DOI: 10.5216/cab.v14i2.13078

 

 

 

 

PADRÃO BIOMÉTRICO DOS CAVALOS DE TRAÇÃO DA CIDADE DE PELOTAS NO RIO GRANDE DO SUL

 

Cahuê Francisco Rosa Paz1, Julio César Paganela2, Douglas Pacheco Oliveira3, Lorena Soares Feijó4, Carlos Eduardo Wayne Nogueira5


 

1Pós-graduando da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil. cahuepaz@gmail.com
2Médico Veterinário Autônomo - Petrópolis – RJ, Brasil.
3Médico Veterinário Autônomo - Pelotas – RS, Brasil.
4Pós-graduando da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.
5Professor Doutor da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.

RESUMO

Muitas famílias utilizam carroça tracionada por equinos como seu meio de trabalho ou suplementação da renda. Preocupando-se com a saúde desses animais, em Pelotas, desde 2006, existe o Ambulatório Veterinário, que presta atendimento clínico gratuito semanalmente aos cavalos de carroceiros. Os objetivos deste trabalho foram avaliar e registrar os padrões biométricos de equinos de tração em Pelotas. Foram avaliados 219 equinos, 129 fêmeas e 90 machos. Largura de peito (LP), perímetro de canela (PC), perímetro torácico (PT), largura de garupa (LG), altura do animal e peso (P) foram mensurados. Baseado nos valores encontrados, foram calculados os índices de Compacidade 1 (ICC1= (P/AC)/100), de compacidade 2 (ICC2=(P/[AC-1]/100) e de conformação (ICF=PT2/AC). Os animais de ambos os sexos apresentaram as seguintes médias: AC - 1,38 ± 0,07 m; PC – 0,19 ± 0,02 cm; PT – 1,56 ± 0,10 m; LP – 0,26 ± 0,05 cm; LG – 0,22 ± 0,05 cm; peso – 308 ± 60 kg. Em relação aos índices ICC1, ICC2 e ICF, as médias encontradas também para ambos os sexos foram, respectivamente, 2,30; 8,39; 1,82. Dessa forma, pelos índices obtidos, os cavalos avaliados foram considerados em sua maioria como inadequados para tração de cargas pesadas e com maior aptidão para tração de cargas leves ou uso como cavalos de sela.
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PALAVRAS-CHAVE: biometria; carroça; cavalos; índice de compacidade; tração.

 

BIOMETRIC STANDARD OF TRACTION HORSES IN PELOTAS, STATE OF RIO GRANDE DO SUL

 

ABSTRACT

Many families use wagon pulled by traction horses as their means of work or supplemental income. In Pelotas, there has been a Veterinary Clinic since 2006, which provides free weekly clinical care to these horses, due to concern about their health. The objectives of this study were to evaluate and record the biometric patterns of traction horses in Pelotas. We evaluated 219 horses, 129 females and 90 males. We measured chest width (ChW), leg perimeter (LP), thoracic perimeter (TP), croup width (CrW), height (H) and weight (W) of the animal. Through these values, we calculated the compactness index 1 (CCI1=(W/WH)/100), compactness index 2 (CCI2 = (W/[WH-1]/100) and conformation index (CFI=TP2/WH). The animals of both sexes showed the following averages: H - 1.38 ± 0.07 m; LP - 0.19 ± 0.02 cm; TP - 1.56 ± 0.10 m; ChW - 0.26 ± 0.05 cm; CrW - 0.22 ± 0.05 cm; weight - 308 ± 60 kg. Regarding the ICC1, ICC2 and ICF indices, the averages for both sexes were, respectively: 2.30; 8.39; 1.82. Accordingly, the indices obtained showed that most of the evaluated horses were inadequate to pull heavy loads and had greater ability to pull light loads or to be used as riding horses.

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KEYWORDS: biometrics; compactness index; horses; traction; wagon.


 

 INTRODUÇÃO

 O equino foi um dos primeiros animais a serem domesticados pelo homem e constituiu uma alavanca-mestre para o desenvolvimento do mundo nos primórdios da humanidade, sendo a sua força empregada para o uso da tração de cargas (CHÂTEAU, 2006).  No Brasil, observa-se o uso crescente de equídeos de tração nas metrópoles, como uma atividade da economia informal (REZENDE, 2004; MARANHÃO et al., 2006). Em consequência, algumas situações podem exigir que os animais esforcem-se acima de seus limites naturais.

Em várias cidades brasileiras, muitas famílias utilizam carroça tracionada por equinos como seu meio de sustento ou complemento da renda. A sustentabilidade dessas pessoas depende diretamente da saúde desses animais, pois, sem eles, torna-se mais difícil realizar longos trajetos à procura de produtos recicláveis para a venda.

O equino é considerado proporcional se a distribuição de peso entre as partes do corpo, observadas em conjunto, é adequada à função a que ele se destina, como sela, esporte ou tração (COSTA et al., 1998). Este trabalho teve como objetivo avaliar os padrões biométricos dos equinos de tração para entender qual o perfil do cavalo de carroça existente na cidade de Pelotas.

 

MATERIAL E MÉTODOS

 

Este experimento foi aprovado pelo Comitê de Ética em Experimentação Animal da Universidade Federal de Pelotas, com o código número 9245. Avaliaram-se os equinos atendidos no Ambulatório Veterinário, da Faculdade de Veterinária – UFPel, durante o período de janeiro de 2008 a janeiro de 2010. Foram escolhidos 219 animais de forma aleatória, 129 fêmeas e 90 machos, sem raça definida, com idade e peso variáveis.

Foram realizadas mensurações biométricas, avaliando-se os animais sobre superfície plana, sempre pelo lado esquerdo. Com a utilização de uma fita métrica, as seguintes mensurações foram feitas: Largura do peito (LA), por meio da distância entre as partes craniais do tubérculo maior dos úmeros direito e esquerdo; Largura de garupa (LG), por meio da distância da tuberosidade isquiática direita até a ponta da tuberosidade isquiática esquerda; Perímetro da canela (PC), por meio da medida da circunferência na região mediana da canela do membro anterior direito, formada pelos ossos metacárpicos II, III e IV; Perímetro torácico (PT), através da porção mais estreita do tórax, caudalmente à cernelha, na porção dorsal das últimas vértebras torácicas e ventralmente no terço caudal do esterno. Com o uso de uma fita de pesagem o Peso do animal (P) foi avaliado, por meio da medida de circunferência aferida com fita métrica posicionada logo após o final da cernelha, entre os processos espinhosos T8 e T9, passando pelo espaço intercostal da 8ª e 9ª costelas, até a articulação da última costela com o processo xifóide. Com o uso de um hipômetro, foi avaliada a Altura da cernelha (AC), tomada do ponto mais alto da região interescapular, e sua distância do solo.

Com base nessas mensurações foram avaliados os Índices de Compacidade (TORRES et al., 1977). O Índice de Compacidade 1 (ICC1) é baseado na relação do peso estimado dividido pela altura da cernelha, dividindo-se o resultado por cem (ICC1= (P/AC)/100). O Índice de compacidade 2 (ICC2) corresponde ao peso estimado divido pela altura da cernelha subtraída do valor 1, dividindo-se o resultado por cem (ICC2=(P/[AC-1]/100), enquanto que o  Índice de Conformação corresponde ao perímetro torácico elevado ao quadrado e dividindo-se esse resultado pela altura de cernelha (ICF=PT2/AC). Os três índices foram avaliados para determinar a aptidão dos cavalos, categorizando-os em cavalos de sela (S), aptos para tração leve (TL) ou tração pesada (TP), de acordo com o método de TORRES et al. (1977). A análise dos dados foi realizada com base na média dos valores de cada índice para avaliar a aptidão dos animais. Foi realizada a distribuição de frequências para cada aptidão, considerando-se os três índices isoladamente.

 

RESULTADOS
 

A Tabela 1 apresenta os resultados com suas respectivas médias para cada medida aferida.

A partir das medidas de altura de cernelha, peso e perímetro torácico, foram calculados três índices zootécnicos, propostos por TORRES et al. (1977), com intuito de avaliar a aptidão física dos equinos em relação a sua atividade. A Tabela 2 apresenta as médias obtidas nos três índices avaliados (ICC1, ICC2 e ICF) para machos, fêmeas e para o total de animais.

 Na Tabela 3 estão demonstradas as distribuições de frequências para determinar a aptidão dos animais, considerando-se os três índices de forma isolada.

 

DISCUSSÃO

Na literatura consultada, há estudos semelhantes com equinos de raças de sela, como o de MCMANUS et al. (2005), que avaliaram animais da raça Campeiro, tendo encontrado as seguintes médias, desconsiderando o sexo dos animais: 1,44m de cernelha; 1,73m de perímetro torácico e 0,18cm  de perímetro de canela. Na raça pantaneira, a altura média para altura de cernelha foi de 1,42m nos machos e 1,37m nas fêmeas (MISERANI, 2002). Na raça mangalarga marchador, CABRAL et al. (2004) encontraram os seguintes valores: altura de cernelha de 1,515m nos machos e 1,516m nas fêmeas; perímetro torácico de 1,808m nos machos e de 1,757m nas fêmeas; perímetro da canela de 0,197cm nos machos e de  0,190cm nas fêmeas. Todos os valores encontrados pelos referidos autores enquadram-se nos padrões recomendados pelas respectivas associações de criadores de cavalos. No presente estudo, os animais avaliados podem ser considerados sem raça definida; entretanto, em virtude da região da cidade de Pelotas ser pólo criatório de animais da raça Crioula, é possível atribuir parte da origem genética dos animais aos equinos desta raça. Em equinos da raça Crioula, as médias encontradas para altura de cernelha foram de 1,43m para machos e 1,42m para fêmeas, as médias em relação ao perímetro torácico e perímetro de canela foram de 1,79m e 0,20cm, respectivamente (KURTZ et al., 2007).

De acordo com PERALI et. al. (2001), a proteína e a energia são os nutrientes básicos que controlam o crescimento, ou seja, a ingestão de níveis adequados de proteína e energia proporciona ao animal taxas de crescimento de acordo com o seu potencial genético. Os requerimentos de proteína dietética pelos equinos estão relacionados com a necessidade de cada categoria e com as quantidades, qualidade e digestibilidade da proteína. Para LEWIS (2000), os problemas nutricionais podem iniciar desde antes do nascimento até a maturidade. A égua mal alimentada vai retirar de seus depósitos os nutrientes necessários ao desenvolvimento fetal. Ele vai ocorrer normalmente, a não ser que as carências sejam crônicas e graves, o que estará evidente em seu estado físico.

De acordo com RIBEIRO (1988), o cavalo é grande quando ultrapassa 1,60m; médio, entre 1,50 e 1,60m; pequeno, entre 1,30 e 1,50m; e considerados pôneis e piquiras com menos de 1,30 m, sendo que tais medidas são referentes à altura de cernelha. Com base no que verificado neste estudo, os cavalos de carroça da cidade de Pelotas são de pequeno e médio porte, com valores mensurados inferiores em relação aos encontrados nos equinos da raça Crioula. Na maioria das vezes, o padrão alimentar dos animais de carroceiros está aquém do necessário. Segundo LEWIS (2000), as deficiências proteicas podem gerar um atraso no crescimento, além de um péssimo estado geral do animal.

Em relação aos cálculos (TORRES et al., 1977) dos Índices de Compacidade (ICC 1 e 2) e Conformação (ICF), para o índice 1, os equinos de tração pesada devem apresentar valores superiores a 3,15; valores próximos a 2,75 indicam animais aptos para tração ligeira e próximos a 2,6 aptos para sela. Para o índice 2, os valores são: maior que 9,5, entre 8 e 9,5, e entre 6 e 7,75, para equinos de tração pesada, ligeira e sela, respectivamente. Em relação ao índice de conformação, animais com valores abaixo ou igual a 2,1125, são animais não aptos à tração e acima desse valor são animais aptos à tração. MENEGATTI et al. (2010) utilizaram os mesmos índices para classificar biometricamente os equinos de tração no município de Lages em Santa Catarina e concluíram que a maioria dos cavalos são classificados como eumétricos, mediolíneo para longilíneo, intermediários de tração ligeira ou de sela e considerados longe do chão. Da mesma forma, em Pelotas, de acordo com os resultados encontrados para o ICC 2, menos de 13% (28) dos cavalos aferidos têm aptidão para tração pesada, 61% (133) têm aptidão para tração leve e 26% (58) não têm aptidão para tração. Em relação ao ICF, os resultados obtidos demonstram que os animais não têm parâmetros biométricos ideais para realizar atividades de tração às quais são submetidos.

 
CONCLUSÃO

Com base nos resultados encontrados, os cavalos de carroça da cidade de Pelotas possuem medidas biométricas inadequadas para tração de cargas pesadas e aptidão para tração de cargas leves e uso como cavalo de sela.

 
REFERÊNCIAS

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COSTA, M. D.; BERGMANN, J. A. G.; PEREIRA, C. S. Caracterização das proporções morfométricas dos pôneis da raça Brasileira. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.50, n.4, p.455-460, 1998.

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MARANHÃO, R. P. A.; PALHARES, M. S.; MELO, U. P.; REZENDE, H. H. C.; BRAGA, C. E.; SILVA FILHO, J. M.; VASCONCELOS, M. N. F. Afecções mais frequentes do aparelho locomotor dos equídeos de tração no município de Belo Horizonte. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.58, n.1, p.21-27, 2006.

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MENEGATTI, J.; DE LIMA, R. V. P.; PAOLINI, E.; FONTEQUE, J. H. Avaliação morfométrica de equinos de tração (carroceiro) pertencentes ao projeto de extensão “amigo do carroceiro” CAV-UDESC no município de Lages – SC. Anais da XI Conferência Anual da Associação Brasileira dos Médicos Veterinários de Equídeos - ABRAVEQ, 2010. São Paulo-SP. Revista Brasileira de Medicina Veterinária Mais Equina. Suplemento I, v.29, s.p., 2010.

MISERANI, M.; MCMANUS, C.; SANTOS, A.; SILVA, J. Evaluation of the factors which influence linear measurements of the Pantaneiro Horse. Revista Brasileira de Zootecnia, v. 31, p.335-341, 2002.

PERALI, C.; LIMA, J. A. F.; FIALHO, E. T.; BERTECCHINI, A. G.; ARAÚJO, K. V. Valores nutricionais de alimentos para equinos. Ciência e Agrotecnologia, v. 25, n. 5, p. 1216-1224, 2001.

RIBEIRO, D. B. O cavalo: raças, qualidades e defeitos. Rio de janeiro: Editora Globo, 1988. 318 p.

REZENDE, H. H. C. Impacto ambiental, perfil sócio-econômico e migração dos carroceiros em Belo Horizonte do setor formal para o informal no período de 1998 a 2003. 61f. Dissertação (Mestrado em Medicina e Cirurgia) - Escola de Veterinária, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte,  2004.

TORRES, A. P.; JARDIM, W. R. Criação do cavalo e de outros equinos. São Paulo: Livraria Nobel, 1981. 654 p.


Protocolado em: 01 fev. 2011. Aceito em: 12 abr. 2013.