A IMpOrtânCIA DO COnCEItO rOuSSEAunIAnO DE InfânCIA pArA A fIlOSOfIA DA EDuCAçãO MuSICAl nO SéCulO XXI

Raimundo Rajobac - UFRGS rajobac@hotmail.com

Resumo: A invenção do conceito moderno de infância representou um marco paradigmático para a educação em geral, e permitiu à modernidade repensar o tratamento oferecido às práticas educativas. Também a educação musical sofreu influência desse processo. Daí surgiu a necessidade de se tratar a criança em seu mundo respeitando-a em suas condições, o que reivindicou

o abandono da pedagogia escolástico-tradicional-racionalista. Nessa perspectiva, teremos como objetivo investigar a contribuição de Rousseau e sua obra Emílio ou Da Educação para se pensar processos educativo-musicais na contemporaneidade. Trabalharemos com a ideia de que a teoria sensitiva desenvolvida no II livro do Emílio permanece, do ponto de vista da filosofia da educação musical, um campo importante de ser estudado e ser objeto de reflexão, tendo em vista os desafios apresentados pela educação musical na contemporaneidade. Palavras-chave: Filosofia; Educação musical; Rousseau; Conceito moderno de infância.

Abstract: The invention of the modern concept of childhood represented a paradigmatic mark for education in general, and has allowed us, in modern times, to rethink the approach to educational practices. The musical education has, likewise, been influenced by this process. As a consequence, the need to respect the child’s reality arose, and led to the abandonment of the traditional scholastic-rationalistic pedagogy. From this perspective, we aim at investigating the contribution of Rousseau in his work Emile, in order to think of contemporary educational processes in music. We will base our work on the concept that the sensitive theory developed in the II book of Emile remains, from the philosophy of musical education perspective, a very relevant field of study and reflection, taking into consideration the challenges faced in the contemporary musical education. Keywords: Philosophy; Music education; Rousseau; Modern concept of childhood.

1. Revoluções paradigmáticas e processos educativo-musicais

Teremos como principal objetivo com o trabalho, apresentar J-.J. Rousseau e sua obra Emílio ou Da Educação como fontes determinantes para se pensar sobre processos educativo-musicais na contemporaneidade. Para tanto, partirmos da hipótese básica de que o programa educacional dividido em estágios pensado por Rousseau para seu aluno fictício Emílio serviu de fundamento para o nascimento do conceito moderno de infância. Por esse caminho, chegaremos à ideia de que a teoria sensitiva desenvolvida pelo teórico no II livro do Emílio, além de ter influenciado os proces-sos educativo-musicais posteriores, permanece, do ponto de vista da filosofia da educação musical, como campo importante a ser estudado tendo em vista os desafios apresentados pela educação musical na contemporaneidade. Launay conjectura bem sobre nossas pretensões quando, ao introduzir o Emílio, afirma que o amor real às crianças e à liberdade que nele respiramos faz dele um livro de todos os tempos. Assim, cada geração de educadores descobre nele, com surpresa, o que confusamente procura. A exemplo disso podem ser citados: a escola emancipada, os métodos de educação ativa, Makarenko e seu admirável Poema pedagógico e pioneiros do “não-diretivismo”, tais como Rogers no Estados Unidos e Georges Lapassade na França, os quais tomaram como inspiração a educação negativa de Rousseau. (2004).1

A invenção do conceito moderno de infância representou um rompimento paradigmático no que diz respeito à maneira como se pensava a educação em geral. Tal rompimento permitiu à modernidade repensar o tratamento oferecido às práticas educativas e fundamentações teóricas que conferiam base aos processos pedagógicos. Também a educação musical sofreu influência desse processo. Foi nesse contexto que surgiu a necessidade de se tratar a criança em seu mundo respeitando-a em suas condições,

o que reivindicava, por outro lado, o abandono da pedagogia escolásticotradicional-racionalista na qual a criança era tratada como um adulto em miniatura, e os processos pedagógicos guiados por perspectivas puramente racionalista-inatistas. Guiada por princípios escolástico-racionalistas, a educação orientava-se por processos pedagógicos baseados numa educação pela razão, na qual prevalecia a instrução pelos conceitos, os quais, necessariamente, seriam apresentados pela autoridade (mestre, professor, tutor) detentora do conhecimento.

A maneira como se pensa a educação musical na atualidade está estreitamente ligada a essa reviravolta paradigmático-educacional ocorrida no Ocidente. Contudo, antes de chegarmos às questões estritamente pedagógico-musicais, faz-se importante retomar brevemente as raízes filosófico-pedagógicas desse processo. Num esforço retrospecto, logo veremos a tremenda influência que a Idade Média exerceu sobre a história ocidental. A cosmovisão medieval orientada pela teologia tradicional e o racionalismo abstrato, entre tantas outras dimensões, moldaram principalmente a maneira de educar e de pensar processos pedagógicos cuja autoridade de

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tentora do saber era figura central.2 “Na escolástica, a [...] educação encontrava suas bases principalmente na teologia. A forma como a teologia tratava [...] da ação humana conferiu os fundamentos para se compreender o lugar da educação [...]”. (BALBINOT, 2006, p. 49). A Idade Média tratou da música tomando como referência dois paradigmas, o pitagórico-boeciano e o platônico-agostiniano, o que resultou na ideia de música como ciência matemática e fator moralizante: resultado do esforço reinterpretativo dos filósofos gregos a serviço da teologia cristã. Imperava, portanto, no âmbito da pedagogia musical, o modelo inatista, cuja fonte clássica é a noção de conhecimento baseada na doutrina das ideias apresentada no Menão de Platão (428-348 a. C.). Para a pedagogia musical inatista a criança era entendida como portadora de uma bagagem hereditária e de uma estrutura mental-conceitual pronta o suficiente para compreender o mundo: “O modelo standard do inatismo baseia-se na tese de que as ideias nascem com o sujeito, residindo no seu interior e, portanto, são anteriores à experiência”. (DALBOSCO, 2010, p. 3).3

A música, assim como as demais áreas do conhecimento, nada mais era do que serva da teologia; no caso específico da música, sua função só se cumpria ao exercer seu papel funcional dentro da liturgia cristã:

o cantochão foi a expressão máxima do ideal medieval de prática musical como louvor a Deus. Junto a essa concepção emergiu num longo processo, o ideal educativo-musical medieval: “a atividade prática de música com a presença de crianças é considerada um de seus pontos principais”. (FONTERRADA, 2008, p. 36). A preocupação com a liturgia e com a prática do cantochão deu origem, portanto, às scholae cantori, as quais o papa Gregório Magno fez questão de expandir desde o final do século VI: “Muitos dos importantes músicos dos períodos gótico, renascentista e barroco foram meninos cantores” (FONTERRADA, 2008, p. 36). Contudo, imperava nesse contexto o que Ariès denominou falta de “sentiment de l’es fance” (1981), ou seja, a falta de consciência da particularidade infantil: “A criança era, no máximo, uma figura marginal em um mundo adulto”. (HEYWOOD, 2004, p. 10).

No ambiente educativo-musical medieval prevalecia o método escolástico, cuja preocupação central não residia na “criança em si”4 e em seu desenvolvimento musical, mas no atendimento das necessidades litúrgicas apresentadas pelas paróquias, conventos, abadias e dioceses. A crian-ça nada mais era que um instrumento sendo aperfeiçoado para o louvor a Deus por meio da música. A pedagogia musical medieval operava, portanto, com um conceito instrumental de criança5, o qual era indiferente às condições da própria criança. Assim, “a criança musicalmente talentosa e portadora de boa voz cantada era levada às instituições religiosas para aprender o ofício de músico”. (FONTERRADA, 2008, p. 37-38).

O Renascimento significou uma profunda mudança para a sociedade ocidental. Embora com outros objetivos, Cruz atentou de forma clara para essas mudanças. Para o autor, com a Renascença, a reviravolta no pensamento ocidental envolveu o homem nos mais diversos aspectos. Não se caracterizou como uma reviravolta apenas no pensamento filosófico, mas também em nível social, político, literário, artístico, científico e religioso; emergindo com uma forte marca imanentista somada ao panteísmo neoplatônico, voltado aos ideais materiais e terrenos. (2010, p. 142). A pedagogia musical também acompanhou esse processo de mudanças: surgiu nesse período, embora de forma atenuada, a ideia de criança como um ser que necessita de atenções especiais; emerge aos poucos a consciência da necessidade de saúde, lazer e educação adequada. As scholae cantori continuaram existindo durante toda a Idade Média e também na Renascença, porém o detalhe importante a ser considerado é que, com a diminuição do poder eclesiástico nas esferas sociais, e a crescente autonomia da sociedade laica, passaram a surgir escolas de formação musical secularizadas, que cada vez mais se distanciavam da metodologia perpetuada pelas scholae cantori: tratava-se dos conservatórios. Os conservatórios eram orfanatos. A Itália foi a responsável pelo nascimento e divulgação dessa nova concepção de escolas de músicas. E, embora tenha prevalecido o ideal de formar músicos para atender às necessidades eclesiais ligadas à liturgia, a significativa mudança na estética musical da época direcionou a atenção ao novo repertório emergente e suas exigências, as quais se faziam notar no aumento do coro e na tímida emancipação dos instrumentos6.

Os conservatórios passaram a tomar como princípio subjacente a concepção humanista-renascentista “de que a música deveria ser ensinada junto com outras disciplinas obrigatórias”. (DGM7, 1994, p. 215). No final do século XVI e inicio do XVII o ensino de música passou a ser atividade determinante na maioria dos orfanatos de Nápoles e Veneza. Os conservatórios de Veneza, principalmente o Ospedale della Pietà, no qual Vivaldi

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ensinou, tornou-se famoso pelo coro e orquestra de meninas órfãs que atraíam a atenção do publico musical da época: “[...] a maior parte dos concertos de Vivaldi e de sua música sacra foi escrita para esses intérpretes. Em Nápoles ficaram famosos os orfanatos musicais destinados a meninos [...]”. (DGM, 1994, p. 215). Os Ospedale (Hospitais) contribuíram de forma significativa para a reviravolta na maneira como se concebia a criança. Com essa experiência educativa atentou-se na época para a necessidade de rompimento com o hábito socialmente comum pelo qual a criança convivia diretamente com os adultos: o ensino de música nos conservatórios italianos ofereceu essa grande contribuição à pedagogia musical. Com a invasão napoleônica a maioria dessas instituições foi fechada (1796). No entanto, a experiência do ensino de música nos conservatórios já chamava a atenção de vários outros países europeus: em seguida, “[...] Charles Burney, na Inglaterra e o clarinetista Anton Stadler, em Viena, apresentaram projetos para [criação de] escolas de música”.8 (DGM, 1994, p. 215). A educação, em geral, passou a ser organizada em colégios e seminários, o que acarretou maior atenção e responsabilidades no atendimento à criança e à formação dos seres humanos em sentido lato. No que diz respeito à pedagogia musical, os Ospedali destinados ao ensino de música na época representaram o novo tratamento oferecido ao ensino institucional de música. Ainda assim, prevalecia o método tradicional-escolástico: “[...] do século XV ao XVII o ensino era de inteira responsabilidade dos jesuítas, doutrinários e oratorianos [...].” (ARIÈS, 1981). Só mais tarde se encontraria um conceito de infância que realmente respondesse às necessidades infantis e contribuísse para se pensar processos pedagógicos segundo novas perspectivas.

O nascimento da modernidade no século XVII inaugurou uma nova maneira de compreender o mundo. A instauração do cogito cartesiano, expresso na máxima cogito ergo sum – penso logo sou –, colocou os processos epistemológicos e toda a tradição intelectual até então vigentes no terreno da dúvida metódica, o que, em última instância atrelou ao conceito de verdade, à necessária passagem do conhecimento pelo método das ciências da natureza, em específico pela matemática. Conforme Cruz, René Descartes (1596-1641) foi o maior representante do racionalismo moderno. A história da filosofia moderna desenvolveu-se a partir de um cartesianismo idealista e mecanicista, influenciado pela nova física e astronomia, então emergentes. Descartes elegeu a matemática como a ciência da natureza: método, física, matemática e metafísica compuseram o corpo do projeto filosófico do teórico. O filósofo acabou por afirmar um único método científico: o método racionalista-dedutivo. Dessa forma, colocou o homem dentro das possibilidades e condições do mundo natural, pois só assim ganharia a matemática uma legítima aplicação. (2010, p. 142). No geral, a educação passou a ser pensada segundo esse paradigma. Conforme Ariès, dois fenômenos marcam tipicamente a educação da época: a divisão da infância em classes de 05-07 a 10 e 11 anos e o processo de estratificação socioeducacional, o qual oferecia uma educação popular e outra burguês-aristocrática. (1981, p. 183). Subjacente aos processos pedagógicos mantinha-se ardentemente vivo o método escolástico. Embora passos significativos tenham orientado a novas experiências educacionais, a infância ainda não gozava do valor necessário à sua condição. Ariès identificou bem essa questão ao afirmar que a preocupação com a educação e formação dos jovens inspirava-se em elementos de psicologia, os quais eram encontrados principalmente na ratio dos jesuítas e na abundante literatura pedagógica de Port Royal (1981, p. 191). No âmbito da pedagogia musical destacaram-se durante a infância processos profissionalizantes que buscavam a excelência musical, a qual deveria ser adquirida mediante exaustivo estudo técnico do canto e dos instrumentos. Como registrado por Scholes: assim, elas cantam como anjos e tocam violino, flauta, órgão, oboé, violoncelo e fagote – de fato não há instrumentos, por maior que seja, que as intimide. Elas se vestem como freiras, tocam sem qualquer ajuda externa, e quarenta garotas tomam parte em cada concerto9. (apud FONTERRADA, 2008, p. 58).

A modernidade viria a possibilitar o rompimento com a tradição inatista: “A crítica empreendia pelo filósofo inglês John Loock (1632-1704) ao filósofo alemão Gotfried Leibniz (1646-1716) desempenha papel decisivo, e [...] prepara o terreno para a ruptura pedagógica”. (DALBOSCO, 2010,

p. 7). Contudo, no âmbito filosófico-pedagógico-musical, o foco do nosso interesse, “nenhum outro autor exerceu influência mais duradoura do que o pensador suíço-francês J.-J. Rousseau (1712– 1778)”. (DALBOSCO, 2010, p. 7). Sobre este nos deteremos mais à frente.

Com o atenuamento do poder da Igreja Católica e o advento da burguesia, a educação com forte tendência laica ainda era privilégio e a ela tinham acesso os que podiam pagar. Na pedagogia musical prevalecia a relação mestre e discípulo. No geral existia uma preocupação comum em toda

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a Europa voltada aos processos pedagógicos. Em relação ao ensino de música essa época viu surgir as “primeiras sistematizações do ensino de baixo cifrado por Matheson e padre Martini. E, na Inglaterra, as escolas italianas inspiraram Charles Burney (1774) a criar um Plano para uma Escola de Música [...] não reconhecido por seus contemporâneos” (SCHOLES apud FONTERRADA, 2008, p. 59). Só mais tarde floresceria o ideal de educação musical e surgiram escolas de música propriamente ditas. Para isso foi preciso acontecer o que denominamos no início do trabalho de “invenção do conceito moderno de infância”, que se deveu, precisamente, ao filósofo genebrino J.-J. Rousseau e sua obra Emílio ou Da Educação. Deter-nosemos por um momento em investigar de que maneira o teórico apresenta sua contribuição; na sequência, procuraremos investigar a pertinência da contribuição da teoria sensitiva rousseauniana aos processos educativomusicais.

2. O conceito moderno de infância: o papel de J.-J. Rousseau

Rousseau (1712-178) foi sociólogo, pedagogo, musicólogo e filósofo iluminista. Nasceu em Genebra, na Suíça. Foi um dos principais pensadores do século XVIII e é considerado o pai da pedagogia moderna. Exerceu forte influência sobre o pensamento musical de sua época ao discutir temas relacionados à linguagem e estética musical. Tornou-se leitura obrigatória no cenário musical da época: “tanto quando se compartilhava suas ideias, quando se estava contra elas, [...] de uma maneira ou de outra, tiveram que ter presente sua maneira de pensar em relação à música”. (FUBINI, 1999, p. 218-219). Também as acirradas críticas a Rameau e sua teoria harmônica o projetaram no âmbito da filosofia da música em sua época.10 Seu projeto filosófico foi responsável por inspirar a Revolução Francesa e os ideais revolucionários de Liberté, Egalité, Fraternité. “Nas décadas de 1750 e início de 1760, [...] teve seu período mais produtivo intelectualmente. Nessa [...] época [...] escreveu a obra Emílio ou da Educação, a qual ele próprio considerou como sua principal obra”. (ROMANI, 2010, p. 31). Neste trabalho será de nosso interesse a dimensão pedagógica do pensamento de Rousseau, do qual Emílio foi a expressão máxima. Para Rousseau somente pela educação o homem pode deixar seu estado de selvageria e tornar-se autônomo a ponto de exercer sobre si mesmo um domínio moral: a educação surge, portanto, como “o principal recurso de polimento da rusticidade humana”.11 (ROMANI, 2010, p. 31).

O projeto educacional rousseauniano toma como objetivo educar a criança segundo a natureza12 para que, posteriormente, ela possa ingressar na vida social. Natureza, para o genebrino, “tem sentido de origem, e aponta [...] para o conjunto de determinações internas do ser humano: os impulsos originais que governam sua conduta, e a ordenação das sucessivas etapas do desenvolvimento de suas faculdades corporais e intelectuais”. (MARQUES, 2002, p. 1). Sua concepção pedagógica está estreitamente vinculada aos ideais iluministas, cujos temas, como razão, autonomia e liberdade, passam a ser determinantes. Assim, “o projeto de uma educação natural, quando voltado à infância, visa a formação de uma criança ‘capaz de ser rainha de si mesma’”. (DALBOSCO 2007, p. 314). Isso exige de nós o entendimento de que “[...] ‘educar segundo a natureza’, para Rousseau, não é produzir um selvagem em oposição a um homem civilizado, mas acomodar o processo de aprendizagem à dinâmica própria de desenvolvimento do animal humano”. (MARQUES, 2002, p. 1). Como iluminista, o genebrino defende a potencialidade da racionalidade humana, da qual a capacidade de decidir por si mesmo (autonomia) é a expressão máxima. Daí a necessidade de se dedicar à criança um tratamento especial, uma vez que

  1. o desenvolvimento desta surge como critério fundamental para o entendimento adequado da sociedade como um todo. O cuidado com o que é peculiar à infância é determinante: afinal de contas, antes de nos tornarmos adultos, todos fomos crianças. Assim, uma educação que realmente procura romper com a pedagogia tradicional precisa mostrar o respeito necessário com o mundo infantil, o que em Rousseau incide na preocupação com
  2. o fortalecimento do corpo e com a educação dos sentidos e na permanente tensão entre as necessidades da criança e os cuidados do adulto: “[...] contra o autoritarismo pedagógico e a favor da socialização democrática, a educação natural precisa mostrar o quanto é importante que a criança seja conhecida e respeitada em seu mundo”. (DALBOSCO, 2007, p. 317). Indica Rousseau: “Amai a infância; favorecei suas brincadeiras, seus prazeres, seu amável instinto. [...] Não fabriqueis remorsos para vós mesmos retirando os poucos instantes que a natureza lhes dá.” (2004, p. 72-73). A invenção do conceito moderno de infância incide, portanto, no ideal rousseauniano

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segundo o qual o bom desenvolvimento cognitivo e moral da criança tem como condição primeira o respeito à infância, ou seja, à “meta [de] [...] tornar as crianças seres humanos, [a qual] deve começar por ensiná-las a viver, ou seja, por deixa-las viver”. (DALBOSCO, 2007, p. 321).

A condição primeira para que o desenvolvimento cognitivo e o moral se tornem possíveis é o respeito à infância; o que significa não apressar nem julgar a criança nas condições que não lhes são própria. O importante é que ela faça suas próprias provações e escolhas para, assim, reconhecer suas necessidades, podendo se tornar autônoma e responsável; do contrário, a criança estaria sendo educada pela razão, o que a tornaria um adulto em miniatura, conduzindo a que seu tempo de ser criança seja antecipado.

Cabe-nos agora realizar um processo de delimitação para que possamos chegar de forma coerente ao objetivo proposto pelo trabalho. Emílio ou da Educação possui uma estreita ligação com o Contrato social, partilhando com este a lógica geral no que diz respeito aos aspectos sistemáticos da obra. No que se trata do Segundo discurso, o qual enfatiza o conceito de liberdade como portador de subjetividade autêntica, será Emílio o responsável por aprofundá-lo ao apresentar como “[...] meta principal alicerçar tal autenticidade na liberdade moral. Portanto, sem descaracterizar a liberdade natural, Emílio vê na liberdade moral a forma de assegurar a autenticidade da ação humana”. (DALBOSCO, 2008, p. 81). Emílio feriu profundamente a concepção educacional tradicional e conservadora da época: “em 9 de julho de 1762, uma sentença do Parlamento de Paris condenava Emílio a ser rasgado e queimado, e ordenava: o chamado J.-J. Rousseau será detido e levado às prisões da Portaria do Palácio”. (LAUNAY, 2004, p. xxiv). A obra é dividida em cinco livros, os quais se ocupam em educar Emílio desde seu nascimento até seu ingresso como adulto na sociedade, o que para o teórico deve ocorrer por volta dos 25 anos. A primeira fase é denominada de infância, por sua vez dividida em primeira infância ou idade das necessidades, que vai de 0 aos 2 anos (Livro I) e segunda infância ou idade da natureza, que vai dos 2 aos 12 anos (Livro II); o terceiro livro, ou idade da força, cor-responde à fase intermediária entre infância e juventude; o quarto livro, ou idade da razão e das paixões, corresponde à juventude e vai dos 15 aos 20 anos; por fim, no quinto livro, ou idade da sabedoria, Emílio se encontra na fase adulta, que vai dos 20 aos 25 anos.

Neste trabalho será de nosso interesse a segunda infância ou idade da natureza, que vai dos 2 aos 12 anos e corresponde ao II livro. No interior do segundo livro faremos um recorte, o qual recai sobre a quinta parte, que corresponde à educação sensorial13, objeto de nossa interpretação.

3. Da pedagogia sensorial

Rousseau serve-se das seguintes palavras para abrir o momento dedicado à educação sensorial no Livro II: “As primeiras faculdades que se formam e se aperfeiçoam em nós são os sentidos. São, portanto, as primeiras faculdades que seria preciso cultivar; [no entanto], são as únicas que são esquecidas, ou mais desdenhadas.” (2004, p. 160). Em Rousseau,

o exercício dos sentidos não é confundido com o simples uso desses, mas com a exigência de aprendizado sistemático para que se possa bem julgar através dos mesmos. Assim, “exercitar os sentidos não é apenas fazer uso deles, mas aprender a bem julgar através deles [...], é aprender, por assim dizer, a sentir; pois nós não sabemos nem tocar, nem ver, nem ouvir a não ser da mesma maneira como aprendemos”. (ROUSSEAU, 2004, p. 160). Após indicar anteriormente os cuidados educativos necessários para o fortalecimento do corpo, o genebrino reivindicará, agora, a importância da existência de exercícios e cuidados que eduquem igualmente os sentidos. Nenhum educando é constituído apenas de braços e pernas: “Não temos olhos e ouvidos também? [...] Serão esses órgãos supérfluos para o uso dos primeiros?” (ROUSSEAU, 2004, p. 160). A preocupação centra-se em indicar a necessidade de que a potencialidade dos sentidos seja aproveitada ao máximo: “tirai de cada um deles todo o partido possível, e depois verificai a impressão de um pelo outro: medi, contai, pesai, comparai”. (ROUSSEAU, 2004, p. 160). Esforços supérfluos e insuficientes em nada contribuem à criança. Portanto, tornar uma criança sensata requer a capacidade de previsão de seus movimentos e ações e, consequentemente, a faculdade de correção de seus próprios erros por meio da experiência, o que nas palavras de Rousseau significa agir de maneira “[...] que o cálculo do efeito preceda o emprego dos meios”. (2004, p. 161). Dedique-mo-nos por um instante a investigar o tratamento dado pelo genebrino à pedagogia sensorial.

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3.1 O sentido do tato

O tato é o sentido que está sempre alerta. Espalhado por todo o corpo atua como uma sentinela e nos adverte contra tudo que o põe em risco. O fato de estar em exercício contínuo torna-o nossa experiência primeira. Isso gera certa comodidade, a qual transparece na forte tendência que temos a dispensar a necessidade de aguçá-lo. Para se opor a tal comodidade, Rousseau serve-se da figura dos cegos, os quais, por não se orientarem pela visão, tendem a ter um tato mais fino e seguro: “são forçados a aprender a tirar unicamente do primeiro sentido os juízos que a visão fornece”. (ROUSSEAU, 2004, p. 161). Existe aqui uma preocupação com o atrofiamento do tato e a supervalorização de apenas um dos sentidos. O que intriga o genebrino é o fato de podermos também educar o tato como cegos. Temos sempre dias e noites, mas a luz artificial nem sempre nos acompanhará. Assim, optar pela educação sensorial, no caso específico o tato, incide no entendimento da máxima rousseauniana: “prefiro que Emílio tenha os olhos na ponta dos dedos a que os tenha na loja de um vendedor de velas”. (2004, p. 161). Existem observações que só podem ser feitas à noite, por exigirem acurada percepção, a qual durante o dia impossibilitam-se pelas distrações que a visão oferece. Muitos conhecimentos que julgamos conhecer apenas visualmente podem ser adquiridos pelo tato. Mas como isso é possível? Rousseau lança mão de várias imagens para ilustrar possiblidades. Quando estamos fechados numa casa durante a noite, numa movimentação concentrada, podemos nos guiar às saídas pelas correntes de ar. Da mesma forma, a direção e velocidade com que navega um barco durante a noite podem ser observadas pelo ar que nos toca o rosto.

As brincadeiras à noite adquirem significativo sentido pedagógico. Existem, naturalmente, medos em relação à noite. Mas a que se deve isso? Rousseau será pontual: “a ignorância das coisas que nos rodeiam e do que se passa ao nosso redor”. (2004, p. 162). A experiência pessoal narrada pelo filósofo, a qual remonta a seu internato na casa do ministro sr. Lambercier busca corroborar a ideia de que a ludicidade surge como elemento pedagógico determinante quando se pretende aguçar os sentidos sem provocar traumas psicológicos. Tal experiência remonta ao intencional pedido do sr. Lambercier ao destemido Rousseau de que fosse ao templo durante a noite e lhe trouxesse a Bíblia, que se encontrava na cátedra. Em resumo, o jovem Rousseau fracassou na primeira vez por medo da escuridão; somente ao ouvir as gargalhadas dos demais reencontrou a coragem para voltar ao templo e apanhar a Bíblia. Rousseau não indica a experiência como modelo a ser seguido, mas ressalta que a descontração expressa pelos demais que o esperavam lhe deu um novo impulso. Daí sua seu apelo aos jogos noturnos, e à organização de gincanas grupais com as crianças. Trata-se de sua defesa de “[...] pés habituados a se firmar [...] e mãos treinadas para se aplicarem com facilidade a todos os corpos circunstantes [...]”. (ROUSSEAU, 2004, p. 168). Para tanto, é preciso que os juízos táteis superem a grosseria e imperfeição, o que na maior parte das vezes acontece pela constante mistura que fazemos dele com a visão. Nos o atrofiamos e esquecemos que os juízos do tato são sempre mais seguros que os da visão; eles estão limitados a nos apresentar apenas o que nossas mãos podem tocar: “[...] retificam os destinos dos outros sentidos, que se atiram ao longe sobre objetos que mal percebem”. (ROUSSEAU, 2004, p. 169). De emprego frequente, o tato assegura de imediato o conhecimento necessário à nossa conservação.

Para o genebrino, o tato educado adequadamente pode suprir a visão e, até certo ponto, a audição, e justifica sua posição ao considerar que os “[...] sons provocam nos corpos sonoros abalos sensíveis ao tato [...]”. (ROUSSEAU, 2004, p. 169-170). O filósofo se servirá de vários exemplos envolvendo a música. Ao citar o violoncelo, por exemplo, Rousseau quer mostrar que, ao se pôr a mão sobre a superfície corpórea do instrumento, faz-se possível, sem o auxílio dos olhos ou ouvidos, mas com a vibração da madeira, identificarmos [...] “se o som que ele produz é grave o agudo, se é tirado das cordas graves ou agudas” [...]. (ROUSSEAU, 2004, p. 170). E vai além

o extremado Rousseau: “se exercitarmos os sentidos para essas diferenças, não tenho dúvida de que com o tempo poderemos tornar-nos tão sensíveis a ponto de conseguirmos ouvir uma ária inteira com os dedos”. (2004, p. 170). Existem exercícios que enfraquecem o sentido do tato, os quais, devemos evitar a qualquer custo: Os exercícios que realmente nos auxiliarão serão os que primam pela leveza e frequência. O uso dos instrumentos musicais é essencial para o aguçamento do tato em busca da identificação de diferenças sensíveis. Assim, “[...] o toque duro e contundente do violoncelo, do contrabaixo, do próprio violino, ao tornar mais flexíveis os dedos, endurece as suas extremidades. O toque liso e polido do cravo torna-os também flexíveis e mais sensíveis ao mesmo tempo. Nisto, portanto, o cravo é

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preferível.” (ROUSSEAU, 2004, p. 170). Rousseau encerará o estudo sobre

o tato indicando o quanto é importante que a pele se tornar resistente às impressões do ar, com as imagens de Emílio de pés descalços e as críticas a Marcel, célebre professor de dança em paris, o que culminará com ideia geral sobre a necessidade de aguçamento do sentido do tato.

3.2 O sentido da visão

A visão difere do tato por concentrar suas operações para além do próprio homem. Esse talvez seja um central motivo para tornar tais operações enganadoras. Basta observarmos o alcance da visão ao mirar o horizonte: numa simples passada colhemos detalhes amplos de toda a paisagem. Nesse sentido, “[...] a visão é de todos os [...] sentidos o mais falível, exatamente porque é o mais extenso: [...] suas operações são rápidas e amplas [...]” (ROUSSEAU, 2004, p. 172). Contudo, Rousseau lembrará que as falsas aparências e as ilusões da perspectiva são necessárias para o processo de conhecimento das extensões: as gradações de tamanho e luz são essenciais para a avaliação das distâncias. O exemplo das árvores em distâncias desiguais servirá para justificar a ideia do genebrino, segundo a qual o julgamento sobre o tamanho e a distância dos objetos realizado pelo sentido da visão possui apenas uma medida: “[...] a abertura do ângulo que eles produzem em nosso olho, e como esta abertura é um efeito simples de uma causa composta, o juízo que ela produz em nós deixa cada causa particular indeterminada ou se torna necessariamente errônea” (ROUSSEAU, 2004,

p. 173). Então: como estabelecer o correto julgamento com a visão? Rousseau indica um método, o qual se fará possível na constante relação entre o tato e a visão. Diante da imprecisão da visão, faz-se necessário a verificação do observado por meio da experiência tátil. Para o filósofo nós tendemos comumente a dispor de frágil exatidão no golpe de vista. Mas o que permite aos engenheiros, agrimensores, arquitetos, pedreiros e pintores um golpe de vista mais seguro? Certamente, a experiência que surge do emprego do sentido: “[...] eles suprimem o equívoco do ângulo pelas aparências que

o acompanham, e determinam com maior exatidão a relação das duas causas desse ângulo”. (ROUSSEAU, 2004, p. 173). Mas como essa experiência pode contribuir com a educação de Emílio? Para Rousseau existem manei-ras diversas de despertar na criança o interesse pelas experiências como medir, conhecer e avaliar distâncias. Tudo vai depender da criatividade do preceptor. Daí o genebrino se ocupou em descrever atividades diversas e instigantes, tais como colher cerejas em cerejeiras altas, a travessia do riacho largo, a organização das pranchas do pátio, o cumprimento necessário da linha para se pescar no fosso do castelo, a corda adequada para se colocar o balanço entre duas árvores, a dúvida sobre a medida do quarto da nova casa, a decisão sobre em qual aldeia se poderá chegar primeiro para o jantar. A final de contas, “tudo o que dá movimento ao corpo sem o forçar é sempre fácil de obter das crianças” (ROUSSEAU, 2004, p. 173) resta-nos, como educadores, explorar as possibilidades.

Daí o interesse em descrever a experiência educativa do menino indolente e preguiçoso, o qual não apresentava nenhum interesse por exercícios. Foi ao longo de demorados passeios e do uso de vários doces como prêmio aos vencedores das corridas que o preceptor conseguiu fazer o indolente jovem despertar para a ideia de que correr e se exercitar poderia ser algo bom. Os treinos, as corridas nos campos, o contato com os obstáculos, as saídas encontradas para superar distâncias, enfim, a vivacidade da infância contribuíram para o aprimoramento da relação dialética entre tato e visão. Com tempo e entre erros e acertos, em um só golpe de vista, o antes preguiçoso e indolente jovem passou a observar o mundo “quase tão certeiramente quanto um agrimensor”. (ROUSSEAU, 2004, p. 177). Essa experiência se legitima pelo fato de a visão, em relação aos outros sentidos, ser a que mais se liga aos juízos do espírito. No entanto, educar a visão exige tempo e trabalho sistemático: “[...] é preciso ter comparado durante muito tempo a visão com o tato para [habituá-la] [...] a nos fazer um relato fiel das figuras e das distâncias”. (ROUSSEAU, 2004, p. 177). Até mesmo os olhos mais aguçados do mundo seriam incapazes de nos oferecer uma sensata ideia de extensão sem a experiência do tato e do movimento progressivo.

Aprender a bem julgar com os olhos a grandeza dos corpos e sua extensão exige o conhecimento das figuras e, consequentemente, de sua imitação. A imitação aproximará Emílio das leis da perspectiva, a qual não pode ser deixada de lado quando se pretende avaliar extensões. Algumas vantagens podem ser tiradas aqui, pois, segundo Rousseau, “as crianças são grandes imitadoras” (2004, p. 178). Daí o interesse rousseauniano em descrever o sentido pedagógico do ato de desenhar, o qual deveria sempre

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evitar imitação da imitação. Para que se explore uma pedagogia do desenho a principal mestra deverá ser a natureza e, como modelos originais, os próprios objetos. Emílio certamente levará muito tempo até adquirir a leveza e elegância dos desenhistas; contudo, quando o fizer, será em um golpe de vista, com mãos leves e o conhecimento sensato das relações de grandeza e de figuras existentes no universo. Rousseau chegará, então, ao problema da geometria. Se a geometria geralmente é posta fora do alcance das crianças, talvez isso se deva ao método de ensino. Não nos atinamos para o fato de que o método das crianças não é igual ao do adulto: “o que para nós é a arte de raciocinar deve ser para elas apenas a arte de ver”. (ROUSSEAU, 2004, p. 181). Assim, também o ensino da geometria deveria ser trabalhada para além da formalidade do compasso e da régua, e pautar-se na discussão sobre o que se fez, o que se pretendeu e que será feito.

Em seguida são destacados os jogos. Muitos jogos adultos, quando adaptados, poderiam ser também praticados por crianças. Rousseau cita a peteca, o pião, a péla, a malha, o bilhar, o arco, a bola, os instrumentos musicais. O sentido pedagógico dos jogos e da prática instrumental reside na exatidão proporcionada aos olhos, nas noções de movimento, distância, manipulações e sensibilidades táteis adquiridas. Rousseau cita exemplos extremos que, mal interpretados, sugerem uma contradição em relação ao que foi defendido até o momento. O filósofo se retratará ao final dos exemplos. Aqui optamos por apresentar sua retratação antes de adentrar os exemplos. Rousseau dirá: “dir-me-ão que caio aqui, com relação ao corpo no erro da cultura prematura, que censuro nas crianças o que diz respeito ao espírito”. (2004, p. 185). O filósofo quer mostrar que ao citar exemplos extremados de habilidades não significa que devamos fazer o mesmo, mas que apenas saibamos das infinitas capacidades que as crianças possuem. Contudo, vale lembrar que as experiências descritas para realmente educar a crianças, ao invés de as adestrar, devem ser conduzidas como “[...] brincadeiras, direção fácil e voluntária dos movimentos que a natureza lhes requer, arte de variar suas diversões para torna-las mais agradáveis, sem que jamais o menor constrangimento as transforme em trabalho [...]”. (ROUSSEAU, 2004, p. 185). Mas quais os exemplos citados? O genebrino serviu-se da imagem das crianças que comumente podiam ser vistas nas feiras de sua época fazendo equilibrismo, usando as mãos para andar e saltando e dançando sobre corda. Cita os grupos de crianças que atraíam a atenção dos espectadores da Comédia Italiana, as quais impressionavam pela desenvoltura, pelo ouvido e movimentos de dançarinos já formados. Rousseau apontará como exemplo uma pequena inglesa que encantou Paris ao fazer prodígios no cravo. Lembra ainda Mozart: “o menino de sete anos [que depois disso] fez outros ainda mais espantosos”. (ROUSSEAU, 2004, p. 185). Testemunha o genebrino sobre o observado na casa de um magistrado: “[...] vi seu filho [...] de oito anos, [...] colocado sobre a mesa após o jantar, como uma estátua em meio aos pratos, tocar um violino quase tão grande quanto ele e surpreender com sua execução os próprios artista” (2004, p. 185). Os exemplos são usados pelo teórico para pôr abaixo a incompetência que se supunha nas crianças, não para afirmar os exemplos como modelos. Caso contrário, Rousseau estaria defendendo a cultura prematura em relação ao corpo. O que realmente indica o filósofo é para este momento é que as crianças “[...] divirtam-se sem inconvenientes [uma vez que] o progresso em todas as coisas não importa agora [...]” (ROUSSEAU, 2004, p. 185).

3.3 O sentido da audição

Rousseau acredita que o tato e a visão são os sentidos de uso mais contínuo; por isso, é preciso mais tempo para explorá-los. Assim, muito do que foi dito sobre estes dois pode ser tomado como diretriz para o exercício dos demais sentidos. Se observarmos veremos que os sentidos do tato e da visão aplicam-se igualmente à realidade, esteja ela em repouso ou em movimento, ao passo que o sentido da audição possui certa peculiaridade: apenas a movimentação do ar pode provocá-lo. Sons são produzidos apenas por corpos em movimento, posto que, “[...] se tudo estivesse em repouso, jamais ouviríamos nada”. (ROUSSEAU, 2004, p. 186). Ouvidos atentos favorecem o julgamento das sensações que atingem o nosso corpo, fazendo-nos perceber sua origem e dimensão, distância e proximidade e a intensidade da agitação que os criou. A movimentação do ar gera repercussões diversas e precisamos nos educar para acompanhá-las. Assim como mantida a relação entre visão e tato anteriormente, será necessário agora que se mantenham em constante relação visão e audição. Esse é o caminho apresentado pelo filósofo para se explorar o potencial educativo da audição. Daí seu interesse em citar o exemplo no qual, ao nos encontramos em um vale,

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  1. o ato de encostar a orelha no chão torna possível ouvir a voz dos homens e os passos dos cavalos com uma distância muito maior do que se esperássemos para vê-los em pé; bem como a diferença entre ver o fogo de um canhão e ouvir o seu barulho, e a avaliação sobre distância da queda de um raio, orientados pelo intervalo de tempo entre o relâmpago e o trovão. Dirá
  2. o genebrino: “fazei com que a criança conheça todas essas experiências, com que faça as que estão ao seu alcance e descubra as outras por indução [...].” (2004, p. 186).

Rousseau indica, após esses exemplos, a correspondência existente entre audição e voz, e a necessidade de que se exercitem os dois em constante contato. Para esclarecer essa questão são apresentados os três tipos de vozes que possui o homem adulto: a voz falante ou articulada, a voz cantante ou melodiosa, a voz patética ou acentuada. Também a criança tem esses três tipos de voz, contudo não sabe combiná-las, ou articulá-las de maneira igual: “ela como nós tem o riso, os gritos, as queixas, a exclamação, os gemidos, mas não sabe misturar suas inflexões [...]” (ROUSSEAU, 2004,

p. 187) de modo a se servir das três vozes: Rousseau encontrará na música a possibilidade de correta relação entre essas três vozes. Para o filósofo, “uma música perfeita é aquela que reúne da melhor forma essas três vozes”. (ROUSSEAU, 2004, p. 187). É importante ressaltar que as crianças são ainda incapazes para a música perfeita; portanto, estas ser educadas dentro de suas condições para no futuro terem plenas condições. Sua imaturidade pode ser notada ainda na voz falante, na qual sua linguagem carece de acentos. Elas gritam e podem até discursar, mas com pouco acento e energia limitada. Por isso a recusa rousseauniana ao que era prática comum nos escolas de sua época: os papéis impostos às crianças em tragédias e comédias e a insistência em ensiná-los a recitar ou declamar. Ainda não é tempo para isso: as crianças precisam de experiência prévia e criativa para, só futuramente, se tornarem capazes de dar tom às suas expressões. É preferível que elas sejam ensinadas a “[...] falar uniformemente, claramente, a articular bem, a pronunciar exatamente e sem afetação, a conhecer e respeitar o acento gramatical e a prosódia, [...] mas nunca mais do que o devido [...]”. (ROUSSEAU, 2004, p. 187).

Rousseau segue falando sobre o canto. No que diz respeito ao canto, “[...] tornai sua voz justa, regular, flexível e sonora, seu ouvido sensível à medida e à harmonia, mas nada mais”. (ROUSSEAU, 2004, p. 187). A criança necessita de uma experiência musical que corresponda à sua idade; portanto, a música imitativa e teatral não se adequa à idade à qual se destina o Livro II. A prática com o canto nesse período pode até mesmo abrir mão das palavras; assim, quando se pretende cantar com crianças, deve-se procurar “[...] fazer-lhe canções para isso, interessantes para a sua idade e tão simples quanto suas ideias”. (ROUSSEAU, 2004, p. 187). A experiência lúdica com a música deve anteceder a leitura musical, pois, é cedo demais para fixar a atenção das crianças em sinais convencionais. Rousseau reconhece a dificuldade que o ensino da música apresenta, principalmente quando se propõe prorrogar o contato com a notação musical. Tendo em vista essa questão, o genebrino se dedica a apresentar vários passos que podem ser seguidos para que o ato de ouvir e experienciar o canto preceda o ato de leitura do mesmo: a fidelidade com que o canto se revela aos ouvidos é sempre muito maior do que quando se revela aos olhos.

O filósofo quer mostrar que o aprendizado musical adequado não deve se concentrar em absoluto, no princípio da execução: também o ato de compor é determinante, estando um relacionado com o outro, e a tensão constante entre os dois é imprescindível para o aprendizado geral da música. Daí a orientação rousseauniana sobre o ensino musical: “exercitai vosso pequeno músico primeiro a fazer frases bem regulares, bem cadenciadas; em seguida, a ligá-las através de uma modulação bem simples, e enfim, a marcar suas diferentes relações com uma pontuação correta [...] através de uma boa escolha das cadências e pausas” (ROUSSEAU, 2004, p. 188). É preciso que sejam evitados cantos bizarros, patéticos ou expressivos em demasia. É indicado, portanto, um cuidado pedagógico-musical acurado. Deve-se sempre primar por “uma melodia [...] cantante e simples, [...] derivada das cordas essenciais do tom e sempre indicar de tal forma o baixo [para] que ele o sinta e o acompanhe sem dificuldades; pois para desenvolver a voz e o ouvido, ele só deve cantar ao cravo”. (ROUSSEAU, 2004, p. 188). Essa ideia geral instigará o genebrino a discutir a prática do solfejo em sua época, o que culminará com a crítica ao método de solfejar ao natural adotado pelos músicos franceses que gozavam de prestígio na época.

Na verdade, para se gravar os sons é natural que os exercícios de solfejos adotem sílabas. Da mesma forma, a distinção dos graus exigirá nomes específicos: “[...] daí os nomes dos intervalos e também as letras do alfabeto com que se indicam as teclas do teclado e as notas da gama”.

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(ROUSSEAU, 2004, p. 188). O aprendizado musical exige, portanto, a interiorização e o conhecimento de termos permanentes comuns ao sistema musical, ou seja, a percepção de que “dó é invariavelmente a tônica de um modo maior, ou a mediante de um modo menor [e que] lá é invariavelmente a tônica de um modo menor, ou a sexta nota de um modo maior”. (ROUSSEAU, 2004, p. 188). Rousseau acusará os músicos franceses de dificultarem em larga escala a prática do solfejo, não oferecendo ideias claras ao espírito. Isso está presente no questionamento rousseauniano dirigido às causas que forçam a França, o país onde se escrevem os mais belos livros de música, a ensinar música servindo-se de métodos tão difíceis. Será defendida pelo genebrino uma prática mais simples e clara. A orientação para o uso de apenas dois modos nos quais as relações sejam sempre as mesmas e sempre indicadas pela mesma sílaba é um exemplo claro dos interesses rousseaunianos no que diz respeito à educação musical. Dessa forma, “quer cantando, quer tocando um instrumento, que ele saiba estabelecer seu modo em cada um dos doze tons que lhe podem servir de base [...]”. (ROUSSEAU, 2004, p. 189).

Ao partir de uma prática simples a criança tenderá, com o tempo, a assimilar as relações mais complexas que a teoria musical exige. Assim, “[...] as relações essenciais do modo para cantar e tocar estarão sempre presentes em seu espírito, sua execução será mais clara e seu progresso mais rápido”. (ROUSSEAU, 2004, p. 189). Precisamos oferecer à criança a possibilidade de uma experiência musical que não as afaste dos eventos musicais como são em sua natureza, o que geralmente acontece quando se ensina música servindo-se de métodos artificias. Contudo, esse processo educativo da audição por meio da música tem uma exigência clara em Rousseau: a importância da ludicidade no trato pedagógico com a música. Dirá filósofo: “[...] quanto à música; ensinai-a como quiserdes, contanto que sempre seja uma diversão [para seu aluno]”. (2004, p. 189).

Ao chegar ao sentido da audição, Rousseau teve como objetivo nos deixar informados e conscientes do estado dos corpos estranhos ao nosso. Por isso sua atenção pedagógica a dimensões como o peso, a figura, cor, solidez, grandeza, distância, temperatura, repouso e movimento. Tais noções, após um processo pedagógico de experimentação, permitirão à criança uma perspicaz atenção e entendimento sobre seu próprio corpo e sobre

o que convém à sua formação em sentido lato.

3.4 O sentido do paladar

Não há como negar que “a gulodice é a paixão da infância”. (ROUSSEAU, 2004, p. 193). Esse, por si só, é o motivo fundamental para se pensar a educação do sentido do paladar. Nunca é demais, quando se pretende formar uma pessoa autônoma, investigar de forma sensata, “[...] através do que agrada ao nosso paladar, sobre o que convém ao estômago”. (ROUSSEAU, 2004, p. 190). A defesa do filósofo em relação ao que convém ao paladar relaciona-se diretamente à tese geral segundo a qual o afastamento da natureza e o contato com a vida superficial que a sociedade oferece são os motivos centrais para a formação de pessoas corruptas e sem autonomia. Quanto à alimentação, transparece a tese segundo a qual, “quanto mais nos afastamos do estado de natureza, mais perdemos de nossos gostos naturais, [e, no contato com a vida artificial que a sociedade oferece] o hábito forma para nós uma segunda natureza, que substituímos de tal modo à primeira [...]”. (ROUSSEAU, 2004, p. 190). Os gostos naturais são sempre os mais simples. Precisamos, portanto, favorecer às crianças os gostos simples, os quais, ao serem aguçados, assumem formas imutáveis de gostos. Para justificar a ideia de que é possível a criação de um hábito alimentar, Rousseau usará as imagens do estrangeiro, que é sempre desafiado a se acostumar aos sabores de outros países; do leite como alimento primeiro, do hábito necessário para que se passe a apreciar o vinho ou até mesmo para a recusa deste.

É defendido nesse contexto o gosto mais primitivo possível: “[...] quanto mais [...] simples, mais eles são universais”. (ROUSSEAU, 2004, p. 191). Daí a importância de que o paladar de Emílio seja habituado a comidas comuns e simples, a sabores pouco picantes, pois para esta idade não há nenhuma necessidade de que a criança forme para si gostos exclusivos. O gosto oferece sensações que nos afetam significativamente e sua atividade tem um caráter puramente físico e material, pouco tendo a dizer à imaginação. Mas sendo a gulodice a paixão da infância, o que precisamos ter como objetivo ao educar? Rousseau usará como exemplo sua investigação sobre adultos que davam importância aos bons pratos. Será com a frase retirada das Epístolas de Horácio que resumirá tal comportamento: fruges consumere nati – “nascidos para consumir os frutos da terra”. A gulodice torna-se um vício irrefreável, e os presos a esse vício são “[...] pretensos

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homens, [os quais] não passam de crianças de quarenta anos, sem vigor e sem consistência”. (ROUSSEAU, 2004, p. 193). É assim que devem ser nossas crianças? Emílio não deverá seguir esse caminho. Contudo, não se deve perder de vista a importância que adquire a alimentação no desenvolvimento físico da criança.

Os exemplos apresentados pelo filósofo sobre a criança de Maiorca, a qual retira a golpes de funda do alto de uma árvore um cesto de comida e dele tira proveito, e o jovem espartano, que desafia os golpes de chicote ao roubar sutilmente uma cozinha, apresentam outra questão. Embora nos pareça justo que tanto o espartano como a criança de Maiorca tenham direitos sobre o que foi fruto do seu esforço, Rousseau alertará para a necessidade de não se encarar a comida como recompensa. Para que seja exercitado o apetite das crianças não se deve exercitar juntamente sua sensualidade, mas simplesmente satisfazê-la. A comida não deve se tornar um problema em torno do qual a criança deve concentrar suas energias. Nós precisamos apenas satisfazê-la, e isso será possível pelas coisas mais comuns e naturais sem que se estrague seu paladar. Rousseau se ocupará ainda em discutir o gosto da carne como algo não natural, citando a abstinência de Pitágoras em relação a carnes, o apoio de Plutarco a essa atitude, e encontrando nas reações de repugnância das próprias crianças a esse alimento sua principal justificativa. Rousseau acredita que o apetite de uma criança só se tornará desmedido à medida que o educarmos em desacordo com as regras da natureza. Contudo, conclui o genebrino: “[...] qualquer que seja o regime que deis às crianças, contanto que as habitueis só a pratos comuns e simples, deixai-as comer, correr e brincar o quanto quiserem, e tende certeza de que nunca comerão demais ou terão indigestões” (ROUSSEAU, 2004, p. 198).

3.5 O sentido do olfato

O olfato tara-se do sentido que está para o paladar assim como a visão para o tato. Em constante vigilância o olfato ocupa-se em advertir o paladar das condições das substâncias e da maneira como estas poderão afetá-lo. Conforme as informações pré-oferecidas pelo olfato ao paladar, este estabelecerá os critérios de aceite ou repugnância. Rousseau, portanto, levantará um problema, o qual consiste na ideia de que os cheiros causam impressões sobre a imaginação e acabam por afetar as crianças tanto pelo que oferecem quanto pelas expectativas que causam. O olfato é, por sua vez, “[...] o sentido da imaginação” (ROUSSEAU, 2004, p. 200), o qual, ao oferecer aos nervos um forte tom, agita substancialmente o cérebro. Para o filósofo, “[...] o olfato não deve ser muito ativo na infância, quando a imaginação [...] é pouco suscetível de emoção e quando não se tem ainda experiência suficiente para prever com um sentido o que outro nos promete”. (2004, p. 200). Rousseau supõe certa obtusidade em relação a esse sentido, não a ponto de negá-los nas crianças, mas no sentido de uma não existência de associações simultâneas de outras ideias.

A imagem dos nativos canadenses, os quais, por tornarem seu olfato tão sutil, dispensam a ajuda dos cães durante as caças, é usada para justificar essa ideia geral. Rousseau julga realmente possível que se eduque o olfato até esse ponto. Contudo, com as crianças não se deve tomar esse exemplo como objetivo a ser alcançado; a estas basta que esse sentido as ajude a conhecer sua relação com o paladar. Basta olharmos a lógica da natureza, que nos forçou a conhecer essa relação: “ela tornou a ação deste último sentido quase que inseparável da ação do outro, tornando seus órgãos vizinhos e colocando a boca numa comunicação imediata entre os dois [...]”. (ROUSSEAU, 2004, p. 201). Estamos naturalmente determinados a cheirar tudo o que saboreamos. Portanto, indica Rousseau em relação ao sentido do olfato: “gostaria apenas que não se alterassem essas relações naturais [...]”. (2004, p. 201).

3.6 O sexto sentido: razão humana ou intelectual

Rousseau acrescenta ao final de sua teoria sobre os sentidos o que denomina de “sexto sentido”, o qual é comum a todos os homens e resulta, sobretudo, “[...] do uso bem regrado de todos os sentidos, e por nos instruir a respeito da natureza das coisas com o auxilio de todas as suas aparências”. (ROUSSEAU, 2004, p. 201). Tal sentido não corresponde a um órgão em particular; “[...] reside apenas no cérebro, e suas sensações, puramente internas, chamam-se percepções ou ideias”. (ROUSSEAU, 2004, p. 201202). Todo o conhecimento que possuímos, como também sua nitidez, é

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medido pelas ideias, percepções e impressões que guardamos na mente. Tudo isso, portanto, é resultado da experiência sensorial adquirida, a qual até agora o genebrino fez questão de investigar sistematicamente. Caso perguntemos sobre de que nos serve uma educação sensorial bem regrada, responderia Rousseau: é ela a responsável pela totalidade de nosso conhecimento e de sua validade, uma vez que cumprem os sentidos papel determinante em nossa maneira como o adquirimos. Assim, o que o genebrino denominou “[...] razão sensitiva ou pueril consiste em formar ideias simples com o auxílio de várias sensações, [por conseguinte], o que denomina razão intelectual ou humana consiste em formar ideias complexas com o auxílio de várias ideias simples”. (2004, p. 202).

A teoria sensitiva no contexto geral do Emílio trabalha com o pressuposto segundo o qual cada idade e estado de vida possuem uma perfeição conveniente e um tipo de maturidade que lhes são próprios. Assim, a preocupação pedagógica acurada com os sentidos nessa faixa etária conjectura uma “[...] criança sadia, forte, bem formada para a idade, [...] animada, sem preocupações, [...] inteiramente entregue a seu ser atual, gozando de uma plenitude de vida”. (ROUSSEAU, 2004, p. 203). Adquirida essa condição, poder-se-ão buscar, posteriormente, resultados ligados ao exercício dos juízos que engrandecem o espírito, os quais em crianças educadas segunde esse método serão cada vez mais frutíferos.

Após esse esforço reconstrutivo concentrado, cabe-nos perguntar:

o que significa pensar educação musical com base no conceito rousseauniano de infância e, mais especificamente de sua teoria educativa dos sentidos? De que forma contribuiu e poderá contribuir para se pensar processos educativo-musicais na contemporaneidade? Nosso próximo passo será concentrar-nos em discutir essas questões.

4. Rousseau e a pedagogia musical

O conceito moderno de infância tal como foi cunhado por Rousseau ofereceu “[...] contribuições detalhadas sobre problemas relacionados ao mundo da criança, [...] seu processo de socialização [...]” (DALBOSCO, 2007, p. 320) e aprendizagem. A proposta de uma educação pelos sentidos desenvolvida pelo teórico e as orientações dirigidas à experiên-cia pedagógica com a música conferem-lhe a posição de primeiro pensador da educação a conjecturar um esquema pedagógico voltado diretamente para a educação musical. A pedagogia musical rousseauniana, que toma como base a experiência lúdica corpóreo-sensitiva, rompeu com a pedagogia musical escolástica e o conceito de infância vigentes até seu século. Tratou-se de um marco histórico-educacional por se retirar da pedagogia em sentido lato e, consequentemente, da pedagogia musical a indiferença à infância e, precisamente, a ideia de criança como um adulto em miniatura, a qual em última instância reivindicou para o ensino de música a excelência no aprendizado musical durante a infância. Daí surgiu o chão fecundo para a prática musical adentrar na escola. Pestalozzi (1746-1827), Friedrich Herbart (1776-1841) e Froebel (1782-1852) surgem logo após Rousseau como os grandes herdeiros do impulso rousseauniano e o fazem viver no cotidiano escolar, principalmente no que diz respeito à pedagogia musical.

Quando Rousseau tematizou o ensino de música como parte de sua pedagogia sensorial, orientou-nos necessariamente a pensar sobre uma questão crucial para a área dos fundamentos da educação musical na contemporaneidade: o diálogo entre filosofia e pedagogia musical14, tanto quando se pensa em discutir os obstáculos, como a necessidade de tal diálogo. Isso nos leva diretamente à crescente tendência de nossa época de valorizar as didáticas específicas em música e limitar o espaço da área dos fundamentos da educação musical. Isso acontece por motivos diversos, mas no geral se destaca “[...] o enfraquecimento da perspectiva filosófica em nome de uma tecnicização da educação [...]” (DALBOSCO, 2010, p. 2). É verdade que esse processo não se dá de forma tão simplória. Se lançarmos um olhar sobre a história da pós-graduação stricto sensu no Brasil e o significativo impulso da década de 1970 do século passado15, podemos encontrar motivos diversos para discutir tal relação, dentre os quais “[...] a especialização crescente da Filosofia e uma empirização preocupante da Pedagogia [Musical]” (DALBOSCO, 2010, p. 3). Retomar o diálogo entre a pedagogia musical e a filosofia e contribuir de forma produtiva para a área dos fundamentos da educação musical exige, portanto, a superação do ideal de filosofia como prima ciência, o qual por muito tempo primou pela análise estrutural dos textos, argumentos e conceitos filosóficos e, por outro lado, de tendências técnico-didáticas em educação musical.

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Somente a consciência interdisciplinar poderá, assim como o fez Rousseau, nos ajudar a pensar a educação musical como campo genuíno de reflexão filosófica. Assim, a pedagogia musical, para além de um preparo técnico-didático, pode pôr em questão dúvidas epistemológicas sobre os processos de aprendizagem que perpassam as duas áreas. O empreendimento rousseauniano indica que as preocupações do pedagogo musical estão estreitamente relacionadas com preocupações de cunho filosófico. Ora, quando pensou um esquema educativo sensorial e, especificamente, numa didática musical, Rousseau investiu contra problemas filosófico-sociológicos de extrema grandeza, relacionados à educabilidade e à formação humana. Portanto, a filosofia da educação musical vê-se desafiada a se manter atenta aos problemas centrais da aprendizagem. Contudo, tal atenção precisa criticar tendências filosóficas “[...] prisioneiras, epistemologicamente, da perspectiva representacional, [a qual, acaba] concebendo, também dicotômica e polarizante, a relação pedagógica entre adulto e criança, professor e aluno”. (DALBOSCO, 2010, p. 7). Lançar mão do conceito rousseauniano de infância orienta-nos à despolarização da relação pedagógica professor e aluno, estabelecendo uma relação dinâmica, na qual as duas partes se apresentam mutuamente capazes de aprender e ensinar. Daí emerge o potencial pedagógico criativo da música, a qual, por meio da experiência sensível didaticamente explorada, favorece ao educando um aprendizado consistente.

Rousseau permite-nos dialogar com os significativos avanços conquistados no campo das teorias da aprendizagem. Afinal de contas, subjacente a seu projeto educativo-sensorial, reside a pergunta sobre como se dá o conhecimento humano, como se processa e com devemos favorecêlo. São perguntas que serviram como ponto de partida para as pesquisas oriundas da epistemologia genética piagetiana, neopiagetiana e as preocupações relativas à psicologia da aprendizagem daí decorrentes. A preocupação rousseauniana com a educação musical e dos sentidos incide, portanto, na constante necessidade de se conhecer o desenvolvimento cognitivo e moral da criança, do adolescente e do jovem a partir da experiência musical didaticamente orientada. Tudo isso questiona, decisivamente, a noção de criança como ser pronto e acabado, que a educação musical tradicional-racionalista imprimiu historicamente nas práticas de ensino em música. Ao superar a tendência inatista, a pedagogia musical rousseauniana possibilitou-nos discutir noções de estruturas que se formam a partir da experiência musical, as quais, em última instância, direcionam nossas preocupações para a estrutura mental do ser humano, e a levarmos em conta a noção de organismo agente, o qual, por meio dos sentidos e da linguagem, interage constantemente com mundo musical circundante e é determinante para o desenvolvimento da capacidade racional em sentido lato.16

Se tomarmos a pedagogia músico-sensorial de Rousseau como referência, incorporamos necessariamente a ideia de gênese do conhecimento. Para a pedagogia musical essa ideia adquire importância tremenda. Ora, é possível pensar processos educativos musicais em nossa época sem levarmos em conta a experiência musical prévia dos educandos, ou mesmo sem favorecê-la a todo custo? Processos didático-musicais precisam, necessariamente, considerar um ideal de vivência ou experiência musical, o qual deve carregar consigo a noção de gênese e superação do mentalismo. Rousseau possibilitou uma ruptura epistemológica-educacional, a qual nos provoca a pensar sobre as significativas mudanças dos processos de ensino e aprendizagem em música. Assim, pensar processos educativos musicais passou a exigir a consciência de que “[...] não é suficiente partir do sujeito já formado, [...] em plenas condições de formular juízos, mas [...] de entender e estimular pedagogicamente o processo que o capacita progressivamente a ser um sujeito judicativo”. (DALBOSCO, 2010, p. 9). Do ponto de vista pedagógico-musical, isso nos instiga a saber como a criança aprende música, pois será essa preocupação fundamental o ponto de partida para pensarmos não só uma pedagogia ou didática musical, mas as próprias teorias sobre o modo mais adequado de se educar musicalmente a criança. Além do mais, o interesse do educador em compreender como a criança aprende música retira-o do patamar de transmissor do conhecimento e coloca-o na situação de quem aprende. Essa postura, além de possibilitar significativa abertura pedagógica, questiona decisivamente a visão tradicional do professor de música como o detentor da experiência musical suficiente e pronta para ser transmitida ao aluno, o que exclui necessariamente a experiencialidade do mundo sonoro circundante e a experiência prévia do próprio educando.17

Em Rousseau, a produtividade dos processos pedagógico-musicais e da própria ação do educador musical só é alcançada por meio de investigações precisas a respeito do modo de aprendizagem dos sentidos e da pergunta sobre a importância destes para a pedagogia musical. Assim, além

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da preocupação didático-musical sobre “o que ensinar em música” e “como ensinar música”, justifica-se uma preocupação de cunho fundamental que transparece na pergunta “para que ensinar música”, a qual confere base a uma filosofia da educação musical em Rousseau. Quando o genebrino se ocupou em discutir educação sensório-musical como elemento significativo para a formação de Emílio, a qual tem como objetivo integrá-lo à sociedade, despertou para a pergunta sobre a finalidade do processo de ensino e aprendizagem musical. Assim, duas questões fundamentais vieram à tona: saber como a criança aprende música e a conexão do aprendizado musical estreitamente ligado a um ideal de ser humano. A relação dialética entre essas duas preocupações fundamentais é que podem, do ponto de vista da filosofia da educação musical, garantir as condições para se pensar e planejar

o ensino de música de modo adequado. Tudo isso nos dá grandes condições de discutirmos até mesmo sobre a formação do professor de música, pois, além das competências específicas e dos procedimentos didático-musicais adequados que o professor de música deve ter, tal aparato formativo deve estar relacionado com a formação cultural em sentido amplo. Ora, educar musicalmente não implica apenas conferir condições de execução musical, mas também a capacidade de conhecimento amplo e estético no âmbito musical: foi pensando num Emílio refinado esteticamente que Rousseau se dedicou exaustivamente a discutir sua educação sensório-musical.

A exploração pedagógica dos sentidos para a pedagogia musical passa a ser algo determinante em Rousseau. A discussão que o teórico faz sobre o que denominou sexto sentido ou razão intelectual demonstra bem essa questão. O sexto sentido reside no cérebro e é nada mais que as percepções e ideias formadas a partir de nossa experiência. A experiência musical de Emílio possui, assim, uma teleologia, ou seja, serão as experiências musicais didaticamente orientadas e adequadas à idade de Emílio que lhe proporcionarão a elaboração intelectual acurada sobre música, o que será possível num processo que parte de ideias sonoro-musicais simples, até se tornarem ideias sonoro-musicais complexas. Daí a exigência de uma preocupação didática no trato com a maneira como se aproximará o educando com a música. Para Rousseau todo conhecimento musical que possuímos e também sua nitidez são resultado da experiência sensório-musical didaticamente adequada e bem orientada para a idade a que se destina. Se o objetivo é formar seres humanos, a pedagogia musical precisa trabalhar com a ideia segundo a qual a totalidade de nosso conhecimento musical e de sua validade depende, necessariamente, da consciência de que a criança é um ser em construção, afetado significativamente pelo ambiente sonoro que

o rodeia. Uma pedagogia musical consciente desse processo terá interesse em discutir processos didáticos que valorizem os sentidos da criança no aprendizado musical. O ambiente sonoro pensado e criado didaticamente favorecerá, portanto, a razão musical sensitiva e pueril. Desse ambiente se formarão as ideias musicais simples com o auxílio das sensações sonoro-musicais vivenciadas pela criança, o que, dentre outras questões, tem como objetivo, posteriormente, formar ideias sonoro-musicais complexas, possibilitando ao educando adquirir no momento certo o entendimento racional e intelectual sobre música.

A pertinência do conceito moderno de infância inaugurado por Rousseau para educação musical em nosso século reside, portanto, na possibilidade de se estabelecer um diálogo produtivo entre filosofia e educação musical, contribuindo significativamente para a área dos fundamentos da educação musical. Além de nos ajudar a questionar processos didáticos com base em perspectivas escolástico-racionalistas e paradigmas ocidentais da educação musical, o trato que Rousseau oferece à experiência sensório-musical possibilita-nos discutir sobre processos educativos em música. Assim, o conceito filosófico de vivência musical passa a ser central para a pedagogia musical de nosso século, uma vez que possibilita aos educadores musicais pensarem suas práticas e lançarem mão de processos didático-musicais artísticos e criativos.

Notas

Nessa perspectiva podem ser citados vários outros trabalhos de pesquisa que lançam mão de Rousseau como percussor e articulador de processos pedagógicos na contemporaneidade: a produção de DALBOSCO: Paradoxos da educação natural em Rousseau: os cuidados do adulto. 2009. Determinação racional da vontade humana e educação natural em Rousseau. 2007. Primeira infância e educação natural em Rousseau: as necessidades da criança. 2007. Filosofia e educação no Emilio de Rousseau: o educador como governante. Alínea, 2010. Paradoxos da educação natural em Rousseau: Editora Cortez, 2010. FREITAG, B. Piaget e a Filosofia. São Paulo: Ed. Unesp, 1991. ROMANI, S. Educação do corpo: Aspectos pedagógicos do segundo livro do Emilio em diálogo com as ciências do desenvolvimento humano. 2010. MARTINS, M. R. Educação natural na primeira infância em Rousseau e Winnicott. 2009. QUEIROZ, F. O conceito de infância em Rousseau: Alcances e limites. 2010. Adroaldo Stürmer. Natureza, sociabilidade e educação natural em Rousseau. 2009. MAZAI,

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N. Natureza e educação natural em Rousseau. 2008. SANTOS A. P. Educação natural e segunda infância em J.-J. Rousseau. 2008. POKOJESKI, S. Educação natural, antropologia e sociabilidade no Emílio de Rousseau. TOMAZELLI, G. L. Educação natural e infância segundo Jean Jacques Rousseau. 2007. WENDT, C. E. Natureza e educação em Rousseau e Dewey. 2010.

2 Embora falemos de superações de paradigmática, isso não significa, necessariamente, que

o método escolástico-tradicional tenha sido superado. Foram longos séculos nos quais tal método foi reforçado e tomado como referência. Dessa forma, passou a compor a malha da tradição pedagógica ocidental, principalmente no que diz respeito a pedagogias acríticas guiadas pelo senso comum. Sobre isso se faz importante citar o esforço crítico de Elli Benincá, que durante gerações procurou ressignificar a prática pedagógica e a teologia das determinações escolásticas presentes no senso comum teológico-pedagógico. São obras representativas desse esforço: Formação de Professores: um diálogo entre teoria e prática (2002), Educação, práxis e ressignificação pedagógica (Org. Eldon H. Mühl – 2010), Religião, Saúde e o Popular (2010).

3 Segundo Dalbosco, dificilmente encontraríamos hoje em dia um epistemólogo ou um pedagogo que defendesse o modelo inatista em seu sentido standard. No entanto, como influenciou decisivamente muitas formas de pedagogia tradicional e ainda se encontra mesclado em teorias educacionais contemporâneas, faz-se necessário investigá-lo em sua origem. (2010).

4 Segundo Heywood, pode-se apresentar um argumento contundente para demonstrar que a suposta indiferença com relação à infância nos períodos medieval e moderno resultou em uma postura insensível com relação à criação de filhos. Os bebês abaixo de dois anos, em particular, sofriam de descaso assustador, com os pais considerando pouco aconselhável investir muito tempo ou esforço em um “pobre animal suspirante”, que tinha tantas probabilidades de morrer com pouca idade. (2004, p. 87).

5 Ariès atentou bem para essa tendência ao apresentar o descaso em relação à criança medieval, intimamente ligado à alta taxa de mortalidade, que dificultava a formação de vínculos afetivos entre pais e filhos. Também pelo fato de a passagem da criança pela família e pela sociedade ser muito breve e muito insignificante para que se tivesse tempo ou razão de forçar a memória e tocar a sensibilidade. Assim, se a criança morresse, como muitas vezes acontecia, alguns adultos poderiam ficar desolados, mas a regra geral era não fazer muito caso, pois outra criança logo a substituiria. A criança não chegava a sair de uma espécie de anonimato. (1981, p. 10).

6 Para Fubini, o que contribuiu de modo decisivo para pôr em dúvida a validez e a legitimidade da concepção medieval de música foi, precisamente, o progresso técnico registrado pelos instrumentos. O órgão, o cravo, os diferentes tipos de instrumentos de arco (violas, violinos, etc.), e os instrumentos pneumáticos em suas novas versões se aperfeiçoaram, tornando-se mais complicados e sofisticados, tanto em relação a seus mecanismos, como a suas técnicas de execução. (1999, p. 1340).

7 Optarei por esta sigla ao citar o Dicionário Grove de Música.

8

Uma das primeiras na França foi a École Royale de Chant (1783), fechada em 1795. No mesmo ano foi fundado o Conservatorie National de Musique, com o patronato do Estado; em 1806 contava com 40 funcionários e mais de 400 estudantes, que contavam com importantes compositores como seus mestres. Serviu de modelo para muitas instituições em outras partes: abriram-se conservatórios em Praga (1811), Viena (1817), Londres (a Royal Academy of Music, 1822) e Milão (1824). De particular importância, por sua influência difundida no século XIX, foi o conservatório de Leipzing (1843), que atraiu estudantes não apenas da Alemanha, mas também da Escandinávia, da Inglaterra e dos EUA. (DGM, 1994).

9 Relato do escritor francês Charles de Brosses (07 de fevereiro de 1709 - 07 de maio de 1777) em sua obra Lettres familières d’Italie.

10 Sobre a relação de Rousseau com a música vale assinalar: De 1730 a 1731 atuou como cantor no coro da catedral de Annecy e como professor de música em Lausanne e Neuchâtel, atividade que voltaria a exercer de 1732 a 1737. De 1741 a 1742 voltou a Charmettes e depois foi a Paris, apresentando à Academia um “Projeto a respeito de novos sinais para a música”. De 1743 a 1744, publicou a Dissertação sobre a música moderna e travou amizade com Diderot. Em 1745 concluiu a ópera Muses galantes e revisou a ópera Fêtes de Ramire de Voltaire e Rameau. Em 1748 redigiu para a Enciclopédia artigos sobre música. De 1751 a 1752 deixou o emprego de tesoureiro de um financista e passou a viver como copista de música; em março de 1753 fez a representação da ópera O Devin du Village; de 1753 a 1754 publicou a Carta sobre a música francesa; em 1767 publicou o Dicionário de música; de 1772 a 1775 ganhou a vida copiando música. (Índice, Emílio, 2004).

11 Conforme Romani (2010), esta ideia seria retomada e aprofundada por vários outros pensadores que vieram depois de Rousseau, entre eles o pensador alemão, o qual se inspirou fortemente nas ideias educacionais de Rousseau para preparar suas aulas de pedagogia na Universidade de Königsberg durante vários semestres (KANT, 2002). Sobre isso ver também Dalbosco e Eidam. (2009, p. 159-190).

12 Segundo Marques, malgrado as imagens bucólicas ocasionalmente associadas à proposta de Rousseau de uma “educação segundo a natureza”, é evidente para quem chega ao fim de seu monumental tratado de educação que ninguém poderia estar mais longe da espontaneidade rústica e da ingênua simplicidade do selvagem inculto que a figura acabada de Emílio, em quem sensibilidade, inteligência, discernimento e gosto nada ficam a dever aos refinados espíritos da sociedade cosmopolita de seu tempo. (2002, p. 1).

13 Rousseau não indica na obra a divisão interna dos livros, contudo isso pode ser percebido nas sucessões temáticas apontadas pelo filósofo. O Livro II pode ser dividido da seguinte maneira: 1. Educação da sensibilidade – os choros e os gritos; o bem-estar da liberdade; a dependência das coisas. 2. Educação moral – máximas gerais; exemplos: propriedade, verdade, caridade. 3. Educação intelectual – partir do interesse sensível; crítica das palavras; crítica da história; crítica das fábulas de La Fontaine; nada de livros antes dos doze anos. 4. Educação do corpo – exercícios físicos; preceitos de higiene, natação. 5. Educação sensorial – o tato; a visão; a audição; o gosto; o olfato.

14 Sobre a relação entre Filosofia e Educação conferir o texto Por uma Filosofia da Educação Transformada de Dalbosco.

15 Sobre isso ver Saviani 2000, p. 1-19.

16 Para Dalbosco, essa preocupação é tomada pela epistemologia genética e pela filosofia social de Mead no início do século passado e significa um duro golpe à ontologia clássica e, de modo especial, à filosofia transcendental kantiana. (2010, p. 9).

17 Segundo Dalbosco, a filosofia metafísica vê-se questionada por questões de natureza genética, postas filosoficamente por Rousseau e cientificamente pelas teorias da aprendizagem. Assim, vê-se desafiada a reintroduzir em seu núcleo questões específicas acerca da finalidade do processo de ensino e aprendizagem. (2010, p. 10).

Referências

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BALBINOT, R. Ação pedagógica: entre o verticalismo pedagógico e práxis dialógica. São Paulo: Paulinas, 2006.

CRUZ, R. J. B. Oito teses sobre o processo de secularização da cultura ocidental. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, ano X, n. 14, p. 141-148, 2010.

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DALBOSCO, C. A. Educação e conhecimento: educação natural como “modelo epistemológico” da educação infantil?, 2010. (Mimeo).

. Por uma filosofia da educação transformada. In. REUNIÃO DA ANPED, 32. Anais... Caxambu, 2010.

. Primeira infância e educação natural: as necessidades da criança. Revista de Educação, Porto Alegre, ano XXX, v. 62, n. 2, p. 313-336, 2007.

. Crítica da razão e iluminismo pedagógico em Rousseau, In: SGRÓ, M. Teoria crítica de La sociedad, educación, democracia y ciudadanía. Tandil: Universidad Nacional Del Centro de La Província de Buenos Aires, 2008.

DICIONÁRIO GROVE DE MÚSICA: edição concisa. Trad. Eduardo Francisco Alves. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994.

FONTERRADA, M. T. O. De tramas e fios: um ensaio sobre música e educação. 2. ed. São Paulo: Unesp; Rio de Janeiro: Funarte, 2008.

FUBINI, Enrico. La estetica musical desde la Antigüedad hasta el siglo XX. Madri: Alianza Editorial, 1999.

HEYWOOD, C. Uma história da infância: da Idade Média á época contemporânea no Ocidente. Porto Alegre: Artmed, 2004.

MARQUES, J. O. A. A educação musical de Emílio. Rapsódia. Almanaque de Filosofia e Arte, São Paulo, n. 2, p. 7-35, 2002.

ROMANI, S. Educação do corpo em diálogo com o Segundo Livro do Emílio de J.-J. Rousseau. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade de Passo Fundo, 2010.

Raimundo Rajobac -Professor efetivo no DEPARTAMENTO DE MÚSICA da UFRGS. DOUTORANDO em EDUCAÇÃO pela PUCRS. MESTRE EM EDUCAÇÃO pela UPF - RS. Possui graduação (Bel) em FILOSOFIA pela URI-ERECHIM/RS. Licenciatura Plena em Filosofia pela UPF - PASSO FUNDO/RS. Graduação em TEOLOGIA pelo ITEPA -PASSO FUNDO/RS. Licenciatura plena em MÚSICA pela UPF - PASSO FUNDO/RS. Áreas de pesquisa: Filosofia da Educação Musical, Filosofia da Música, Teorias da Ação e Educação, Iluminismo e Pedagogia, Racionalidade e Formação, Hermenêutica e Educação.