Revista Música Hodie, Goiânia - V.13, 362p., n.1, 2013
PACHECO, A. J. V. Canzonetta 10ª com variações a solo (1798/1799), de Policarpo José António da Silva, para vozes e piano forte.
Revista Música Hodie, Goiânia, V.13 - n.1, 2013, p. 303-315.
Edição crítica: Alberto José Vieira Pacheco (FCT/CESEM – Universidade Nova de Lisboa, Portugal)
Canzonetta 10ª with variations a solo (1798/1799), by Policarpo José António da Silva, for voices and piano forte
As variações sobre um tema são uma prática comum que abrange várias épocas e estilos musicais, sendo cultivadas por nomes como Mozart, Chopin, Brahms, só para citar alguns entre os compositores canónicos. Nada incomum era extrair estes temas de peças vocais, como é o caso das Seis variações sobre “Nel col più non mi sento” de Beethoven, ou aquelas feitas por Schubert sobre temas de alguns de seus próprios Lieder. Em Portugal, esta prática também era comum. Por exemplo, João Domingos Bomtempo compôs variações so- bre o mesmo “Nel cor più non mi sento”. Apesar de terem como fonte de inspiração o reper- tório vocal, estas composições geralmente resultam em música instrumental. No entanto, para além de seu valor musical intrínseco, estas variações representam um excelente exer- cício de ornamentação e estilo, sem falar nas demandas fundamentalmente técnicas. A prá- tica destas variações pode incrementar a habilidade improvisatória do cantor, ao oferecer um repertório de ideias e motivos a serem aplicados no repertório coevo – isto, claro, nos ca- sos em que a improvisação era algo esperado, como nos períodos Barroco e Clássico. Por ou- tro lado, os exemplos de variações para voz permanecem pouco executados pelos cantores e consequentemente pouco conhecidos pelo público em geral. A presente edição crítica da “Canzonetta 10ª com variações a solo”, escrita em 1798 ou 1799, por Policarpo José António da Silva pretende chamar a atenção para a existência deste tipo de composição, bem como contribuir na facilitação de seu acesso.
O compositor foi um renomado tenor e professor de canto português que viveu na segunda metade do século XVIII e início do século seguinte1. Compôs uma série de pe- ças vocais que podem ser vistas nos arquivos portugueses, como a Biblioteca Nacional de Portugal ou na Biblioteca do Palácio da Ajuda, em Lisboa. Assim, as fórmulas de ornamen- tação e variação melódica aqui apresentadas podem ser adaptadas ao repertório vocal luso-
-brasileiro contemporâneo, incluindo aqui as modinhas.
A composição faz uso dos seguintes versos:
Perchè, vezzosi rai, Tanto rigor, perchè? Non troverete mai,
Chi v’ami al par di me.
Na verdade, o texto é um trecho das “Strofe per Musica da cantarsi a canone” escri- tas por Pietro Mestasio (1698-1782)2 e é um exemplo de como este poeta italiano ainda era cultivado no meio luso-brasileiro de finais do século XVIII.
A composição em questão está inserida num manuscrito autógrafo intitulado Varias pessas de Muzica com Piano Forte Obrigado, para Camera. A solo, a Duo, e a Tres Vozes.
Compozição de Policarpo Jozé Antonio da Silva. No anno de 1798. Té o de 1799. Tudo escri-
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to pello mesmo àutor, guardado na Biblioteca Nacional de Portugal (cota: F.C.R. 201//1). Este manuscrito revela uma rica coleção musical, em escrita cuidada, com cerca de 200 páginas, chamando atenção a aquarela que serve como página de rosto.
As alterações editoriais foram mínimas, visto a boa qualidade da escrita original. É bom ressaltar que as poucoas indicações dinâmcias estão presentes no original. Alguns grupos de notas tiveram suas hastes ligadas em grupos maiores, por consi-
derarmos que isto facilitaria a leitura.
A ortografia dos versos teve como modelo a edição impressa da obra de Metastasio, já citada.
Na 7ª variação, compasso 16, 5ª nota, o bequadro foi inserido conforme harmonia e condução melódica.
Na 6ª variação, compasso 17ª, 7ª nota, o sustenido foi inserido conforme harmonia.
1 Nasceu e morreu em datas ignoradas. Mais informações em: VIEIRA, Ernesto. Diccionário Biographico de musi- cos portuguezes: história e bilbiographia da musica em Portugual, 2. vol. Lisboa: Typographia Mattos Moreira & Pinheiro, 1900.
2 Ver: Mestastasio, Pietro. Opere di Pietro Metastasio eseguite sulle edizioni di Parigi, 1780, e Lucca, 1782. Vol. 4.
Milano: Giovanni Silvestri, 1822, p. 264. Disponível em: http://books.google.pt/books/about/Opere_di_Pietro_ Metastasio.html?id=LRw0AQAAMAAJ&redir_esc=y.
Alberto José Vieira Pacheco - Doutor em música pela UNICAMP. Atualmente realiza seu pós-doutoramento na Universidade Nova de Lisboa, CESEM, como bolsista da FCT (Fundação para a Ciência e Tecnologia de Portugal), pesquisando “O Repertório de obras dramático-musicais ocasionais em Portugal e no Brasil”. Nesta mesma ins- tituição é um dos membros fundadores do Caravelas, Núcleo de Estudos da História da Música Luso-Brasileira. É Presidente do Conselho Fiscal da Sociedade Portuguesa de Musicologia.
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