Cinco vacas holandesas multíparas
(média de 526 kg de peso vivo e 85 dias de lactação) foram distribuídas
em delineamento quadrado latino 5 × 5 para avaliar a substituição de
silagem de milho por cana-de-açúcar mais caroço de algodão em rações
contendo 50% de concentrado e 50% de volumoso (base matéria seca - MS).
Os tratamentos consistiram na substituição de silagem de milho por
cana-de-açúcar picada, nas seguintes proporções: 100:0 (controle),
75:25, 50:50, 25:75 e 0:100, com base na MS do volumoso. A cada
tratamento, adicionaram-se 0%, 5%, 10%, 15% e 20% de caroço de algodão
na MS da dieta, respectivamente. Os consumos de MS das vacas recebendo
as rações com 100%, 75% e 50% de silagem de milho foram maiores (P <
0,05) do que os das vacas recebendo 25% e 0% de silagem de milho. A
produção de leite foi maior (P < 0,05) para as vacas recebendo 100%,
75% ou 50% de silagem de milho do que para as vacas recebendo 25% ou 0%
de silagem de milho. O teor de gordura mostrou-se maior (P < 0,05)
para vacas recebendo 50%, 25% ou 0% de silagem de milho do que para as
vacas que receberam os demais tratamentos. O teor de proteína não foi
afetado (P > 0,05) pela inclusão de cana-de-açúcar à dieta. A
silagem de milho pode ser substituída por cana-de-açúcar até 50% do
volumoso sem efeitos negativos no desempenho de vacas em lactação
produzindo até 18 L/dia de leite.
Palavras-chaves: Caroço de algodão, composição do leite, consumo de matéria seca, produção de leite.
REPLACEMENT OF CORN SILAGE BY CHOPPED SUGAR CANE AND WHOLE COTTONSEED ON THE PERFORMANCE OF LACTATING HOLSTEIN COWS
Five multiparous Holstein cows
averaging 526 kg of body weight and 85 days of lactation were assigned
in a 5 x 5 latin square design for the evaluation of the
replacement of corn silage by sugar cane and whole cottonseed.
Cows were fed a 50:50 concentrate:forage diet (dry matter basis-DM).
Treatments were defined by the replacement of corn silage by chopped
sugar cane (whole plant) according to the following proportions: 100:0
(control), 75:25, 50:50, 25:75, 0:100, based on dry matter roughage. In
each treatment, 0, 5, 10, 15, and 20% of whole cottonseed were added to
the dietary DM, respectively. Dry matter intake (DMI) of cows fed 100,
75, and 50% corn silage diets was higher (P < 0.05) than the DMI of
cows fed 25 and 0% corn silage. Milk production was higher (P <
0.05) for cows fed 100, 75 and 50% corn silage than for cows fed 25 or
0% corn silage. Milk fat concentration was higher (P < 0.05) for
cows fed 50, 25 or 0% corn silage than for cows fed 100 or 75% corn
silage. Milk protein concentration was not affected (P > 0.05) by
inclusion of sugar cane and whole cottonseed. Corn silage can be
replaced by sugar cane up to 50% of roughage level without negative
effect on performance of dairy cows producing up to 18 kg milk/day.
KEYWORDS: Cottonseed, dry matter intake, milk composition, milk production.
Dado o grande potencial de produção
de matéria seca (MS) e energia por unidade de área, a cana-de-açúcar é
amplamente utilizada na alimentação de bovinos leiteiros confinados. A
utilização dessa forrageira permite obter custo de produção
relativamente mais baixo do que o observado com o uso de alimentos
volumosos normalmente utilizados no período da seca como, por exemplo,
as silagens de milho e sorgo.
Uma das grandes limitações da utilização da cana-de-açúcar refere-se ao
baixo consumo de matéria seca (CMS) dos animais quando comparada com o
CMS de outras fontes de volumosos (MENDONÇA et al., 2004; MAGALHÃES et al.,
2006). Essa redução no CMS é normalmente atribuída à baixa
digestibilidade da fração fibrosa e/ou às baixas taxas de digestão e
passagem da fibra da cana-de-açúcar no rúmen.
Vários autores constataram que a cana-de-açúcar quando usada em
substituição à silagem de milho provocou redução na produção de leite,
assim como na produção de leite corrigida para gordura (VALVASORI et al., 1995; MAGALHÃES et al., 2004; COSTA et al.,
2005). Segundo esses autores, o menor desempenho das vacas alimentadas
com cana-de-açúcar como principal volumoso é justificado,
principalmente, pelo menor CMS.
Dessa forma, sugere-se que o uso de caroço de algodão, por ser alimento
rico em gordura e possuir elevada concentração energética (NRC, 2001),
pode compensar o menor CMS verificado quando se inclui cana-de-açúcar,
mantendo-se o consumo de energia e o desempenho de vacas em lactação
dentro de padrões adequados.
O objetivo deste trabalho foi determinar os efeitos da substituição de
silagem de milho por cana-de-açúcar mais caroço de algodão sobre a
produção e a composição do leite de vacas holandesas em lactação.
Cinco vacas holandesas multíparas
fistuladas no rúmen (média de 526 kg de peso vivo - PV e 85 dias de
lactação) foram utilizadas em delineamento quadrado latino 5 × 5.
Alimentaram-se as vacas com rações contendo 50% de concentrado e 50% de
volumoso (base seca). Os tratamentos foram determinados pela
substituição da silagem de milho por cana-de-açúcar picada (planta
inteira) conforme as proporções: 100:0 (controle), 75:25, 50:50, 25:75
e 0:100, com base na MS do volumoso. A cada tratamento adicionou-se 0%,
5%, 10%, 15% e 20% de caroço de algodão na MS da dieta,
respectivamente.
Os efeitos deletérios da adição excessiva de fontes suplementares de
gordura sobre a fermentação ruminal e a degradabilidade da fibra são
amplamente conhecidos (PALMQUIST & MATTOS, 2006). Em geral,
recomenda-se o teor máximo de 7% de extrato etéreo na MS da dieta (NRC,
2001). Portanto, o nível máximo de inclusão de caroço de algodão usado
neste experimento foi 20% da MS da dieta, sendo 5,4% o teor máximo de
extrato etéreo.
Procedeu-se ao balanceamento do concentrado de forma a tornar as rações isonitrogenadas (
Tabela 1).
Cada período experimental foi constituído de quatorze dias, sendo os
primeiros dez dias para adaptação aos tratamentos e os quatro
últimos utilizados para colheita de dados e de amostras.
As rações completas foram preparadas e fornecidas ad libitum duas vezes
ao dia, permitindo-se sobra de 5% do oferecido. Amostras do alimento
oferecido e recusado foram colhidas diariamente durante os últimos
quatro dias, sendo em seguida congeladas.
Amostras das rações experimentais e das sobras foram analisadas no
Laboratório de Bromatologia do Departamento de Zootecnia da ESALQ/USP.
Depois de descongeladas, secaram-se as amostras em estufa por 72 h a
55ºC, sendo moídas em moinho tipo Wiley com peneiras de crivos de 1 mm.
Amostras do alimento oferecido e recusado foram analisadas quanto aos
teores de MS, matéria mineral (MM), proteína bruta (PB) e extrato
etéreo (EE), segundo a AOAC (1990); fibra em detergente neutro (FDN),
segundo VAN SOEST
et al. (1991); fibra em detergente ácido (FDA) e lignina, de acordo com GOERING & VAN SOEST (1970).
Registrou-se a produção de leite duas vezes ao dia durante o período de
colheita de cada período. Colheram-se amostras de leite proporcionais à
produção de cada período (manhã e tarde) para a determinação das
concentrações de proteína e gordura. O delineamento estatístico
utilizado foi o quadrado latino 5 x 5. Analisaram-se os dados por meio
da GLM (SAS, 1991). Para a obtenção das médias, utilizou-se o
comando LSMEANS do SAS (1991). Diferenças estatísticas foram
consideradas a 5% de probabilidade pelo Teste Tukey.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os CMS (
Tabela 2)
das vacas alimentadas com as rações constituídas por 100%, 75% e 50% de
silagem de milho foram maiores (P > 0,05) do que os CMS das vacas
alimentadas com 25% e 0% de silagem de milho. PRESTON (1976) e PRESTON
(1978) também observaram queda no CMS quando a silagem de milho foi
substituída pela cana-de-açúcar. PATE (1981) observou correlações
negativas (r = −0,93) entre a porcentagem de cana-de-açúcar na dieta e
o CMS. Os dados obtidos também estão de acordo com os observados por
NOGUEIRA FILHO
et al. (1977), no qual a silagem de sorgo foi substituída pela cana-de-açúcar na alimentação de vacas em lactação.
MAGALHÃES
et al. (2004)
verificaram que, para cada 1% de inclusão de cana-de-açúcar em
substituição à silagem de milho, houve redução de 0,0266 kg no CMS (r2
= 0,98). COSTA
et al. (2005)
constataram que vacas em lactação que consumiram ração contendo 60% de
silagem de milho ingeriram 19,32 kg de MS, ao passo que vacas que
consumiram ração contendo 60% de cana-de-açúcar na MS ingeriram 15,77
kg de MS.
Segundo PRESTON (1982), a redução do CMS causada pela cana-de-açúcar é
fruto da reduzida taxa de digestão e/ou da baixa digestibilidade
ruminal de sua fração fibrosa. MAGALHÃES
et al.
(2006) verificaram que a inclusão de cana-de-açúcar em substituição
total à silagem de milho causou redução na taxa de passagem ruminal de
5,84% para 5,27%/h. Isso comprova a teoria de maior acúmulo de material
indigestível no rúmen, o que aumenta o efeito de enchimento, causando
menor CMS (ALLEN, 2000).
A produção de leite foi maior (P < 0,05) nas vacas alimentadas com a
ração contendo 50% de silagem de milho quando comparada com as rações
contendo 25% ou 0% de silagem de milho (
Tabela 2).
Concluiu-se que a inclusão de caroço de algodão, como forma de aumentar
a densidade energética da ração, não foi capaz de manter um mesmo
padrão de desempenho para os animais recebendo rações contendo 25% ou
0% de silagem de milho. As produções dos tratamentos contendo 100%, 75%
ou 50% de silagem de milho não diferiram entre si (P > 0,05).
Ao substituírem silagem de milho por cana-de-açúcar, MAGALHÃES
et al.
(2004) verificaram produções de leite de 24,17; 23,28; 22,10 e 20,36
kg/dia para vacas em lactação alimentadas com 0%, 20%, 40% e 60% de
cana-de-açúcar na MS da ração, respectivamente. Os mesmos autores
verificaram, pelo cálculo da equação de regressão, que para cada 1% de
inclusão de cana-de-açúcar na MS da ração houve queda de 0,038 kg de
leite/dia.
NAUFEL
et al. (1969), ao
compararem a cana-de-açúcar com silagens de milho, de sorgo e de capim
napier, constataram que a menor produção de leite foi obtida no
tratamento com cana-de-açúcar. Os resultados obtidos também estão de
acordo com os observados por BIONDI
et al.
(1978), que verificaram que até o teor de 50% de substituição da
silagem de milho por cana-de-açúcar não houve efeito sobre a produção
de leite.
Da mesma forma, COSTA et al. (2005) observaram queda tanto na produção
de leite quanto na produção de leite corrigida para gordura (PLCG)
quando 100% da silagem de milho foi substituída pela cana-de-açúcar
(60% de volumoso na MS da ração). Os valores de produção encontrados
foram 20,81 e 16,80 kg/dia de leite, respectivamente. No caso da PLCG
(3,5%), os valores relatados foram 21,22 e 17,76 kg/dia de leite para
os tratamentos silagem de milho e cana-de-açúcar, respectivamente. Por
sua vez, VALVASORI et al. (1995), ao compararem o uso de silagem e da
cana-de-açúcar, encontraram valores de produção de leite de 19,63
kg/dia para o tratamento silagem de milho; 18,94 kg/dia para o
tratamento silagem de milho e cana-de-açúcar (50:50) e 18,07 kg/dia
para o tratamento cana-de-açúcar.
No presente experimento, as maiores produções de leite, observadas nos
tratamentos com 100%, 75% e 50% de silagem de milho, ocorreram em razão
dos maiores CMS desses tratamentos. Observa-se, na Tabela 2, que apenas
a partir de 75% de inclusão de cana-de-açúcar no volumoso é que o CMS
passou a ser severamente afetado, diminuindo, sem dúvida, a ingestão
diária de energia.
Quanto aos componentes do leite, verificou-se na
Tabela 2
que os tratamentos contendo 50%, 25% e 0% de silagem de milho
apresentaram maior concentração (P < 0,05) de gordura quando
comparados aos tratamentos contendo 100% e 75% de silagem de milho. Tal
resultado pode ser atribuído à inclusão de caroço de algodão nas rações
com teores crescentes de cana-de-açúcar. Outra possível explicação
seria o efeito de diluição causado pela maior produção verificada nos
tratamentos contendo 100% e 75% de silagem de milho. No entanto, a
produção diária de gordura (kg/dia) acompanhou o padrão verificado para
produção de leite. O teor de proteína do leite foi semelhante (P >
0,05) entre os tratamentos. Entretanto, a produção diária de proteína
(kg/dia) foi menor para os tratamentos contendo 25% ou 0% de silagem de
milho. Este fato pode ser explicado pelas alterações na fermentação
ruminal, conforme constatado por PIRES et al. (2008). Esses autores
avaliaram os efeitos da substituição de silagem de milho por
cana-de-açúcar e caroço de algodão sobre os parâmetros ruminais e
síntese microbiana de vacas em lactação, sendo observada redução no
fluxo intestinal de matéria orgânica de origem bacteriana e de proteína
bruta dietética nos animais alimentados com as rações contendo os
maiores teores de inclusão de cana-de-açúcar (75% e 100%). De
acordo com os autores, a redução no fluxo de proteína para o intestino
pode limitar a disponibilidade de aminoácidos no trato digestivo
posterior e reduzir a produção de leite. Adicionalmente, pode-se
inferir que a produção de proteína no leite também pode ter sido
prejudicada pela limitação de aminoácidos no intestino.
MAGALHÃES et al. (2004), ao compararem silagem de milho com
cana-de-açúcar, não constataram alteração (P > 0,05) nos teores de
gordura, proteína, extrato seco total e extrato seco desengordurado do
leite quando vacas em lactação foram alimentadas com 0%, 20%, 40% e 60%
de cana-de-açúcar na MS da ração. Os valores médios encontrados por
esses autores foram 4,06% de gordura; 3,56% de proteína; 13,38% de
extrato seco total e 9,31% de extrato seco desengordurado. Contudo, a
produção diária de todos os componentes foi menor (P < 0,01) de
acordo com a inclusão de cana-de-açúcar, graças à queda na produção de
leite. Da mesma forma, MENDONÇA et al. (2004) também não constataram
alteração (P > 0,05) nos teores de gordura, proteína, extrato seco
total e extrato seco desengordurado do leite de vacas alimentadas com
60% de silagem de milho ou 60% de cana-de-açúcar na MS da ração. Os
valores encontrados por esses autores foram 3,8% de gordura; 3,2% de
proteína; 12,9% de extrato seco total e 9,1% de extrato seco
desengordurado. De forma semelhante, COSTA et al. (2005) também não
observaram diferenças nos constituintes do leite ao compararem uma
ração com 60% de silagem de milho na MS e com outra contendo 60% de
cana-de-açúcar na MS.
Dessa forma, as diferenças encontradas nesse experimento para os teores
dos constituintes do leite são mais bem explicadas pelo efeito da
inclusão do caroço de algodão. Esse alimento possui 50,3% de FDN e
19,3% de extrato etéreo (NRC, 2001) e sua inclusão na dieta aumenta o
aporte de gordura oriunda da ração para a glândula mamária, bem como o
tempo de ruminação e de mastigação, em razão do seu línter ser ótima
fonte de fibra efetiva (GRANT, 1997; MERTENS, 1997). Por fim, o maior
valor de PLCG:CMS (P < 0,05) do tratamento contendo 25% de silagem
de milho em comparação ao contendo 100% de silagem de milho pode ser
atribuído à menor produção de calor de animais recebendo caroço de
algodão, fato explicado pela elevada concentração de gordura nesse
alimento (COPPOCK et al., 1987; ARIELI, 1998).
CONCLUSÕES
O consumo de matéria seca e a produção de leite mantiveram-se adequados
até 50% de substituição de silagem de milho por cana-de-açúcar. A
inclusão de caroço de algodão não foi capaz de manter o desempenho dos
animais alimentados com as rações contendo substituições de 75% e 100%
de silagem de milho por cana-de-açúcar. O teor de gordura do leite
aumentou de acordo com a inclusão de cana-de-açúcar e o teor de
proteína do leite não foi afetado. Em termos produtivos, é viável a
substituição de 50% de silagem de milho por uma mistura de
cana-de-açúcar mais caroço de algodão.
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Protocolado
em: 22 out. 2008. Aceito em: 10 fev.
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