lAGrIME DI SAn pIEtrO DE OrlAnDO DI lASSO: uMA AnálISE SObrE SuA EXECuçãO

laGrIme dI san pIeTro By orlando dI lasso: an analysIs on ITs performance

Daniela Francine Lino - UNICAMP dani_linop@yahoo.com.br

Carlos Fernando Fiorini - UNICAMP

fiorinic@unicamp.com.br

Resumo: O presente trabalho faz parte de um estudo amplo da obra Lagrime di San Pietro de Orlando di Lasso e traz a proposta de uma possível execução da peça com coro misto a cappella. Serão tratados os aspectos mais relevantes da obra como seu caráter composicional, os tipos vocais a que foi destinada e o grupo executante, abordando a prática da época e traçando um paralelo com os recursos existentes em nossos dias. Após o levantamento destes aspectos, este estudo aponta uma execução coerente com o ideal do compositor e adequada aos parâmetros atuais. Palavras-chave: Orlando di Lasso; Madrigal Espiritual; Renascimento; Regência coral; Práticas interpretativas.

Abstract: This work is part of a broader study of the work Lagrime di San Pietro by Orlando di Lasso and brings the proposal for a viable execution of the piece with mixed choir a cappella. Will be treated most relevant aspects of the work such as his compositional characteristics, vocal types that was intended and performing group, approaching the practice of that era and drawing a parallel with the existing resources in our day. After discussing these aspects, this study suggests a performance consistent with the ideal of the composer and adapted to current parameters. Keywords: Orlando di Lasso; Spiritual Madrigal; Renaissance; Choral conducting; Performance.

Introdução

Discorrer sobre a interpretação da música antiga, qualquer que seja sua especificidade, pode ser uma tarefa árdua não apenas para quem escreve como também para quem a executa. Esta dificuldade é acentuada por se tratar de um período tão distante do nosso, o que gera certa deficiência em encontrar resquícios de registros sólidos que exemplifiquem a prática da época, tampouco a forma como os elementos musicais inerentes a essa interpretação eram executados.

Ao se tratar de música vocal, nos deparamos com outros fatores que dificultam ainda mais o trabalho, uma vez que sabe-se que os tipos vocais do Renascimento e suas peculiaridades timbrísticas eram bem diversos das vozes de hoje. Além disso, há diversidade entre ambientes de execução, na forma como eram executadas e até mesmo a que tipo de público eram destinadas. No entanto, talvez o fator mais difícil a ser trabalhado seja a percepção estilística dos intérpretes, que é influenciada principalemente pelo ambiente social e cultural a que o homem é imposto e que, entre os períodos, são muito diversas.

Tais questões podem ser resolvidas se nos aprofundarmos na obra e no estilo de escrita do compositor. Assim, o primeiro passo é estudar a fundo os elementos mais importantes de uma peça, que englobam desde os recursos de escrita utilizados pelo compositor até a funcionalidade da obra, para que possamos nos aproximar ao máximo da época de composição, levando em conta os contextos sociais que envolviam os compositores, os intérpretes e até mesmo os ambientes de execução.

Dentro do contexto da música renascentista, Orlando di Lasso é considerado um dos mais versáteis compositores de sua época. Compôs mais de 2000 peças, destacando-se principalmente pela música sacra, o que não lhe impediu de compor madrigais, chansons e lieder com a mesma habilidade, inclusive com forte influência da música secular em suas obras sacras e com características provenientes do estilo franco-flamengo de compor, onde prevalece o uso da imitação, provenientes de sua origem belga. As Lagrime se destacam dentro de sua obra, uma vez que trazem várias características deste seu estilo de compor.

Este artigo abordará questões pertinentes à execução da época, além de traçar um paralelo com uma possível prática atual, conforme a realidade do grupo atuante, sem se abster da qualidade musical necessária para uma adequada interpretação da obra. Para um melhor entendimento das questões que abrangem este tema, iniciaremos este artigo com uma visão geral de Lagrime di San Pietro.

1. A obra

Lagrime di San Pietro merece destaque dentro da vasta obra de Orlando di Lasso. Sua forma musical de Madrigal Espiritual, atribuída pelo próprio compositor, situa a obra num cenário religioso devido à temática sacra, mas sem aplicar a ela uma concepção de música para o serviço religioso, além do uso da língua vernácula e da escrita para sete vozes mistas, incomuns para a época.

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A obra é formada por um conjunto de 21 peças - 20 madrigais espirituais e um moteto. A peça relata o arrependimento do apóstolo Pedro após ter negado Cristo, citado no Evangelho Segundo São Mateus. Os textos dos madrigais estão em italiano, seguindo os originais do poeta maneirista Luigi Tansillo (1510-1568). Apenas o moteto final é escrito em latim, num poema atribuído a Philip the Chancellor (ca. 1160, Paris – 1236), poeta e teólogo francês do século XIII. Orlando di Lasso fez algumas alterações no poema quanto à distribuição dos versos e troca de algumas expressões.

Lagrime di San Pietro está situada no final do Renascimento, especificamente no período pós Concílio de Trento que ocorreu entre os anos de 1545 a 1563. Este Concílio estipulou novas normas de adequação das celebrações e dos regimes da Igreja Católica, influenciando, em muitos aspectos, a música ali composta e praticada. Com essas novas normas, os compositores deveriam adequar suas composições priorizando o texto e restringindo a prática polifônica.

Nesse cenário, destacam-se três compositores que souberam escrever peças sacras de extrema riqueza e complexidade musical, sem ferir as regras estipuladas pela Igreja: Palestrina, Victoria e Lasso. Estes compositores eram hábeis na escrita não apenas da música sacra, mas também da música secular, em especial dos madrigais, em auge neste período. Foi desta prática da nova música sacra e da influência deste estilo que surge o Madrigal Espiritual, forma musical do final do Renascimento que possuía um caráter sacro, com textos em vernáculo, como as Lagrime de Orlando di Lasso.

As Lagrime foram compostas no ano de 1594, ano da morte de Lasso, sendo esta a última obra que o compositor escreveu.

As sete vozes das Lágrimas são: Canto I e II, Alto I e II, Tenor I e II e Baixo. Esta indicação nos faz pensar facilmente numa possível execução atual com coro misto, com aplicação de vozes femininas nas partes de Cantus e Altus e vozes masculinas nas partes de Tenores e Baixo. Mas se recorrermos à execução da época esta prática não se aplicaria.

Para se entender um pouco da prática de época, este artigo fará uma breve contextualização do cenário em que se encontra a obra, traçando um paralelo com uma possível interpretação moderna, de forma a amenizar as discrepâncias e obter um resultado satisfatório na execução.

2. Contextualização da época

A escrita da música renascentista era baseada no contraponto vocal, influenciada diretamente por gerações de compositores franco-flamengos desde o século XV. Além dessa predominância do estilo contrapontístico, o estilo franco-flamengo privilegiava a técnica da imitação vocal e determinava uma escrita baseada em sobreposições de terças e, por conseguinte de sextas, o que resultava em tríades, prática que mais tarde serviria de base para a música tonal.

Outra peculiaridade da época é que, devido a uma forte influência da Igreja, apenas os homens eram permitidos cantar nos serviços religiosos. As composições do século XVI, portanto, ainda seguiam uma linha de escrita propícia para os cantores da época (baixos, tenores e contra-tenores) para todas as partes especificadas: canto, alto, tenor, baixo e seus desdobramentos. Além disso, os coros da época muitas vezes contavam com a presença de meninos cantores ou mesmo dos castratti ou falsetistas, de acordo com a prática de cada região, para executarem as vozes mais altas. Como cita Garretson, 2000:

Durante o começo do Renascimento, homens cantando com suas vozes de falsete eram geralmente usados para reforçar as vozes dos meninos. [...] Durante a parte final do século XV, a extensão da música polifônica cresceu para além do que os falsetistas italianos podiam cantar. A Espanha, entretanto, criou um sistema especial para treinar a voz de falsete que melhorou ambas, a qualidade e a extensão. [...] Durante o século XVI, muitos falsetistas espanhóis foram exportados para a Itália, e muitos foram empregados no Coro Papal, onde cantavam a parte mais aguda ou as duas partes mais agudas dos motetos e missas.1 (p. 08)

A técnica de escrita madrigalesca traduzia a idéia de que a música deveria estar inteiramente ligada ao texto e em função dele. Assim, a escrita musical desempenharia o papel de transparecer o texto através de recursos melódicos, rítmicos ou estruturais, principalmente no que se referia aos afetos inerentes à temática de cada obra.

No trecho abaixo, extraído do madrigal X, é possível verificar um exemplo de relação texto-música, onde Lasso escreve as palavras inverno e primavera de forma distinta, mudando os grupos vocais.

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Após o conhecimento da devida importância dada a cada uma das linhas melódicas na composição do madrigal, é possível crer que provavelmente cada linha deveria ser executada vocalmente, apesar de não se poder afastar a possibilidade da inclusão de um ou mais instrumentos, na época, para realizar determinadas partes, na ausência de um ou mais cantores: “Muito da música vocal publicada no século dezesseis teve claramente a intenção de atingir também os instrumentistas”.2 O grupo Huelgas Ensembles, liderado por Paul Van Nevel3, possui um registro das Lagrime di San Pietro com a inclusão de instrumentos, alternando peças vocais com peças instrumentais.

Quanto ao número de cantores, sabe-se que a maioria das peças era escrita para ser executada com um cantor por linha, reforçando a idéia de que na ausência de um cantor seria necessária a presença de um instrumentista. A respeito desta afirmação Plank (2004), em seu livro sobre a prática coral, relata:

[...] Em outros lugares, em Roma, no Colégio Alemão em 1589 existe uma referência a um cantor incapaz de cantar na capela e enviarem um trombonista como seu substituto. Por que um substituto seria necessário, em primeiro lugar, se houvesse mais de um cantor cantando uma parte? 4 (p. 32)

Com todas estas questões levantadas, vários problemas voltados para a execução já podem ser apontados. Pensando numa prática moderna, a obra deve ser realizada com solistas ou coro? Coro masculino ou coro misto? Com ou sem acompanhamento instrumental? A música deve ser executada em um serviço religioso ou possui caráter de musica reservata, com a finalidade de música para concerto?

3. Sugestões de adaptações para coro misto a cappella

A primeira questão se refere à escolha do grupo, uma vez que a obra Lagrime di San Pietro foi escrita com tessituras expandidas para as vozes da época, especialmente no que diz respeito às vozes superiores, como podemos verificar na figura abaixo, que traz as extensões de cada uma das sete vozes durante a obra:

Figura 2: Extensões Gerais das 7 vozes.

Devido a tais tessituras, surge uma polêmica quanto à execução somente por homens, uma vez que atualmente é raro encontrarmos cantores masculinos aptos a realizar as vozes superiores destas composições. A prática da inserção de meninos nos coros adultos poderia resolver esta questão

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das tessituras, mas traria uma outro problema com relação ao desequilíbrio vocal, gerado entre vozes infantis e adultas.

No ano de 2003 o grupo Hofkapelle, sob a direção de Michel Procter5, realizou uma gravação da obra somente com vozes masculinas e solistas, mas efetuou a transposição dos madrigais XIII, XIV, XV, XIX e XX a um intervalo de quarta abaixo para manter as mesmas tessituras das demais peças, viabilizando a prática. Tal prática era utilizada no Renascimento, devido a um sistema transpositor conhecido por chiavette.6 O grupo de Procter, portanto, se utiliza da corrente forma de transposição da época.

No trecho abaixo, extraído do madrigal XX em sua versão original, é possível verificar as tessituras das vozes, tendendo para o agudo, principalmente das vozes de Sopranos e Tenores.

Figura 3: Madrigal XX – Negando Il mio Signor – c. 5 a 8.

Uma alternativa seria a prática com os contra-tenores ou falsetistas, mas sabe-se que isso se torna quase inviável, uma vez que estes tipos vocais encontram-se cada vez mais escassos, e muitas vezes não estão habituados ou aptos a executar tais linhas. Devido à falta de prática em incorporar contra-tenores ou falsetistas nos coros das Igrejas atuais, os cantores encontrados que possuem estes tipos vocais geralmente atuam como solistas, o que dificulta a inclusão dos mesmos nos grupos corais.

Além disso, salienta-se aqui outro fator importante no que diz respeito à inclusão ou não de tais tipos vocais: a diferenciação destas vozes, mais como solistas do que como cantores de coro, poderia gerar certa complexidade para se equilibrar timbre e volume com os demais cantores, o que reforça a inviabilidade da prática.

Dessa forma, levando-se em consideração a viabilidade do projeto, a estética e a apreciação musical, o presente estudo indica uma execução com coro misto, o que se aproximará muito da execução da época, uma vez que não será necessário recorrer às transposições das tonalidades de nenhuma das peças, seguindo as tessituras de cada uma das sete vozes, com vozes femininas nas 4 partes superiores e vozes masculinas nas demais partes. Como exemplo sonoro desta versão citamos aqui a execução de três grupos: Ensemble Vocal Européen por Philippe Herreweghe7, o grupo Ars Nova, sob a direção de Bo Holten8 e do grupo Studio de Musique Ancienne de Montréal9 sob a direção de Christopher Jackson. Todos os três grupos utilizam o coro misto, mas no primeiro, além de contarem com solistas, acontece a transposição das mesmas peças já citadas com o grupo Hofkapelle. Na versão do grupo de Montreal, apesar de não realizarem a transposição, a linha de Alto 2 é executada por voz masculina, o que se distancia da prática idealizada neste estudo. Já na versão do Ars Nova a obra é realizada sem transposição e com vozes femininas nas linhas de Sopranos e Altos e vozes masculinas nas linhas de Tenores e Baixos, tornando-se esta a mais próxima à idéia do presente estudo.

Sem dúvida haverá uma distorção dos parâmetros vocais da época, se compararmos um coro misto atual a um grupo masculino da época, mas, constatadas todas estas questões, percebe-se essa como a melhor alternativa para uma execução praticável e adaptada aos grupos existentes nos dias atuais.

Outro fator relevante se refere ao número de executantes por parte. É realmente possível realizar uma interpretação fiel aos manuscritos com apenas um cantor por voz? O principal problema encontrado na execução das linhas por solistas é a dificuldade na manutenção das frases musicais ou textuais. Quando se opta pela escolha de um grupo solista sabe-se que muitas frases poderão ser interrompidas devido à necessidade da respiração. Esta questão poderia ser facilmente resolvida com um grupo de dois cantores por parte, o que não difere tanto da prática com solistas e seria o mais satisfatório quanto à qualidade timbrística entre os naipes, além de resolver a questão das manutenções das frases. É relevante citar que, embora

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a utilização de dois cantores por parte possa fugir à prática da época, este trabalho entende esta como a melhor opção de resultado sonoro e musical.

Encontra-se abaixo um exemplo tirado do madrigal IV (compassos 1 a 4) no qual há a presença de uma longa frase nas vozes superiores e Tenor II, que, devido à frase do poema deveria ser executada sem interrupção – Qual a l’incontro di quegli occhi santi (Como ao encontro daqueles olhos santos):

Este estudo, portanto, defende a aplicação de dois cantores por parte, assinalando esta como a melhor alternativa, de forma a não se distanciar muito da execução da época, feita por solistas, sem a necessidade de abnegar da prática da respiração coral (ou alternada), possibilitando a realização das linhas melódicas inteiras, sem interrupção.

Sabe-se que a prática com dois cantores por naipe gera grande dificuldade com relação ao timbre entre as vozes, sendo facilmente minimizada com a substituição por três ou mais cantores, uma vez que as diferenças entre os timbres são mais perceptíveis quando o número de cantores é menor. Contudo, defende-se aqui, como melhor opção, duas vozes por naipe, buscando uma forma de aproximar o som ao de uma execução com solistas. Esta prática de fusão timbrística dificulta, sim, o processo de ensaio, mas pode e deve ser trabalhada naipe por naipe.

Assim, já se descarta também a necessidade da inclusão de instrumentos para realizar uma linha ou, simplesmente, dobrar as vozes, defendendo mais uma vez a realização da obra da maneira mais próxima e fiel às idéias originais do compositor, valorizando a expressão do texto.

Quanto à funcionalidade da obra é importante ressaltar que as Lagrime não foram escritas como peça para o serviço religioso, uma vez que não se encaixam em nenhuma parte do serviço litúrgico e estão em língua vernácula, e não em latim. Também é de extrema relevância mostrar os indícios que a apontam para o caráter de musica reservata, como a complexidade da escrita, a dramaticidade do texto e da temática, a forte relação entre texto e música, sendo acentuada através do uso exacerbado de figuras retórico-musicais, como podemos verificar no trecho abaixo extraído do madrigal XVI em que Lasso escreve a frase “Que para fugir de um breve conflito neste mundo” em forma de fuga entre as vozes, utilizando-se de uma figura retórica denominada por Fuga Real. 10

Figura 5: Madrigal XVI – O vita troppo rea – c. 7 a 9

Sendo assim, e também levando em conta a duração da obra, cerca de 60 minutos, é difícil pensá-la hoje como peça para concerto, pois sabemos que nossas plateias nem sempre estão prontas ou acostumadas a este tipo de

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repertório, tanto que, mesmo durante o Renascimento, estas obras eram executadas para um público seleto e preparado, segundo Allan Atlas, (1998):

Mas nós podemos entender o termo [musica reservata] como uma referência à música do final do século XVI, que expressou o significado, a emoção e as imagens do texto com uma intensidade [...] desconhecida para as gerações anteriores; que era, aliás, música destinada a uma elite, o público cultivado. 11 (p. 629).

Por este motivo, o presente estudo sugere, sim, a obra como peça de concerto devendo ser realizada, preferencialmente, de forma completa para que se possa compreendê-la como um todo. Entretanto aconselha-se que haja opções de execução, como por exemplo, a inserção de textos que tratem da temática da obra ou mesmo que resumam suas traduções, intercalando-as com as peças, facilitando, dessa forma, a audição para o público.

Conclusão

Sabe-se que, atualmente, para se interpretar a música antiga é inevitável uma adaptação para os meios existentes. Isso pode ou não influenciar a qualidade musical, uma vez que os manuscritos foram baseados em recursos musicais da época e nem sempre é possível resgatá-los, como por exemplo, os timbres dos castratti. Seria, sim, possível a inclusão de falsetistas ou contra-tenores ou meninos cantores nos grupos, mas, como já visto, a qualidade sonora poderia ser prejudicada.

Seguindo este pensamento, Lagrime di San Pietro é apontada como uma obra de extrema complexidade no ponto de vista prático e estrutural, sendo necessárias várias adaptações e adequações para uma execução atual.

Sem dúvida, seguir fielmente os originais seria o mais aconselhável, mas a experiência atual nos mostra que essa prática é inviável a partir do momento que nos deparamos com aspectos humanos, físicos e acústicos bem distintos ao do período em questão. Resta-nos a possibilidade de nos aprofundarmos nos aspectos que envolvem a obra e o compositor para que, ao entender este universo, as adaptações necessárias para a execução sirvam de ferramenta para que os recursos da época sejam priorizados. As adequações aqui sugeridas buscam minimizar os problemas da execução da música vocal antiga sem influenciar a qualidade do produto final.

Notas

1 During the early Renaissance, men singing in their falsetto voices were often used to reinforce the boys’ voices. [...] During the latter part of the fifteenth century, the range of polyphonic music increased beyond the range that Italian falsettists could readily sing. The Spanish, in the meantime, devised a special system of training the falsetto voice that improved both its quality and range. [...] During the sixteenth century, many Spanish falsettists were exported to Italy, and many were employed in the Papal Choir, where they sang the treble or upper two parts of the motets and masses.” Garretson, Robert L. Choral music: history, style, and performance practice.

2 “Much of the vocal music published in the sixteenth century was clearly intended to reach instrumentalist as well.” Allan W. Atlas. Renaissance Music: music in Western Europe, 1400-1600.

3 LASSO, Orlando di. Lagrime di San Pietro. HUELGAS ENSEMBLES – Paul Van Nevel.

4 “Elsewhere in Rome, at the German College in 1589 there is a reference to a singer being unable to sing in chapel and sending a trombonist as his substitute. Why would a substitute be necessary in the first place if more than one singer were singing a part?” Plank, Steven

E. Choral Performance: a guide to historical practice. 5 LASSO, Orlando di. Lagrime di San Pietro – Melancholia. Procter, Michael – HOFKAPELLE, 2003. 1 CD (ca. 76 min).

6 Chiavette – Termo italiano, derivado de chiave (clave). Sistema de claves altas utilizado na Música Vocal Renascentista que sugere uma transposição das linhas melódicas uma 4ª ou 5ª abaixo. Este sistema tinha a finalidade de evitar a presença de linhas suplementares ou mesmo a inclusão de acidentes nas armaduras de claves.

7

LASSO: Lagrime di San Pietro. ENSEMBLE VOCAL EUROPÉEN -Philippe Herreweghe – Harmonia Mundi. 1994.

8 LASSUS. Lagrime di San Pietro (Spiritual Madrigals). ARS NOVA – Bo Holten - Copenhagen: Naxos, Grundtvigskirken, 1994.

9 LASSO, Orlando di. Lagrime di San Pietro Studio de Musique Ancienne de Montréal – Christopher Jackson – ATMA Classique. 2010.

10 “Fuga realis (fuge ousiodes) é aquela disposição da harmonia na qual todas as vozes imitam

através do uso de intervalos idênticos ou similares – um determinado sujeito [affectio] extraído de uma voz na combinação.” (BURMEINSTER, [1606], 1993, p. 159).

11 “But we can generally understand the term as referring to late-sixteenth-century music that expressed the meaning, emotion, and imagery of the text with an intensity (at least to contemporary ears) unknown to previous generations; it was, moreover, music intended for an elite, cultivated audience.” Atlas W. Allan. Renaissance Music: music in Western Europe, 1400-1600.

Referências bibliográficas

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Artigos

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Referências fonográficas:

LASSO, Orlando di. Lagrime di San Pietro – Melancholia. PROCTER, Michael – HOFKAPELLE. CD. 2003. 1 CD (ca. 76 min).

LASSO, Orlando di. Lagrime di San Pietro. HUELGAS ENSEMBLES – Paul Van Nevel. CD SK 53373. VIVARTE, 1993.

LASSO, Orlando di. Lagrime di San Pietro. ENSEMBLE VOCAL EUROPÉEN – Philippe Herreweghe. CD 901483. Harmonia Mundi France, 1994.

LASSUS. Lagrime di San Pietro (Spiritual Madrigals). ARS NOVA – Bo Holten. CD 8.553311. Naxos, 1994.

LASSO, Orlando di. Lagrime di San Pietro – Studio de Musique Ancienne de Montréal. CD 72205625092. ATMA CLASSIQUE, 2010.

Daniela Lino - Graduada em Regência Coral pela UNICAMP onde atualmente cursa Doutorado em Música na área de Práticas Interpretativas sob a orientação do Prof. Dr. Carlos Fiorini. Sua atuação como Regente e Preparadora Vocal abrange coros da cidade de Campinas e região. Desde o ano de 2009 é bolsista PED onde ministra aulas de Regência Coral para alunos de Graduação em Música da UNICAMP.

Carlos Fiorini - Doutor em Música pela UNICAMP onde é docente na área de Regência desde 1998. Atualmente coordena o Centro Interno de Pesquisa do Instituto de Artes da UNICAMP Regência: Arte e Técnica. É regente do Coro do Departamento de Música da UNICAMP e Diretor Artístico da Camerata Anima Antiqua, grupo especializado na música do Renascimento. Sua carreira como regente convidado, assistente e titular de diversas orquestras sinfônicas iniciou-se em 1995.