RESUMO
Avaliou-se o etileno glicol com criopreservador de córnea de coelhos.
Foram colhidas córneas do bulbo ocular direito e esquerdo de 10
cadáveres de coelhos adultos, machos, da raça Nova Zelândia, com massa
corporal variando de 4,0kg a 5,0kg. As peças foram obtidas
imediatamente após o abate dos animais realizado em abatedouro. As
córneas foram removidas com uma margem de 2,0mm de esclera e banhadas
em solução fisiológica 0,9%. As córneas dos bulbos oculares direitos
foram fixadas em formol, incluídas em parafina e coradas em
hematoxilina-eosina para avaliação em microscopia de luz. As dos globos
oculares esquerdos foram imersas em frascos criogênicos contendo
solução salina tamponada em fosfato, 0,4% de albumina sérica bovina e
1,5 molar de etilenoglicol. Os frascos foram congelados em nitrogênio
líquido à temperatura de -196ºC durante um período de 60 dias. Após
descongelamento, as córneas foram submetidas à análise macroscópica e
mensuradas a partir de imagens digitalizadas. A preservação de córneas
de coelhos com etilenoglicol, em nitrogênio líquido, não ocasiona
alterações na transparência, estruturais e morfométricas das camadas
que compõem a córnea.
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PALAVRAS-CHAVE: Coelho; córnea; criopreservação.
ABSTRACT
MORPHOLOGICAL EVALUATION OF RABBIT CORNEA CRYOPRESERVED WITH ETHYLENE GLYCOL
Rabbit corneas, cryopreserved with ethylene glycol, were evaluated.
Corneas of the right and left ocular globes were collected from eleven
New Zelanda male rabbits, weighing between 4.0kg and 5.0kg, immediately
after the animals were slaughtered. The corneas were removed with a
2.0mm edge of sclera and washed in physiological solution 0.9%. The
right corneas were fixed in formaldeide, enclosed in paraffin, stained
in hematoxyline eosine for evaluation in light microscopy. The left
corneas were immersed in cryoprotect bottles containing
phosphate-buffered saline solution, 0.4% of bovine albumen and 1.5
molar of ethylene glycol. The bottles were frozen for 60 days at -196º
C in liquid nitrogen. After thawing, they were submitted to
macrocospic analysis, and measured from digital images. The rabbits´
corneas preservated with ethylene glycol in liquid nitrogen caused no
structural nor morphometry alterations at the layers that compose the
cornea.
___________
KEYWORDS: córnea; cryopreserved; rabbit.
INTRODUÇÃO
Lesões corneais nos animais podem provocar opacidade e deformações que
podem comprometer a nitidez da imagem e, dependendo de sua gravidade,
conduzir à cegueira (ANDRADE & LAUS, 1998).
Úlceras corneais, descemetoceles e perfurações têm sido tratadas por
diferentes métodos, como retalhos tarsoconjuntivais (WHITLEY, 1991;
SLATTER, 2005), transposição lamelar corneoescleral (PARSHALL Jr,
1973), flap de membrana nictitante (WHITLEY, 1991; SLATTER, 2005),
enxertos pediculados de conjuntiva (LAUS
et al., 1996; MORALES
et al.,
1996), lentes de contato (WILLIANS, 1991), enxertos conjuntivais livres
(KUHNS, 1979), ceratoplastias lamelares (BERNIS, 1980), enxertos
autólogos, livres, de córnea e pediculados de conjuntiva (LAUS
et al., 1996), cápsula esplênica de bovino na ceratoplastia lamelar em coelhos (EURIDES, 2006) e membrana amniótica (BARROS
et al., 1998; PONTES
et al., 2008).
Córneas de cães foram preservadas para transplantes em glicerina 98%, solução supersaturada de açúcar a 300% (GONÇALVES
et al., 2003), de coelhos, em solução contendo dextrano 10% (WEEKERS & MICHIELS, 1976; HALBERSTADT
et al.,
2003) e em polietileno e sulfato de condroitina (ROUTLEDGE &
ARMITAGE, 2003), de humanos, em solução de 1,2 propanodiol 10% e
solução de dimetilssulfóxido 7% (O´NEILL
et al., 1967; CANALS
et al., 1999) e de cães e gatos, em solução de Optisol GS (ARNDT
et al., 2001).
Para obtenção de bons resultados nos transplantes de córneas
preservadas, é necessária a utilização de métodos que mantenham sua
integridade anatomofuncional (ALMEIDA, 1974). É imprescindível que o
epitélio posterior esteja íntegro por possuir células de vida curta,
que não se regeneram e são facilmente afetadas por traumas mecânicos ou
por alterações de pH do meio (WHITLEY, 1991).
O etilenoglicol tem sido utilizado para a criopreservação, em
nitrogênio líquido a -196ºC, do sêmen de várias espécies de animais
como cães (SOARES
et al. 2002), ovinos (MORAES
et al., 1998) e equinos (ALVARENGA
et al., 2000), com bons resultados.
Neste experimento, avaliou-se a integridade e as medidas das camadas
que compõem a córnea do coelho, criopreservadas em nitrogênio líquido a
- 196ºC, com etilenoglicol, através da análise morfológica e
morfométrica. Este projeto aprovado pela comissão de ética CEUA-UFU:
044/08, parecer 060/2008.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram colhidas córneas do bulbo ocular direito e esquerdo de 10
cadáveres de coelhos adultos, machos, da raça Nova Zelândia e pesando
de 4,0kg a 5,0kg. As peças foram obtidas imediatamente após o abate dos
animais em abatedouro. Os doadores não apresentavam clinicamente
doenças infectocontagiosas e as córneas foram avaliadas com
oftalmoscopia direta para excluir as portadoras de alterações. As
córneas foram removidas com tesoura incluindo 2,0mm da esclera e
lavadas em solução fisiológica 0,9% (Solução fisiológica a 0,9%. JP
Indústria Farmacêutica. Ribeirão Preto, SP.) (
Figura 1).
Córneas do bulbo ocular direito (Grupo controle, n = 10) foram fixadas
em formol a 10% durante três dias. As do bulbo ocular esquerdo (Grupo
criopreservado, n = 10) foram imersas em tubos criogênicos(Tubos
criogênicos. Nutrientes celulares. Campinas, SP.), contendo solução
salina tamponada com fosfato (PBS), 0,4% de albumina sérica bovina e
1,5 molar de etilenoglicol (Etilenoglicol. Nutricell. Nutrientes
celulares. Campinas, SP), e permaneceram em temperatura ambiente por 20
minutos. Os frascos foram colocados no vapor de nitrogênio, 5,0cm acima
do nível de nitrogênio, por 20 minutos e, em seguida, mergulhados em
nitrogênio líquido, durante 60 dias.
O descongelamento foi realizado em banho-maria a 38ºC por, no mínimo,
30 segundos e, para remoção do crioprotetor, as córneas foram colocadas
em solução de PBS, com 0,4% de albumina sérica bovina, onde
permaneceram durante cinco minutos. Os segmentos corneanos do grupo
controle e criopreservados foram analisados quanto à transparência e em
seguida fixados em formol 10% durante três dias e inclusos em parafina.
Com a utilização do micrótomo (Micrótomo. Leika modelo 2.065.
Alemanha.) foram obtidos cortes histológicos transversais de
5,0µm, corados em hematoxilina-eosina e montados com lamínula em
bálsamo do Canadá. Através da microscopia de luz, com aumento de 10, 40
e 100 X, avaliou-se a integridade das camadas das córneas. As do grupo
controle e criopreservado foram mensuradas através de imagens
digitalizadas obtidas em microscópio Olimpus triocular BX40 acoplado à
câmera Oly-200, conectada a um computador PC através de placa
digitalizadora Data Translation 3153. As imagens foram analisadas
utilizando-se o “software” HL Image 97++ (Wester Vision Software.
USA.).
Foram utilizados o teste de Kolmogorov e o de Wilcoxon para verificar
se as alterações foram estatisticamente significativas (TRIOLA, 2005).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O epitélio anterior é escamoso e não queratinizado, de espessura
variável, com padrão básico de membrana basal, células epiteliais
basais, aladas e superficiais escamosas (SLATTER, 2005). Neste
experimento, o epitélio das córneas do grupo controle apresentou
variação de espessura de 13 a 33µm e no criopreservado foi de 20 a
34µm, valores não significativos.
Na criopreservação em nitrogênio líquido a -196ºC de 28 córneas humanas
em solução de dextrano 10%, ocorreu perda do epitélio posterior e, em
duas córneas, essa camada encontrava-se totalmente necrosada (WEEKERS
& MICHIELS, 1976; HALBERSTADT
et al.,
2003). Neste experimento, a criopreservação foi realizada com
etilenoglicol e as córneas apresentavam-se com epitélio posterior solto
em algumas áreas e espaço intercelular aumentado em sete (70%) córneas
no grupo controle e em oito (80%) no grupo criopreservado. Em seis
(60%) córneas do grupo controle e sete (70%) do criopreservado, a
substância própria apresentou aberturas entre as fibras colágenas.
Apesar de as alterações diferirem numericamente entre os grupos, a
ocorrência deveu-se ao processamento histológico e não pela
criopreservação, já que os resultados obtidos são semelhantes nos dois
grupos (
Figura 2).
Córneas de coelhos foram preservadas em solução sintética de Parker
199, com e sem dextrano 10%, e avaliadas após sete e 14 dias a 4ºC. Com
o dextrano ocorreu limitação da hidratação. Notou-se boa conservação da
estrutura celular decorridos sete dias e destruição do núcleo aos 14
dias de preservação (WEEKERS & MICHIELS, 1976). Com o método
utilizado neste o trabalho, os núcleos celulares mantiveram-se
aparentemente inalterados, com deslocamento mínimo do epitélio
posterior.
Córneas de cães e gatos preservadas em Optisol GS a 4ºC revelaram
aberturas dispersadas no epitélio posterior de dimensões aproximadas de
uma única célula. As células endoteliais dos animais variaram de 18 a
21µm de largura, sendo geralmente de 15µm (ARNDT
et al.,
2001). Neste estudo, verificou-se que as células do epitélio posterior
do grupo controle apresentavam de 3,03 a 4,41µm de largura e as do
grupo criopreservado, de 1,68 a 4,01µm, evidenciando que não houve
alterações morfométricas significativas. A modificação do epitélio
posterior também foi verificada por BOURNE
et al. (2001), na preservação de córneas humanas com meio de Chen e Optisol-GS a 4ºC.
Olhos de suínos foram utilizados por ALVIM
et al.
(2003) para injeção de dextrano 40 a 10% na câmara anterior e embebidos
na mesma solução durante 72 horas. Os autores verificaram que as
córneas em solução a 10% preservaram sua transparência. Com o método de
criopreservação em etilenoglicol, utilizado neste trabalho, não foi
notada alteração na sua transparência.
Com diferentes concentrações de dimetilssulfóxido, para criopreservação de córneas de cães, O´NEILL
et al.
(1967) observou que, de 2 a 6%, ocorreu aumento de densidade celular do
epitélio posterior, a 8% grandes áreas da substância própria foi
destruída e a 14% houve destruição do epitélio posterior. Neste
trabalho, não foram constatadas lesões do epitélio posterior nem
alterações que pudessem ser consideradas como destruição da córnea, nas
córneas do grupo controle e criopreservadas avaliadas em microscopia de
luz.
Para analise das imagens e das mensurações obtidas em microscópio de
luz foi utilizado o teste de Kolmogorov e anormalidades na distribuição
das mensurações foram observadas. Em seguida, os dados foram submetidos
ao teste de comparação de variáveis não paramétricos Wilcoxon. Foi
constatado que nenhuma das variáveis pode ser considerada
estatisticamente diferente entre o grupo controle e grupo
criopreservado. Verificou-se que não houve modificações morfométricas
das córneas de coelhos criopreservadas a -196ºC em solução de
etilenoglicol (
Figuras 3,
4,
5 e
6).
CONCLUSÕES
A criopreservação de córneas de coelhos com etilenoglicol em nitrogênio
líquido durante 60 dias não ocasiona alterações na transparência e nos
aspectos estruturais da córnea. A espessura das camadas da córnea não
diferiu expressivamente entre o grupo controle e o tratado, o epitélio
anterior variou de 15 a 33µm e de 20 a 34µm; a substância própria de
375 a 200µm e de 378 a 240µm, a membrana limitante de 5,25 a 8,95µm e
de 5,22 a 9,31µm e, o epitélio posterior de 3,15 a 4,51 e de 1,85 a
4,00µm, respectivamente.
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Protocolado em: 12 set. 2010. Aceito em: 03 fev. 2011.