentos das intumescências cervical (IC),
lombar (IL) e do cone medular (CM). Por final todas as estruturas foram
fotodocumentadas e estabeleceu-se a esqueletopia das intumescências bem
como a base e o ápice do cone medular.
RESULTADOS
Nos dez animais analisados, observou-se
que a coluna vertebral consistia de sete vértebras cervicais, treze
torácicas, sete lombares e três sacrais, revelando uma medula espinhal com
formato cilíndrico e ligeiramente achatada dorsoventralmente.
Evidenciaram-se duas dilatações, a intumescência cervical e a lombar, e o
cone medular, localizado na porção caudal e terminal da medula espinhal (
Figura 1). Notou-se também que
os prolongamentos dos ramos nervosos, lombares e sacrais formavam a cauda
equina e o término da medula foi determinado pela presença do filamento
terminal (
Figura 2).
Os comprimentos da medula e de seus componentes na espécie
Callithrix
jacchus, bem como os valores da média e desvio padrão, tanto para
fêmeas quanto para machos, estão representados nas
Tabelas 1 e
2, respectivamente. E a
esqueletopia das duas intumescências e do cone medular são encontradas na
Tabela 3.
Os valores médios encontrados no presente estudo para o comprimento da
medula espinhal, da intumescência cervical, da intumescência lombar e do
cone medular segundo o teste estatístico de Mann-Whitney ou Teste U não
apresentaram diferenças significativas entre os machos e as fêmeas
analisados.
As intumescências cervical e lombar do sagui-de-tufo-branco apresentaram
posição mais cranial quando comparadas às do búfalo, em que a
intumescência cervical iniciava-se em C6 e terminava em T1 e a
intumescência lombar iniciava-se em L3 e terminava em S1 (RAO, 1976), e às
da ovelha, em que a intumescência cervical iniciava-se em C5 e terminava
em T2 e a intumescência lombar iniciava-se em L4 e terminava em S1(RAO,
1990).
A localização anatômica do cone medular nos saguis-de-tufo-branco deste
estudo é discrepante quando comparado a duas outras espécies de primatas,
sendo o estudo efetuado em sauins (
Saguinus
midas) em que registrou-se a base do cone em L4 e ápice em S2
(MARTINS et al., 2013) e o estudo em macacos-de-cheiro (
Saimiri
sciureus) onde a base do cone medular ocorreu em L7-8 e ápice em
S3 ou Cc1 (LIMA et al., 2011).
Ao se comparar os achados aqui expostos com mamíferos de outros grupos,
notaram-se algumas semelhanças na topografia do cone medular em relação a
carnívoros, como o lobo-guará (
Chrysocyon
brachyurus), em que se registrou o cone medular apresentando base
em L3 e ápice em L5 (MACHADO et al., 2002), a ariranha (
Pteronura
brasiliensis), que possui base em L2 e ápice em L4 (MACHADO et
al., 2009b) e a irara (
Eira barbara),
que possui base do cone em L3-L4 e ápice em L6 (BRANCO et al., 2013), e
também em relação a uma espécie de roedor, o ratão-do-banhado (
Myocastor
coypus), o qual possui a base do cone em L3-L5 e ápice em L4-L6
(MACHADO et al., 2009a).
Contudo quando se analisa a topografia do cone medular em outras espécies,
observam-se discrepâncias em relação ao presente estudo. Tais como no
gato-mourisco (
Herpailurus yagouaroundi),
em que o cone medular teve início em L6 e término em S2 (CARVALHO et al.,
2003), no cachorro-do-mato (
Cerdocyon
thous), em que a base do cone deu-se em L6 e ápice em S3
(PINHEIRO et al., 2011), no quati (
Nasua
nasua), em que a base do cone foi registrada em L5-L6 e ápice em
S3 (GREGORES et al., 2010), no javali, em que o cone medular possui base
em L4 e ápice em S3 (SANTOS et al., 2013) e no lobo-marinho (
Arctocephalus
australis), em que o cone medular estende-se de T5 até T7
(MACHADO et al., 2003).
O valor médio do comprimento do cone medular da espécie
Callithrix
jacchus foi próximo ao obtido para o ratão-do-banhado, o qual
apresentou um valor médio de 2 cm (MACHADO et al., 2009a), e
significativamente menor do que as médias obtidas para o cachorro-do-mato
(10,13 cm) (PINHEIRO et al., 2011), para o sauim (5,14 cm) (MARTINS et
al., 2013), para o quati (
Nasua nasua),
que apresentou valor de 5,2 a 5,8 cm (GREGORES et al., 2010), para o
macaco-de-cheiro (3,3 cm) (LIMA et al., 2011), para a paca (
Agouti
paca), com valor de 3,39 cm (SCAVONE et al., 2007), para o
lobo-marinho (4,4 cm) (MACHADO et al., 2003), para o gato-mourisco (5 cm)
(CARVALHO et al., 2003), para a ariranha (5,5 cm) (MACHADO et al., 2009b),
para a irara (4,31 cm) (BRANCO et al., 2013) e para o lobo-guará (6,5 cm)
(MACHADO et al., 2002).
CONCLUSÃO
A medula espinhal do sagui-de-tufo-branco
possui um padrão morfométrico característico para as intumescências
cervical e lombar e, mediante a descrição morfológica do cone medular,
localizado entre L2-L5, sugere-se que a anestesia epidural nesta espécie
seja realizada na região lombosacra.
AGRADECIMENTOS
Ao criadouro comercial de animais
selvagens, AJBSoares, pela disponibilidade e fornecimento dos animais
analisados e à Médica Veterinária Marta Brito Guimarães.
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