Artigos Científicos
José Maurício Brandão (UFBA, Salvador, BA, Brasil)
jmvbrandao@gmail.com
Resumo: O presente artigo apresenta um panorama histórico da ópera produzida e consumida no Brasil. As origens, a herança portuguesa, os desenvolvimentos e realizações locais, os principais centros de realização e produção, os compositores e suas obras são os elementos investigados no universo da música dramática e da produção operística no Brasil. Metodologicamente, a abordagem é cronológica e procura balizar os elementos identificáveis na prática, literatura e tradição operística presente no Brasil, do século XVI ao Século XX. Apresenta como conclusões principais a grande inserção e influência do gênero operístico nas realidades musicais do Brasil, e indica possíveis causas para a ausência de uma tradição que pudera estruturar uma escola brasileira de ópera. Palavras-chave: Música Dramática Brasileira; Ópera Brasileira; Performance operística no Brasil.
Opera in Brazil: a historical overview
Abstract: This article presents a historical overview of the opera in Brazil. Its origins, the Portuguese inheritance, the local developments and realizations, the main production and performance centers, the composers and their output are the main elements investigated into the universe of dramatic music and operatic output in Brazil. Methodologically the approach is mapped out in chronological order and points out the elements present in practice and operatic tradition in Brazil, from the 16th century to 20th century. As main conclusions, it presents opera’s strong penetration and influence in Brazilian musical scenario, and points out possible causes for the dearth of a tradition which could structure a Brazilian operatic school. Keywords: Dramatic Brazilian Music; Brazilian Opera; Opera performance in Brazil.
Antes de qualquer colocação acerca de ópera no Brasil, é relevante situar o termo ópera no seu significado estrito e nos elementos adjacentes a este gênero:
Ópera é o termo genérico utilizado para denominar obras dramático-musicais, nas quais os atores cantam alguma porção ou todas as suas partes. É a união de música, drama e espetáculo, combinados em graus e maneiras diversas em diferentes países e períodos históricos, embora tendo a música, normalmente, o papel dominante. [...] A ópera é talvez a mais elaborada das formas artísticas, e recorre às práticas e habilidades reunidas do poeta, compositor, artista plástico, [regente], e (por vezes) coreógrafo, para criar uma ‘obra de arte completa’ (Gesamtkunstwerk, usando o termo Wagneriano). (SADIE et al, 1980, p. 544-545).
Diante desta conceituação, situamos a ópera como gênero artístico, dentro do qual estão contidos elementos musicais, cênicos e visuais. Fugiria aos propósitos da presente abordagem avaliar o maior ou menor grau de importância destes elementos na constituição da ópera e os seus ordenamentos na sua estruturação enquanto objeto de arte. Apesar de ser enfocada recorrentemente como gênero musical apenas, procuraremos aqui abordá-la como gênero artístico. Isto é condição necessária ao trabalho da regência, que munida de libreto e partitura, realizará a direção efetiva do espetáculo. Utilizando uma terminologia italiana,
o regente de ópera é Maestro Direttore e Concertattore.1
Revista Música Hodie, Goiânia - V.12, 302p., n.2, 2012 Recebido em: 14/04/2012 - Aprovado em: 18/05/2012
Encaminhado com ajustes finais em 02 de dezembro de 2012.
Originária da Itália no final do século XVI – apesar das inúmeras manifestações artísticas baseadas na combinação de música e cena, muito anteriores a este período2 – a ópera chega ao Brasil com a colonização portuguesa. A propósito da estruturação cultural portuguesa, uma considerável dose de conservadorismo sempre emulou a tendência de manutenção de estruturas e processos nas atividades musicais em Portugal. Como conseqüência isto gerava uma defasagem por atraso nas atividades musicais portuguesas que tendiam a incorporar tardiamente práticas já comuns em outros centros e regiões da Europa.
O Maneirismo perdura na Música portuguesa muito para lá de as suas últimas manifestações em Itália terem dado definitivamente lugar ao Barroco, ao longo das décadas de 1630 e 1640 [...] Não existe Ópera em Portugal no século XVII, nem existirá até às primeiras serenatas italianas cantadas na corte portuguesa na década de 1720 (NERY; CASTRO, 1991, p. 76-79).
Em verdade e certamente como fruto do exposto nos parágrafos anteriores, manifestações de teatro e música já se faziam comuns em Portugal desde o século XVI, não se tratando porém de atividades de natureza operística. A atividade operística em Portugal origina-se, por um lado da prática de realização de teatro musicado e zarzuelas3 e por outro – este muito mais importante – da penetração da opera italiana, proveniente das escolas Veneziana, Romana e Napolitana na corte portuguesa, por volta de 1730. Como nação católica, as ligações religioso-culturais com a Itália, especialmente com a cidade de Roma, eram intensas, e por isso esta cidade foi para os compositores e músicos portugueses o grande centro de formação. Assim, estando na Itália, do mesmo modo como tinham treinamento em música sacra e oratória, a prática operística era próxima, cujo reflexo pode ser assim entendido:
Todos os nossos bolseiros tiveram, como é evidente, ocasião de se familiarizarem em maior ou menor grau com uma tradição operática a que a Cidade Pontifícia não era estranha, mas quer a formação especializada que receberam quer a experiência auditiva que acumularam deverão por certo ter-se concentrado no âmbito da música sacra em stille concertato, da escrita coral maciça a 8 e mais vozes e da Oratória (NERY; CASTRO, 1991, p. 90).
Deste modo, a prática de ópera em Portugal concentrou-se nas seguintes vertentes:
o consumo das obras compostas na Itália, a produção dos compositores italianos importados para os grandes centros portugueses – dentre eles David Perez e Domenico Scarlatti – e as tentativas dos compositores locais, todas estas dentro da mais estrita tradição de ópera italiana, especificamente da escola napolitana. Com tudo isto, ao lado de outros fatores extra-musicais, naturais ou sociais,4 é possível determinar o desenvolvimento de uma intensa prática operística em Portugal, entrecortada de hiatos e baseada no largo consumo de ópera italiana. Entretanto, configurar a tradição de uma escola de ópera com raízes portuguesas é quase impossível, com as obras fundamentando-se na Aria da Cappo, com libretos estruturados tradicionalmente no estilo de Metastasio e em idioma italiano.
Portanto, em Portugal, predominava a total influencia italiana. Da primeira execução de uma obra de caráter operístico – “três intermezzi a seis vozes sob o título Il Don Chisciotte della Mancia, com música de Scarlatti, em 1728” (NERY; CASTRO, 1991, p. 91)
– até a prática comum de execução e consumo de ópera na côrte e cidades portuguesas do início do século XIX, o gosto, as técnicas e a estética eram de origem italiana. Dentre estas obras é relevante mencionar as operas buffas de um brasileiro: Antônio José da Silva, cognominado ‘o Judeu’, como afirma Azevedo (1956). Diante deste panorama, não se pode relevar a provável penetração destas atividades nas colônias portuguesas, sendo o Brasil a maior delas; certamente em menor grau e direcionado a um público restrito.
A ópera italiana decerto exerceu uma decisiva influência no teatro português do século XVIII. Existiram muitas traduções e adaptações de libretos, particularmente aqueles de Metastásio, por vezes montados como dramas falados. Performances deste tipo estão também documentadas nas províncias portuguesas, na Ilha da Madeira e na colônia do Brasil. (BRITO, 1998, p. 1074)
De qualquer modo, mesmo considerando o intenso consumo de ópera em Portugal, por motivos variados, esta nunca se estabeleceu nesta nação com o mesmo grau de importância social que alcançaria em outros centros europeus. Ao lado deste fator configuram-se as raras tentativas de criação de repertório sobre o idioma português, o que aconteceu na maioria das vezes como traduções de libretos cômicos italianos. É exatamente esta a herança que o Brasil assume no campo da ópera, e que, como não poderia deixar de ser, iria configurar a estruturação operística brasileira.
A ópera chega ao Brasil com a colonização portuguesa, sendo, segundo Azevedo (1938), o drama em música Le due Gemelle a primeira ópera brasileira, de autoria do Pe. José Maurício Nunes Garcia. Entretanto, desde a constituição dos primeiros centros de povoamento da colônia, o que remonta a meados do século XVI, tem-se inúmeras referências à realização de montagens e espetáculos unindo artes cênicas e musicais, sejam elas obras de caráter e estrutura operística ou não. Neste sentido, os autos ocupam uma posição preponderante, como se pode observar:
[...] já no ano de 1583 Fernão Cardim encontrou os missionários Jesuítas apresentando drama pastoril em certas cidades favorecidas do nordeste, mesclando música de viola, pandeiro, tamboril e frauta, danças e canto de árias nativas, esta forma artística similar aos autos e entremêses de Gil Vicente nasceu no solo brasileiro (STEVENSON, 1968, p. 8).
Sobre este fato, Appleby (1983) afirma que o auto – ou auto scacramentale – era uma das mais populares formas de instrução religiosa e entretenimento usadas pelos Jesuítas. Normalmente, os autos eram produções dramáticas com cenários, figurinos e, frequentemente, música. Segundo este mesmo autor, o primeiro auto executado na vila de Piratininga (atual São Paulo), do qual existe registro, foi o Auto da Pregação Universal em 1567, e que acredita-se ter sido escrito pelos padres Jesuítas Manoel da Nóbrega e José de Anchieta.
Por outro lado, Azevedo (1938) retifica, considerando a realização dos autos como anterior às iniciativas dos Jesuítas. Neste aspecto, apesar da inegável participação e penetração da atividade de difusão cultural efetuada pelos missionários Jesuítas no Brasil, não seria correto creditar todo o processo a sua atividade, mas sim a todos os elementos transladados ao Brasil pela colonização portuguesa.
O teatro musical, aliás, vinha sendo impulsionado pelos padres desde o século XVI; e sua origem, como a própria origem do teatro nacional, encontra-se nos autos edificantes que os Jesuítas escreviam e faziam representar nos dias festivos. O costume era lidimamente português e Serafim Leite, o grande historiador da Companhia, no Brasil, assevera, mesmo, que os Jesuítas não foram propriamente os primeiros a introduzi-lo na Colônia, pois como diz, “os Portugueses já representavam autos no Brasil, quando os Jesuítas começaram os seus” (AZEVEDO, 1956, p. 13).
Como estes exemplos, muitos autos5 foram levados a apresentação em diversos centros urbanos do Brasil colônia, e, do mesmo modo como a atividade de música para a igreja aumentava e se difundia, a música profana, em especial a música associada às representações cênicas, florescia largamente em todo território brasileiro, especialmente nos locais que em dado momento gozavam de fartura econômica. Exatamente como em Portugal, esta fartura econômica significava a abertura de um vasto mercado para o emprego de músicos
– muitos deles vindos da Europa – e consumo de música, importada dos centros europeus
ou composta no Brasil, refletindo a música que aqui chegava. Ao lado dos autos – estes verdadeiramente que poderiam ser identificados como
o simples germinar do que mais tarde viria a se desenvolver no teatro e ópera nacionais – muitas outras obras dramático-musicais tiveram larga difusão no Brasil colônia até a cristalização do consumo de ópera propriamente dita, conforme cita Stevenson:
Um dramaturgo poeta além de músico, ele [Luis Alvares Pinto] compôs uma obra em três atos Amor mal correspondido produzida publicamente em Recife em 1780, a qual muitos historiadores da literatura brasileira classificam como o primeiro drama montado publicamente no Brasil por um autor nativo. Apesar de não ter sido planejada para ser cantada (existe porém um coro figurado pela musica), a peça é similar à melhor ópera séria da época, no que concerne à trama (STEVENSON, 1968, p. 19).
Já no final do século XVII encontram-se registros de performances de óperas na Bahia e em Pernambuco; Sadie (1998) menciona que nas primeiras décadas do século XVIII temos a construção de casas de ópera, não somente em Salvador, Olinda e Recife, como também no Rio de Janeiro, em São Paulo, Belém, Porto Alegre e nas Minas Gerais. Appleby (1983) também afirma que a ópera secular no Brasil tem seu início no século dezoito. Béhague (1979) faz referencia que desta época sobrevivem registros de inúmeras montagens de ópera procedentes da Europa, como por exemplo: Alessandro nelle Indie, Artaserse e Didone abbandonata, óperas de origem espanhola de autor não referendado, levadas a público na Casa de Ópera da Praia na Bahia em 1760.
Aproximando-se o fechamento do século XVIII, o consumo de ópera no Brasil já era bastante vasto, havendo registros de muitas obras executadas, tais como: Pietà d’Amore, de Millico; L’Italiana in Londra, de Cimarosa; e Ezio, de Porpora. Azevedo (1956) afirma que eram, porém, as óperas de Antônio José da Silva, o Judeu, que constituíam o repertório habitual dos primeiros teatros brasileiros. Dentre tantas, este mesmo autor resalta: Vida do grande Dom Quixote de la Mancha e do gordo Sancho Pança (1733), Esopaida (1734), Os encantos de Medéia (1735), Anfitrião (1736), Labirinto de Creta (1736), Guerras do alecrim e manjerona (1737), As variedades de Proteu (1737) e Precipício de Faetonte (1738) (AZEVEDO, 1956, p. 1921). Sua popularidade – em Portugal e no Brasil – originou-se da simplicidade de suas obras, definidas por Mota (1930) como simples comédias declamadas tendo intercalados vários cantares melódicos de árias então conhecidas e estritamente dentro do estilo da opera buffa italiana, na qual cantos populares eram utilizados para a disposição dos versos do texto.
Neste sentido, não seria completamente errôneo elaborar conjecturas acerca da possibilidade da Modinha6 ser elemento constituinte destas obras. Sobre isto, convém notar que desde muito cedo este tipo de canção penetrou na atividade cênico-musical brasileira e portuguesa, quer como música incidental, quer como interlúdios, ou ainda em “simbiose” com a Aria da Cappo nas composições dos músicos brasileiros. Assim, dentre as tantas misturas ocorridas entre os gêneros supra citados, além dos processos da composição, vale ressaltar
o fato de que também cantores nativos da colônia do Brasil chegaram a obter fama em carreiras na corte de Portugal. Cantores, como por exemplo, Joaquina da Conceição Lapa – apelidada a “Lapinha” (AZEVEDO, 1956, p. 20) – ficaram famosos, não somente pela voz, mas também pela maneira peculiar de interpretar. Certamente, ainda que em via inversa, este também pode se configurar como elemento de formação da realidade operística do Brasil.
“Poucos são os nomes de músicos brasileiros dêsse período que a história guardou” (AZEVEDO, 1956, p. 22), ou dos quais se tenham fartos registros das obras que compuseram, assim podem ser citados: Francisco Rodrigues Penteado, Eusébio de Matos (irmão do poeta Gregório de Matos e que ingressando na ordem religiosa carmelita, assumiu o nome de Frei Eusébio da Soledade), João de Lima, João Soares da Fonseca, os religiosos Frei Antão de Santo Elias e Francisco Xavier de Santa Teresa, Francisco de Souza Gouveia, José dos Santos Barreto, Jerônimo Pinto Nogueira, dentre outros. A maioria destes autores experimentou a composição de óperas ou mesmo música vocal profana, independente de suas atividades como intérpretes, como atesta Stevenson (1968)..Um exemplo disto é o compositor baiano Damião Barbosa de Araújo (1778-1843), de quem, dentre muitas obras, há registros da composição de uma opera buffa, intitulada A Intriga Amorosa, como afirma Azevedo (1956).
De princípio, isto já seria um possível indicador da vasta penetração, consumo e influência da atividade operística no Brasil, ainda que os registros até o momento disponíveis não confirmem este fato. Entretanto, um aspecto em particular pode ser um indício bastante relevante: a existência de tantos e tão portentosos teatros em todos os grandes centros urbanos do Brasil, conforme citam Azevedo (1950 e 1956), Stevenson (1968), Behague (1979), Appleby (1983), Leeuwen e Hora (2008). No final do século XVIII e início do século XIX, cidades como Salvador, Recife, São Paulo e Rio de Janeiro7 contavam com mais de um teatro. Outra particularidade é o fato de que muitas destas salas de espetáculo eram normalmente designadas Casa de Ópera, Ópera Municipal ou simplesmente Ópera. Por conseguinte, havendo tantos espaços adequados a esta prática, intui-se que a ópera estava sendo largamente difundida.
Em 1808, quando da chegada da corte de D. João, a cidade do Rio de Janeiro apresentava pouca atividade cultural pois a vida social era pequena, ainda que já estivesse como capital da colônia desde o ano de 1763. Tem-se notícia da existência de dois teatros na cidade do Rio de Janeiro neste período, mas a instalação da côrte portuguesa no Brasil nesta cidade provocou uma mudança total no direcionamento da atividade cultural brasileira, como atesta Castello:
[...] a transição ocorre de 1808 a 1821, quando D. João VI preparou o ambiente propício à nossa independência econômica, política e cultural, favorecendo-nos de tal forma que foi considerado pelo Instituto Histórico e Geográfico o fundador da nacionalidade brasileira (CASTELLO, 1967, p. 194).
São criadas então escolas, academias, bibliotecas, museus, bancos, além da liberação às atividades de imprensa. Teatros são inaugurados e é fundada – com os músicos vindos da corte e a incorporação da Capela da Sé – a Capela Real, que teve o Pe. José Maurício Nunes Garcia (1767-1830) como primeiro Mestre de Capela. Assim, passando o Brasil de colônia ao status de reino e com todas as conseqüências da presença da corte real no Rio de Janeiro, o desenvolvimento e efervescência da vida social e das atividades culturais a partir de 1808, influenciou decisivamente o panorama operístico do Brasil, como indica Azevedo:
No tempo de José Maurício o Rio de Janeiro era, provavelmente, a cidade de mais brilhante vida musical, em todo o Continente. [...] O Teatro São João, construído à imitação do de São Carlos, em Lisboa, e inaugurado, em 1813, com as primeiras temporadas de grande ópera, que haviam de ser, por muitos anos, o luxo do velho Rio real e imperial; (AZEVEDO, 1950, p. 24).
É certo, por conseguinte, que apesar da afirmação de Azevedo acerca da obra do Pe. José Maurício, Le Due Gemelle, como sendo a primeira ópera brasileira,8 muitas outras obras de caráter operístico foram provavelmente compostas no Brasil, além do vasto consumo de obras de origem italiana no campo da ópera, tanto em montagens completas como em execuções de trechos, ou mesmo sob a forma de árias ou aberturas avulsas. Observe-se aqui a total exclusão de qualquer juízo de valor sobre a qualidade técnica, artística ou estética destas obras. Desta época particularmente, são dignas de menção as obras operísticas do lusitano Marcos Portugal: O Juramento dos Nunes, A Saloia Namorada, compostas no Brasil, além de outras compostas ainda na Europa como Demofoonte. L’oro non compra amore, Artaserse e Merope.
Partindo da premissa que óperas estavam sendo escritas por compositores no Brasil
– quer nativos, quer emigrados – convém levantar um questionamento acerca do que poderia ser denominado Ópera Brasileira. Seria esta, a ópera cujo libreto era escrito no idioma local, o português do Brasil? Ou seria aquela cuja música fundamentava-se em elementos nacionais, ou o argumento partia de bases originárias em tradições do Brasil? Seria ainda, aquela cujo tema abordasse assuntos, personagens ou histórias nativas, ou aquele em que todos estes elementos combinados de alguma forma e em alguma medida estariam presentes?
Se ao lado deste questionamento, comparamos e relacionamos a ópera produzida no Brasil com a ópera das escolas operísticas tradicionais: italiana, alemã e francesa, podemos observar que nestas, todo um misto de características e elementos combinados e ordenados num modo específico, determinam as particularidades e individualidades de cada uma delas. Desde o idioma, até a expectativa de cada público, passando pela identidade musical, com desdobramentos inclusive na postura social, intelectual, artística e emotiva do povo que a gerou, todos os seus elementos constituintes – nos níveis mais diversos – são de-terminantes na geração de uma tradição e de uma escola operística.
Questionamento semelhante ao anterior poderia ser estendido no sentido de verificar se teríamos realmente uma música brasileira. Azevedo assim afirma:“Já se pode afirmar, hoje em dia, sem receio de ênfase, que possuímos música brasileira; seria arriscado, entretanto, afiançar a existência da ópera brasileira” (AZEVEDO, 1938, p. 1). Desta forma, determinar o que vem a ser “Ópera Brasileira”, ou mais especificamente avaliar a existência e o consequente desenvolvimento de um tradição ou de uma escola operística brasileira, constitui-se ainda assunto de meticuloso exame, principalmente no sentido de avaliar as causas deste processo. Avaliemos portanto tão somente a produção operística composta no Brasil, seu desenvolvimento e suas modificações ao longo da história, a partir daquela que foi denominada “a primeira ópera brasileira”.
A produção de compositores José Maurício e Marcos Portugal situa-se, em parte, coincidentemente com a independência do Brasil da dominação colonial portuguesa e consequente transição do status político da nova nação. Esta fase revelou-se extremamente difícil para as artes no Brasil, dadas as dificuldades econômicas e a própria instabilidade sociopolítica dos primeiros tempos de Império Brasileiro. Entretanto “só a ópera é que não entrara em colapso. Rossini dominava no Imperial Teatro São Pedro de Alcântara, [...] Mathilda di Shabran, Cenerentola, L’Italiana in Algeri, La Gazza Ladra, Otelo, iam à cena, cantadas por italianos, conquistando favor crescente do público” (AZEVEDO, 1956, p. 45).
Esta avalanche de repertório operístico italiano, muito mais do que tão somente o consumo de ópera, determinou no Brasil uma “contaminação” de todas as manifestações musicais pelas tradições deste gênero. A música sacra, a modinha e a música instrumental passaram a ser profundamente invadidas por melodias e peculiaridades interpretativas da ópera, o que era largamente aceito e aplaudido pela sociedade de então. Isto pode ser constatado na recorrência de elementos rítmicos, melódicos, formais, texturais e estruturais típicos da ópera italiana, além de muitas peças compostas com temas de óperas.
Do final do século XVIII até início do século XIX sobreviveram registros da produção de um compositor italiano radicado no Brasil: Joseph Fachinetti. Este compositor chegou a Salvador pouco tempo depois da morte do baiano José Joaquim de Souza Negrão e teve a oportunidade de conhecer músicos nativos como: Domingos da Rocha Mussurunga, Damião Barbosa de Araújo, João Honorato Francisco Régis, Salvador Francisco Leite, Domingos Machado e José Rebouças. Inicialmente em Salvador ele foi contratado pelo governo da província da Bahia para atividades no “Theatro São João”9 e, mais tarde em Recife, para atividades musicais tanto no campo da ópera como da capela. Deste italiano sabe-se da composição de óperas ainda na Europa, como: Colombo na descoberta d’América, Os pescadores da Calábria, As duas rainhas, O Genio Benefico e Iginia d’Asti, além da ópera: Ignez de Castro (1847), com libreto, ao que parece, do próprio autor, e escrita no Brasil (DINIZ, 1986, p. 20 e 69).
No período composicionalmente ativo de Francisco Manuel da Silva “o centro da atividade musical no Brasil gradualmente deslocou-se da igreja e capela para o teatro [...], e
– mais uma ópera com texto em português: Marília de Itamaracá, com música de Adolfo Maersch e libreto atribuído a Luis Vicenzi de Simoni.14 Esta obra não chegou a ser encenada, tendo sobrevivido trechos dela impressos sob a forma de peças para canto e piano.
Esta conjunção de eventos, propiciou o momento oportuno à criação da Imperial Academia de Música e Ópera Nacional em 1857 que, após uma mescla de tentativas venturosas e desastrosas, veio à falência poucos anos mais tarde. A Academia gerou, entretanto, o primeiro grande operista brasileiro: Carlos Gomes, além de outros nomes importantes para o gênero, tais como: Henrique Alves de Mesquita e Elias Álvares Lobo. Esta instituição, fundada por iniciativa de D. José Amat, militar espanhol, e com o apoio da Corte Imperial Brasileira, tinha por objetivo “propagar e desenvolver o gosto pelo canto em língua pátria, através do ensino da arte dramática, da reta pronúncia, da inteligência gramatical do discurso e da expressão das idéias pela música e entoação da voz”, conforme publicidades da ocasião (AZEVEDO, 1950, p. 57).
Tendo o referido Amat como encarregado pela administração, a Imperial Academia de Música e Ópera Nacional reunia nobres da sociedade carioca como membros do seu Conselho Diretor e artistas como Francisco Manuel da Silva, Joaquim Giannini, Manuel de Araújo Porto Alegre, membros do Conselho Artístico, além de escritores como José de Alencar, Manuel Antônio de Almeida, Quintino Bocaiúva, Salvador de Mendonça e Machado de Assis atuando como libretistas, tradutores ou adaptadores dos libretos trabalhados. De fato, o intuito de tal entidade fundamentava-se na possibilidade de estruturação de uma ópera nacional no sentido estrito de oposição à ópera italiana, ainda que pela mera utilização do vernáculo em traduções de libretos originais em outras línguas.15
Dentre as obras realizadas pela Imperial Academia figuravam zarzuellas e óperas cômicas, estas sendo as primeiras atividades da entidade, além de algumas poucas grandes óperas italianas traduzidas para o português e levadas mais tarde à cena. Acerca da produção nacional desta Academia, cita Azevedo:
Em uma das cláusulas de seu programa, a Imperial Academia de Música e Ópera Nacional se obrigava a montar, cada ano, pelo menos uma ópera nova brasileira. Entretanto só em 1860, isto é, em sua quarta temporada, pôde o snr. José Amat dar cumprimento a essa cláusula. Em compensação, daí por diante, multiplicaram-se as obras nacionais inscritas em suas temporadas. De 1860 a 1863 foram cantadas nada menos de cinco óperas novas de autores brasileiros natos, além de outras duas escritas por estrangeiros domiciliados no Brasil (AZEVEDO, 1950, p. 63).
Datam deste período A noite de São João (1860) de autoria do paulista Elias Álvares Lobo16, sobre libreto de José de Alencar17 – cuja partitura foi perdida; Moema e Paraguassú (1861) composta por um maestro italiano de nome Sangiorgi, sobre libreto de Francisco Bonifácio de Abreu; Os dois amores (1861) de Rafaela Roswadowska, sobre libreto de Manuel Antônio de Almeida; A Côrte de Mônaco (1862) com música de Domingos José Ferreira e libreto de Francisco Gonçalves Braga e Colombo ou O Descobrimento da América deste mesmo compositor, sobre libreto de Joaquim Norberto de Souza e Silva. Mas os frutos mais viçosos da Academia de Ópera Nacional – que já a esta época, 1860-1861, se havia transformado na Empresa de Ópera Lírica Nacional18 – viriam a ser as primeiras obras de Antônio Carlos Gomes: A Noite do Castelo, sobre libreto de Antônio José Fernandes dos Reis, estreada a 4 de setembro de 1861, sob a regência de Francisco Manuel da Silva, e Joana de Flandres, sobre libreto de Salvador de Mendonça, estreada a 15 de setembro de 1863, momento no qual a referida instituição já vivia seu ocaso. A última produção da Ópera Nacional foi O Vagabundo (1863) de Henrique Alves de Mesquita,19 com libreto de Francisco Gumirato, traduzido ao português por Luis Vicenzi de Simoni.20
Neste ponto, mais uma vez nos deparamos com a questão do que deveria ser “Ópera Brasileira” – ou “Ópera Nacional”, utilizando a terminologia da época. Diante das propostas originais da Imperial Academia de Música e Ópera Nacional, aquilo que era denominado sob o “rótulo” de óperas nacionais era: uma mescla de óperas, zarzuellas e operas buffas, sobre temas de origens das mais diversas, tratados musicalmente à maneira da música vocal dramática corrente, tendo tão somente o texto em português como fator de unificação.
Ao lado desta efervescência nativista, prosseguia com total aprovação do público a grande quantidade de montagens de ópera italiana no Brasil, na época um dos maiores mercados de consumo deste gênero. Acerca deste panorama convém salientar que as tentativas da Academia de Ópera Nacional viriam a fracassar – dentre outros fatores – justamente devido ao fato das companhias e elencos de ópera serem compostos, na maioria das vezes, por cantores italianos e franceses, que não dominavam o idioma português, além de toda problemática deste idioma quando cantado.21
De qualquer modo, os tempos da Imperial Academia configuraram-se como “o único período da nossa história musical em que, sistematizadamente, o idioma vernáculo ocupara o lugar a que tinha incontestável direito, nos espetáculos de ópera, cuja plenitude artística deve supor uma generalizada compreensão da ficção dramática” (AZEVEDO, 1950,
p. 56). Entretanto, quer por fatores econômicos (era de todo modo mais rentável a produção de ópera italiana), quer pela ausência de uma tradição em ópera (o que se configura na ausência da especialização de compositores neste gênero e de libretistas como tal), ainda não seria neste momento que a ópera brasileira poder-se-ía estabelecer como gênero musical maduro no espectro da música nacional, mesmo com o aparecimento de Carlos Gomes.
Carlos Gomes, fruto do Conservatório de Música – como aluno de Joaquim Giannini e Francisco Manuel da Silva – e da Academia de Ópera Nacional, é o grande operista brasileiro. Em verdade, se considerarmos sobre este título, o compositor que tem a ópera como gênero principal de sua obra, e na qual se pode observar um processo de desenvolvimento e maturação dos processos composicional e criativo, Carlos Gomes pode ser identificado como o único operista brasileiro. Filho de uma família de músicos, natural da cidade de Campinas, estado de São Paulo, onde teve sua iniciação em música, mudou-se mais tarde para o Rio de Janeiro onde veio a iniciar suas atividades em ópera na Academia de Ópera Nacional, como músico, ensaiador e finalmente compositor e regente. Transferiu-se posteriormente para a Europa, fixando-se na cidade de Milão, Itália, onde produziu grande parte de sua obra, muitas delas estreadas neste continente, em cujos teatros passou desde então a ser compositor constante em muitas temporadas de ópera, como atesta Azevedo (1938). Carlos Gomes tornou-se o primeiro compositor brasileiro a obter larga repercussão no exterior, e, apenas no final de sua vida, retornou definitivamente ao Brasil, fixando residência em Belém do Pará em 1896, falecendo a 16 de setembro deste mesmo ano, nesta cidade, como cita sua filha Ítala Gomes Vaz de Carvalho (1935).
A obra de Carlos Gomes, bastante influenciada por Rossini, Bellini, Donizetti e Verdi, revela um forte senso dramático e suas melodias apresentam rico lirismo. Num senso geral, sua produção caracteriza-se pelo domínio dos padrões da ópera romântica italiana, dentro da qual, ideais nacionalistas não teriam campo fértil ao seu desenvolvimento. Por conseguinte, muitos dos elementos nacionais que utiliza nas suas óperas, constituem-se em acessórios ou circunstâncias incidentais das obras, e não motivos delas geradores. Sua produção operística compreende as seguintes óperas, além das já mencionadas A Noite do Castelo e Joana de Flandres: Se sa minga (1867) e Nella luna (1868), estas duas, revistas musicais; Il Guarany (1870); Telégrafo eléctrico (1871), esta uma opereta; Fosca (1873); Salvator Rosa (1874); Maria Tudor (1879); Lo schiavo (1889); Condor (1891); Colombo (1892), um oratório; além de duas cantatas, canções, modinhas, música sacra, obras para piano, hinos e algumas poucas peças de câmara instrumentais.
Estou convencido de que a obra de Carlos Gomes tem, em muito maior dose do que pensam aquêles que o consideram, exclusivamente, um operista italiano, sentido brasileiro. Não a forma ou as fórmulas da música brasileira, que ainda não estavam constituídas, em seu tempo; mas êsse conteúdo íntimo, essencial, imponderável, que torna tão francesa a obra de Fauré, tão alemã a de Brahms e tão russa a de Tschaikowsky. Convém não exagerar, entretanto, o brasileirismo de Carlos Gomes; em verdade êle fica bem reduzido se o compararmos à explosão verde-amarela da obra de Villa-Lobos, à fina intuição de Nepomuceno ou de Lorenzo Fernândez. Mas existe, não podemos duvidar; [...] Estou certo de que se a morte não tivesse abatido aos 60 anos a sua rija têmpera de cabôclo, e se mais serenos tivessem sido os seus últimos anos, êle poderia criar, como parece que desejou, aquilo que ainda não temos, até agora: ópera brasileira (AZEVEDO, 1950, p. 155).
Dentre outros tantos fatores, a existência de Carlos Gomes no panorama musical brasileiro marca também um reordenamento na relação dos músicos do Brasil com os centros de formação europeus. A Itália deixa de ser o centro considerado adequado para uma boa formação em música, passando este status a outras localidades, principalmente a França, na cidade de Paris. Este aspecto haveria de contribuir sobremaneira para o desenvolvimento da música brasileira, no sentido de que passaria a ser influenciada numa outra vertente. Mesmo com a popularidade que autores da ópera francesa alcançaram no Brasil, a hegemonia da ópera italiana nestas plagas sempre foi mantida. Entretanto, no que concerne à ópera produzida no Brasil, apesar de poder ser observada a presença de elementos deste novo direcionamento estético, persiste a fragilidade da estruturação da tradição de ópera brasileira, mantendo-se este gênero como componente secundário do rol de peças compostas por autores brasileiros.
Num senso geral, a relação entre ópera e romantismo musical, tão difundida em tantas culturas, não haveria de ser diferente na cultura musical brasileira. Mesmo sem configurar-se no Brasil como gênero composicional largamente difundido e em pleno desenvolvimento, a ópera constitui-se elemento de alguma importância do romantismo musical brasileiro. Isto pode significar que, quer pela necessidade de explorar a composição de repertório cênico-musical, quer pelo intuito de atingir a “brasilidade” neste gênero, a grande maioria dos compositores brasileiros experimentou a composição de óperas ou obras afins. Acerca disto vale ressaltar entretanto que, no Brasil, a ópera enquanto gênero composicional, nunca conseguiu rivalizar com a canção e a música para piano, a atenção e devotação de seus compositores.
Tendo a França e a Alemanha como novos centros de formação, permeados por influências do Alto Romantismo, do Romantismo tardio, da germinação do Impressionismo, dentre outras tendências, ao lado da convivência com obras de Lizst, Strauss, De Falla, Wagner, Debussy, dentre outros, além das escolas nacionalistas européias que estavam em franca expansão, os compositores do romantismo musical brasileiro – cada vez mais imbuídos na busca da “Música Brasileira” – procuravam incorporar elementos nacionais ao lado do que era normalmente utilizado enquanto processos técnico-composicionais. Neste sentido, a ópera no Brasil, composta por compositores brasileiros, apesar de não apresentar um desenvolvimento que lhe fosse próprio, absorvia a maturação técnica, estética e estilística da música brasileira.
Assim, a ópera brasileira viria a conhecer progressos em obras como: Artemis (1898), O Garatuja (1904, inacabada) e Abul (1913) de Alberto Nepumuceno, este, ardoroso defensor do canto em vernáculo; Os Saldunes (1901) de Leopoldo Miguez; La croce d’oro (1872), Il neo (1900) e Le fate (1902) de Henrique Oswald, todas com libreto em italiano e compostas na Itália durante sua longa permanência neste país; Jupyra (1899) composta na Europa, Pastoral (1903) em colaboração com José Pedro de Santana Gomes, Nepomuceno e Oswald sobre texto de Coelho Neto, O contratador de diamantes (1906) e Anita Garibaldi (1919) de Francisco Braga; Soeur Beatrice (c. 1910, inacabada) de Glauco Velasques; Edmea (1886), Carmosina (1888), Helena (1908) e Maria Petrowna (1929) de João Gomes de Araújo; Idália (1881) de Henrique Eulálio Gurjão; Bug-Jargal (1890) e Iara (1895) de José Cândido da Gama Malcher; além das óperas de compositores como Meneleu Campos, Silvio Deolindo Fróes, João Gomes Junior e José de Araújo Viana, e operetas e comédias musicais de variados autores como: Abdon Milanês, Assis Pacheco e Chiquinha Gonzaga, como cita Azevedo (1938).
O início do século XX revelou uma grande quantidade de eventos no sentido de obter uma música tanto mais nacional quanto possível, principalmente em oposição à música européia de consumo tão corrente no Brasil. No campo da ópera, conforme pode ser observado nas obras citadas, havia, na transição do século XIX ao século XX, uma mistura de temáticas nacionais e estrangeiras, de libretos originalmente escritos em português com outros em italiano e ainda as traduções, tudo isto amalgamado por música das mais diversas tendências, com raízes tanto mais ou menos nativistas. De qualquer modo, em 1909 foi organizado o Sindicato Lírico Fluminense no Rio de Janeiro por amantes das idéias Wagnerianas, numa tentativa de implementar produções num direcionamento distinto dos produtores de origem italiana. Esta entidade apesar de durar pouco tempo, conseguiu implementar mais uma face no panorama dramático musical brasileiro. Ainda de 1909, data a inauguração do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, que se tornaria o mais celebrado palco de ópera do Brasil. De 1910, data a fundação da Empresa do Teatro Lírico Brasileiro, outra entidade voltada ao canto em vernáculo e a difusão de obras de autores nacionais, como atesta Azevedo (1950).
Ao lado destas iniciativas, o Movimento Modernista nascente e a sua busca de um nacionalismo mais autêntico, tornara-se uma realidade. Partindo das obras de Villa-Lobos e dos trabalhos de orientação estética de Mário de Andrade, culminando com a Semana de Arte Moderna e suas conseqüências, muito haveria de ser incorporado à cultura musical brasileira, e finalmente, a ópera no Brasil começaria a esboçar um vislumbre do que deveria ser “Ópera Brasileira”, com Villa-Lobos, Lorenzo Fernandez, Mignone e Guarnieri.
Villa-Lobos compôs dez obras dramático-musicais, sendo seis óperas, uma comédia lírica, duas aventuras musicais e um bailado infernal (HORTA, 1987, p. 156). Independente de sua importância geral dentro da música brasileira, a produção operística de Villa-Lobos caracteriza-se basicamente por uma combinação de linguagens néo-romantica e proto-nacionalista, ao lado do refinamento na escrita instrumental típico de seu estilo. Izath (191214), Malazarte (1921), Magdalena (1948), A Menina das Nuvens (1952-58) e Yerma (1955-56) são suas principais obras neste campo.
Na sequência da produção de Villa-Lobos figuram obras representativas de outros grandes compositores, como Luciano Gallet, Lorenzo Fernandez, Alberto Costa, Francisco Mignone, Camargo Guarnieri, José Siqueira e Radamés Gnattali, dentre outros. É interessante observar que – apesar de não constituir um processo claramente delineado de desenvolvimento, no qual os progressos obtidos pela obra de um compositor são o ponto de partida para os seus sucessores – a ópera composta no Brasil passa a ser, em medida cada vez maior, estruturada a partir dos elementos idiomáticos da música brasileira. Naquele momento – década de 20 do século passado – mais que em qualquer outro tempo da nossa história, a música produzida no Brasil por compositores nativos pode ser definida como “Música Brasileira”, com suas técnicas, processos, temáticas, elementos constituintes, estilo e estética de raízes e frutos brasileiros. Com a ópera não haveria de ser diferente.
Finalmente é possível encontrar na produção brasileira obras dramático-musicais ricas de elementos nacionais, dosados de modo a obter uma obra deste gênero plena de “brasilidade” nas quais questões como o idioma do libreto, o tema, a linguagem musical, a inflexão de voz, texto e canto estão combinados para gerar aquilo que em muitas outras regiões do mundo é denominado ópera nacional. Ainda como fator complementar, o Congresso sobre a Língua Nacional Cantada, que ocorreu em 1937, mais uma vez viria a contribuir na ratificação do vernáculo e sua utilização na música brasileira.
São obras significativas daquele momento: Sóror Madalena (1926) de Alberto Costa; O Contratador de Diamantes (1924) e L’Inocente (1928) de Francisco Mignone; Malazarte (1941, estréia) de Lorenzo Fernandez, esta última, obra de grande importância no panorama operístico nacional, e é “uma das primeiras óperas brasileiras escritas em estilo nacionalista” (APPLEBY, 1983, p. 140).
Com a ópera de Lorenzo Fernândez estava-se, pois, definitivamente, diante de uma manifestação de arte nacionalista; a primeira que encontramos no domínio do teatro lírico brasileiro, no qual muitas vezes os argumentos, mas nunca a música, haviam pedido inspiração ao povo e às tradições do país (AZEVEDO, 1938, p. 323).
Baseado no mesmo argumento utilizado por Lorenzo Fernandez, sobre libreto de Graça Aranha, Mário de Andrade escreve outro libreto e encarrega Camargo Guarnieri, então com pouco mais de 20 anos, a compor uma ópera cômica. A obra nascente deste processo é Pedro Malazarte, composta em 1932 e estreada em 1952. Por uma coincidência de fatores o argumento do Malazarte viria a se constituir num dos mais fecundos caminhos de cristalização da ópera brasileira, conforme cita Azevedo:
Aí tudo é brasileiro, bem brasileiro; [no Malasarte de Lorenzo Fernandez] a começar pelo argumento e toda a sua simbólica, a seguir pela temática que o compositor empregou, a rítmica, a doçura expressiva de certas frases a própria linha emocional, sinuosa, arrebatada, cheia de explosões violentas, logo depois sarcástica e amole-cada, captando com subtileza, como até hoje só Villa-Lobos, Lorenzo Fernândez e Camargo Guarnieri souberam fazê-lo, todo o processo de sensibilização musical da psique brasileira. Sobre o mesmo endiabrado personagem do Malazarte traçou Mário de Andrade o libretto da ópera cômica em 1 ato que Camargo Guarnieri musicou. [...] Todos os acentos são do mais puro brasileirismo e é indubitável que essa farsa musical, cheia de episódios divertidíssimos, está destinada, de fato, a criar, em nossa música dramática, o gênero cômico, que a extrema singeleza das realizações anteriores, já citadas, de Elias Lobo, Domingos Ferreira ou Henrique Mesquita, não nos permite fazer entrar em linha de conta. [...] Com elas [o Malasarte de Lorenzo Fernandez e o Pedro Malazarte de Guarnieri] se iniciará, é certo, a ópera típica brasileira (AZEVEDO, 1938, p. 10-11).
Todos estes elementos concatenados reforçam a idéia de desenvolvimento dos ideais nacionalistas dentro e a partir do gênero ópera na música brasileira. Como também, por outro lado, torna-se evidente a fragilidade de uma tradição de ópera no Brasil justamente por não ser este gênero o centro de atenção de nossos compositores e principalmente escritores libretistas – ao menos até o presente momento.
Na segunda metade do século XX, uma razoável quantidade de obras dramático musicais foi composta, na sua grande maioria dentro dos padrões obtidos pela obra de Villa-Lobos, Lorenzo Fernandez, Mignone e Guarnieri. Deste período são importantes as seguintes óperas: Memórias de Um Sargento de Milícias (1979) de Francisco Mignone; Um Homem Só (1960) de Camargo Guarnieri; A Compadecida (1959) e Gimba (1960) de José Siqueira; Lídia de Oxum (1988) de Lindembergue Cardoso, além de obras outras como oratórios, cantatas cênicas e adaptações de folclore efetuadas por diversos compositores.
Dentro do panorama geral da música no Brasil, a ópera sempre figurou como elemento importante, tanto pela quantidade de execuções e vastidão do consumo, como pela penetração e influência por ela efetuada na atividade cultural desta nação. Entretanto, apesar de tamanha importância, este gênero, mesmo chegando a suscitar a germinação de aspectos e particularidades próprias e sempre gozando da simpatia e do gosto do público, não alcançou um patamar de desenvolvimento que pudesse implementar clara e definitivamente uma escola e, por conseguinte, uma tradição.
No que concerne ao consumo de ópera no Brasil, as obras importadas da Europa, Itália e França, e em menor grau da Alemanha sempre gozaram de vasto público e confortável prestígio. O fenômeno definido por Henry Raynor como “A Comercialização da Ópera”22 encontrou no Brasil um exemplo vivo, especificamente no que concerne ao tipo de obra que era desejável de ser representada e assistida em detrimento daquela que deveria ser gerada pela respectiva cultura. Por este motivo – dentre tantos outros – do mesmo modo como se apresenta sendo um vasto mercado consumidor de ópera, não revela entretanto facilidades à composição e estruturação de uma realidade operística puramente nacional.
Nas últimas décadas do século XX, tradicionais temporadas de ópera tem tido continuidade em muitas cidades, mantidas primariamente pelas altas classes sociais, mas ópera como gênero composicional figura num certo grau de anacronismo na maioria dos compositores brasileiros (BÉHAGUE, 1998, p. 590).
Tal situação de inexistência de uma tradição em ópera no Brasil deve-se aos seguintes fatores principais: 1) A herança portuguesa não nos propiciou facilidades na estruturação de uma tradição em ópera. Do mesmo modo como no Brasil, em Portugal, a ópera nunca teve configurada uma tradição local própria; 2) O idioma italiano, em princípio e em larga maioria, seguido do francês e do alemão impuseram-se como idiomas operísticos. É bem verdade que isto é um reflexo da implementação em regiões que detinham estes idiomas como línguas pátrias de uma tradição neste campo, mas o fato é que o português não se firmou em nenhum momento da história, como idioma para ópera.
Da conjunção destes dois primeiros fatores, três outros vem a ratificar a ausência de uma tradição operística brasileira: 1) O Brasil sempre foi um grande mercado de consumo de ópera, o que significa que muitas companhias européias aportavam nos grandes centros brasileiros para suas temporadas, realizando espetáculos com repertório de escolas européias e, por conseguinte, gerando o consumo de óperas italiana e francesa na quase totalidade; 2) As primeiras tentativas de implementação de uma ópera nacional fundamentaram-se na tradução de libretos para o idioma português, o que representava a ratificação de estilos e estéticas operísticas já configurados, mascarados de nacionalidade pelo idioma pátrio; 3) A grande maioria dos grupos, companhias e staffs dos teatros de ópera eram compostos de cantores em grande quantidade europeus, que certamente tenderiam a cantar em idiomas outros que não o português.
Ao lado de todos estes fatores, situa-se aquele que é certamente o mais determinante no panorama operístico nacional: a ausência de libretistas e de uma tradição literária neste gênero no Brasil. Em verdade nunca tivemos libretistas de fato e sem libretistas não há ópera. A necessidade de especialização de um texto teatral para ser cantado é premente, e como este processo nunca foi efetivamente desenvolvido, não poderíamos em tempo algum obter uma tradição em ópera. Acerca disto o compositor Camargo Guarnieri posiciona-se dizendo: “Não há quem faça libretos no Brasil. Os escritores escrevem para teatro e não para o canto [a ópera por conseguinte]” (GUARNIERI, 1990). Considerando-se esta escassez, havemos de admitir que em determinados casos, quantidade é fator determinante de qualidade: se não há muitos fazendo algo em determinada área, certamente difícil será que se possa atingir a excelência. Uma tradição não nasce por geração espontânea ou pela tentativa de poucos, mas sim, pelo amadurecimento e pela realização contínua de todo um background, ao longo de uma seqüência de tentativas.
Assim, a ópera no Brasil, como em Portugal, apesar de ser largamente consumida, nunca se configurou como elemento e evento social de importância capital, como o fora na Itália, França e Alemanha. É muito provável que isto não tenha ocorrido pelo fato de que nunca fora realizada concretamente a ópera em idioma português. Nas outras nações citadas, Itália, França e Alemanha, a ópera típica de cada uma destas regiões utilizava-se do idioma vernáculo de cada uma delas. Considerando-se a ópera sob o aspecto cênico, é fundamental a uma realização teatral socialmente satisfatória, a compreensão do texto por parte da platéia, o que só é possível se o mesmo se encontra em vernáculo. Como herdeiro da realidade portuguesa, o panorama operístico brasileiro padeceu do mesmo problema. Isto significa que uma platéia de ópera nestas duas sociedades, brasileira e portuguesa, constituía-se, ou ainda continua a se constituir em consumidores de um objeto de arte mutilado, uma vez que a compreensão direta das falas é dificultada ou mesmo impossibilitada, ainda que se considere o vasto consumo destas obras.23 Não havendo, por outro lado, a prática comum de produção de textos adequados à cena operística – libretos – por extensão, difícil se torna nestas realidades a germinação e desenvolvimento de uma tradição própria e de uma escola de ópera nativa.
Não se pode pois determinar o que seja uma tradição ou escola operística brasileira, visto que a produção – composição – de óperas escritas por compositores nativos do Brasil constituem-se em tentativas esparsas, efetuadas por eles individualmente, dentro do escopo de suas obras. Não se percebe uma linha mestra de estruturação do gênero, de modo que a obra produzida por eles em particular seja fundamentada em um conjunto de procedimentos e técnicas germinadas, desenvolvidas, amadurecidas e cristalizadas a partir da produção de seus antecessores. Pode-se sim avaliar que a ópera, dentro da obra dos compositores brasileiros, é uma das heranças do desenvolvimento da música brasileira como um todo, recebendo influências desta, além das experiências particulares de cada um, sem no entanto se configurar uma herança advinda de um desenvolvimento da ópera em si.
A função social, o idioma, os interesses do público e do mercado, a hegemonia das companhias européias, a carência de libretistas, o modo e propósito de formação dos compositores, a estruturação de uma escola de canto nacional – dentre tantos outros fatores e elementos, são componentes de um perfil tão particular, como o é no caso da ópera no Brasil. Em verdade, não é possível determinar dentro da realidade e panorama musical brasileiro o que seria uma Tradição ou Escola de Ópera Brasileira. Entretanto, sob vários aspectos, pode-se avaliar o que vem a ser “Ópera Brasileira”. Se é o caso de definirmos, acredito que possa ser enquadrado dentro deste termo – “Ópera Brasileira” – por um lado, todo o processo gerador de repertório dramático-musical no Brasil, desde as primeiras obras deste gênero aqui compostas, sem implementar nenhum juízo de valor qualitativo, estético ou estilístico deste repertório. Por outro lado, especificamente à produção de compositores como Lorenzo Fernandez e Guarnieri e seus sucessores com os quais a ópera composta no Brasil assume em seus elementos, estrutura e estética, uma “personalidade e identidade” verdadeiramente brasileiras.
1 Na tradição operística italiana, assim é denominado o regente dos espetáculos de ópera visto que a regência que realiza não se resume à direção de elementos musicais tão somente, mas sim de todos os elementos contidos na montagem. Tal terminologia enfatiza a realidade da ópera enquanto gênero artístico, na busca da realização de uma “obra de arte completa”.
2 Comédias madrigalescas, autos, rapresentaziones, divertissements, masques, drammas per música, melodramas, teatros musicais, etc.
3 Zarzuela. Forma dramática espanhola caracterizada pela alternância entre canto e dança com diálogos falados.
4 Conforme Nery e Castro (1991), a suspensão das atividades operísticas, teatrais e cênico-musicais de qualquer espécie ocoreram devido a: 1. Fatores naturais: terremotos e conseqüente destruição dos teatros. 2. Fatores sociais: estado de saúde dos monarcas, momentos de situação econômica desfavorável, proibição da participação de intérpretes do sexo feminino nas montagens, ou mesmo a vontade do monarca em não permitir tais atividades. Isto provocou uma considerável quantidade de execuções de óperas em forma de concerto (libretto da cantarsi).
5 Dentre eles: A Tragédia do Rico Avarento e Lázaro Pobre (1575); Auto das Onze Mil Virgens (1583); Auto de São Sebastião (1584); Auto de São Lourenço (1586), (AZEVEDO, 1956, p. 15)
6 Modinha. Canção sentimental de origem portuguesa e brasileira cultivada nos séculos XVIII e XIX.
7 Teatro da Câmara Municipal, Casa de Ópera da Praia e Teatro São João em Salvador, BA; Casa de Ópera do Recife em Recife, PE; Casa de Ópera do Pe. Boaventura (também denominada Ópera dos Vivos e Casa de Ópera Velha), Teatro da Ópera Nova e Real Teatro São João (mais tarde rebatizado Teatro São Pedro de Alcântara) no Rio de Janeiro, RJ, apenas para citar alguns.
8 Além do musicólogo Luiz Heitor Corrêa de Azevedo, os musicólogos: Gerard Béhague no livro Music in Latin America e David Appleby no livro The Music of Brazil, citam a ópera Le Due Gemelle do Pe. José Maurício Nunes Garcia como a primeira ópera de um compositor nativo do Brasil.
9 “O teatro aludido, de há muito demolido, foi importante sala de espetáculo da cidade do Salvador. E um dos três mais belos dos primeiros anos do Brasil imperial. Os outros dois foram o de São Luís do Maranhão e o do Rio de Janeiro, o S. Pedro de Alcântara” (DINIZ, 1986, p. 18).
10 Acreditava-se nesta possibilidade – uma ópera nacional – provavelmente em virtude do papel social que a ópera sempre despertou nas sociedades que a tinham como atividade artístico-cultural em voga. Como gênero artístico, conciliando manifestações diversas, e principalmente textos e temáticas originais de cada sociedade, ela poderia tornar-se um retrato adequado da sociedade que a gerou, e assim representá-la e a seus anseios.
11 Existem referências de vários autores – Luiz Heitor C. de Azevedo, Bruno Kiefer, Renato Almeida, e outros – citando que esta opera teve seu libreto originalmente escrito em português, sobre tema brasileiro, traduzida para
o italiano para ser encenada neste idioma. Entretanto quando de uma de suas récitas, anos mais tarde, sob a
forma de cantata profana, o texto executado foi o português.
12 A história é baseada nos eventos da invasão holandesa a Pernambuco.
13 “Não se tem notícias exatas acerca desta partitura ou mesmo se foi levada à cena.” (AZEVEDO, 1956, p. 47).
14 Luis Vicenzi de Simoni, escritor que realizou algumas traduções de libretos para o português.
15 Note-se que, no quartel final do século XIX, ocorreu em todos os centros produtores e consumidores de ópera do
mundo, uma tendência de cultivo as tradições regionais, na tentativa de obtenção de escolas nacionais de ópera tanto mais especializadas e vinculadas aos aspectos particulares de cada lugar. Neste escopo encontra-se a obra de Wagner e o conseqüente dualismo Wagner-Verdi, a Grande Ópera francesa, o teatro espanhol e, porque não,
o trabalho da Imperial Academia de Música e Ópera Nacional no Brasil. 16 Este compositor escreveu também a ópera A Louca. 17 Diversas fontes citam esta ópera da seguinte maneira: “Primeira ópera composta e levada à cena no Brasil” ou “A
primeira ópera nacional cujo libreto e música tinham autores brasileiros e cujo assunto tinha caráter regional”.
18 Azevedo (1938) atesta que, complicações de ordem administrativa provocaram o afastamento de D. José Amat da Imperial Academia em 1858. Passando uma fase de pouca produção entre 1859 e 1860, neste ultimo ano, a Imperial Academia foi extinta, surgindo pouco tempo depois a Ópera Lírica Nacional, tendo contudo a mesma estrutura funcional e o mesmo staff, com José Amat na sua coordenação.
19 Azevedo (1950) afirma que a primeira ópera deste autor foi La Nuit au Chateau, ópera cômica sobre libreto de Paulo de Koch, datada de finais da década de 1850, composta e estreada em Paris, uma vez que este compositor foi agraciado com pensão do governo imperial brasileiro para estudos na França. Compôs também operetas.
20 Cita Azevedo (1938), ainda datando desta época, digna de menção a ópera Paraguassú de José O’Kelly e libreto de Junius Constancio de Villeneuve.
21 Sobre este assunto, anos mais tarde, em 1937, seria realizado um congresso para avaliação e ordenamentos acerca da língua nacional cantada. E ainda assim, carece a língua e o canto no Brasil de meticuloso estudo, no sentido de buscar uma adequação da formação técnica dos cantores e das suas práticas interpretativas às particularidades do idioma português do Brasil.
22 Originalmente a ópera era entretenimento para as cortes e monarcas, chegando ao público gratuitamente como obra pronta e fechada. Com a transformação da sociedade, a ascensão da burguesia, a restruturação dos teatros, neste momento como instituições privadas, e o conseqüente direcionamento da ópera aos grandes públicos que pagavam para assisti-la, o gosto do público passou a ser determinante sobre a estruturação das óperas. Por conseguinte a expectativa, o gosto, a preferência do público – entenda-se por público aqui a tudo e todos que fossem custeadores e consumidores de ópera – tornaram-se elementos de importância considerável na determinação do que deveria ou não existir dentro do gênero. (RAYNOR, 1976, p. 67).
23 Neste sentido, a utilização de legendas com traduções das falas dos personagens e demais elementos do libreto ao longo das execuções, como normalmente tem sido utilizados nas montagens operísticas dos últimos tempos, tem se constituído num fator minimizador da parcela incompreendida do espetáculo operístico, vinculada a não compreensão do idioma no qual o texto foi escrito.
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José Maurício Brandão - Possui graduação em Instrumento pela, UFBA (1994), Mestrado em Música pela UFBA (1999), Doutorado em Música pela UFBA (2009) e Doutorado em Música pela Louisiana State University, EUA (2011). Tem experiência na área de Artes, com ênfase em Regência, atuando em: execução musical, regência orquestral e coral, educação musical, opera e musicologia. Professor Adjunto na UFBA desde 2010, é atualmente Chefe do Departamento de Música e Coordenador Artístico da Orquestra Sinfônica e Madrigal da UFBA.