ATIVIDADE DA
LACTATO DESIDROGENASE (LDH) SÉRICA
Felipp
Silveira
Ferreira1, Lara Lages Silveira2, Alessandra
Castello
Costa2, Daniela Fantini Vale2, Claudio Baptista
Carvalho3,
Josias Alves Machado4, André Lacerda de Abreu Oliveira3
1Doutorando em Ciência Animal pela Universidade Estadual do Norte Fluminense, Campos dos Goytacazes – felipp@gigalink.com.br
2Pós-graduandos da
Universidade Estadual do Norte Fluminense
3Professor Doutor da
Universidade Estadual do Norte Fluminense
4Biólogo da Prefeitura Municipal de Carapebus
RESUMO
A
oxigenação extracorpórea por membrana (ECMO) é uma técnica de suporte
cardiopulmonar prolongado, que objetiva auxiliar os pulmões e/ou o
coração
quando estes não respondem aos tratamentos convencionais. Este estudo
avaliou a
atividade da lactato desidrogenase (LDH) sérica de cinco cães sem raça
definida
(SRD) submetidos à ECMO por um período de três horas. Sob pressão expiratória positiva final (PEEP) de
10mmHg, ventilação controlada e FiO2 de 21%, a ECMO foi
realizada
por canulação femoral (artéria e veia), em um desvio artério-venoso
(AV). A
atividade da LDH foi mensurada a cada trinta minutos, por três horas e
os
resultados analisados estatisticamente com os testes de ANOVA e Tukey,
com
=5%. O resultado apontou um aumento sérico na atividade da LDH,
caracterizando
uma lesão muscular ao longo do procedimento, em virtude de uma resposta
fisiológica semelhante àquela causada por um choque hipovolêmico.
Conclui-se
que a ECMO é uma técnica viável de suporte, mas necessita de adaptações
para
uso clínico em cães.
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SERUM
LACTATE DEHYDROGENASE (LDH) ACTIVITY IN DOGS
SUBMITTED TO EXTRACORPOREAL MEMBRANE OXYGENATION (ECMO) FOR THREE HOURS
ABSTRACT
The extracorporeal membrane
oxygenation
(ECMO) is a prolonged cardiopulmonary support technique, which aims to
help the
lungs and the heart when they do not respond to conventional
non-invasive
treatments. This research was carried out to determine the behavior of
lactate
dehydrogenase (LDH) of five mongrel dogs undergoing ECMO for three
hours. Under
controlled ventilation, positive end-expiratory pressure (PEEP) at
10mmHg and
FiO2 at 21%, the animals were submitted to femoral
cannulation for
ECMO (artery and vein), by the arterial-venous (AV) deviation. The LDH
was
measured and evaluated every thirty minutes for an uninterrupted period
of
three hours. The results were tabulated and statistically analyzed with
ANOVA
and Tukey tests, with p<0.05. The results showed an increase of
serum LDH,
featuring a muscle injury during the procedure due to a physiological
response,
similar to that caused by a hypovolemic shock. We concluded that ECMO
is a
viable technique for prolonged ventilatory support, but it needs some
adjustments for clinical use in dogs.
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A oxigenação extracorpórea por membrana (ECMO) é uma técnica de suporte cardiopulmonar prolongado, com o objetivo de auxiliar o pulmão e/ou o coração, na maioria das vezes de neonatos e crianças, quando estes apresentam processos de falência não responsiva aos tratamentos convencionais não-invasivos (BARTLETT et al., 1974, WEBER et al., 1990, MOSCARDINI et al., 2002, PEEK et al., 2006, TAMESUE et al., 2006, KAHN et al., 2007). Entretanto, essa técnica deve ser realizada apenas nos casos em que a insuficiência respiratória for causada por uma enfermidade potencialmente reversível (SOUZA & ELIAS, 2006a).
Em humanos, é recomendada para pacientes com a respiração
prejudicada de forma aguda e para o tratamento de pacientes com disfunção
miocárdica severa e reversiva, como cardiomiopatias ou choque cardiogênico
pós-operatório (LIN et al., 2006; PEEK et al., 2006). Em recém-nascidos, a
técnica é empregada em vários casos, tais como na Síndrome da Aspiração do
Mecônio, hérnias diafragmáticas congênitas, hipertensão pulmonar persistente do
recém-nascido e pneumonias e sepses (VORST et al., 2006). A ECMO também deve
ser considerada em casos refratários à terapêutica farmacológica para a
Hipertensão Pulmonar (HP) em crianças. No entanto, o índice de sucesso desta
modalidade terapêutica em pós-operatório de cirurgia cardíaca com HP é menor do
que na HP primária do recém-nascido (HOROWITZ,
2002).
Em adultos, possíveis indicações da ECMO são doenças respiratórias agudas, como a síndrome da angústia respiratória, hipóxicas ou hipercárbicas, insuficiência cardíaca direita aguda e insuficiência cardíaca global aguda, porém sempre nos casos em que a reversibilidade for esperada. A ECMO também é utilizada em casos de transplantes de pulmões e/ou coração (KAHN et al., 2007). Neste caso, segundo HOROWITZ (2002), com bastante utilidade quando o suporte inotrópico não funciona no pós-cirúrgico; assim, a ECMO tem sido utilizada nessas situações com o objetivo de manter a perfusão tecidual, minimizar os gastos energéticos, maximizar a recuperação miocárdica e como ponte para transplante. Ainda de acordo com HOROWITZ (2002), o índice de sucesso varia conforme a instituição, mas é consenso que melhora a sobrevida em crianças com síndrome de baixo débito cardíaco e hipertensão pulmonar severa.
No Brasil,
Para a realização desse procedimento, existem três tipos de desvio cardiopulmonar. Dentre eles, o desvio artério-venoso é o menos utilizado nos procedimentos de assistência ventilatória. Ele ocorre através da retirada do sangue pela artéria femoral, retornando através da veia jugular interna, após a hematose. Seu uso é considerado para prematuros, como uma alternativa quando os demais tipos não são aplicáveis. É importante que haja um correto balanço dos fluxos; o mesmo volume de sangue removido deve retornar ao paciente, de modo que a hemodinâmica do paciente mantenha-se estável (SOUZA & ELIAS, 2006a).
A ECMO é um procedimento não fisiológico. Em todos os pacientes submetidos à circulação extracorpórea, principalmente os pacientes pediátricos, os efeitos da hipotermia, da distribuição irregular do fluxo sanguíneo aos tecidos, da hemodiluição, dos desvios do equilíbrio ácido-base, das microembolias e da resposta inflamatória sistêmica do organismo continuam representando um desafio de grandes proporções (SOUZA & ELIAS, 2006b).
Segundo
BARTLETT et al. (1974), a aplicação clínica da ECMO é aparentemente viável,
porém é cada vez mais importante estabelecer as respostas orgânicas frente ao
procedimento. De acordo com o autor, corroborado por SOUSA & ELIAS (2006a),
a hipotensão causada pelo procedimento pode causar a redução do fluxo sanguíneo
para as extremidades, o que resultaria em uma lesão tecidual.
Assim, como descrito por DUNCAN & PRASSE (1986), MEYER et al. (1995) e KANEKO et al. (1997), a aferição da LDH é uma das formas de avaliação da função muscular em medicina veterinária, podendo revelar possíveis lesões teciduais e inflamatórias, embora não se configure como um marcador de alta especificidade, embora apresente relativa significância.
Por esse motivo, realizou-se esta pesquisa com a finalidade de avaliar a atividade da enzima Lactato Desidrogenase sérica (LDH) em modelos caninos de cães submetidos à ECMO, com o intuito de estabelecer seus parâmetros e tornar o procedimento mais seguro, reduzindo a incidência das relativas complicações.
Este trabalho foi realizado no centro cirúrgico
do Hospital Veterinário da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy
Ribeiro (UENF).
Para a presente pesquisa, foram utilizados cinco
cães SRD, sem restrição de sexo e idade, com peso corporal entre 10 e 15
quilos. Todos os animais foram cedidos pelo Centro de Controle de Zoonoses de
Campos dos Goytacazes, RJ. Para a padronização dos animais, eles foram
identificados como A1 (animal 1), A2 (animal 2), A3 (animal 3), A4 (animal 4) e
A5 (animal 5). Os animais foram admitidos no Hospital Veterinário da UENF, onde
foram realizados exames clínicos e laboratoriais (hemograma e bioquímica
sérica), a fim de detectar quaisquer alterações orgânicas. Os animais enfermos
foram descartados do experimento.
Posteriormente, foram alocados em gaiolas
apropriadas, recebendo alimentação especializada, água ad libitum, limpeza e banhos de sol, objetivando seu
bem-estar.
Os animais
utilizados foram anestesiados a partir do seguinte protocolo: 0,1mg.kg-1
de Acepromazina[1] por via intravenosa (IV),
seguido de 2 mg.kg-1 de Cetamina[2]
IV, posteriormente 7 mg.kg-1 de Lidocaína[3]
por via epidural. A manutenção
anestésica foi feita com Isoflurano[4]
2,5%. A anticoagulação foi realizada com Heparina[5],
na dose única de 4mg.kg-1 IV.
Depois de
anestesiados e intubados, os animais foram colocados em decúbito dorsal e
submetidos à ECMO pela utilização da
técnica de desvio artério-venoso, com a retirada do sangue pela artéria femoral
e a reinfusão pela veia femoral. O sangue seguiu o seguinte trajeto: artéria
femoral, tubo conector, oxigenador de membranas e, após a remoção do CO2
e o recebimento de O2, o sangue fluiu de volta para o organismo
através de outro tubo conector, chegando à veia femoral. Os animais
permaneceram sob ECMO durante 180 minutos, com o Oxigenador de Membranas[6].
Para a manutenção
sob ECMO, os animais receberam um suporte ventilatório mínimo, com
pressão expiratória positiva final (PEEP) de
Os animais receberam, ainda, Dopamina[7],
na dose de 5µg/kg/minuto,
em infusão contínua, como suporte pressórico e
inotrópico.
As amostras de sangue
venoso foram coletadas por seringas de 3mL conectadas a um cateter longo
localizado na veia jugular, o qual foi guiado em direção ao átrio direito. O
sangue coletado foi repassado em frascos siliconizados sem anticoagulante. O
intervalo entre as coletas foi estipulado em 30 minutos, durante três horas,
totalizando sete amostras por animal durante a ECMO. Também foi realizada a
coleta de uma amostra de sangue do animal antes da ECMO, para controle,
totalizando oito tempos de coleta durante o período total de experimentação.
As amostras sanguíneas foram centrifugadas (1500g por 5
minutos), em tempo não superior a uma hora, e o produto sobrenadante foi
transformado em aliquota após a coleta em volume mínimo de 500mL.
Tais amostras foram acondicionadas em microtubos tipo “Eppendorf” e mantidas
sob refrigeração em “freezer”, à temperatura de -20ºC, para posterior
realização de análises bioquímicas da LDH, em equipamento espectrofotométrico[8] e
kits comerciais específicos[9].
Após o estudo, os animais foram submetidos à
eutanásia com administração de tiopental sódico[10],
na dose de 40mg.kg-1 IV, e cloreto de potássio[11],
na dose de 100mg.kg-1 IV, respeitando-se os princípios éticos
do uso de animais de experimentação.
O
presente trabalho foi licenciado pelo Comitê de Ética para Uso de Animais da
Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, sob o registro
CEUA-UENF 038/2008.
Os resultados
foram anotados em fichas individuais (oito para cada animal) e as diferenças
entre os momentos foram analisadas com programa estatístico GraphPad Prism
versão 4.03 for Windows (GraphPad Software), através dos testes One-way ANOVA
(Friedman e Kruskal-Wallis), com pós teste de comparações múltiplas de Tukey,
com p<0,05.
Os dados da análise estatística, por ANOVA (p<0,05), apesentaram uma não significância entre os
momentos analisados. Entretanto, é relevante destacar a seguinte situação: no
momento 0 (M0), o gráfico (Figura 1) apresenta um destaque para o ponto
referente ao Animal 1 (A1) do grupo, o qual apresentou um comportamento que
difere do restante do grupo, com alta atividade enzimática, contrapondo os
valores mais baixos observados nos demais animais. Em uma análise inicial,
descarta-se a possibilidade de uma alteração induzida pela ECMO, uma vez que o
animal apenas esteve sob ECMO a partir do momento 1 (M1). Enquanto os demais
animais apresentavam valores próximos de 200U/L, este animal em destaque
apresentava um valor superior a 600U/L por motivos não elucidados. Cabe
relatar, ainda, que este animal não manteve esse nível elevado nos momentos
posteriores, excluindo-se a possibilidade de que ele possa ter apresentado
níveis séricos de LDH que possam ter comprometido os momentos posteriores de
avaliação.
Outro fato interessante a ser destacado é que mesmo não apresentando diferenças estatisticamente significativas entre si, todos os valores médios da LDH a partir de M3, ou seja, 1 hora de ECMO, encontravam-se além dos valores de referência para cães (63,0-270,0 U/L, segundo KANEKO et al. (1997)). Esse fato é semelhante ao descrito inicialmente por BARTLETT et al. (1974), em seu ensaio de oxigenação extracorpórea com ovelhas. Destaca-se o fato que também em M0 os valores estão acima do referencial para a espécie; contudo, isso se deve ao comportamento aberrante do A1, o qual, neste caso, foi o responsável direto pela elevação da média neste momento. A título de informação, excluindo-se o valor do animal (A1) no momento (M0), a nova média seria em torno de 152,5 U/L, dentro dos parâmetros de normalidade para cães.
Com base no descrito por DUNCAN & PRASSE (1986) e MEYER et al. (1995) sobre a LDH ser uma enzima localizada em diversos tecidos, sobretudo musculares, somado aos achados experimentais de BARTLETT et al. (1974) sobre a LDH e aos eventos de hipoperfusão periférica desencadeados pela ECMO descritos por SOUSA & ELIAS (2006a), pode-se concluir que a ECMO causou uma lesão muscular considerável a partir de uma hora de procedimento. Esse resultado é semelhante ao descrito por MARTINS et al. (2002), que, por sua vez, atribuíram a variação da LDH, durante seu experimento de circulação extracorpórea em bezerros, não somente ao estresse causado pelo procedimento, mas também à hemólise.
A descrição dos valores médios da LDH por tempo de ECMO é mostrada no Quadro 1.
Esses achados corroboram as informações de GUYTON & HALL
(2006) e SOUSA & ELIAS (2006a). De acordo com os autores, em resposta à
circulação extracorpórea, ou à hipotensão, o organismo tende à ativação de
barorreceptores, que, por sua vez, desencadeiam uma série de reações visando o
restabelecimento da pressão arterial. Dentre esses mecanismos, a ativação do
sistema nervoso simpático resulta em um aumento da resistência vascular
periférica. Isso torna a velocidade do fluxo sanguíneo para algumas regiões
reduzida, o que resulta em déficit no aporte de oxigênio e nutrientes
necessários à manutenção das funções fisiológicas do tecido. Paralelamente a
tal fato, ocorre uma acessória redistribuição do fluxo de sangue para os órgãos
mais nobres. Em detrimento disso, outros órgãos, como rins, fígado e as massas
musculares recebem fluxos de sangue insuficientes para as suas necessidades. Em
função dessa condição, produz-se um quadro propício ao dano muscular, caracterizado
pelos aumentos séricos da LDH no presente trabalho.
Acredita-se que, frente aos resultados
apresentados, a ECMO constitua um elemento importante e viável para o suporte
respiratório prolongado; entretanto, necessita de algum aperfeiçoamento ou adaptação
para utilização na prática clínica em medicina veterinária.
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[1] Acepran®, Univet S/A, Rua Clímaco Barbosa 700, Cambuci,
São Paulo-SP.
[2] Ketamina®, Agener União Química Farmacêutica Nacional, Rua Cel. Luiz Tenório de Brito 90, Embu-Guaçu, São Paulo-SP.
[3] Lidovet®, Laboratório Bravet LTDA, Rua Visconde de
Santa Cruz 276, Engenho Novo, Rio de Janeiro-RJ.
[4] Isoforine®, Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda, Rod. Itapira-Lindóia Km 14, Itapira-SP.
[5] Heparin®, Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda, Rod. Itapira-Lindóia Km 14, Itapira-SP.
[6] Kids D100®, Sorin Group Italia, Via Statale 12 Nord 86, Mirandola, Modena, Itália.
[7] Cloridrato de Dopamina®, Laboratório Teuto Brasileiro S/A, VP 7-D módulo 11 - Quadra 13, Anápolis-GO.
[8] Labmax Plenno®, Labtest Diagnóstica, Av. Paulo Ferreira da Costa 600, Lagoa Santa-MG.
[9] LDH Liquiform Ref. 86®, Labtest Diagnóstica, Av. Paulo Ferreira da Costa 600, Lagoa Santa-MG.
[10] Thiopentax®, Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda, Rod. Itapira-Lindóia Km 14, Itapira-SP.
[11] Cloreto de Potássio®, Equiplex Indústria Farmacêutica,
Rua Thubérgia Qd. K Nº 233, Aparecida de Goiânia-GO.