ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL PAPERS / ARTICULOS ORIGINALES |
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PINHO, IIka
Chediak; SIQUEIRA, Josilucy Cristine Brito Aguiar; PINHO,
Lícia Maria Oliveira. AS PERCEPÇÕES
DO ENFERMEIRO ACERCA DA INTEGRALIDADE DA ASSISTÊNCIA.
Revista Eletrônica de Enfermagem, v. 08, n. 01,
p. 42 – 51, 2006. Disponível em http://www.revistas.ufg.br/index.php/fen |
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AS
PERCEPÇÕES DO ENFERMEIRO ACERCA DA INTEGRALIDADE DA ASSISTÊNCIA
THE
PERCEPTIONS OF THE NURSE CONCERNING THE COMPLETENESS OF THE ASSISTANCE
LAS
PERCEPCIÓNES DEL ENFERMERO SOBRE LA INTEGRALIDAD DE LA ASISTENCIA
IIka Chediak Pinho1
Josilucy Cristine Brito Aguiar Siqueira2
Lícia Maria Oliveira Pinho3
RESUMO: O presente estudo teve o objetivo
de conhecer os significados acerca da integralidade por enfermeiros
de Unidades de Saúde da cidade de Goiânia, Goiás. Trata-se de um
estudo descritivo com abordagem qualitativa. Por meio das falas
das enfermeiras entrevistadas emergiram duas categorias: “Integralidade:
entre o conhecer e o aplicar” e “Integralidade: o despreparo para
lidar com a subjetividade do outro”. O tema que emergiu foi a percepção
do enfermeiro acerca da integralidade da assistência. Este tema
desvela o relato das enfermeiras que conhecem, desconhecem e/ou
confundem o significado de integralidade, aplicando-os ou não em
seu cotidiano. O envolvimento e respeito com os usuários, entretanto,
revela a precária interação e despreparo para lidar com a dimensão
subjetiva nas práticas de atenção por parte de algumas enfermeiras.
A integralidade não deve ser transformada em um conceito, mas sim
numa prática do cuidado que trata da valorização da vida, do respeito
ao outro e das diferenças entre os seres humanos.
PALAVRAS-CHAVE: Cuidados de Enfermagem; Educação
em Enfermagem; Assistência Integral à Saúde.
ABSTRACT: This study had as aim to know the
meaning of health integrality for nurses of a Primary Health Services
in Goiânia, Goiás, by a descriptive study in a qualitative approach.
From interviewed nurses speeches two categories has emerged: “Completeness:
between knowing and applying” and “Completeness: the unprepared
to deal with the subjectivity of the other one”. The subject that
emerged was nurse’s perceptions concerning the completeness of the
assistance. This subject show the story of the nurses who know,
are unaware of and/or confuse about the completeness meaning, applying
them or not to their daily activities. The involvement and respect
with the patients, however, reveals the precarious interaction and
unprepared to deal with the subjective dimension in the assistance
practice. The completeness does not have to be made into a concept,
but in health care practice that deals life, respect to the other
and differences among human beings valuation.
KEY WORDS: Nursing Care; Nursing Education;
Comprehensive Health Care.
RESUMEN: Este estudio tuvo como objetivo,
conocer los significados de la integralidad de la salud para los
enfermeros de los servicios de atención primaria en salud de la
ciudad de Goiania, Goiás, por medio de un estudio descriptivo de
abordaje cualitativo. Por medio de los discursos de las enfermeras
se emergió las categorías: “Integralidad: entre el conocer e el
aplicar” e “Integralidad: el despreparación para tratar con la subjetividad
del otro”. El tema que emergió fue las percepciones de las enfermeras
en relación a integralidad de la asistencia en salud. Este tema
revela el relato de las enfermeras que conocen, desconocen o confunden
el significado de integralidad, lo utilizando o no en su cotidiano.
El envolvimiento e respecto con los usuarios, sin embargo, revela
las precarias interacciones y despreparación para ocuparse de la
dimensión subjetiva en las prácticas de atención en salud. La integralidad
no tiene que ser hecho en un concepto, sino en la práctica del cuidado
en salud que trata de la valorización de la vida del respecto al
otro y a las diferencias entre los seres humanos.
PALABRAS CLAVE: Atención de Enfermería; Educación
en Enfermería; Atención Integral de Salud. |
INTRODUÇÃO
A integralidade
não pode ser definida apenas como uma diretriz básica do SUS, mas
pode ser percebida como um conjunto de noções pertinentes a uma
assistência livre de reducionismo; com uma visão abrangente do ser
humano, tratando não somente como seres doentes, mas como pessoas
dotadas de sentimentos, desejos e aflições.
A integralidade
sugere a ampliação e o desenvolvimento do cuidar na profissão da
saúde, a fim de formar profissionais mais responsáveis pelos resultados
das práticas de atenção, mais capazes de acolhimento, de vínculo
com os usuários das ações e serviços de saúde e, também, mais sensível
às dimensões do processo saúde /doença inscrita nos âmbitos da epidemiologia
ou terapêutica.
O enfermeiro como
um profissional participante da equipe multi-profissional, deve
engajar-se na luta dos valores preconizados pelo SUS, bem como na
concretização da integralidade na Rede Básica de Saúde.
Na década de 70,
criou-se o Sistema Nacional de Saúde (SNS), onde foi consolidada
uma antiga divisão entre as instituições responsáveis pela saúde
pública (Ministério da Saúde) e pela assistência médica (Ministério
da Previdência Social). Essa fragmentação no sistema de saúde foi
criticada, pois se criou um local para formulação de uma política
de saúde que promovesse a articulação da assistência e da saúde
pública, havendo uma distinção entre a política de saúde pública
e a assistência médica.
Segundo MENDES
(1999), as políticas de saúde foram caracterizadas no período de
1980-90, por seu desenvolvimento no contexto de uma crise econômica,
expressada por meio da deterioração da situação cambial, da aceleração
inflacionária, da recessão e, principalmente, da ruptura de um padrão
de crescimento apoiado na articulação solidária entre Estado, empresas
multinacionais e empresas privadas nacionais.
De acordo com MENDES (1999), a proposta de descentralização surgiu
com a criação do SUDS, em 1987. Sendo seus princípios, aqueles incorporados
da Reforma Sanitária (1986): universalização, integralidade da atenção,
regionalização, hierarquização, descentralização do processo decisório,
democratização das instâncias gestoras e políticas integradas de
recursos humanos.
O SUDS incorporou
conteúdos estratégicos visando realizar os princípios da reforma
sanitária e preparar sua transição para o SUS.
Em 1988, foi promulgada
a Constituição Federal, a qual definiu saúde como dever do Estado
e direito da população e, que as ações e os serviços de saúde são
de importância pública e devem ser providos por um Sistema Único
de Saúde (SUS), cujas diretrizes são: descentralização; mando único
em cada esfera do governo; atendimento integral; e participação
comunitária.
Conforme a Lei
Orgânica da Saúde, nº. 8.080, de 19 de setembro de 1990, Título
I, Art.3°, a saúde tem como fatores determinantes e condicionantes,
entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio
ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer
e o acesso aos bens e serviços essenciais. Os níveis de saúde da
população expressam a organização social e econômica do país.
Nos dias atuais,
na busca por uma melhor assistência à saúde faz-se necessário o
cumprimento das diretrizes e princípios do SUS. Particularmente
do atendimento integral ao paciente, tendo em vista sua implicação
numa prática de qualidade, que desenvolva capacidade de análise
crítica de contextos. A ação integral pressupõe mudanças nas relações
de poder entre os profissionais de saúde e, entre o profissional
de saúde e o usuário.
O SUS preconiza
dentro de seus princípios e diretrizes, a integralidade de assistência,
que é entendida como “conjunto articulado e contínuo das ações e
serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigido
para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema” (Lei
8.080/90).
Os níveis de complexidade
do sistema estão dispostos em três, sendo que, o nível primário
está qualificado para atender e resolver os principais problemas
que demandam serviços de saúde. Os que não forem resolvidos neste
nível deverão ser referenciados para os serviços de maior complexidade
tecnológica. O nível secundário, são os centros de especialidades
e, no nível terciário de atenção à saúde estão os hospitais de referência.
Todo cidadão tem
direito a uma assistência global, onde o profissional de saúde,
em questão o enfermeiro, deve ter uma visão holística. Assim sendo,
a relação entre o enfermeiro e o paciente deve discorrer de tal
forma que sejam considerados os aspectos emocionais, econômicos
e culturais, onde o diálogo entre paciente e enfermeiros é primordial.
Esta assistência proporciona tanto o bem-estar físico como mental
e ambiental, permitindo a atuação do profissional, também na prevenção
de doenças, e desta forma, é possível perceber a importância do
conhecimento da integralidade, por parte dos profissionais de saúde,
na Rede Básica. Diante destas questões, foi estabelecido como objetivo
deste estudo conhecer os significados sobre a integralidade por
enfermeiros de Unidades de Saúde da cidade de Goiânia, Goiás.
REVISÃO DA LITERATURA
A Lei Orgânica
da Saúde, em seu artigo 198, II, estabelece prioridades para as
atividades preventivas, coerentemente com o mandamento enunciado
no artigo 196 que diz respeito ao combate às causas da doença e
de outros agravos. Constitucionalmente, o SUS é organizado de acordo
com as seguintes diretrizes: a descentralização, o atendimento integral,
e a participação da comunidade. De acordo com essas diretrizes constitucionais,
o SUS obedece aos seguintes princípios: universalidade de acesso
aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência; integralidade
da assistência; preservação da autonomia da pessoa na defesa da
sua integridade física e moral; igualdade de assistência; direito
à informação; divulgação de informações sobre o potencial dos serviços
de saúde e a sua utilização pelo usuário; utilização da epidemiologia
para o estabelecimento de prioridades, a alocação de recursos e
a orientação programática; participação da comunidade e, descentralização
político-administrativa com direção única em cada esfera do governo.
Segundo SANTOS
& CARVALHO (1995, p.77) “a leitura do princípio da integralidade
da assistência há de se fazer combinadamente como o princípio da
igualdade de assistência (inciso IV). Em primeiro lugar a assistência
integral combina de forma harmônica e igualitária, as ações e os
serviços de saúde preventivos com as assistências ou curativos.
Em segundo lugar a assistência implica, como se enuncia atenção
individualizada, ou seja, para cada caso, segundo suas exigências,
e em todos os níveis de complexidade”.
O conceito de
integralidade é um dos pilares a sustentar a criação do Sistema
Único de Saúde. Princípio consagrado pela Constituição de 1988,
seu cumprimento pode contribuir muito para garantir a qualidade
da atenção à saúde e, conseqüentemente, a melhoria da qualidade
de vida do usuário que utiliza o serviço do SUS.
Para CAMPOS (2003),
o sistema de saúde busca oferecer atualmente a assistência integral
através de uma maior articulação das práticas e tecnologias relativas
ao conhecimento clínico e epidemiológico. O primeiro desafio na
busca do atendimento integral é reestruturar a forma como os distintos
estabelecimentos e organizações do setor saúde trabalham ainda até
os dias de hoje. A mudança das práticas de saúde deve ocorrer em
dois níveis. O primeiro, institucional, da organização e articulação
dos serviços de saúde. O segundo, das práticas dos profissionais
de saúde, no qual a equipe de saúde é determinante do processo de
estruturação das práticas integrais à saúde.
Outro aspecto
ligado à integralidade refere-se à garantia de acesso do indivíduo,
aos três níveis de atenção à saúde, nível primário, nível secundário
e nível terciário. A idéia de que níveis de complexidade estejam
relacionados diretamente com menor ou maior grau de especialização
leva à idéia de que a atenção primária à saúde apresenta menor grau
de dificuldade ou exige menor grau de conhecimento ou habilitação.
CAMPOS (2003), afirma que isso é um equívoco, pois o nível de complexidade
mais básico do sistema está relacionado com a necessidade de conhecimentos
mais abrangentes, enquanto os níveis secundário e terciário são
mais específicos ou parcelados/especializados, e usam intensivamente
procedimentos baseados em aparelhos e exames. No nível primário
são utilizadas intervenções com enfoque preventivo, comunitário
e coletivo, destinadas a atender aos problemas mais comuns da população.
Na integralidade
o modo de entender e abordar o indivíduo baseia-se na teoria holística,
integral. Para o holismo o homem é um ser indivisível e não pode
ser explicado por seus aspectos físico, psicológico e social, ou
seja, avaliados separadamente.
A garantia do
princípio da integralidade implica dotar o sistema de condições
relacionadas às diversas fases da atenção à saúde, ao processo de
cuidar, ao relacionamento do profissional de saúde com os pacientes.
Indivíduos e coletividades devem dispor de um atendimento organizado,
diversificado e humano. Esse princípio, portanto, não exclui nenhuma
das possibilidades de se promover, prevenir e restaurar a saúde
e reabilitar os indivíduos. Para se alcançar a integralidade no
sistema de saúde faz-se necessário que os gestores municipais, estaduais
e federais passem a dar prioridade a este princípio.
De acordo com
GIOVANELLA et al (2000), os sistemas integrais de saúde deveriam
atender a algumas premissas básicas, quais sejam: a primazia das
ações de promoção e prevenção; a garantia de atenção nos três níveis
de complexidade da assistência médica; a articulação das ações de
promoção, prevenção, cura e recuperação; a abordagem integral do
indivíduo e famílias.
O Ministério da
Saúde e o Ministério da Educação realizaram um Seminário Nacional
sobre o Aprender SUS em que apresentaram sugestões de mudanças nas
graduações da área da saúde (BRASIL, 2004). Destaca que a integralidade
da atenção à saúde supõe, entre outros aspectos, a ampliação e o
desenvolvimento da dimensão cuidadora no trabalho dos profissionais
para que se tornem mais responsáveis pelos resultados das práticas
de atenção, mais capazes de acolhimento, de vínculos com os usuários
das ações e serviço de saúde e, também, mais sensíveis às dimensões
do processo saúde /doença não inscritas nos âmbitos tradicionais
da epidemiologia ou da terapêutica.
Ainda destacando
os objetivos do Seminário Aprender SUS a atenção integral à saúde
implica ampliação dos referenciais com que cada profissional de
saúde trabalha na construção de seu repertório de compreensão e
ação e, ao mesmo tempo, o reconhecimento da limitação da ação uniprofissional
para dar conta das necessidades de saúde dos indivíduos e das populações.
Destaca-se que a atenção integral implica em mudanças nas relações
de poder entre profissionais de saúde (para que efetivamente constituam
equipe multiprofissional) e entre profissionais de saúde e usuários
(para que se desenvolva efetivamente a autonomia dos usuários).
A integralidade
dispõe de práticas inovadoras em todos os espaços de atenção a saúde
e em diferentes cenários. Nesse sentido, a integralidade requer
a implementação clara e precisa de uma formação para as competências
gerais necessárias a todos os profissionais de saúde, tendo em vista
uma prática de qualidade, qualquer que seja seu local e área de
atuação, que desenvolva a capacidade de análise crítica de contextos
e que problematize saberes e processos de educação permanente, no
desenvolvimento das competências especificas de cada trabalho.
Segundo PINHEIRO
(2003), a integralidade do cuidado na atenção às pessoas deve ser
entendida como um princípio norteador de uma política de Estado
para a Saúde – o SUS - que tem no campo das práticas um espaço privilegiado
para a materialização da saúde como direito e como serviço. Isso
significa dizer que a Integralidade, como eixo norteador de uma
política, deverá ser construída cotidianamente, por permanentes
interações democráticas dos atores, pautada por valores emancipatórios
fundados na garantia da autonomia, no exercício da solidariedade
e no reconhecimento da liberdade de escolha do cuidado e da saúde
que se deseja obter.
Concordamos com
a declaração de Regina Henriques, enfermeira e ex-diretora da Universidade
Estadual do Rio de Janeiro, de que a natureza do trabalho da enfermagem
é dialogar com o paciente o tempo inteiro, e que para isso, é necessário
buscar formas de dialogar com a pessoa de quem está se cuidando.
Na prática da enfermagem, o cuidado mais humano é um elemento muito
presente. A enfermagem teve também, por muito tempo, os cursos marcados
pela questão da tecnologia e da ciência. Então, se por um lado,
os enfermeiros têm a facilidade do contato direto, por outro, algumas
coisas ficaram sem aprofundamento na história. Ao trazer a integralidade
como eixo de discussão, essas questões têm vindo à tona. Assim,
vemos a necessidade de discutir entre nossos pares para desmistificar
algumas coisas, compreender porque o enfermeiro, que tanto fala
do cuidado integral e humanizado, afasta-se do paciente e envolve-se
com outras atividades cada vez mais administrativas.
CAMINHO METODOLÓGICO
O trabalho realizado
foi um estudo descritivo com abordagem qualitativa que busca o desvelar
do fenômeno por si mesmo, na sua essência. Sua ênfase está na compreensão
do que se deseja conhecer, e não em teorias explicativas. Optamos
por esta abordagem por acreditar ser ela a que melhor atende o nosso
objeto de estudo. Segundo MARTINS & BICUDO (1994, p.23), a abordagem
qualitativa “(...) busca uma compreensão particular daquilo que
estuda (...) não se preocupa com generalizações, princípios e leis
(...) o foco de sua atenção é centralizado no especifico, no peculiar,
na individualidade, almejando sempre a compreensão e não as explicações
dos fenômenos estudados”.
Por meio de relatos de enfermeiras que já vivenciaram no cotidiano
o fenômeno em questão se deu a compreensão do mesmo.
Conforme MARTINS
& BICUDO (1994), as descrições para experiências que os sujeitos
viveram, estão nelas as essências do que se busca conhecer e a intencionalidade
do sujeito. A essência do fenômeno não é o fim da análise, mas o
meio pelo qual se pode trazer à luz o que as relações vividas apresentam
de essenciais. Desta forma, o objetivo da pesquisa buscou descrever
a natureza da experiência vivida
Este projeto teve
início após a aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade
Católica de Goiás (CAAE nº 0063.0.168.000-05) e contém relatos de
Enfermeiras que atuam há mais de um ano na profissão e em uma das
Unidades Básicas de Saúde que compõe o Distrito Sanitário da Região
Noroeste de Goiânia, ou seja: CAIS Finsocial, CAIS Jardim Curitiba
e Maternidade Nascer Cidadão, que se dispôs a colaborar voluntariamente
com a pesquisa.
As informações
coletadas foram realizadas pelas pesquisadoras, por meio de entrevista
semi-estruturada, gravadas em fita cassete, com a prévia autorização
do sujeito, que assinou o termo de consentimento e livre esclarecido
(Anexo II). Foi mantido o sigilo e o anonimato dos participantes,
conforme a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (BRASIL,
1996). Encerramos a coleta de dados no momento em que percebermos
a saturação por repetições e convergências do conteúdo investigado
Em busca do desvelar
do fenômeno formulamos duas questões norteadoras para que o indivíduo
revelasse seu pensar:
- Fale para nós
sobre integralidade.
- Em que momento
do seu cuidar cotidianamente você identifica a integralidade?
O DESVELAR DO FENÔMENO
Renomeação dos sujeitos
A renomeação dos sujeitos
foi realizada baseada na observação das características pessoais
apresentadas pelas enfermeiras, no momento das entrevistas e por
meio da análise dos seus relatos.
Avaliando separadamente
o comportamento e a forma de expressão de cada enfermeira, selecionamos
alguns substantivos derivados de adjetivos que mais se assemelham
e refletem as características pessoais de maior destaque.
Os substantivos
atribuídos às enfermeiras são identificados como: amizade, sensibilidade,
parceria, sinceridade, gentileza, indiferença, comunicação, compreensão
e equívoco.
INTEGRALIDADE:
entre o conhecer e o aplicar Nesta categoria agrupamos
relatos das enfermeiras participantes deste estudo que conhecem, desconhecem
e/ou confundem o significado de integralidade, aplicando-os ou não
em seu cotidiano. Entendem integralidade, como atender o paciente
como um todo, de forma holística e globalizada. Como podemos ler abaixo:
|
“... nossa integralidade é você está atendendo o paciente
como um todo. Você Ver o indivíduo como um todo” Amizade
“Integralidade é ver o doente de forma holística. É vê-lo como
pessoa física, espiritual, emocional, social, econômica, vê-lo
como um todo. E cuidar dos seus problemas de forma que a gente
respeite o todo.” Sensibilidade
“Atendimento integral [...] você atende de modo global, globalizado,
como o mundo de hoje está globalizado, então o atendimento é globalizado,
a gente, pelo menos, a gente está caminhando para isso. Às vezes,
existem algumas falhas [...] a gente está buscando atender o usuário,
hoje a gente não chama mais de paciente, a gente está buscando
atender o usuário de maneira global, tanto do lado psicológico,
social, é aspecto integralizado mesmo. Aqui, por exemplo, a gente
trabalha o médico, a enfermagem, a psicóloga.”Parceria
“A integralidade do paciente, quando ele chega aqui, eu não quero
cuidar só daquela ferida, naquele momento. Eu quero vê-lo como
um todo. Eu quero ver como ele está na casa dele, até que ponto
vai influenciar na cura desse paciente. É muito importante eu
ver isso. [...] É justamente ver o paciente como um todo. E no
entanto não faz isso. Então fica muito difícil. Você fala as coisas,
mas no papel está, mas na hora de você fazer, você não tem condição.
E isso deixa você frustrada.” Sinceridade
“... não só cuidar daquele aspecto restrito, mas da pessoa como
um todo... físico, mental, espiritual.” Gentileza
“Integralidade é aquele respeito que nós temos que ter com o paciente,
na minha profissão. Vendo que o paciente é a parte principal na
nossa relação. Tratar o paciente como um todo, tanto social como
psicologicamente.”Indiferença
“Eu entendo integralidade como a visão do todo do paciente. Não
só do paciente, mas, qualquer pessoa que... do cliente que você
está atendendo ou dos funcionários. [...] é você está enxergando
o paciente, cliente, de forma como o todo, não uma parte só. No
caso a gente que trabalha aqui na saúde da família, a gente atende
o paciente, ele chega aqui com falta de dinheiro, com o marido
que bate, com falta de um monte de coisas, carente. Um exame de
prevenção que a gente faz, não dá simplesmente pra você chegar,
o paciente entra aqui, você colher a prevenção. O que a gente
tem que fazer, é realmente, consultar o paciente, ver as necessidades
dele, emocionais e tudo mais. Explicar o que é a consulta, pra
quê você está fazendo aquilo. [...] Mas acho que a forma de atendimento,
a gente tem que atender as pessoas como a gente gostaria de ser
atendido. [...] significa que você tem que está vendo todas as
partes, as faces desse indivíduo”Comunicação
“o cliente deve ser visto de maneira ampla e integral [...] não
basta estarmos focados apenas num sinal e/ou sintoma, abrangência
deve ir além disso, buscando estar atentos em todos os níveis
socioeconômicos do cliente, pois muitas vezes o cliente precisa,
além do tratamento específico, de uma palavra de carinho, uma
atenção ou um simples bom dia, principalmente quando lidamos com
usuários de baixo poder socioeconômico.” Compreensão
“O cuidar não só pela enfermagem porque as pessoas tem noções
de que o cuidar é só do enfermeiro. É o cuidar do psicólogo, o
cuidar do médico, o cuidar de toda a equipe multidisciplinar.[...]
A gente não tá vendo ele não só com o fator doença, a gente tá
vendo a questão sócio-econômica, é na questão cultural.”Equívoco
Para PINHEIRO
& MATTOS (2004), o cuidado deve ser apreendido como uma ação
integral, que tem significados e sentidos voltados para compreensão
de saúde como o direito de ser. É o tratar o respeitar, o acolher,
o atender o ser humano em seu sofrimento, em grande medida fruto
de sua fragilidade social. A ação integral é também entendida como
o “entre-relações” de pessoas, ou seja, ação integral como efeitos
e repercussões de interações positivas entre usuários, profissionais
e instituições, que são traduzidas em atitudes como: tratamento
digno e respeitoso, com qualidade, acolhimento e vínculo. Essas
ações são inerentes à prática profissional de algumas enfermeiras
das instituições pesquisadas, conforme pode ser verificado nos relatos
a seguir:
“A integralidade do paciente, quando ele chega aqui,
eu não quero cuidar só daquela ferida, naquele momento. Eu quero
vê-lo como um todo. Eu quero ver como ele está na casa dele, até
que ponto vai influenciar na cura desse paciente. É muito importante
eu ver isso. [...] É justamente ver o paciente como um todo. E,
no entanto, não faz isso. Então fica muito difícil. Você fala
as coisas, mas no papel está, mas na hora de você fazer, você
não tem condição. E isso deixa você frustrada”.
A integralidade
não pode ser percebida como atributo da boa prática biomédica, mas
como um atributo que permeia a prática de todos os profissionais
de saúde, independente dela se dar no âmbito público ou privado.
Deve ser fruto do esforço e confluência dos vários saberes de uma
equipe multiprofissional, no espaço concreto e singular dos serviços
de saúde.
Segundo PINHEIRO
& MATTOS (2001) são consideradas “integralidade focalizada”
aquela que é trabalhada no espaço bem delimitado (focalizado) de
um serviço de saúde. O resultado dessa integralidade há de ser o
resultado do esforço de cada um dos trabalhadores e da equipe como
um todo. Cada atendimento, de cada profissional, deve estar compromissado
com a maior integralidade possível, sempre, mas também ser realizado
na perspectiva de que a integralidade pretendida só será alcançada
como fruto do trabalho solidário da equipe de saúde, com seus múltiplos
saberes e práticas. Maior integralidade possível na abordagem de
cada profissional, maior integralidade possível como fruto de um
trabalho multiprofissional.
Diante disso,
concluímos que a integralidade pode estar presente no atendimento
individual de cada profissional pertencente à equipe de saúde, no
entanto, evidenciamos nos relatos de Parceria e Confusão, uma mistura
de conceitos, em que a definição de integralidade é confundida com
a de multidiciplinaridade.
“Atendimento integral [...] você atende de modo global,
globalizado, como o mundo de hoje está globalizado, então o atendimento
é globalizado, a gente, pelo menos, a gente está caminhando prá
isso. Às vezes existe algumas falhas [...] a gente está buscando
atender o usuário, hoje a gente não chama mais de paciente, a
gente está buscando atender o usuário de maneira global, tanto
do lado psicológico, social, é aspecto integralizado mesmo. Aqui,
por exemplo, a gente trabalha o médico, a enfermagem, a psicóloga.
[...]Que o trabalho individual, no consultório, eu acho que ele
fica um pouco a desejar” Parceria
“O cuidar não só pela enfermagem porque as pessoas tem noções
de que o cuidar é só do enfermeiro. É o cuidar do psicólogo, o
cuidar do médico, o cuidar de toda a equipe multidisciplinar.”
Equívoco
De acordo com
PINHEIRO & LUZ (2003), a concretização da integralidade não
passa, portanto, pela aplicação exclusiva dos saberes disciplinares
já existentes, mas pela construção incessante de práticas eficazes.
Trata-se de um desafio que tem como horizonte não apenas um êxito
técnico, mas um sucesso prático, que se diferencia daquele na medida
em que tem de ser remetido explicitamente ao plano das relações.
A integralidade
deve fazer parte da filosofia da enfermagem. A valorização da essência
do ser humano deve conduzir o pensamento e as ações do enfermeiro,
tornando-o capaz de criticar e construir uma realidade mais humana.
No entanto, constatamos que a integralidade não é compreendida em
toda sua magnitude, por grande parte das entrevistadas. O que nos
leva a refletir e questionar a qualidade da assistência prestada
aos usuários que procuram os serviços públicos de saúde.
INTEGRALIDADE: o despreparo para lidar com a subjetividade
do outro As enfermeiras entrevistadas
deixaram transparecer em suas falas a adoção ou não da humanização
na assistência, relatando seus conhecimentos e experiências vivenciadas
no cotidiano. Por meio dos relatos, notamos o envolvimento e respeito
com os usuários, entretanto, podemos observar a precária interação
e despreparo para lidar com a dimensão subjetiva nas práticas de atenção,
por parte de algumas enfermeiras, como descrito nos discursos abaixo:
“Eu acho
que a todo o momento, não só dentro do consultório, mas principalmente
quando a gente também trabalha em grupo, faz a visita domiciliar,
a gente trabalha essa questão da integralidade. A gente tenta
conhecer o paciente na sua casa, na sua moradia, com relações
familiares, nas suas condições de trabalho, nas suas condições
de moradia e, isso passa também através do atendimento que a gente
faz, em grupo com o paciente. A gente tenta trabalhar toda aquela
problemática que a gente vivencia na casa [...] você trabalha
também as questões que foram levantadas na vivência que a gente
tem com esse paciente.”Amizade
“Sempre, em todos os momentos que eu as minhas orientações,
as minhas prescrições de enfermagem, eu penso na integralidade,
porque às vezes você está diante de uma pessoa aqui que tem problema
a que não é só, é digamos patológico. Ele tem outros problemas
espirituais, emocionais, financeiros, e a gente faz as nossas
orientações visando tudo isso. [...] Então a gente tem que enxergar
o paciente e, como ele pode alcançar a saúde da melhor forma possível,
qual o caminho que a gente pode traçar pro paciente da melhor
forma possível. Se o paciente, por exemplo, tem diabetes não pode
ser emocional? É, ou se ele tem a diabetes e a gente passa a dieta
e polipídica, muita fruta, muita verdura, ele tem dinheiro pra
comprar? Quais tão mais baratas, quais a gente pode está orientando,
isso é verificar o paciente de forma integral. É, levar que ele
tenha saúde da melhor forma, da maneira mais adequada, na medida
da necessidade dele mesmo, não é isso? ”Sensibilidade
“... nos trabalhos em grupo que a gente faz [...] eu vejo
integralidade nos trabalhos de grupo [...]. Que o trabalho individual,
no consultório, eu acho que ele fica um pouco a desejar”Parceria
“Você fala as coisas, mas no papel está, mas na hora de você
fazer, você não tem condição. E isso deixa você frustrada. [...]
nem no PSF, que está pra fazer isso, ele não faz. Eles acham que
não tem tempo, eles acham que agenda as pessoas e não tem condição
de atender bem. [...] Se as vezes você chega lá na emergência,
tem um paciente que está brigando, que ele quer ser consultado
agora. Você olha nele, está cheio de manchas roxa, paciente está
chorando, aí você traz ela pra sua sala, você vai conversar com
ela, você vai ver que não é isso que ela está precisando. O simples
ensinar uma mãe como dá o banho na criança, como amamentar. O
carinho que essa amamentação passa pra essa criança. Isso é saber
acompanhar esse paciente, não só aqui na fase curativa não, na
preventiva. [...] aí você vai ver o paciente mais como um todo,
a integralidade por inteiro”Sinceridade
“... em todo momento. É quando eu chego de manhã pra fazer
visita pro paciente. [...] No antes, pré ou pós o parto. No momento
até daquela abordagem, daquela visita, eu olho a pessoa como um
todo. Eu acho que a integralidade tem que tá em todo momento.
É o momento que eu posso olhar a pessoa de uma maneira fragmentária.
[...] No momento mais específico, mais delicado, no momento do
parto mesmo; pré-parto imediato e no parto. Eu acho que é esse
o momento que você tem que ter esse olhar de mais integralidade
[...] a gente participa junto com o médico [...] dando aquele
apoio pessoal. É nesse sentido. Não simplesmente ela vai dar a
luz, vai terminar, vai estar ali inteira.”Gentileza
“Eu atuo com integralidade em todo momento da minha vida.
Todo paciente que vem aqui eu respeito muito. [...] Não deixando
os problemas de o paciente interferir na minha conduta. [...]
Eu tenho que muitas vezes que pôr uma couraça, assim... pra que
o paciente traz pra mim, não me afeta. Eu tenho que tratar o paciente
como um todo mas, de acordo com o que ele está sentindo. [...]
O paciente vem aqui e chora. Quer que eu envolva na vida dele
e, eu trato ele como um ser humano, mas, ele lá e eu cá. Vem pra
mim com todos seus deveres, todas suas carências mas, eu não posso
deixar me influenciar”Indiferença
“... na hora do exame de prevenção, por exemplo. Ou na hora
do CD (crescimento e desenvolvimento da criança), que a gente
vai fazer aferimento da criança [...] só, por exemplo, a criança
chegou aqui com febre. Eu só vou, é... orientar, encaminhar pro
medico, falar: não! Vai lá ao médico que ele te passa um anti-térmico.
Não é só isso. Tem que ver por trás disso o quê que está acontecendo.
[...] realmente é ver a pessoa, todas as faces da pessoa [...]
tem que está é orientando, esclarecendo, informando realmente.
Mas a gente tem muitos casos de pessoa, não tem realmente o que
comer. Isso é um fator dificultador.”Comunicação
“... Sempre, sempre, sempre, sempre, chegou o paciente tem
que identificar.”Equívoco
De acordo com
FELDMANN et al (1973), humanizar é tudo que desperta o sentimento
de solidariedade humana e concorre para facilitar a circulação do
homem no mundo.
MEZOMO (1980),
afirma que humanizar é um processo vivencial que permeia toda atividade
do local e das pessoas que ali trabalham, dando ao paciente o tratamento
que ele merece como pessoa.
Uma prática humanizada
em saúde é aquela capaz de oferecer atendimento de qualidade, articulando
os avanços tecnológicos com o bom relacionamento; incentivo do diálogo
entre os profissionais e com os usuários; vínculo entre profissional
e usuário, proporcionando assim, um tratamento digno e respeitoso.
Esta prática pode ser notada através do discurso de Compreensão:
“... desde
que a gestante chega à Unidade para o pré-natal (não preocupo
apenas com a barriga, mas também com necessidades e anseios da
gestante), depois durante o trabalho de parto (parturiente é atendida
de acordo com as necessidades do momento do trabalho de parto,
inclusive com esclarecimento sobre suas dúvidas e anseios) e,
finalmente, no puerpério (visão vinculo enfermeiro- puerpera e
recém-nascido – bem estar e boa evolução).”
Concordamos com
BOFF (1998), que um dos aspectos envolvidos no cuidar são os sentimentos
de solidariedade, amor, compaixão, honestidade, preocupação e desvelo.
O cuidado que humaniza acontece porque somos seres humanos, sentimos
afeto, amor (fenômeno cósmico e biológico), são sensíveis e tomamos
decisões buscando o equilíbrio. Cuidar implica em sentir afeto,
ternura, em acariciar pelo toque, em conviver.
Acreditamos que
o cuidado da enfermagem deve ser ético, e por isso pressupõe habilidades
técnicas, conhecimento, sensibilidade e experiências entre outros.
Tal cuidado é guiado por ações que assiste, oferece suporte e facilita
ou melhora sua condição humana de vida. Engloba a saúde em sua integralidade,
nos seus aspectos psicobiológicos, espiritual, social e político.
Como podemos ver abaixo:
“... porque
às vezes você está diante de uma pessoa aqui que tem problema
a que não é só, é digamos patológico. Ele tem outros problemas
espirituais, emocionais, financeiro, e a gente faz as nossas orientações
visando tudo isso. [...] Então a gente tem que enxergar o paciente
e, como ele pode alcançar a saúde da melhor forma possível, qual
o caminho que a gente pode traçar pro paciente da melhor forma
possível.”Sensibilidade
“... você tem que ter esse olhar de mais integralidade [...]
a gente participa junto com o médico [...] dando aquele apoio
pessoal. É nesse sentido. Não simplesmente ela vai dar a luz,
vai terminar, vai estar ali inteira..”Gentileza
COSTA (2004),
afirma que o diálogo humaniza a relação entre indivíduos que são
fundamentalmente distintos, permitindo a aproximação e a confiança
necessária ao processo da cura.
No encontro do
usuário com a equipe de saúde deve ocorrer a conversação, na qual
deve prevalecer a capacidade de escuta, de forma a permitir a apreensão
das necessidades de saúde, trazida por aquela pessoa que busca o
serviço. Estamos certas que o diálogo constitui parte do tratamento
cuidadoso e domina uma dimensão decisiva de toda a ação de enfermagem.
Sinceridade e Comunicação colocam que:
“Você olha nele, tá cheio de manchas roxa, paciente está
chorando, aí você traz ela pra sua sala, você vai conversar com
ela, você vai ver que não é isso que ela está precisando. [...]
Isso é saber acompanhar esse paciente, não só aqui na fase curativa
não, na preventiva. [...] aí você vai ver o paciente mais como
um todo, a integralidade por inteiro”
“...a criança chegou aqui com febre [...] Tem que ver por trás
disso o quê que está acontecendo. [...] realmente é ver a pessoa,
todas as faces da pessoa [...] tem que está é orientando, esclarecendo,
informando realmente.”
Segundo BOFF (2004),
um outro aspecto a ser discutido na formação do profissional é a
desumanização como mecanismo de defesa dos profissionais. O contato
com o sofrimento humano pode gerar ansiedade e, como conseqüência,
um afastamento, uma dificuldade de interagir com o sujeito.
Por outra parte,
PINHEIRO & MATTOS (2001), afirmam que a desvalorização, por
parte do profissional de saúde, na relação com o paciente, se deve
em grande medida à falta de uma formação específica voltada para
a comunidade, o que considera fundamental para o estabelecimento
do vínculo.
COSTA (2004) enfatiza
que a lógica centrada no profissional, na ação curativa e focada
na queixa, produza efeitos presentes numa prática de saúde desumanizada,
não é possível, contudo, atribuir-lhe uma total responsabilidade
na manutenção das condições de precariedade do sistema de atenção
à saúde.
Sabemos que formação
a acadêmica tem importante contribuição neste contexto, uma vez
que, com a existência de um ensino não reducionista e menos fragmentado,
seria cada vez mais freqüente a formação de profissionais capazes
de apreender de seus pacientes suas necessidades de modo mais integral.
Por meio da fala
de Indiferença, podemos evidenciar sua incapacidade de estabelecer
uma relação com o outro, estando impossibilitada de tratar com sujeitos,
focando-se apenas na doença, optando por um modelo de atenção centrado
na relação queixa/conduta.
“...Não
deixando os problemas do paciente interferir na minha conduta.[...]
Eu tenho que muitas vezes que pôr uma couraça, assim... pra que
o paciente traz pra mim, não me afeta. Eu tenho que tratar o paciente
como um todo mas, de acordo com o que ele está sentindo. [...]
O paciente vem aqui e chora. Quer que eu envolva na vida dele
e, eu trato ele como um ser humano, mas, ele lá e eu cá. Vem pra
mim vem com todos seus deveres, todas suas carências mas, eu não
posso deixar me influenciar”
Acerca de tudo
que a literatura científica discute sobre a integralidade, inferimos
que a noção do todo relacionada à saúde é, portanto, preocupação
antiga e afirma que o cuidado do corpo pela ação da enfermagem não
é possível sem o simultâneo cuidado da alma. No entanto, nem isso
seja o bastante, pois talvez seja até impossível fazê-lo sem o conhecimento
do ser na sua integralidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao finalizarmos
este trabalho percebemos que o nosso aprendizado foi grande, no
que diz respeito à compreensão do termo integralidade. O que nos
proporcionou uma visão ampliada acerca do tema em questão, uma reflexão
sobre nossas práticas e ações como futuras enfermeiras, bem como
nos levou a questionar a qualidade da assistência de enfermagem
que é oferecida à população, na Rede Básica de Saúde.
Percebemos que
há um despreparo por parte das enfermeiras participantes do presente
estudo para lidar com a subjetividade do outro e, para estabelecer
uma interação satisfatória com o usuário do sistema de saúde. Acreditamos
que um dos fatores condicionantes para esta situação, é a existência
de um ensino, ainda fragmentado e reducionista, nas faculdades de
enfermagem. Um outro fator dificultador é a falta de investimentos,
por parte das Unidades de Saúde, na qualificação profissional de
seus funcionários, inclusive da equipe de enfermagem; podemos citar
ainda, o desinteresse de algumas enfermeiras em manterem-se atualizadas
no campo do conhecimento.
A academia deveria
proporcionar aos alunos um ensino que contempla a totalidade do
cuidado, a humanização no atendimento, destacando a subjetividade
e a singularidade do usuário. Acreditamos ainda, que a prática da
integralidade deveria ser instituída nas academias, onde a apreensão
de termos como vínculo, acolhimento, afetividade e respeito estariam
presentes na relação professor–aluno–departamento, facilitando assim,
a internalização da integralidade por parte dos alunos e conseqüente
reflexão da mesma em suas futuras relações profissionais.
As Unidades de
Saúde deveriam promover seminários, debates e incentivar a educação
continuada, com a abordagem de temas como integralidade, humanização,
dentre outros relacionados a políticas de saúde, a fim de promover
o aperfeiçoamento profissional e conseqüentemente a melhora da assistência
prestada aos usuários da Rede Básica.
Ainda que se exista
uma academia capacitada para oferecer um ensino livre de fragmentações
e, Unidades de Saúde empenhadas na promoção da capacitação profissional,
a qualidade do atendimento e a assistência integral e humanizada
do cuidado não poderia ser garantida, se as enfermeiras não possuírem
empatia, compromisso, respeito com os usuários e o interesse em
expandir ou adquirir novos conhecimentos.
Sugerimos que
a integralidade seja algo como um ideal de objetividade para investigação
científica, difícil de ser plenamente atingido, mas do qual constantemente,
buscamos nos aproximar.
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Artigo recebido
em 21/03/2006
Publicação aprovada em 30/04/2006
1 Enfermeira. Pedagoga da Secretaria de Educação
de Goiânia, Goiás, Brasil. E-mail: ilkacp@hotmail.com
2 Enfermeira. Goiânia, Goiás, Brasil.
3 Enfermeira. Mestre em Enfermagem. Doutoranda no
Programa Multiinstitucional de Pós Graduação em Ciências da Saúde
– Convenio Rede Centro Oeste – UnB/UFG/UFMS. Professora-adjunta
do Departamento de Enfermagem e Fisioterapia da Universidade Católica
de Goiás (UCG). Pesquisadora de Iniciação Científica do NEPSS (BIC
- UCG). Goiânia, Goiás, Brasil. E-mail: mailto:licia@ucg.br |
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