CORRELAÇÕES ENTRE CARACTERÍSTICAS MORFOGÊNICAS
E ESTRUTURAIS
Manoel Eduardo Rozalino Santos1, Dilermando Miranda da
Fonseca2, Virgilio Mesquita Gomes3, Simone Pedro da Silva4,
Guilherme Portes Silva5, Marina Reis Sant’Anna e Castro6
RESUMO
ABSTRACT
The analysis of
both morphogenetic and structural characteristics of pasture allows us to
understand the response patterns of the plant to the environment. Thus, this
study was conducted to evaluate the associations between the morphogenetic and
structural characteristics of Brachiaria decumbens under continuous grazing by
cattle. The development of individual tillers in pastures was evaluated under
two grazing management strategies during three seasons (winter, spring and
summer). Pearson correlations between variables were estimated. The lengths of
leaf and stem, number of tillers and leaves per tiller, rates of leaf
appearance and elongation of leaf and stem of B. decumbens were positively
correlated. There was a negative relationship between appearance and lifespan
of leaves (r = -0.89). However, positive correlations between leaf appearance
rate and number of tillers (r = 0.64) and between length of stem and leaf
senescence rate (r = 0.63) were determined. The B. decumbens modifies its
morphogenesis to better adapt to climate and grazing management.
KEYWORDS: Brachiaria decumbens; climate, grazing; growth; senescence.
INTRODUÇÃO
O desenvolvimento do colmo também influencia a produção de forragem
porque, dependendo do estádio de desenvolvimento do perfilho, o colmo tem
prioridade na partição de fotoassimilados. Ademais, o colmo pode favorecer à
fotossíntese do dossel pela redução do seu coeficiente de extinção de luz
(FAGUNDES et al., 2001).
O melhor entendimento da dinâmica de produção de forragem no pasto pode
ser obtido pelo estudo da morfogênese. Em pastos onde apenas folhas são
produzidas, a morfogênese de plantas pode ser descrita por três características
principais: taxa de aparecimento foliar, taxa de alongamento foliar e duração
de vida da folha. A combinação das características morfogênicas determina as
três principais características estruturais do pasto: tamanho da folha,
densidade populacional de perfilhos e número de folhas vivas por perfilho
(CHAPMAN & LEMAIRE, 1993).
Vale salientar que, em pastos tropicais, o alongamento do colmo também é
característica morfogênica importante, pois determina outras características
estruturais que influenciam decisivamente a produção primária e secundária da
pastagem, tais como o tamanho do colmo (SANTOS et al., 2011) e a relação lâmina
foliar/colmo (CÂNDIDO et al., 2005).
As alterações nas características morfogênicas da planta determinam
modificações nas características estruturais do pasto, ou seja, alteram a forma
como os órgãos da parte aérea da planta são arranjados no tempo e no espaço.
Isso altera o microclima (e. g.: ventilação, temperatura, umidade,
luminosidade) no qual as plantas se desenvolvem e, como consequência, gera
novas mudanças no padrão morfogênico da planta. Todos esses processos
caracterizam a complexa e interdependente natureza da dinâmica de populações de
plantas e do fluxo de tecidos no ecossistema pastagem. Desse modo, o estudo de
correlações é importante porque identifica a natureza das associações entre as
variáveis da morfogênese do vegetal.
Adicionalmente, a interpretação das respostas morfogênicas da planta
possibilita averiguar se o manejo do pastejo sazonal, caracterizado pela adoção
de alturas de pasto diferenciadas entre as estações do ano, é vantajoso, quando
comparado ao manejo do pastejo semelhante entre as estações do ano.
Assim, este trabalho foi desenvolvido com o objetivo de avaliar a
associação entre características morfogênicas e estruturais da Brachiaria decumbens manejada em lotação
contínua durante três estações do ano.
O clima da região de Viçosa, de acordo com o sistema de Köppen (1948), é
do tipo Cwa, com precipitação anual em torno de
Foram avaliadas duas
estratégias de manejo do pastejo. Em uma, o pasto foi mantido com
Desde junho de 2007, os oito
piquetes da área experimental vinham sendo manejados sob lotação contínua com
taxa de lotação variável para manter a altura média do pasto em
O monitoramento das alturas
dos pastos foi realizado por meio de medidas em 50 pontos de cada piquete,
utilizando-se instrumento e metodologia descritos por Santos et al. (2011). Para o controle da altura do pasto,
bovinos com cerca de
O manejo da adubação foi
feito com base na análise química do solo realizada em outubro de 2008, que
apresentou os seguintes resultados: pH em H2O: 4,79; P: 1,5
(Mehlich-1) e K: 86 mg/dm3; Ca2+: 1,46; Mg2+:
0,32 e Al3+: 0,19 cmolc/dm3 (KCl 1 mol/L). Foi
realizada adubação em toda área experimental com a aplicação de 100 kg/ha de N
e K2O, bem como 25 kg/ha de P2O5, usando-se o
formulado 20-05-20. Essas doses foram divididas em duas aplicações iguais, que
ocorreram nos dias 11/11/2008 e 15/12/2008.
Desde o início de julho de
2008 até o fim de março de 2009, as características morfogênicas e estruturais
do capim-braquiária foram avaliadas em 16 perfilhos por unidade experimental,
de acordo com metodologia descrita por Santos
et al. (2011). A partir desses procedimentos foram calculadas as variáveis:
taxa de aparecimento foliar, filocrono, taxa de alongamento foliar, taxa de
alongamento de colmo, taxa de senescência foliar, duração de vida da folha,
comprimento da lâmina foliar, comprimento do colmo, números de folhas vivas e
mortas por perfilho e número de perfilhos por área.
O banco de dados gerado com
essas avaliações de morfogênese (SANTOS et al., 2011) foi utilizado para o
estudo de associação entre as características morfogênicas e estruturais do
capim-braquiária. As análises dos dados experimentais foram feitas usando o
Sistema para Análises Estatísticas - SAEG, versão 8.1 (UFV, 2003). Correlações
lineares de Pearson entre as características morfogênicas e estruturais foram
estimadas utilizando-se 24 observações. Todos os valores foram testados pelo
teste t a até 10% de probabilidade.
A relação negativa entre TApF
e duração de vida da folha (DVF) (Tabela 3) evidencia um mecanismo
compensatório no pasto de capim-braquiária em resposta aos fatores abióticos.
No inverno, há condições restritivas para o crescimento do pasto devido, dentre
outros fatores, ao decréscimo da disponibilidade de nutrientes para a planta
forrageira em decorrência, principalmente, do déficit hídrico ocorrido nessa
época do ano, o que limita a absorção de nutrientes pela planta via fluxo de
massa e difusão no solo (NOVAES & SMYTH, 1999). Nessas condições, o
capim-braquiária reduz sua taxa de crescimento, apresentando menores TApF, TAlF
e TAlC. Entretanto, como forma de contrabalancear esses efeitos adversos à
formação da nova área foliar do pasto, o capim-braquiária incrementou a DVF.
Isso permitiu o aumento do tempo médio de permanência dos nutrientes na planta
e, por conseguinte, melhorou a conservação dos mesmos no organismo vegetal
(SANTOS et al., 2011).
É oportuno ressaltar que a
eficiência na conservação dos nutrientes, conferida pela maior DVF do
capim-braquiária, é apropriada quando o ambiente é caracterizado por menor
ocorrência de desfolhação (SANTOS et al., 2011), fato que aconteceu no inverno,
estação em que os pastos de capim-braquiária permaneceram sem animais, devido à
necessidade de manutenção das alturas pretendidas.
Contrariamente, na primavera
e no verão, estações em que os fatores ambientais de crescimento foram
restabelecidos (Tabela 1) e épocas em que foram realizadas as adubações, a
maximização do crescimento (maiores TApF, TAlF e TAlC) resultou em redução da
DVF. De fato, a baixa DVF tem sido reconhecida como marcador de resposta de
plantas relacionado à condição de meio favorável ao crescimento, como alta
fertilidade do solo (WRIGHT et al., 2004).
As correlações do filocrono
com as demais características morfogênicas foram contrárias àquelas verificadas
para a TApF (Tabela 3), o que é coerente, haja vista que o filocrono corresponde ao
inverso da TApF.
Com relação à taxa de
senescência foliar (TSeF), suas correlações foram fracas e não significativas
com as demais características morfogênicas do capim-braquiária (Tabela 3).
Esses resultados podem ser justificados pela instabilidade inerente ao processo
de senescência foliar. Ademais, enquanto as demais características morfogênicas
apresentaram padrões de respostas típicos e diferenciados entre os meses de
inverno e os de primavera e verão, a TSeF foi alta apenas durante a primavera,
apresentando valores reduzidos no inverno e também no verão (SANTOS et al.,
2011).
Como as características
morfogênicas determinam as características estruturais da planta (CHAPMAN &
LEMAIRE, 1993), torna-se relevante conhecer a associação entre essas variáveis respostas. Nesse sentido, verificou-se que, de
modo geral, aquelas características estruturais descritoras do maior
crescimento do pasto (comprimento da lâmina foliar, comprimento do colmo,
número de folha viva por perfilho, número de perfilhos) estiveram positivamente
correlacionadas com as características morfogênicas que denotam maior fluxo de
tecidos da planta (taxas de aparecimento foliar e de alongamento de folha e de
colmo) (Tabela 4). Isso ocorreu porque os valores dessas variáveis foram
aumentados, de forma conjunta, nos meses do ano com condições climáticas
favoráveis ao crescimento do pasto.
Esses resultados estão de
acordo com aqueles obtidos por SANTOS et al. (2010), que verificaram que o peso
do perfilho de capim-braquiária sob lotação contínua foi positivamente
correlacionado com as suas taxas de alongamento de folha (r = +0,64) e de colmo
(r = +0,63).
Por outro lado, o número de folhas mortas por perfilho correlacionou-se
de modo positivo com aquelas variáveis
respostas que denotam menor fluxo de tecidos e inferior taxa de
crescimento da planta, tais como filocrono e duração de vida da folha (Tabela 4). Isso ocorreu porque os valores dessas variáveis foram aumentados,
conjuntamente, nos meses do ano com clima desfavorável ao crescimento do pasto.
É oportuno sublinhar a associação positiva entre a TApF e o número de
perfilho do capim-braquiária (Tabela 4). Esse resultado é justificado
considerando-se que a maior TApF é premissa para o aparecimento de perfilhos no
pasto. Em outras palavras, quando uma nova folha é sintetizada, há a formação
concomitante de uma nova gema axilar, com potencial de originar um perfilho
(NELSON, 2000). Dessa forma, o incremento da TApF nos meses de clima favorável
(Tabela 1) pode estimular o perfilhamento do pasto, o que assegura sua
estabilidade e sua produção de forragem.
Outras relações positivas e coerentes ocorreram entre a TAlF e o CLF,
bem como entre a TAlC e o CC (Tabela 4). De fato, a maior síntese e/ou
alongamento celular ocorrido nos órgãos do vegetal, especialmente nos meses com
clima predisponente ao crescimento e desenvolvimento do pasto, concorre para
incrementar o tamanho desses órgãos. De fato, BRAZ et al. (2010) verificaram
aumento linear do comprimento da lâmina foliar do capim-braquiária em função da
sua taxa de alongamento foliar, bem como incremento linear do comprimento do
colmo em resposta à elevação da sua taxa de alongamento.
Conforme já foi discutido, a TSeF não apresentou correlações (P>0,10)
com a maioria das características estruturais do capim-braquiária. Na verdade,
apenas o comprimento do colmo esteve positivamente correlacionado com a TSeF
(Tabela 4). Em geral, em pastos tropicais, algumas condições em que ocorre
maior senescência foliar também resultam em perfilhos com colmo mais compridos,
e uma dessas condições é o sombreamento no interior do dossel, comum em pastos
com maior altura média, tal como aquele manejado neste trabalho com
Esses argumentos também foram utilizados por BRAZ et al. (2010) para
justificar a correlação positiva da taxa de senescência foliar com a taxa de
alongamento do colmo em plantas de capim-braquiária com alturas variáveis no
mesmo pasto manejado em lotação contínua com bovinos.
Embora não tenha ocorrido (P>0,10), era esperada a correlação positiva entre a TSeF e o número de folhas mortas por perfilho (Tabela 4). Isso pode ter acontecido em virtude da metodologia empregada neste trabalho, em que somente quando o processo de senescência ultrapassava mais de 50% do comprimento das lâminas foliares, as folhas eram consideradas mortas. Desse modo, em muitos casos, houve a mensuração da senescência foliar apenas na porção apical das lâminas foliares, porém muitas folhas continuaram a ser classificadas como vivas.
No tocante às associações entre as características estruturais do
capim-braquiária, constatou-se que o comprimento da lâmina foliar (CLF)
correlacionou de forma positiva com o comprimento do colmo (CC) (Tabela 5).
Comparativamente ao pasto mantido em
De modo geral, as correlações foram positivas entre as características estruturais que se referem ao número e tamanho dos órgãos vivos dos perfilhos, quais sejam: CLF, CC, número de folhas vivas (NFV) e número de perfilho (NP). Por outro lado, essas características correlacionaram-se negativamente com o número de folhas mortas por perfilho (NFM) (Tabela 5).
Todavia, o menor NFM durante as estações em que o pasto apresentou maior
crescimento e tamanho dos seus órgãos (primavera e verão) (SANTOS et al., 2011)
justifica a correlação negativa do NFM com as demais características
estruturais. Provavelmente, em virtude do maior comprimento das lâminas
foliares durante a primavera e o verão, as folhas levaram mais tempo para
apresentarem mais de 50 % de senescência e, com isso, menos folhas foram
consideradas mortas.
Os dados apresentados permitem inferir que o capim-braquiária modifica suas
características morfogênicas e estruturais de maneira dinâmica e interativa
como forma de adaptação às condições variáveis do ambiente, incluindo o clima e
o manejo do pastejo. Nesse sentido, o estudo de correlações permitiu
identificar a natureza das relações ou associações entre as variáveis respostas
obtidas pela avaliação morfogênica, o que é de grande valia para melhor
compreensão das respostas das plantas forrageiras no ecossistema de pastagem.
Os tamanhos e os números dos órgãos da parte aérea da Brachiaria decumbens cv. Basilisk, bem
como suas taxas de crescimento são positivamente correlacionados.
No pasto de B. decumbens sob
lotação contínua ocorrem as seguintes relações: 1) compensação entre
aparecimento e duração de vida das folhas; 2) correlação positiva entre taxa de
aparecimento foliar e número de perfilho; e 3) associação positiva entre
comprimento do colmo e taxa de senescência foliar.
A B. decumbens modifica sua
morfogênese para adaptação às condições variáveis do ambiente, incluindo o
clima e o manejo do pastejo.
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