MÚSICA E PAlAvRA nA MuSICA POEtICA E nO PEnSAMEntO lutERAnO DOS SéCulOS XvII E XvIII

Mônica Isabel Lucas (USP) monicalucas@usp.br

Resumo: O presente artigo trata de aspectos da relação entre música e palavra, desde a Idade Média até o séc. XVIII, descrevendo desde sua concepção como ciência do Quadrivium até sua subordinação às novas releituras humanistas da Poética aristotélica, e à consequente ideia de que a música deva imitar conceitos lógicos transformados em palavras. Em seguida, concentra-se nas especificidades do pensamento luterano, que levam à sistematização da retórica musical, a partir do início do século XVII. Com isto, este trabalho determina os limites temporais e geográficos da retórica musical, colaborando tanto para trabalhos analíticos quanto para a interpretação musical. Palavras-chave: Retórica musical; Imitação; Musica poetica.

Abstract: The present article concentrates on some aspects of the relation between music and word, from the Middle Ages until the 18th Century. It presents the medieval conception of music as a science of Quadrivium. In following, it describes the establishment of a new relationship, based on humanistic interpretation of Aristotelian Poetics, which proposes that music should imitate logical concepts transformed into words. Finally, it shows some specificities of Lutheran musical thinking that lead to systematizing of musical rhetoric. This process began to take place at the beginning of the 17th Century. By determining the temporal and geographic limits of musical rhetoric, this article will be useful for any related research as well as for providing some aid for musical interpretation. Keywords: Musical rhetoric; Imitation; Musica poetica.

Nos escritos musicais (e também matemáticos) publicados nos séculos XVII e XVIII, lemos que a música deve ser concebida como “imitação sonora” das proporções perfeitas da Ordem Divina. Esses autores seguem a visão proposta na Antigüidade e retomada por Boécio, cujo tratado sobre música, escrito no século V, teve enorme alcance e, ainda no século XVIII, era compreendido como auctoritas, fonte indubitável de conhecimento.

Retomando a categoria das Artes Liberales – práticas próprias do homem livre – e dividindo-as em gêneros numéricos (Quadrivium) e verbais (Trivium), autores medievais dizem que a música é objeto de estudo matemático, pertencendo, junto com a aritmética, a geometria e a astronomia, ao Quadrivium. Mesmo quando não mencionam a sua fonte, tratados musicais anteriores ao século XVIII se apóiam na ideia do quadrivium, ao afirmarem a condição matemática da harmonia musical. Nesses mesmos tratados, as artes relativas ao número também são incluídas na categoria de “ciência”, aristotelicamente definida como a capacidade de fazer demonstrações a partir de premissas conhecidas.

Para Boécio, assim como para Santo Agostinho, as proporções harmônicas se referem em última instância à unidade, que representa o mais alto grau de perfeição na ordem da natureza. A unidade caracteriza a essência das coisas construídas segundo a natureza divina. Nessa visão, a razão, capaz de perceber as proporções cósmicas materializadas na música, tem proeminência sobre as outras faculdades humanas.

O estudo da música nas universidades medievais concentrava-se na investigação das proporções matemáticas, e não em seu efeito sonoro. Entretanto, a prática da composição musical, mesmo ausente dos estudos especulativos do quadrivium, também era regida por este mesmo pensamento proporcional. Os gêneros polifônicos mais relevantes da Idade Média, como o organum, o moteto e a missa eram elaborados a partir de um cantus firmus, uma estrutura pré-existente extraída do cantochão. Sobre ela se edificava a construção matemática da música, com base em relações numéricas (rítmicas e harmônicas). O cantus firmus era considerado a voz principal, fundamentum totius relationis.1

A partir da metade do século XV, o cantus firmus deixou de ser a substância básica da composição musical. Na obra tardia de Dufay e de Ockeghem, encontram-se missas e motetos compostos sobre cantus não advindos da liturgia cristã ou mesmo inteiramente novos. Nessa época, surge um novo ideal sonoro que faz com que a hierarquia do cantus firmus se dissolva em favor de uma música na qual linhas melódicas de igual importância se coordenam.

Por volta desta mesma época, a prática musical, que até então estivera fora das discussões praticadas nas Universidades, também passa a ser objeto de especulação. Gioseffo Zarlino, na metade do séc. XVI, já descreveria o Músico Perfeito como aquele que domina tanto a teoria quanto a prática musical.2

No âmbito da composição, música e palavra já guardavam uma relação estreita praticamente desde o início da notação musical. Ela se dá pela afinidade sonora existente entre as duas artes, pois ambas lidam com ritmo e melodia. Esta identidade fica evidenciada no termo comum carmen, utilizado para descrever tanto música como poesia.

A relação entre música e discurso verbal já havia sido discutida na Antigüidade, por antigos retores – Plutarco, Dionísio de Halicarnaso e Quintiliano.3 Platão, em A República, diz que a melodia cantada, como a falada, é composta de palavra, melodia e ritmo.4 Para Aristóteles, discurso e música também se pautam “pelo ritmo, pela palavra e pela melodia, separados ou combinados”.5 Ele dá total prioridade ao sentido da palavra. No século XV, essas ideias são revisitadas por músicos e por poetas, causando modificações consideráveis na concepção medieval. Platão, como Aristóteles, dão preferência total à representação sonora do conceito. Autores humanistas, relendo autores da Antiguidade, adotam este pensamento e passam a considerar ritmo e melodia, elementos substanciais da música medieval, como sendo secundários. Para estes, música e poesia passam a ter como preocupação fundamental a representação do conceito. Humanistas como Lionardo Bruni (1369-1444), Giordano Bruno (1548-1600) e também Martinho Lutero (1483-1546) retomam o princípio aristotélico de que a palavra é propriedade substancial do homem. No século XVI, o aspecto declamatório da linguagem e seu valor imagético e afetivo passam a constituir as diretrizes da inventio musical, substituindo a ideia medieval de numerus.

Com isso, a música passou a se relacionar ao gênero de artes ligadas à palavra, o Trivium, que, segundo Boécio, reunia a dialética, a gramática e a retórica. Assim, a música passa a ser entendida como “imitação sonora” da natureza humana, imitação esta realizada pelo viés do discurso: a voz (cantada), a melodia e o ritmo são veículos para mover o público, imitando as paixões humanas. Essa semelhança de finalidade entre a música e o discurso verbal, reiterada pela própria presença da palavra nos discursos cantados, possibilitou a realização de aproximações sistemáticas entre música e oratória. Na polifonia franco-flamenga e italiana do século XVI já se nota uma vinculação clara entre o conteúdo do texto e procedimentos musicais pré-determinados que visam esclarecer musicalmente o conteúdo verbal. Essa relação pode ser simplesmente visual (como o uso de semínimas e colcheias, notas “pretas” no lamento à morte de Ockeghem, de Josquin des Prez) ou representativa do sentido do texto (como o uso de dissonâncias para representar palavras com sentido doloroso). O segundo tipo de relação foi o mais explorado por compositores dos sécs. XVI ao XVIII.

No século XVII, no entanto, a relação entre música e palavra foi entendida de maneira diferente por teóricos católicos e luteranos.

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No século XVI, já se discutia na Itália a dependência mútua entre música e fala, no âmbito da música vocal polifônica, especialmente o madrigal. Gioseffo Zarlino, em 1558, já afirmava que “a harmonia e o ritmo devem seguir a palavra”.6 Contudo, essa questão assumiu proporções mais amplas no círculo da Camerata Fiorentina, em que, a partir de 1573, debatiam-se ciências e artes. Faziam parte da Camerata ou estiveram em estreito contato com ela, entre outros, teóricos musicais como Vicenzo Galilei (pai do astrônomo) e Giovanni Battista Doni e Girolamo Mei (este último como correspondente); compositores como Giulio Caccini, Emilio de’ Cavalieri e Jacopo Peri; poetas como Ottavio Rinuccini. Nas discussões da Camerata surgiu a proposta de recobrar o estilo dramático, tal como praticado na Antigüidade clássica, instituindo como recursos musicais para este fim a monodia e o baixo-contínuo. Com isso, estabeleceram-se as raízes da representação cênica e musical que mais tarde se denominaria ópera.

As críticas da Camerata à polifonia acusavam a falta de inteligibilidade do texto – o laceramento della Poesia (Caccini, 1602) –, seja por esticar as palavras, seja por repeti-las, ou às suas partes, seja por utilizar camadas melódicas com ritmos diferentes entre si, tornando o texto confuso. Por estas razões, Bardi afirmava que “o contraponto é inimigo da música”.7 Para Doni, a polifonia surgira “em tempos antiqüíssimos e entre homens nus de toda sorte de literatura e gentileza”. Ele inclui nesta categoria dois dentre os mais importantes praticantes do contraponto franco-flamengo: Jacob Obrecht (1457-1505) e Johannes Ockeghem (c. 1420-1497).8

Para os integrantes da Camerata, a prática coeva do contraponto se chocava diretamente com a nova proposta musical, em que o interesse da música, assim como da poesia, reside unicamente na clareza e na compreensibilidade sentido do texto. A palavra musicada é considerada como um modo de dizer aperfeiçoado, por ser acompanhada de melodia e ritmo, elementos acidentais que, no entanto, tornam o dizer mais persuasivo.

Buscando mover o ouvinte pela unidade palavra-tom, e repudiando o contraponto em nome da clareza do texto, compositores do início do séc. XVII propuseram um novo estilo musical monódico, baseado em preceitos semelhantes aos que regiam a teoria musical da Antigüidade grega. Nele, a palavra deve ser apresentada de acordo com seu ritmo próprio e com uma melodia que evidencie seu significado afetivo.

Essas ideias chegaram ainda no século XVII ao mundo luterano. Heinrich Schütz, tendo viajado para a Itália e estado em contato com Giovanni Gabrieli e com o próprio Claudio Monteverdi, foi o primeiro compositor a adotar este estilo moderno ao norte dos Alpes. Christoph Bernhardt, aluno de Schütz, reafirma a primazia da palavra no estilo moderno. Nele, “a palavra é senhora absolutíssima da harmonia”. Em oposição, no estilo antigo, contrapontístico, “a harmonia é senhora da palavra”.

Na concepção italiana, procedimentos musicais não visavam apenas ilustrar diretamente o texto, mas explicitar o afeto que dominava o cantor, portador da palavra. O objetivo da representação musical deveria ser a alma humana movida pelo afeto. A orientação é aristotélica: no De Anima, o mundo das paixões faz parte da alma perceptiva, e, por isso, é anterior ao âmbito da linguagem, que é próprio da alma racional. Baseando-se nessa ideia, os autores da Camerata afirmavam que as paixões, por serem mais fundamentais, são mais eficazes para mover o ouvinte que a razão contida na linguagem. A anterioridade ontológica das paixões também ditava, para esses autores, a subordinação das particularidades textuais ao efeito patético geral.

Para os teóricos da Camerata, toda fala tem um soggetto, um afeto formalmente determinado, que é também imitado pela música. A relação entre música e linguagem apóia-se na ideia de imitação: ambas copiam os afetos humanos. Essa imitação, no entanto, não é livremente ditada pelos sentidos e pela individualidade do compositor: ela é objetivamente determinada. Autores como Galilei entendem que o modelo da composição é a observação do comportamento dramático do ator trágico ou cômico. Esse comportamento não tem caráter subjetivo. Imitam-se tipos do teatro como

o Irado, a Matrona, o Amante, o Lamentoso, o Alegre etc. A música deve imitar a fala codificada desses modelos dramáticos; a declamação carregada de afeto constitui a matéria musical.

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A concepção musical luterana, apesar de sua fundamentação humanista, guarda algumas diferenças sensíveis em relação à visão proposta por autores italianos, especialmente aqueles ligados à Camerata Fiorentina. Ela faz parte de uma construção ideológica sólida e duradoura, que fundamentou o currículo das Lateinschulen, as escolas reformadas. Essas instituições teológicas (que deram origem aos Ginásios Humanistas) visavam preparar os alunos para o estudo superior, o Studium.

O currículo da Lateinschule foi estabelecido em 1528 por dois colaboradores de Lutero: Philipp Melanchton (1497-1560) e Johannes Bugenhagen (1485-1588). Ambos trabalharam no círculo de pensadores ligados a Lutero, na Universidade de Wittenberg. Melanchton ficou conhecido como Praeceptor Germaniae após ter produzido o material didático utilizado para boa parte da educação luterana: gramáticas do grego e do latim, obras sobre Retórica, Ética, Física, História e Geografia. Para ele, a educação deveria seguir os moldes instituídos pelo pensamento humanista, essenciais na constituição da teologia reformada.

A educação luterana atribuía enorme importância à música, junto com o estudo da religião e das línguas. Nas classes mais avançadas – a secunda e a prima – o curso era inteiramente ministrado em latim. De acordo com as ordenanças de Melanchton e Bugenhagen, o ensino na Lateinschule deveria dedicar no mínimo cinco horas semanais à música, incluindo solfejo, canto e prática de música polifônica, coral e instrumental. Elas deveriam ser ministradas logo após o almoço, respeitando a crença médica de que o canto ajudava na digestão.

Além do estudo da teologia, estavam previstas oito horas semanais de latim, que incluíam gramática, exercícios de estilo (imitação de autores clássicos), leitura e declamação de Terêncio, Virgílio e Cícero, bem como a teoria e prática da poesia e catecismo latinos. O currículo contava ainda com quatro horas semanais de grego e quatro de hebraico. A retórica estava presente desde as classes iniciais; na secunda e na prima, as classes mais avançadas, contava-se com três horas semanais de dialética e duas de retórica (ensinadas segundo a visão de Melanchton). Havia ainda aulas extras, opcionais, dessas disciplinas.9

A retórica tinha grande importância no ensino da Lateinschule, e seu estudo estava estreitamente vinculado ao da religião. Nas aulas de teologia, o aluno aprendia a desmembrar a Bíblia, encontrando nela lugares-comuns, comprovando etimologias e produzindo silogismos. Além disso, para se candidatar à prova final, o Examen Theologicum, era preciso memorizar o Compendium Locorum Theologicorum ex Scriptoris et Libro Concordiae Collectum, [“Compêndio das passagens teológicas da Sagrada Escritura e do Livro de Concórdia”], de Leonhard Hutter (1610). Neste tratado,

o dogma luterano é apresentado sob forma retórica: o compêndio consiste de trinta e quatro teses, seguidas de refutação e de confirmação com base em citações da Escritura (o conhecimento desse compêndio de cerca de 200 páginas também foi exigido de Bach, em 1723, quando este se candidatou ao posto de Kantor na Thomasschule em Leipzig). Essa enorme ênfase dada à retórica na educação pode ajudar a explicar porque a música luterana foi, por ela, tão fortemente influenciada.

Todos os professores da Lateinschule tinham formação teológica, e também se comprometiam a realizar funções na igreja. Assim, o Kantor era incumbido do ensino da música e do latim, sendo ainda responsável pela música nos cultos, que era executada pelos alunos. Bugenhagen determina que

“os Kantoren (...) devem executar seu serviço escolar, como os outros professores. É sua obrigação ensinar canto a todas as crianças e adolescentes, educados ou não tanto, de modo que cantem conjuntamente em latim e em alemão, e que aprendam a música figural [polifônica], não apenas de modo costumeiro, mas também artístico, aprendendo a entender as vozes, claves e tudo o que pertença a esta música, e aprendendo a cantar de maneira segura e afinada...”.10

Baseados nos preceitos de Melanchton e Bugenhagen, os Kantoren estabeleceram a concepção e a prática musical luterana. Importantes músicos protestantes dos séculos XVI a XVIII – Dressler, Listenius, Burmeister, Herbst, Printz, Praetorius, Walther, Bach, Hiller, Ramler – ocuparam postos de Kantor.

As escolas reformadas utilizavam dois compêndios para o ensino e para a prática da música, denominados Enchiridion utriusque musicae practicae e Enchiridion musicae mensuralis. Ambos os livros foram utilizados nessas instituições até o século XVIII. Estas obras foram publica-das pela primeira vez por Georg Rhaw, em cuja casa editorial – inaugurada em Wittemberg, em 1523 –, foi impressa a maior parte das obras de Lutero. Rhaw destaca-se como um importante propagador das ideias e, com isso, também da concepção musical luterana.

Rhaw e os pensadores que difundiram as ideias reformadas compartilhavam de conceitos humanistas de contemporâneos seus, como Eras-mo, Valla, Mei e Doni, que propunham uma educação baseada nos studia humanitatis, preocupando-se também com uma nova leitura do legado clássico. Todos esses autores estavam interessados em disseminar esse cabedal cultural na forma impressa desenvolvida por Gutenberg, que publicara por volta de 1455, a primeira tradução vernácula da Bíblia.

As edições musicais publicadas por Rhaw distinguem-se de outras coleções similares de sua época não só por tratar de questões morais e teológicas subjacentes a esse repertório em seus prefácios, mas também pelo empenho do autor em abarcar todas as instâncias da liturgia. Rhaw imprimiu, entre 1538 e 1545, quinze coleções de música polifônica vocal, além de várias compilações de corais luteranos, muito utilizadas por compositores reformados. Estas coleções de corais se expandiram enormemente. Uma publicação em Leipzig, em 1697, continha mais de cinco mil corais.11

As coletâneas musicais editadas por Rhaw eram prefaciadas por Lutero, Melanchton e Bugenhagen. Dentre estas, destaca-se o prefácio de Lutero às Symphoniae Jucundae (1538), que foi traduzido do latim para o alemão e reeditado em 1564 pelo Kantor Johann Walther como Lob und Preis der himmlischen Kunst Musica [“Louvor e elogio da música, arte celestial”]. Ideias contidas nesse texto foram consideradas canônicas no mundo reformado, e continuaram válidas até o fim do século XVIII.

Rolf Dammann demostrou que os Kantoren luteranos repetiram e parafrasearam as crenças musicais de Boécio e Agostinho nos séculos XVII e XVIII. Para Dammann, a permanência da ideia de música como numerus, que remonta ao quadrivium medieval, junto a uma sistematização retórica da palavra cantada, são características essenciais da concepção musical luterana. Segundo esse autor, no mundo protestante, o pensamento musical de Boécio (música como reflexo da ordem macrocósmica e divina) continua válido até o século XVIII.12 Esta ideia é fundamental para se compreender a visão de música como discurso retórico e alegórico, e para se compreender a posição privilegiada que a música alcançou, entre as artes, no final do século XVIII na Alemanha. A concepção de música como numerus ajuda a compreender o cultivo do contraponto na prática musical luterana, enquanto na Itália, como vimos, esta técnica passou a ser alvo de críticas a partir do século XVII.

Durante os séculos XVII e XVIII, são comuns os escritos luteranos que se referem, ainda que indiretamente, à musica humana, mundana e instrumentalis de Boécio. Assim, lemos no prefácio de Lutero às Symphoniae Jucundae que

“quando a música natural é afiada e polida pela arte, percebemos em parte (pois não podemos compreender ou entender totalmente) e com grande admiração a grande e completa sabedoria de Deus na Música, sua maravilhosa Obra; nela, antes de tudo, é maravilhoso e admirável que alguém cante uma melodia simples e ingênua, e junto a ela três, quatro ou cinco outras vozes também sejam cantadas, e brinquem em torno dessa melodia simples e direta, adornando-a maravilhosamente de muitas maneiras e sons, conduzindo uma dança celeste, encontrando-se amigavelmente e abraçando-se afetuosamente. Quem pensa sobre isso e não considera [que isso seja] uma obra maravilhosa e indizível do Senhor, é verdadeiramente um ser rude, que não merece a denominação ser humano, que não deveria ouvir outra coisa que

o zunir do burro e o grunhido do porco”.13

Essa concepção foi propagada por inúmeros compositores e Kantoren luteranos nos séculos XVII e XVIII: Calvisius, Lippius, Praetorius, Baryphonus, Bartolus, Herbst, Matthaei, Printz, Kuhnau, Buttstett, Walther, Werckmeister, Mitzler etc. Para eles, as relações numéricas que governam as proporções musicais e divinas são carregadas de valor alegórico e metafísico. No mundo luterano do século XVII, as consonâncias musicais são compreendidas pelo viés teológico, como podemos apreender da afirmação de Andreas Werckmeister (1700): “quanto mais próxima uma coisa estiver de sua origem, mais perfeita será; portanto, quanto mais as proporções [musicais] se desviarem da Unidade como seu princípio, mais imperfeitas serão.14

A crença numa relação direta entre as harmonias sonoras e a natureza numérica divina fez com que a música ocupasse no mundo luterano um lugar elevado no conhecimento, superado apenas pela Teologia. Essa relação remonta a Santo Agostinho e a Boécio, que por sua vez reafirmam ideias platônicas de A República.15 E Lutero iniciara sua vida religiosa como monge agostiniano, dado importante, tendo em vista o débito de Santo Agostinho a Platão. Assim, o reformador afirmava que as harmonias musicais estabelecem harmonia na alma, e por isso têm caráter ético. Lutero e seus seguidores citam freqüentemente o trecho de Confissões em que Santo Agostinho, ainda que involutariamente, como-ve-se ao ouvir música, tomando isto como prova da ação direta da música sobre a alma.

A analogia entre os sons musicais e os afetos da alma é propagada ainda nos escritos musicais do século XVIII. Johann Mattheson afirma, em 1739, que “sons bem ordenados produzem almas bem ordenadas e harmoniosas”.16 O mesmo princípio está no fundamento das tentativas de autores setecentistas como Lorenz Mizler e o próprio Mattheson de construir uma ciência mecânica da moralidade musical, que levasse em conta as propriedades físicas do som e a natureza fisiológica do ouvido e das paixões. No fim do século XVIII, mesmo com o fortalecimento da Estética e dos ideais românticos, estas ideias ainda estão presentes na obra de autores como Adam Hiller e Caspar Ruetz.

É por conta desse caráter intrinsecamente ligado a valores morais que Lutero atribui uma posição superior à música, dentre as artes. Lemos no prefácio às Symphoniae Jucundae (1538) que

“depois da Palavra de Deus, nada é tão elevado e louvável quanto a música, pois ela é uma regente poderosa e violenta de todos os movimentos coração humano e porque os homens são freqüentemente regidos e dominados por ela, como por seu senhor.”17

Para Lutero, a música “é tanto disciplina quanto educadora, e torna as pessoas mais razoáveis, honestas e suaves”.18 A percepção de propriedades moralizantes na música leva Lutero a recomendar esta disciplina para a educação dos jovens. Mais adiante ele acrescenta que

“a música é um dom divino, belo e maravilhoso, próximo da teologia. Não posso perdoar, por nada no mundo, a pouca aptidão para a música. Devemos acostumar a juventude a essa arte, pois ela torna as pessoas finas e habilidosas.”19

O papel que Lutero atribui à música na educação é claramente associado às ideias de Platão. Mas também é possível observar uma analogia muito estreita com a visão aristotélica exposta na Política. Nessa obra, o estagirita enfatiza tanto o poder recreativo quanto o aspecto moral da música, dois pontos que Lutero também considera fundamentais nessa arte. Além disso, o prazer inerente à música é o que para ambos torna essa disciplina adequada à educação dos jovens. Aristóteles diz:

“é evidente que a música pode imprimir uma certa qualidade no caráter da alma e se pode fazer isso é evidente que se deve dirigir os jovens para ela e dar-lhes uma educação musical. O estudo da música se adapta à natureza dos jovens pois estes não suportam nada que não dê prazer. E a música é por natureza uma das coisas prazenteiras. Além disso, parece que há na alma humana uma certa harmonia e ritmo.”20

Lutero, como Aristóteles, considera a música como um passatempo nobre. Ele a concebe como um dom divino para aprazer a condição humana. Nesse ponto, a visão luterana se distingue da de pensadores medievais, como Santo Agostinho e Boécio, e de outros reformadores, como Calvino e Zwingli, para quem a prática musical, como todas as coisas relativas aos sentidos e não à razão, é censurável. No final do século XVIII, a Poética de Charles Batteux, uma reciclagem da Poética aristotélica – essa a mais lida no mundo setecentista germânico –, ainda enfatiza o prazer como o elemento característico das Belas-Artes. Contudo, na visão luterana seiscentista, diferentemente da de Batteux, o prazer jamais se dissocia da utilidade moral. Para autores reformados, a beleza reside no decoro, na adequação entre música e moral e em seu potencial de harmonizar a alma com a essência divina.

Na concepção luterana, a música age sobre os afetos, e com isso pode equilibrá-los, conduzindo à Virtude cristã. Ainda no prefácio às Symphoniae Jucundae, Lutero diz que

“nada na terra é mais poderoso para tornar os tristes alegres, os alegres tristes, os humilhados orgulhosos, os orgulhosos humildes, para acalmar o amor quente e exagerado, para diminuir a inveja e o ódio, e nada é mais eficaz que a música para elevar e arrastar os movimentos do coração que regem os homens para a virtude ou para o vício, e para controlar e dominar os movimentos do ânimo. Nada é mais poderoso, digo eu, que a música”.21

Para corroborar esta posição, autores reformados se referem freqüentemente aos exemplos bíblicos que comprovam o poder da música. No mesmo prefácio Lutero afirma que

“a Escritura testemunha que pela música, Satã, que impele as pessoas a todo o vício e maldade, é afastado, como se mostra no rei Saul. Quando o Espírito de Deus chegou, David tomou da harpa e tocou com suas mãos; o rei ficou aliviado e sentiu-se bem, o mau espírito se afastou dele”.22

A passagem em que Davi cura o Rei Saul da melancolia através do som de sua harpa23 é um tópico incessantemente repetido por escritos luteranos, e que encontraremos em textos musicais germânicos até o final do século XVIII, como a Allgemeine Geschichte der Musik [“História Geral da Música”] de Johann Nikolaus Forkel (1788).

A percepção da afinidade natural entre sons e moralidade também leva Mattheson, em 1739, a recomendar o uso político da música:

“a música amansa espíritos selvagens, amacia a essência dura e rude das almas, refina os costumes, torna as pessoas mais predispostas para a Moral, une os corações humanos de maneira doce a agradável e traz repulsa aos males que levam à desumanidade, inflexibilidade e impertinência. A harmonia mantém este estado”.24

Assim, o mundo luterano criou uma visão particular da poética e da retórica clássicas que, diferentemente da concepção italiana, não descarta as ideias do quadrivium. Pensadores luteranos absorvem a compreensão de seus colegas da Camerata Fiorentina – música como um instrumento de imitação dos afetos contidos no texto musicado. Contudo, não deixam de reconhecer nessas imitações um poder espiritual inerente ao som. As proporções sonoras presentes no contraponto também são capazes de conduzir a alma à Virtude cristã.

Assim, enquanto os integrantes da Camerata procuraram se libertar da polifonia, argumentando que esta obscurecia o sentido da palavra, compositores luteranos trataram de fundamentá-la sistematicamente. A figura do Kantor luterano e sua formação intelectual, orientada pela Teologia e pela retórica, foi fundamental na concepção desse método de composição, que une as potencialidades afetivas da música e a visão matemática da polifonia, denominado pela tratadística musical seiscentista de musica poetica.

Joachim Burmeister é o primeiro autor a estabelecer a musica poetica como disciplina teórica. Ele a define, em 1606, como

“a parte da música que ensina a compor, unindo sons da melodia para perfazer uma harmonia adornada com diferentes afetos em cada período e destinada a mover os ânimos e corações humanos para diferentes disposições”.25

Na musica poetica, procedimentos musicais (imagéticos e afetivos) da polifonia passaram a ser terminologicamente denominados. Esta orientação segue a premissa aristotélica de que o que não é definido não pode ser compreendido. Aristóteles já afirma, no De Anima, que “a partir de coisas não claras, embora mais manifestas, advém clareza e maior inteligibilidade segundo o enunciado”.26 No século XVII, pensadores luteranos principiaram a se apropriar da terminologia gramática e retórica para definir procedimentos musicais específicos. Com isso, estreitaram a analogia entre música e discurso verbal, analogia que perdurou até o fim do século XVIII, abarcando inclusive a música instrumental.

No século XVII, tanto na concepção católica como na de autores luteranos, a linguagem passou a ser entendida como a fonte da representação musical. Na concepção dos integrantes da Camerata Fiorentina, a música visava imitar a veemência patética da fala movida pelo afeto. Na concepção reformada, diferentemente, a linguagem musical foi abordada em seu aspecto lógico, como materialização do dogma.

A concepção musical luterana centra-se na representação de palavras do texto. Para autores reformados, a palavra isolada é entendida como a matéria da inventio, a aplicação de lugares-comuns à composição musical: a fantasia do compositor deve girar em torno de palavras do texto que possuam conteúdo afetivo e imagético. Andreas Herbst, em seu Musica Poetica (1643), oferece quatro categorias de palavras musicalmente representáveis: verbos que exprimem afecção, verbos locomotivos, advérbios e as idades do homem ou seus atributos.27 No pensamento luterano, certos procedimentos musicais não só representam, mas ainda explicam a palavra, evidenciando seu sentido oculto, geralmente fundamentado nos dogmas da doutrina.

Na compreensão proposta pela Camerata Fiorentina, não existe uma preocupação em transformar procedimentos musicais em um sistema de regras didático. Teóricos luteranos (os Kantoren) diferentemente, afirmam que a música é ars, faculdade aristotelicamente definida como a “disposição da capacidade de fazer envolvendo um método verdadeiro de raciocínio”.28 Para músicos luteranos, a musica poetica é uma técnica transmissível, como a arte de produzir discursos.

Músicos da Camerata Fiorentina, como Galilei, desprezam a retórica. Eles seguem a orientação platônica, para quem esta é uma arte enga-nadora que não leva à verdade, permanecendo no plano da opinião. Para os pensadores do círculo de Bardi, a representação musical de palavras isoladas impossibilita a compreensão do todo, do afeto que rege a composição. Eles retomam ainda Aristóteles, afirmando que os afetos, sendo próprios da alma perceptiva, são anteriores à razão. Por este motivo, seria impossível considerar a música sem palavras, imitadora de afetos, como linguagem. Essa concepção só se torna possível com a atribuição de significado lógico a procedimentos codificados, proposto por pensadores reformados. Eles constroem dessa maneira uma linguagem musical que se associa às artes do trivium, em especial à retórica. Com isso, obras como a Retórica aristotélica e a Institutio Oratoria de Quintiliano passaram a ser normativas também para a composição e a execução musicais.

Burmeister evidencia sua sintonia com ideias humanistas, ao unir a teoria musical à retórica antiga. Essa sintonia se opera sobre premissas claramente distintas das dos autores da Camerata Fiorentina.

Um dos aspectos historicamente mais importantes da Musica Poetica de Burmeister é a teoria das figuras, designadas com termos técnicos transpostos da retórica. Com isso, ele transforma as relações entre música e linguagem em ferramentas de composição. Após Burmeister, inúmeros autores passaram a fornecer apanhados de figuras musicais emprestadas da retórica em seus tratados, entre eles Walther, Nucius, Thuringus, Kircher, Bernhard, Printz, Ahle, Janowka, Vogt, Mattheson, Spiess, Scheibe, Forkel etc.29

Compositores da Camerata Fiorentina também utilizaram procedimentos musicais codificados em suas composições. No entanto, eles não procuraram sistematizá-los em manuais nem fundamentá-los na retórica clássica. A caracterização desses procedimentos como figura possibilitou conferir ao discurso musical um caráter de ensinamento doutrinário, além de prover um método de análise musical.

A ideia de que as figuras contenham ensinamento já está proposta na Retórica aristotélica. Nela, lemos que “[a metáfora] causa prazer ao que procura ensinamento”.30 Similarmente, lemos no Cannocchiale Aristotelico,

o tratado de agudeza de Emanuele Tesauro (1652), que “as figuras retóricas não são outra coisa que uma beleza peregrina que varia a oração do estilo cotidiano e vulgar para que ela traga ensinamento conjunto com a novidade, e o ouvinte simultaneamente aprenda gozando e goze aprendendo”.31

Essas definições se assemelham muito à definição de figura apresentada por Burmeister: “ornamento ou figura musical é uma progressão musical da harmonia ou da melodia (...) que se afasta das regras básicas da composição e corajosamente ganha uma forma mais ornada”.32 Para Burmeister, ainda, as figuras propõem deleite e ensinamento, obtido pela atribuição de valor lógico a procedimentos musicais.

O pensamento musical herdado da Camerata Fiorentina, que concebe a música como imitadora de afetos, também é assimilado pela musica poetica e sistematizado. Arnold Schering, em 1908, cunha o termo Affektenlehre (“Teoria dos Afetos”) para se referir à técnica de persuasão afetiva, unida à retórica por Aristóteles e transposta no século XVII para a composição musical.33

No século XVII, o mundo dos afetos, objeto de tratamento dos livros sobre a moral, passam também a ser fundamentados pela filosofia natural de Descartes, além da teoria médica de Hipócrates e Galeno. Contudo, na concepção luterana, os afetos servem apenas para enfatizar a ideia de Virtude, evidenciando o sentido dogmático e metafísico da música. Este é sancionado por sua ligação numérica ao princípio da Ordem divina.

Neste pano de fundo se insere a produção literária de autores que continuaram, em maior ou menor medida, defendendo o princípio aristotélico da música como imitação dos afetos e concebendo a música como linguagem retórica durante os séculos XVII e XVIII.

A partir da segunda metade do século XIX, o surgimento da Estética tendeu a superar a concepção musical baseada na poética e na retórica, causando uma gradual mudança de paradigma. A obra a respeito das artes mais lida no mundo luterano da segunda metade do século XVIII foi a Les Beaux-Art réduits a um même Principe [“As Belas-Artes reduzidas a um mesmo princípio”]. Ela foi editada pelo menos dez vezes em alemão, entre 1746 e 1801, e constitui uma defesa clara do princípio aristotélico da Poética. Marie Luise Linn demonstra que obras como a Estética de Baumgarten ainda são fortemente influenciadas pela Retórica e pela Poética.34 Estes dados permitem notar que a influência dessas duas artes no pensamento musical setecentista foi profunda e duradoura, e a superação dessas premissas, que se deu com o nascimento da Estética, não foi fruto de uma ruptura, mas de uma transição lenta e gradual.

A partir destas informações históricas, é possível constatar a importância da recuperação de preceptivas aristotélicas para uma compreensão mais profunda da definição e das funções da música nos séculos XVII e XVIII. Procura, ainda, determinar com maior precisão espaço-temporal e geográfico a que se circunscreveu o pensamento musical de caráter poético-retórico. A determinação das aplicações e dos limites da retórica musical é útil na elaboração de ferramentas, tanto para trabalhos de caráter analítico como para uma interpretação musical que carregue maior verossimilhança histórica.

Notas

1 Tinctoris, Johannes. Diffinitorium musicae Johannes Tinctoris (1474). Disponível em: http://www.chmtl.indiana.edu/tml/15th/TININV_TEXT.html (acesso em: 20/01/2007). 2 apud TETTAMANTI, Giulia. Silvestro Ganassi. Obra Intitulada Fontegara. São Paulo: UNICAMP, dissertação de mestrado, 2010, p. 34. 3 cf. MUHANA, Adma. Prefácio. In: Poesia Completa de Manuel de Oliveira. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. XL.

4

PLATÃO. República. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2001, 398d.

5

ARISTÓTELES. Poética. Madrid: Gredos, 1978, 1447a20-25. 6 DAMMANN, Rolf. Der Musikbegriff im deutschen Barock. Laaber: Laaber Verlag, 1995,

p.
99. 7 Id. Ibid., p. 106. 8 Id. Ibid., p. 106. 9 Id. Ibid. p. 100-101. 10 Apud. CHIAPUSSO, Jan. Bach’s World. Bloomington: Indiana University Press, 1968,
p.
40. 11 CARVALHO, Any Raquel. A Retórica em J. S. Bach. In: II Encontro de Pesquisadores em

Poética Musical dos Séculos XVI, XVII e XVIII: 2010, CMU-ECA-USP. 12 DAMMANN. Op. cit., p. 22-92. 13 “Wo die natürliche Musica durch die Kunst geschärft und poliert wird, da sieht und er

kennt man zum Teil (denn ganz kann’s nicht begriffen noch verstanden werden) mit großer Verwunderung die große und vollkommene Weisheit Gottes in seinem wunderbaren Werk Musica, in welcher vor allem das seltsam und wohl zu verwundern ist, dass einer eine schlichte Weise hersinget, neben welcher drei, vier oder fünf andere Stimme auch gesungen werden, die um solche schlichte, einfaltige Weise gleich als mit Jauchzen ringsherum spielen und springen, und mit mancherlei Art und Klang dieselbige Weise wunderbar zieren und schmücken und gleichwie einen himmlischen Tanzreigen führen, freundlich einander begegnen und sich gleich herzen und lieblich umfangen. Wer dem ein wenig nachdenket, und es nicht für ein unaussprechliches Wunderwerk des Herrn halt, der muss wahrlich ein grober Klotz sein und ist nicht wert, dass er ein Mensch heist, und sollte nicht anderes hören, denn wie der Esel schreit und die Sau grunzt.” WALTHER, Johann. Lob und Preis der himmlischen Kunst Musica (Wittenberg, 1564). In: BIESSECKER, Georg. Fünfstimmige Choralsätze des 16. und 17. Jahrhunderts. Heidelberg: Ruprecht-Karls-Universität, Dissertação de mestrado: 2004, p. 35-38.

14 “je näher ein Ding seinem Ursprunge ist, je vollkommener es ist: Derwegen, je weiter die Proportiones von der Unität als ihren Principio abweichen, je unvollkommener sie sind”. Apud: DAMMANN. Op. cit., p. 34.

15 AGOSTINHO, Santo. Confissões. Petrópolis: Vozes, 1997, X, 34; BOETHIUS, Ancius Manlius Severinus. Fünf Bücher über die Musik [De institutione musica libri quinque]. Hildesheim: Olms, 1985, I,2,3; PLATÃO. República, III,392c.

16 MATTHESON, Johann. Der Vollkommene Capellmeister (Hamburg, 1739). Kassel: Bärenreiter, 1954. I,3, 49-52.

17 Nach dem heiligen Wort Gottes / nichts is so billich / und so hoch zurühmrn und zuloben / als eben die Musica / nemblich / aus der Ursach / dass sie aller Bewegung des Menschlichen Hertzen ein Regierin / ihr mechtig und gewaltig ist / durch welche doch offtmals die Menschen / gleich als von ihrem Herren regiert und überwunden werden”. In: BIESSEKKER. Op. cit., p. 38.

18 “Musika ist eine halbe Disziplin und Zuchtmeisterin, so die Leute gelinder und sanftmütiger, sittsamer und vernünftiger machet.”. Apud. HOSLER, Bellamy. Changing views of instrumental music in Eighteenth Century Germany. University of Wisconsin-Madison: tese de doutorado, 1978, p. 78.

19 “Die Musika ist eine schöne, herrliche Gabe Gottes und nahe der Theologia. Ich kann mir meine geringe musikalische Begabung nicht um alles in der Welt verzeihen. Die Jugend soll man stets an diese Kunst gewöhnen, denn sie macht feine geschickte Leute aus ihnen”. Symphoniae Jucundae (1538). In: BIESSECKER. Op. cit., p. 36.

20 Aristóteles. Política. Madrid: Gredos, 1994. 1340b10-15.

21 “Nichts auff Erden krefftiger ist / die traurigen frölich / die frölichen traurig / die verzagten hertzenhafftig zu machen / die hoffertigen zur Demut zu reitzen / die hitzige und ubermessige Liebe zustillen und dempffen / den Neid und Hass zu mindern; und wer kan alle Bewegung dess Menschlichen Hertzen / welche die Leute regieren / und entweder zu Tugent oder zu Laster reitzen und treiben / erzehlen / dieselbige Bewegung des Gemüts / im Zaum zuhalten / und zuregieren / sage ich / ist nichts krefftiger / denn die Musica.” Symphoniae Jucundae (1538). In: BIESSECKER. Op. cit., p. 38.

22 “wiederumb zeuget die Schrifft / daß durch die Musica / der Sathan / welcher die Leute zu aller Untugent und Laster treibet / vertrieben werde / wie denn im Könige Saul angezeigt wirdt / uber welchen / wenn der Geist Gottes kam / so nam David die Harffen / und spielet mit seiner Hand / so erquicket sich Saul / und ward besser mit ihm / und der böse Geist weich von ihm.”. In: Id. Ibid., p. 37.

23 1 Sam. 16:15-23.

24 “Die Music mache die wilden Geister zahn,; erweiche das harte und rohe Wesen der Gemüther; polire die Sitten; mache die Leute fähiger zur Zucht-Lehre; verbinde die menschlichen Herzen auf eine süsse und angenehme Art mit einander, und bringe einen Abscheu zu wege vor allen solchen Lastern, die zur Strenge, Unmenschlichkeit und Frechheit führen.” In: MATTHESON. Op. cit., I,5,2, p. 28.

25 “Musica Poëtica (...) est illa Musicae pars, quae carmen musicum docet conscribere, conjugendo sonos Melodiarum in Harmoniam, variis periodorum affectionibus exornatam, ad animos hominum cordaque in varios motus flectenda”. In: BURMEISTER, Johann. Musica Poetica (Rostock, 1606). Laaber: Laaber, 2004, I,1.

26 “A partir de coisas não claras, embora mais manifestas, advêm clareza e maior inteligibilidade segundo o enunciado (...). É preciso que o enunciado definidor esclareça o fato e ainda contenha e expresse a causa. Os enunciados da definições, na verdade, são como conclusões.” In: ARISTÓTELES. De Anima. São Paulo: Editora 34, 2006, 413a11.

27 Apud. DAMMANN. Op. cit., p. 119-120.

28

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Brasília: UNB, 2001, 1140a1.

29 Estas figuras foram descritas por Dietrich Bartel em seu Musica Poetica: musical-rhetorical figures in german baroque music (Lincoln and London: University of Nebraska Press, 1998).

30 Aristóteles. Retórica. Madrid: Gredos, 1991, 1412b12.

31 “Conchiudo, le Figure Rettoriche altro non esser, che Un vezzo pellegrino, variante la Oratione dallo stile cotidiano & volgare: accioch’ ell’ habbia insegnamento congiunto com la novità: & l’uditore in um tempo impari godendo, & goda imparando.” In: TESAURO, Emanuele. Il Cannocchiale Aristotelico (Torino, 1670). Savigliano: Editrice Artistica Piemontese, 2000, p. 124 (1. ed. 1652).

32 “Ornamentum, sive figura musica est tractus [região] musicus; tam in harmonia, quam in melodia, certa periodo [volta completa], quae a clausula initium sumit, & in clausulam desinit circumscriptus, que a simplici compositionis ratione discedit, & cum virtute ornatiorem habitum assumit & induit”. In: BURMEISTER. Op. cit., XII.

33 SCHERING,Arnold. Die Lehre von den Musikalischen Figuren im 17. und 18. Jahrhundert. Kirchenmusikalisches Jahrbuch, v. 21, p. 106-114, 1908.

34 Linn, Marie Luise. “A. G. Baumgartens Aeshetica und die Antike Rhetorik”. In: SCHANZE, Helmut (Ed.). Rhetorik. Beiträge zur Geschichte in Deutschland vom 16-20. Jahrhundert. Frankfurt: Athenäum, 1974, p. 105-125.

Mônica Isabel Lucas -Graduou-se em clarinete na Universidade de São Paulo e especializou-se em flauta-doce e clarinetes históricos no Conservatório Real de Haia (Holanda). Pesquisa a retórica musical setecentista, tendo discorrido sobre a ideia de agudeza na obra de Haydn e sobre a visão retórica de Johann Nikolaus Forkel (1784), Ministra a disciplina “História da Música” no Departamento de Música da ECA-USP. É autora de “Humor e Agudeza em Joseph Haydn: os Quartetos de Cordas op.33” (São Paulo: Anna Blume, 2009).