INTERDEPENDÊNCIA ENTRE OS PADRÕES DE DESFOLHAÇÃO E A MORFOGÊNESE DO CAPIM-BRAQUIÁRIA SOB INFLUÊNCIA DAS FEZES DEPOSITADAS POR BOVINOS
Manoel Rozalino Santos1, Dilermando Miranda da Fonseca2, Virgilio Mesquita Gomes3, Simone Pedro da Silva1, Marina Reis Sant’Anna e Castro4, Victor Valério de Carvalho5
1Professor Doutor da Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG Brasil - m_rozalino@yahoo.com.br
2Professores Doutores da Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG, Brasil.
3Professor Doutor da Universidade Estadual de Montes Claros, MG, Brasil.
4Graduada em Zootecnia pela Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG, Brasil .
5Graduando em Zootecnia pela Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG, Brasil
RESUMO
O
conhecimento da interdependência entre os padrões de desfolhação e a
morfogênese da planta forrageira permite identificar os efeitos da
deposição das fezes pelos bovinos no pasto. Desse modo, este trabalho
foi desenvolvido para estimar equações de regressão para as
características morfogênicas em função dos padrões de desfolhação da Brachiaria
decumbens no mesmo pasto sob influência das fezes depositadas por
bovinos. O pasto foi manejado em lotação contínua com taxa de lotação
variável para manter a altura média de 25 cm. Os aumentos da taxa de
desfolhação (TD) e da intensidade de pastejo (IP) de desfolhação
diminuíram linearmente as taxas de senescência e de alongamento de folha
e de colmo, porém incrementaram linearmente a taxa de aparecimento
foliar. A TD e a IP também reduziram de forma linear o número de folha
morta por perfilho e os comprimentos da lâmina foliar e do colmo. A
perda de forragem resultou em efeitos contrários sobre as
características morfogênicas e estruturais da B. decumbens. O menor nível de pastejo nos locais próximos das fezes
aumenta a perda de forragem no pasto, eleva o tamanho das folhas e
colmos, a senescência e o crescimento dos perfilhos de B. decumbens, bem como reduz o aparecimento foliar.
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PALAVRAS-CHAVE:
Brachiaria
decumbens; crescimento; intensidade de pastejo; frequência de
desfolhação; perda de forragem
INTERDEPENDENCE BETWEEN DEFOLIATION PATTERNS AND MORPHOGENESIS OF SIGNALGRASS UNDER INFLUENCE OF FECES DEPOSITED BY CATTLE
ABSTRACT
The knowledge of
interdependence between defoliation patterns and morphogenesis of
grasses allows the identification of the effects of feces deposition by
cattle on the pasture. Thus, this work was developed to estimate
regression equations for morphogenetic characteristics in function of
grazing patterns of the same Brachiaria
decumbens pasture under influence of feces deposited by cattle.
The pasture was managed under continuous stocking with variable stocking
rate to maintain the average height of 25 cm. The increases in
defoliation frequency (DF) and grazing intensity (GI) reduced linearly
the rates of senescence and leaf and stem elongation, but increased
linearly the leaf appearance rate. The DF and GI also linearly reduced
the number of dead leaves per tiller and the leaf and stem lengths. The
forage loss resulted in adverse effects on the morphogenetic and
structural characteristics of B.
decumbens. The lowest grazing level near the feces increases
forage loss on pasture, the size of leafs and stems, senescence and
growth of B. decumbens tillers, and reduces leaf appearance.
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KEYWORDS:
Brachiaria
decumbens;
defoliation frequency; forage loss; grazing intensity; growth.
INTRODUÇÃO
Atualmente, os esforços para compreensão dos aspectos relativos à interface planta/animal assumem importância no planejamento de práticas de manejo que otimizem a produção animal em pastagens (1). Nesse contexto, o estudo dos padrões de desfolhação dos perfilhos é relevante, pois permite conhecer os efeitos de diversos fatores ambientais sobre a frequência, a intensidade e a eficiência de pastejo.
Os padrões de desfolhação de perfilhos individuais influenciam a dinâmica de desenvolvimento da planta forrageira, que pode ser mais bem compreendida pelo estudo de morfogênese. Esta permite conhecer a forma como os órgãos da parte aérea da planta são sintetizados e crescem no tempo e no espaço. Além disso, a morfogênese também auxilia na identificação de mecanismos de resistência ao pastejo desenvolvidos pela planta forrageira a fim de manter sua perenidade no ecossistema (2, 3).
Tanto os padrões de desfolhação quanto a morfogênese do pasto são influenciados pela deposição natural de fezes pelos ruminantes na pastagem. A presença de fezes resulta em rejeição das plantas adjacentes pelos bovinos (3) e, além disso, pode aumentar a quantidade de nutrientes disponíveis no solo para o pasto (4), o que tem efeitos positivos nas taxas de crescimentos dos órgãos da planta (3).
Com isso, as fezes podem modificar os padrões de desfolhação e a morfogênese dos perfilhos individuais e, consequentemente, alterar a estrutura do pasto, o que tem reflexos diretos sobre a produtividade primária e secundária dos ecossistemas de pastagens (1, 5).
Devido à interdependência entre os padrões de desfolhação e a morfogênese do pasto, torna-se importante conhecer as relações entre essas características, o que permite a identificação de padrões de respostas compensatórios que garantem a adaptação e a perenidade da planta em condições de pastejo. O conhecimento das relações de causa e efeito entre os processos de desfolhação e de morfogênese da planta possibilita a realização de inferências sobre várias características do pasto a partir de menor número de variáveis respostas avaliadas.
Assim, este trabalho foi desenvolvido com o objetivo de avaliar a interdependência entre os padrões de desfolhação e a morfogênese em pasto de Brachiaria decumbens cv. Basilisk manejado em lotação contínua sob influência das fezes depositadas por bovinos.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi conduzido de novembro de 2007 a maio de 2008 em área de pastagem de Brachiaria decumbens cv. Basilisk (Stapf.) (capim-braquiária), pertencente ao Setor de Forragicultura do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa, em Viçosa-MG (20º45' S; 42º51' W; 651 m). A área experimental era constituída de três piquetes de cerca de 0,30 ha, além de uma área reserva. O solo da área experimental é Latossolo Vermelho-Amarelo de textura argilosa. A análise química do solo, realizada no início do período experimental, na camada 0-20 cm, apresentou os seguintes resultados: pH em H2O = 5,4; P = 1,5 (Mehlich-1) e K = 88 mg/dm3; Ca2+ = 1,88; Mg2+= 0,47 e Al3+= 0,16 cmolc/dm3 (KCl 1 mol/L). Durante o período de avaliação, os dados climáticos foram registrados em estação meteorológica distante da área experimental aproximadamente 500 m (Tabela 1).
A adubação fosfatada foi efetuada no dia 16 de janeiro de 2008, com aplicação de 70 kg/ha de P2O5, na forma de superfosfato simples, em toda área experimental. A adubação nitrogenada, na forma de uréia, foi realizada em três aplicações de 50 kg/ha de N ao final da tarde de cada data de aplicação (16/01/2008, 26/02/2008 e 07/04/2008).
A partir de novembro de 2007, os piquetes foram manejados sob lotação contínua com taxa de lotação variável a fim de manter a altura do pasto em torno de 25 cm. Para isso, a altura do pasto foi monitorada duas vezes por semana e foram utilizados bovinos machos, em recria, com peso médio de 200 kg. O monitoramento das alturas dos pastos nos piquetes foi realizado por meio de medidas em 50 pontos de cada piquete.
Foram avaliadas duas áreas na pastagem, uma próxima e outra distante do local onde as vezes haviam sido depositadas. Considerou-se como próxima das fezes a área imediatamente adjacente às fezes, enquanto que a área distante correspondeu aos locais do pasto em que, num raio de cerca de um metro, não havia presença de fezes. Adotou-se o delineamento em blocos ao acaso com três repetições.
No início de janeiro de 2008, o pasto de capim-braquiária foi infestado pela lagarta Mocis latipes, o que impediu a realização e continuidade das avaliações em campo, que haviam iniciado em meados de dezembro de 2007. Com a infestação da lagarta, retiraram-se os animais dos piquetes e fez-se aplicação do inseticida do grupo piretróide (Decis 25EC) na dose de 200 mL/ha. Os piquetes foram novamente utilizados, sob pastejo e seguindo o mesmo manejo anterior, somente a partir de meados de fevereiro de 2008. As avaliações foram realizadas de março a abril de 2008.
As características morfogênicas e estruturais dos perfilhos foram avaliadas em áreas do pasto que representavam, inicialmente, sua condição média (25 cm de altura). No início dessas avaliações, escolheram-se áreas próximas de fezes frescas que haviam sido depositadas recentemente na área, além de áreas distantes das fezes. Em cada piquete, foram marcados 16 perfilhos por meio de anel plástico colorido, oito próximos às placas de fezes e os demais, distantes. Foram avaliados dois ciclos de coleta de dados de no mínimo quatro semanas. Em cada ciclo, um novo grupo de perfilhos foi selecionado para avaliação. Com o auxílio de uma régua graduada, foram efetuadas medições do comprimento das lâminas foliares e do pseudocolmo dos perfilhos marcados, duas vezes por semana. A partir dessas informações foram calculadas as variáveis: número de folha morta por perfilho, comprimento final da lâmina foliar, comprimento do colmo, taxa de aparecimento foliar, taxa de alongamento foliar, taxa de senescência foliar e taxa de alongamento de colmo (3).
Nos mesmos perfilhos marcados para as avaliações morfogênicas, as características dos padrões de desfolhações também foram estimadas, quais sejam:
Intensidade de pastejo (IP): razão entre o comprimento pastejado e o comprimento inicial das lâminas foliares expandidas, expressa em percentagem e obtida pela equação: IP= CILF – CAD/CILF, em que CIL= comprimento inicial da lâmina foliar, CAD= comprimento após a desfolhação;
Taxa de desfolhação (TD): número de desfolhações ocorrido nas lâminas foliares expandidas durante o período de avaliação do perfilho, obtida pela equação: TD= ND / DIA, em que ND= número de desfolhações, DIA= número de dia de avaliação do perfilho marcado;
Eficiência de pastejo: indica a percentagem da lâmina foliar produzida que foi efetivamente consumida pelos animais (6);
Perda de forragem: indica a percentagem da lâmina foliar produzida que não foi efetivamente consumida pelos animais (6);
As equações de regressão entre as características morfogênicas e as variáveis do padrão de desfolhação de perfilhos individuais foram estimadas. Para isso, avaliou-se o coeficiente de determinação e a significância dos coeficientes de regressão, testada pelo teste t ao nível de significância de até 10% de probabilidade.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A relação entre a taxa de aparecimento foliar (TApF) e a taxa de desfolhação (TD) foi linear e positiva. Padrão de resposta semelhante ocorreu entre a TApF e a intensidade de pastejo (IP). Porém, a perda de forragem reduziu-se linearmente com o aumento da TApF (Figura 1).
As menores TD e IP ocorreram nos locais do pasto próximos de onde havia fezes em razão da rejeição natural dos bovinos pela forragem adjacente às fezes, especialmente daquelas recentemente depositadas (3, 6). Com isso, as plantas de capim-braquiária que não tiveram o seu desenvolvimento interrompido pelo pastejo atingiram maiores alturas. Nessa condição, é comum que plantas com perfilhos mais compridos apresentem menores TApF, porque pseudocolmos de maior comprimento tendem a aumentar o intervalo entre o surgimento de duas folhas consecutivas e, portanto, reduzir a taxa de aparecimento foliar (7).
Por outro lado, nos locais distantes das fezes, houve maior intensidade e frequência de desfolhação, o que reduziu o tamanho natural das plantas, bem como resultou em maior TApF, já que os perfilhos nesse local eram de menor comprimento (3, 6).
Por outro lado, nos locais distantes das fezes, houve maior intensidade e frequência de desfolhação, o que reduziu o tamanho natural das plantas, bem como resultou em maior TApF, já que os perfilhos nesse local eram de menor comprimento (3, 6).
Além disso, a maior luminosidade no interior do dossel distante das fezes também pode ter contribuído para elevar a TApF, haja vista que variações no índice de área foliar alteram a interceptação de luz, que, por sua vez, promove mudanças nas características morfogênicas e estruturais do pasto (2). Esses fatores justificam a relação linear e positiva entre a TD e a TApF e entre a IP e a TApF (Figura 1A e B).
As relações positivas entre as FD e IP com a TApF (Figura 1A e B) também permitem evidenciar um efeito benéfico do pastejo sobre o pasto. A maior TApF é premissa para a expressão de uma importante forma de perenização do pasto: o aparecimento de perfilhos. Quando uma nova folha é sintetizada, há a formação concomitante de uma nova gema axilar, com potencial de originar um perfilho. Vale salientar que esse efeito benéfico do pastejo sobre o pasto ocorre apenas em situações de manejo do pastejo compatível com a capacidade de resistência ou tolerância da planta forrageira (5).
Com relação à perda de forragem, seus valores diminuíram linearmente com a TApF (Figura 1C). Essa relação negativa pode ser explicada pelo menor consumo da forragem produzida nos locais próximos das fezes em virtude da rejeição das plantas pelos bovinos. Isso resultou em plantas de capim-braquiária mais desenvolvidas, que naturalmente apresentam menores TApF (8), bem como maiores perdas de forragem devido à sua acentuada senescência foliar (3, 6). Já nos locais distantes das fezes, a maior frequência e intensidade de pastejo resultou em menores perdas de forragem por senescência foliar, bem como manteve as plantas de capim-braquiária mais baixas, situação em que é comum a maior TApF dos perfilhos (3).
Verificou-se que a ocorrência de maiores perdas de forragem no pasto, além de ser desvantajoso por aumentar o desperdício dos tecidos vegetais e reduzir a taxa de lotação da pastagem (9), também gera efeito deletério na TApF da planta (Figura 1C). Esse fato pode ter implicações relevantes sobre a produtividade do pasto na medida em que a TApF é característica central da sua morfogênese (2, 3). Dessa forma, a redução na TApF em situações de altas perdas de forragem (Figura 1C) pode gerar limitação ou atraso no potencial futuro de perfilhamento do pasto, o que compromete sua estabilidade e sua produção de forragem.
Os padrões de resposta entre as taxas de alongamento de folha (TAlF) e de colmo (TAlC) com as características descritoras dos padrões de desfolhação do pasto foram semelhantes. De fato, os incrementos das TD e da IP causaram redução linear das TAlF e TAlC. Contudo, a resposta das TAlF e TAlC em função perda de forragem foram lineares e positivas (Figuras 2 e 3). A maior remoção dos tecidos foliares devido às maiores frequência e intensidade de pastejo nos locais distantes das fezes reduz a área foliar do pasto e, por conseguinte, pode diminuir a interceptação de luz e a fotossíntese do capim-braquiária (10). Desse modo, menos fotoassimilados são disponibilizados para o crescimento dos órgãos das plantas e, por isso, os perfilhos individuais experimentam menores TAlF e TAlC.
Nos locais próximos das fezes, os mesmos processos atuam, porém em sentido contrário. Próximo das fezes há menores taxa e intensidade de desfolhação, o que mantém a planta com alta área foliar, adequada interceptação de luz, elevada taxa de fotossíntese e altos níveis crescimento de folhas e colmos nos perfilhos individuais. Essa é a razão das relações negativas entre as TD e IP e as TAlF e TAlC (Figura 2 A e B, e Figura 3 A e B).
A menor incidência de pastejo nas plantas adjacentes às fezes, além de incrementar a TAlF e a TAlC (Figuras 1 A e B e Figuras 2 A e B), também resultou em maiores perdas de forragem nesse local, conforme já explicado. Por isso, ocorreram aumentos lineares das TAlF e TAlC em função da perda de forragem (Figuras 1 C e 2 C). As maiores perdas de forragem no pasto estão associadas às altas taxas de senescência dos tecidos foliares (9). Nesse sentido, verificou-se que a TD e a IP reduziram linearmente a taxa de senescência foliar (TSeF) do capim-braquiária. Por outro lado, a perda de forragem resultou em acréscimo linear da TSeF (Figura 4).
A maior ocorrência de pastejo nos locais distantes das fezes fez com que maior percentagem de tecidos foliares do capim-braquiária fosse colhida pelos bovinos antes da morte das folhas. Isso resultou em inferior TSeF, em maior eficiência de pastejo e em menores perdas de forragem, ou seja, maior percentual da forragem produzida foi colhida nos locais distantes das fezes, o que aumenta a eficiência na etapa de utilização do pasto (6). A partir dessa justificativa, compreendem-se as respostas negativas da TSeF em função da TD e da IP, bem como a resposta positiva da TSeF em função da perda de forragem (Figura 4).
É relevante salientar que o acúmulo de tecidos senescentes decorrente da maior TSeF nos locais próximos das fezes, com menores TD e IP (Figura 4 A e B) pode limitar a incidência da luz nos extratos inferiores do pasto, o que restringe a taxa de aparecimento de perfilho pela diminuição da taxa de desenvolvimento das gemas em perfilhos (decréscimo no site filling) e, consequentemente, reduz o número de perfilhos no pasto (11).
Os padrões de desfolhações, por terem efeitos sobre as características morfogênicas do pasto, também acabam influenciando as características estruturais da planta forrageira. Nesse contexto, constatou-se que os comprimentos da lâmina foliar (CLF) e do colmo (CC) foram linearmente reduzidos pelas FD e IP, porém aumentados de maneira linear pela perda de forragem (Figuras 5 e 6).
Nos locais distantes das fezes, é possível que a maior frequência e/ou intensidade de desfolhação pelos bovinos tenha resultado em interrupção no crescimento natural do capim-braquiária e, assim, os perfilhos vegetativos permaneceram com menor tamanho. Desse modo, são coerentes as respostas lineares e negativas entre as TD e IP com os CLF e CC (Figuras 5 A e B e Figuras 6 A e B)
O pastejo mais frequente e/ou intenso promovido pelos bovinos nos locais distantes das fezes resulta em plantas mais baixas no pasto. Estas possuem perfilhos menores, o que constitui uma resposta morfológica de adaptação ao pastejo, via o mecanismo de escape (10, 11). Muitos desses perfilhos de menor tamanho possuem colmo e folhas demasiadamente curtos, que estão localizados mais próximos ao nível da superfície do solo, em um estrato do pasto mais difícil de ser acessado pelos bovinos em pastejo.
Por outro lado, as menores frequência e intensidade de desfolhação ocorridas nos locais próximos das fezes fizeram com que as plantas permanecessem por mais tempo em crescimento livre. Com isso, as plantas apresentaram maior estádio de desenvolvimento e foram constituídas de perfilhos mais compridos, que possuem lâminas foliares e colmos de maior tamanho (10).
Outra característica estrutural do capim-braquiária influenciada pelos padrões de desfolhação consiste no número de folha morta por perfilho (NFM). Observaram-se respostas lineares e negativas para essa característica em função das TD e IP. Contudo, o NFM respondeu de forma negativa em função das variações nos valores de perda de forragem (Figura 7).
Os efeitos dos padrões de desfolhação sobre a TSeF (Figura 4) explicam as respostas verificadas com o NFM. As menores frequências e intensidades de desfolhação, comuns nos locais adjacentes às fezes, resultam em maior mortalidade de folhas, porque estas não são pastejadas durante o período em que permanecem vivas, o que aumenta a TSeF e a perda de forragem nesses locais. Todavia, nos locais distantes das fezes, ocorre padrão de resposta contrário, ou seja, o menor intervalo entre desfolhações, somado à maior intensidade de pastejo, faz com que as folhas sejam pastejadas durante a sua duração de vida, o que reduz a TSeF, o NFM e a perda de forragem.
Os resultados apresentados evidenciam mecanismos compensatórios operando no pasto, como resposta do capim-braquiária aos distintos níveis de pastejo, intermediados pela deposição natural das fezes pelos bovinos. Nos locais com plantas mais pastejadas (distantes das fezes), os perfilhos apresentam menores taxas de alongamento de folhas e de colmo. Desse modo, esses perfilhos possuem normalmente menor área foliar, o que tem efeitos negativos para a interceptação de luz e a fotossíntese da planta (9). Para contrabalancear esse efeito deletério do maior nível de pastejo, o capim-braquiária desenvolveu outros mecanismos adaptativos, tais como maior taxa de aparecimento foliar, menor taxa de senescência foliar e menores comprimentos do colmo e da lâmina foliar.
Essa plasticidade fenotípica do capim-braquiária aos padrões de desfolhação, que são modificados pela ocorrência das fezes, garante a perenidade e a produtividade do pasto. De fato, a maior TApF e a inferior TSeF potencializam a formação de novos perfilhos e os menores CLF e CC permitem que os órgãos da parte aérea da planta escapem do pastejo (10) e, portanto, que a planta mantenha preservada a sua área foliar.
CONCLUSÕES
Em pasto de Brachiaria decumbens, os menores níveis de frequência e intensidade de desfolhação nos locais próximos das fezes resultam em aumento do tamanho das folhas e colmos, da senescência e do crescimento de perfilhos individuais e geram maior perda de forragem e menor taxa de aparecimento de folhas em Brachiaria decumbens. Nos locais distantes das fezes, as maiores frequências e intensidades de desfolhação geram adaptações morfológicas na B. decumbens, que passam a ter folhas e colmos mais curtos, taxas de senescência inferiores, menor perda de forragem, bem como maior taxa de aparecimento foliar.
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Protocolado em: 28 jan. 2011. Aceito em: 29 out. 2013