VOICE AND CORPORALITY ACCORDING TO CHOIR SINGERS’ PERCEPTION
Adriana Braga - UnB
braga.adriana@gmail.com
Patrícia Pederiva - UnB
pat.pederiva@uol.com.br
Resumo: Este artigo traz como tema a voz e a corporeidade de acordo com a percepção de coristas. Aborda discussões e resultados de uma pesquisa realizada com seis cantores participantes do Coro Lírico do Teatro Nacional Cláudio Santoro (Brasília-DF) e apresenta algumas sugestões dos coristas participantes para melhorias na relação ‘corpo-voz’. Palavras-chave: Voz: Corporeidade: Coristas, Percepção musical.
Abstract: This article addresses the voice and corporality according to choir singers’ perception. It approaches discussions and results of a research accomplished with six participant singers of the Coro Lírico do Teatro Nacional Cláudio Santoro (Brasilia-DF) and presents some suggestions for improvements on the `body-voice’ connection provided by the choir singers participants. Keywords: Voice: Corporality: Choir singers: Music perception.
O presente artigo é parte da pesquisa de especialização “A relação corpo-voz: percepção de coristas” desenvolvida recentemente em Brasília-ᆳdo-se pela entrevista de grupo focal como instrumento de coleta de dados. Foram entrevistados seis participantes – três homens e três mulheres – do Coro Lírico do Teatro Nacional Cláudio Santoro – Brasília-DF, em razão de serem todos cantores líricos e compartilharem do mesmo tipo de técnica ᆳvenciam a corporeidade, sobretudo durante o ato de cantar; objetivou-se ᆳᆳcepção dos participantes.
ᆳᆳdade, e apresenta os resultados e conclusões obtidos a partir da investigação.
ᆳce durante a passagem do ar pelas pregas vocais. Mente, físico e emoção se tornam unidade no momento da busca de um som vocal de boa qualidade, ansiando conforto, técnica correta e a melhor interpretação para o canto, tornando-se uma vivência da corporeidade, assim definida. Com o intuito de chegar ao “som vocal perfeito”, muitos cantores tendem a se preocupar excessivamente com a técnica vocal. Isto se torna um problema quando o ᆳᆳciado do intelecto, das dimensões cognitivas e das emoções a fim de haver harmonia integral do ser e melhora no resultado vocal.
ᆳᆳtigações. Tratando a respeito da formação do professor de instrumento, Pederiva (2005) alega não haver disciplinas pedagógicas nos cursos de bacharelado e argumenta não ser suficiente saber tocar um instrumento musical para poder ensinar. De acordo com a autora, “o sucesso do ensino não provém automaticamente do sucesso na execução musical” (p. 117). O mesmo se aplica ao processo ensino-aprendizagem do canto, área em que os professores necessitam ter um conhecimento mais aprofundado das práticas de conscientização corporal e da vivência da corporeidade.
ᆳde, onde músculos, tendões, ossos, órgãos, articulações, sistemas e todo
Assim, para que o indivíduo chegue ao equilíbrio na unidade ᆳlho voltado à consciência corporal e estabelecerem-se os parâmetros da corporeidade, isto é, da vivência e das experiências do corpo. Esta idéia é compartilhada por Quinteiro (2000), quando argumenta que cuidar bem do físico significa também cuidar da voz, sendo imprescindível que eles estejam bem ajustados e perfeitamente equilibrados. Nesta mesma linha de pensamento, Coelho (1999) alega que
A voz é o resultado sonoro de um instrumento que exige cuidados. Antes ᆳmentação, o repouso equilibrado, os bons hábitos, a ausência de vícios e a disciplina são fatores indispensáveis para quem deseja ter boa voz. Também a saúde e o equilíbrio psicológico são fundamentais. (p. 11)
ᆳsão da voz cantada só pode ser aprimorada quando há equilíbrio do ser como um todo, pensamento respaldado por Behlau e Rehder (1997) quando explicam que dentre “as regras de ouro da boa voz de um cantor” está o fato de que não se deve cantar, a não ser em boas condições de saúde, pois, o ato ᆳcentam que ter boa saúde facilita a emissão vocal falada ou cantada e que poucas são as pessoas doentes que conseguem manter uma boa emissão.
É interessante o argumento de Rondina (2005) de que grande parte dos indivíduos que se submetem à terapia vocal fica surpresa ao perceber as relações que existem entre o corpo e a voz, pois, de forma geral, várias pessoas ainda têm uma visão fragmentada de corpo. A autora observa que
ᆳvo exercitar a voz. Exemplos destas práticas são: respiração, ressonância, articulação, emissão. Esta opinião tem consonância com a de Quinteiro, (1989) que argumenta:
A produção sonora do ser humano está ligada organicamente como um todo; desde a postura corporal ao funcionamento íntimo de órgãos e sistemas biológicos, ao desempenho do padrão de pensamento de cada um, ao tipo de cultura que envolve o indivíduo, bem como o seu ᆳto da sua saúde em geral, sendo indicativas de problemas orgânicos, psicológicos e funcionais. (p. 37, 39)
Outra questão relevante é abordada por Rondina (2005) quando ᆳᆳlar; que grande parte das pessoas que apresentam disfonias tem um corpo ᆳsultado na qualidade da fonação, é preciso que o indivíduo se reorganize ᆳtrem um caminho corporal aberto para fluir, o movimento do corpo deve se dar sem empecilhos (QUINTEIRO, 2000).
ᆳtura corporal causam interferências na produção vocal e na estabilidade de sua qualidade. As autoras argumentam que a posição do corpo durante a emissão da voz cantada varia pouco e que o indivíduo procura manter o ᆳᆳra corporal durante a emissão vocal do que o cantor de música popular.
Uma argumentação importante é feita por Coelho (1999) quando alega ser necessário que desde o princípio o processo ensino-aprendizagem ᆳdos. Segundo a autora, nem todos os exercícios são apropriados para todas ᆳtar seus próprios limites, procurando associar paciência e disciplina.
ᆳrações no tônus muscular (no sentido das tensões) interferem de maneira negativa na produção sonora humana. “Um organismo tenso, amarrado por tensões musculares, apresentará grandes dificuldades para emitir o seu som” (p. 110). Assim sendo, a autora alega que uma pessoa em estado de tensão tem mais possibilidades de adquirir problemas vocais e que as tensões musculares também podem provocar dificuldades de respiração, articulação, além de outras envolvidas na emissão vocal.
Ressalta-se, portanto, a necessidade de se trabalhar a voz sempre ᆳᆳᆳdo, a voz mal consegue sair” (QUINTEIRO, 2000, p. 39).
Durante a entrevista feita para esta pesquisa, três participantes mencionaram a postura como fator de grande relevância na qualidade de emissão da voz cantada. As falas referentes a este aspecto apontam para a necessidade de se observar o corpo, de posicioná-lo corretamente, a fim de conseguir-se um resultado vocal qualitativamente melhor.
ᆳᆳtar não sentir a firmeza dos pés – o que lhe dá a sensação de equilíbrio – ele perde a direção da voz, prejudicando, de forma acentuada, a sua emissão:
(...) se os meus pés não tiverem firmes eu não consigo. Parece que eu perco toda a direção da voz (...) eu acho que é equilíbrio, aí eu não sinto que a minha voz sai legal, não (...) tenho que sentir bem os meus ᆳção de apoio, eu acho que o resto desmorona tudo em mim. (Jader)
ᆳᆳda, ou seja, não se utilizando de toda a área plantar, faz com que o corpo tente compensar os desvios de postura desencadeados por esta atitude. De acordo com a autora, isto poderá acarretar diversas deformações na linha do eixo corporal e também desenvolver variadas tensões musculares, o que favorece o aparecimento de dores nas costas, nas pernas e de desvios de vértebras.
Certamente a postura poderá influenciar no conforto físico, e, consequentemente, no resultado vocal do indivíduo, uma vez que desvios posturais possibilitam distúrbios da voz, como fendas glóticas, nódulos, entre outros. Nota-se, porém, que a atitude de observar a postura é mais comum entre os cantores líricos do que entre os que se dedicam à música popular. Outro aspecto levantado pelos entrevistados foi a importância do relaxamento para a performance artística do cantor. Para dois dos coristas,
ᆳᆳformance, o corpo todo é usado, e não somente a voz; o outro relaciona o relaxamento a uma melhor impostação vocal:
ᆳtações, a concentração. A concentração é ligada ao relaxamento (...) Como no espetáculo a gente vai usar totalmente o corpo, não só a voz, mas todo o corpo, o corpo, então, precisa ta preparado. (Heitor) (...) às vezes você não ta com a voz colocada, aí você não sabe por que que não ta relaxada, de repente ce pensa em relaxar, aí parece que o negócio vai pro lugar. (Andressa)
Quinteiro (1989) dá suporte a estas afirmações quando alega que relaxar é uma atitude consciente, um trabalho de reconhecimento e observação do corpo todo, especialmente dos pontos de tensão. Complementando, a autora também observa que um indivíduo com tensões musculares poderá ter dificuldades articulatórias, respiratórias, além de outras envolvidas na produção vocal, o que, possivelmente, acarretará em problemas na voz e na fala.
Considerando-se, então, que um organismo necessita estar livre de tensões desnecessárias para poder emitir um som vocal de boa qualidade,
o relaxamento torna-se um fator que interfere diretamente na relação “corpo-voz”. Não existe “tensão zero” durante a emissão vocal, uma vez que, nestas condições, o corpo se encontra em movimento. Portanto, torna-se imprescindível buscar apenas as tensões necessárias para produção da voz, pois o excesso de tensões pode prejudicar o indivíduo como um todo.
O último aspecto a ser detalhado emergiu da fala de um dos participantes. Aqui, ele alega que o indivíduo deve ser visto como um todo; que deve ser considerado em relação ao meio ao qual ele se encontra e que, por este motivo, pode receber influências diretas deste meio. O entrevistado ainda argumenta ser necessária grande concentração por parte do cantor para que ele não seja influenciado por determinada situação:
Eu acredito que é o todo, que você é o todo, você não é só uma parte (...) eu to falando da pessoa, a pessoa é um todo. Você é o conjunto daquilo que você é e do que ta acontecendo à sua volta. Você tem que se concentrar ao máximo pra não deixar aquilo influenciar. Agora, pode ter influências na hora? Pode. (Andressa)
De fato, a produção sonora de um indivíduo está ligada organicamente de forma integral: da postura corporal ao íntimo funcionamento dos órgãos e sistemas biológicos; ao tipo de cultura que envolve a pessoa, ao desempenho do padrão de pensamento de cada um, além de seu potencial econômico (QUINTEIRO, 1989). Este pensamento pode ser complementado pelo de Vygotsky (2003) quando ele alega que a personalidade de um indivíduo não pode ser vista como uma forma acabada, mas deve ser entendida como uma forma dinâmica de interação que flui de maneira permanente entre o meio e o organismo. Pederiva (2005) também contribui quando afirma que, para que o indivíduo seja encarado como uma unidade existencial, ele necessita ser compreendido como um ser corpóreo e espiritual, como uma subjetividade encarnada, estando aberto ao mundo, sem
o qual ele não tem como existir.
É fator de grande relevância na relação “corpo-voz” que o indivíduo seja visto de forma integral e que haja equilíbrio da unidade “mente-físico-emoção” durante o ato de cantar, uma vez que a qualidade vocal tende a ser aprimorada quando a voz parte de um corpo saudável e balanceado em todos os seus aspectos.
A necessidade de atividade física para melhorar a performance vocal foi uma das sugestões levantadas pelos entrevistados. Dentre as atividades mais significativas citadas por eles estão dança, expressão corporal e ginástica rítmica. As próximas duas falas demonstram a importância da dança e da ginástica rítmica para a performance do cantor. Na primeira, o participante alega que o corpo do indivíduo precisa estar preparado para o ato de cantar, e que o balé e outras danças facilitam a postura no palco. O outro corista argumenta que, para ele, a prática de ginástica rítmica favoreceu a liberdade de movimentar o corpo durante a performance artística:
(...) o músico, ele tem tanta coisa pra passar (...) O corpo dele é muito completo; (...) tem que ta pronto fisicamente pra aquelas atividades (...) se ele tem aula de balé, ele tem mais facilidade pra se centrar, o corpo, (...) não só o balé (...) a dança em geral, que você tem aquela postura. (Graziela) (...) eu (...) pratiquei (...) ginástica rítmica durante sete anos. (...) Eu não tenho dificuldade nenhuma com o corpo. Porque eu vejo pessoas, que ficam (...) com os braços e não sabe, e põe pra trás e prende aqui (...) se você já mexe com o corpo fica muito mais fácil saber o que fazer com ele na hora de cantar. Então, isso também foi importante pra mim. (Greice)
O pensamento de Behlau; Pontes (2001) respaldam os entrevistados porque alegam ser sempre recomendada uma atividade esportiva para a saúde geral do corpo e para uma produção vocal mais resistente e mais energética. Os autores também afirmam que as pessoas que possuem boa forma física e que praticam algum tipo de esporte têm mais possibilidades de manter suas vozes jovens, sem sinais de envelhecimento. Costa; Silva (1998), em consonância, explicam que, para o cantor, as atividades físicas mais recomendadas são as de baixo impacto, sem força; dentre eles, alongamento, bicicleta, caminhada e dança.
Outra sugestão levantada pelos coristas para que haja melhorias na prática vocal é a massagem. Dois participantes argumentaram que tal prática alivia as tensões musculares que aparecem antes das apresentações artísticas:
(...) uma coisa boa: a massagem antes das apresentações (...) Porque você tensiona muito. (Graziela) Uma massagem é muito bom quando o cantor está muito tenso. (Jader)
Seguramente, o equilíbrio da musculatura corporal, imprescindível para uma boa qualidade de produção da voz, pode ser auxiliado por técnicas de massagem e relaxamento (BEHLAU; PONTES, 2001). É fato que, com um corpo livre de tensões o resultado vocal do indivíduo será melhor, pois, a massagem pode, além de relaxar a musculatura, proporcionar bem-estar físico, mental e emocional ao cantor.
Os resultados obtidos nesta pesquisa revelam que cantores líricos têm uma tendência a não vivenciar seus corpos como unidade: mente-físico-emoção, ou seja, sua corporeidade. Sugerem que o emocional parece ser a parte mais negligenciada, diante da afirmação dos participantes de que o cansaço físico e o mental são de difícil controle, enquanto as dificuldades emocionais devem ser canalizadas ou dominadas para que não influenciem a performance artística. Os resultados ainda indicam que em situação de performance artística, qualquer desconforto no âmbito físico, emocional, ou um cansaço mental parece ter importância secundária.
A vivência da corporeidade não parece ser uma realidade entre cantores. Assim sendo, espera-se que esta pesquisa possa ser um alerta aos cantores solistas, aos coristas, bem como aos alunos e professores de canto, para que se possa viver plenamente o corpo neste tipo de atividade, e, da mesma forma, uma vida com mais qualidade.
BEHLAU, Mara; PONTES, Paulo. Higiene vocal: cuidando da voz. 3. ed. Rio de Janei
ro: Revinter, 2001. BEHLAU, Mara; REHDER, Maria. Higiene vocal para o canto coral. Rio de Janeiro: Revinter, 1997.
COELHO, Helena. Técnica vocal para coros. 4. ed. São Leopoldo, RS: Sinodal, 1999.
COSTA, Henrique O; SILVA, Marta A. Voz cantada – evolução, avaliação e terapia fonoaudiológica. São Paulo: Lovise, 1998. PEDERIVA, Patrícia. O corpo no processo ensino-aprendizagem de instrumentos
musicais: percepção de professores. Dissertação (Mestrado). Brasília: UCB, 2005.
QUINTEIRO, Eudosia. Estética da voz: uma voz para o ator. São Paulo: Summus, 1989. _______. Manual de terapia corporal como base da estética da voz e fala. Carapicuí
ba, SP: Pró-Fono, 2000.
RONDINA, Alessandra. Atuação fonoaudiológica na preparação vocal do ator. Campinas, SP: UNICAMP, 2005. VIGOTSKI, Liev. Psicologia pedagógica. Porto Alegre: ARTMED, 2003.
Adriana Braga – Bacharel em Música – Regência – pela Universidade de Campinas (UNICAMP). Desde o ano de 2002 atua como regente do Coro Lírico do Teatro Nacional em programas feitos junto à Orquestra do Teatro Nacional Cláudio Santoro (Brasília – DF). É especialista em Educação Musical pela Fundação Brasileira de Teatro – Faculdade de Artes Dulcina de Moraes-DF. Atualmente é mestranda no programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília - UnB.
Patrícia Pederiva – mestre em Educação pela Universidade Católica de Brasília - UCB. Apresenta trabalhos frequentemente em congressos e publica em variados periódicos nacionais e internacionais. Atualmente é doutoranda no programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília - UnB.