MULTIDISCIPLINARIDADE NA PRÁTICA: A RELAÇÃO ENTRE EDUCAÇÃO FÍSICA E MATEMÁTICA E SUAS COLABORAÇÕES MÚTUAS NO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DE ESCOLARES DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Carlos Magno Monteiro da Silva*

Alessandro Jesus do Carmo**

Anderson Pontes Morales***

Vernon Furtado da Silva****

RESUMO

Este artigo resulta de um estudo qualitativo e quantitativo envolvendo um trabalho de campo com crianças alunas de uma escola da Zona Oeste do Rio de Janeiro, em que foram utilizados os resultados da avaliação acadêmica de Matemática e aplicados os testes da Bateria Psicomotora de Vítor da Fonseca. Com isso, buscou-se verificar quais atividades motoras estão mais ligadas a aspectos cognitivos de alta demanda da referida bateria, relacionando-as com o aprendizado de matemática. Este artigo propõe-se a verificar uma provável interação entre os conteúdos de aprendizagem hábil-motriz e a Matemática. Os resultados definidos por instrumentais estatísticos mostraram a existência desta relação em crianças em nível da quinta série, mas não nas da segunda série.

PALAVRAS-CHAVE: Psicomotricidade – Educação Física – Matemática

INTRODUÇÃO

Problemas relativos à aprendizagem humana são comuns em qualquer área de estudos e podem, portanto, ser pensados como ligados ao organismo do aprendiz e/ou ao meio ambiente no qual ele está inserido e em que o processo se desenvolve. Analisando-se o contexto ambiental, a metodologia de ensino é um fator de grande importância, e, como tal, precisa conter, em sua estruturação, técnicas que possam motivar a adesão dos aprendizes em um sentido mais amplo.

Sob esse contexto, evidências na literatura têm demonstrado que existe uma relação entre motricidade e desenvolvimento cognitivo. Assim, o baixo rendimento em atividades físicas deveria estar diretamente ligado ao rendimento acadêmico e vice-versa, o que leva a pensar se seria possível estabelecer uma proximidade entre disciplinas do currículo escolar como, por exemplo, a Matemática e a Educação Física. Relações essas que, se bem desenvolvidas, poderiam acarretar significativo aperfeiçoamento cognitivo.

A palavra cognição, em sua perspectiva mais simples, pode ser definida como o ato ou processo de conhecer, que envolve atenção, percepção, memória, raciocínio, juízo, imaginação, pensamento e linguagem. Desta forma, observa-se que a cognição é muito mais do que apenas a aquisição de conhecimento e, consequentemente, a melhor adaptação ao meio. Ela é também um mecanismo de conversão de tudo o que é percebido e captado para o modo de ser interno. É um processo pelo qual o indivíduo interage com seus semelhantes e com o meio em que vive, sem perder a sua identidade existencial (GODOY, 2006).

Vista sob a perspectiva da didática que permeia a interface entre ensino e aprendizagem, ou, ainda, a partir de uma visão neurofisiológica, a percepção humana deve ser entendida como associada a uma variedade de contextos cognitivos e, consequentemente, a vários tipos de inteligência.

Howard Gardner (2000), em seu trabalho sobre inteligência humana, delineou vários aspectos sobre aquilo que se pode chamar de inteligência. Abrangendo versáteis considerações sobre Inteligências Múltiplas, o autor as categorizou, inicialmente, em sete modalidades. Estas foram posteriormente ampliadas por ele e por outros autores (ARMSTRONG, 2001; ANTUNES, 2002). Gardner (2000) expandiu a noção comum de inteligência, assumindo uma posição de que havia evidências de diversas competências intelectuais humanas relativamente autônomas. Desse modo, divide a inteligência em: Lógico-Matemática, Lingüística, Espacial, Musical, Físico-Cinestésica, Intrapessoal, Interpessoal, Naturalista e Existencial.

Posteriormente, em seu livro Inteligência: um conceito reformulado (2001), o autor explica que as inteligências não são objetos que podem ser contados, e sim, potenciais que poderão ou não ser ativados, dependendo dos valores de uma cultura específica, de todas as oportunidades disponíveis nessa cultura e das decisões pessoais tomadas por indivíduos e/ou suas famílias, seus professores e outros. Em princípio, a que mais interessa a este estudo é a que ele chamou de Inteligência Físico-Cinestésica, que se traduz na maior capacidade do indivíduo de utilizar o corpo (GARDNER, 2001).

De acordo com Mascarenhas et al. (2004), o desenvolvimento motor deve ser visto como um processo complexo e contínuo, estendendo-se ao longo da vida e ocorrendo em sequência ontogênica. Isso demonstra que esta inteligência pode ser continuamente aprimorada, e, portanto, que seria possível estimular nos alunos a Inteligência Físico-Cinestésica vista aqui em seu aspecto mais palpável por meio da Atividade Motora. Esta é uma poderosa ferramenta para otimização do tempo de tomada de decisão, característica indispensável para um bom aprendizado acadêmico em várias disciplinas do currículo escolar. Cada aquisição motora influencia na anterior, em que os movimentos tomam características mais significativas (GOBBI et al., 2007).

Atividade Motora exige concentração, movimento, atenção, agilidade de pensamento, entre outros, para operar conceitos e resolver problemas de todos os tipos. O aluno se apropria do mundo pelo seu agir sobre ele, apodera-se da realidade pela ação (MATTOS; NEIRA, 2006).

Esses fatos são muito discutidos atualmente nos meios acadêmicos e definem o que se chama de Educação Psicomotora. Para Mattos e Neira (2006), a Educação Psicomotora é a educação de base motivada pelo movimento, que trabalha os aspectos afetivos, motores e intelectuais. Todavia, conforme foi possível comprovar com os trabalhos de Ajuriaguerra (1980), Vayer (1984) e Fonseca (1985), estudos sobre a Educação Psicomotora já a definiam como uma ação pedagógica que utiliza os meios da Educação Física com o obejtivo de normalizar ou melhorar o comportamento das crianças, no que se refere à capacidade de aprendizagem. O próprio Ajuriaguerra (1980) definiu, à época, a educação psicomotora como a expressão de um pensamento pelo ato motor preciso, econômico e harmônico. Posteriormente, Vítor da Fonseca (1995) tratou com mais detalhes o que representa esse perfil psicomotor e criou uma bateria de testes para aferi-lo. O perfil psicomotor representa a qualidade da comunicação entre o psíquico e o motor em um determinado estágio do desenvolvimento (FONSECA, 1995).

Cabe ressaltar que, neste estudo, o que até o momento chamou-se de Inteligência Físico-Cinestésica, será chamado agora por um termo mais simples de ser compreendido, a saber, habilidades motoras.

Foi visto, até aqui, que a habilidade motora não pode ser tratada como um elemento isolado de um conjunto de outras habilidades que compõem a inteligência humana. Sendo assim, a principal forma de educar o corpo utilizada nas escolas, conhecida como Educação Física, de forma alguma deve se isolar como disciplina dentro do contexto escolar, treinando o aluno apenas no desenvolvimento de suas habilidades técnicas para prática desportiva. Deve-se criar um elo multidisciplinar com as demais disciplinas e saber que as vantagens e contribuições para o desenvolvimento das capacidades cognitivas dos alunos serão mútuas.

Neste estudo foi abordado a relação entre Educação Física e Matemática, nesse sentido vale dizer que a Matemática sempre foi considerada como algo que gera problemas de compreensão entre os alunos e, em razão disso, acaba tornando-se uma preocupação muito grande para os estudiosos da área de educação, que tentam investigar as causas desse problema, principalmente no que concerne aos métodos de ensino por vezes condenados pelos próprios professores por se apresentarem confusos e abstratos (RODRIGUES, 2001).

De outro lado, a Educação Física vista como tradicional e a concepção da formação pelo esporte concentram a maior parte de sua atenção na finalidade prática do rendimento gestual e no movimento. Esta preocupação, justificada pela necessidade de domínio do real e pela busca da eficácia, pode, no entanto, resultar em uma concepção de corpo como instrumento, que o leva diretamente ao adestramento. Esta é a crítica comumente feita às séries de progressões, concebidas com a finalidade de permitir ao aluno adquirir as habilidades técnicas (LE BOUCH, 1987).

Portanto, neste estudo, procurou-se mensurar as relações existentes entre as habilidades motoras e os processos cognitivos, estabelecendo relações multidisciplinares entre as diversas disciplinas escolares, o que, conforme foi observado até aqui, colaboraria em muito para o aperfeiçoamento dos alunos ao longo da vida acadêmica.

METODOLOGIA

Este estudo foi realizado em uma instituição particular de ensino localizada no bairro de Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro / RJ, considerada como bairro de classe média baixa. A referida instituição atua na Educação Infantil e Básica (fundamental e médio) e no Ensino Técnico-Profissionalizante.

A população selecionada foi composta, inicialmente, por 23 alunos da segunda série e 28 alunos da quinta série sem patologias cuja significância pudesse afetar o resultado do estudo.

Antes de iniciar a seleção da amostra e coleta de dados, todo o corpo docente, de apoio e administrativo recebeu informações sobre o que consistiria o estudo, assim como os responsáveis pelos menores. Foi apresentada uma palestra na escola mostrando os propósitos e as consequências da pesquisa, deixando claro que ela se propõe apenas à aferição e à computação estatística de resultados.

Foi solicitada, aos responsáveis pelas crianças participantes deste estudo, a devida autorização que consta no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme a normativa da lei 196/96 para pesquisa com seres humanos. À escola foi solicitada assinatura de outro Termo de Consentimento dando permissão para a utilização de suas instalações e para o acesso a dados. Nestes Termos constavam, de forma detalhada, os objetivos, as consequências e a ausência de custos da experiência, assim como o termo de responsabilidade dos pesquisadores perante danos físicos ou mentais aos menores.

Esses documentos foram assinados em três vias de igual teor, ficando uma arquivada na escola, uma com os pesquisadores e outra com os pais/responsáveis.

Posteriormente, esses documentos fizeram parte do projeto de pesquisa que foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (COMEP) da Universidade Castelo Branco, atendendo ao disposto na resolução 196/96 do CNS e protocolada pela UCB/VREPGPE/COMEP/PROCIM sob número 0005/2009.

Por solicitação expressa dos pais e da escola, foi também estabelecido que, por tratar-se de menores, em nenhuma circunstância deveriam ser tiradas fotos, expostos nomes, cópias de provas, diários de classe ou outros mecanismos que pudessem levar o menor à exposição pública. Com relação às notas de Matemática, foi obtido acesso somente à cópia manuscrita do diário de classe com os respectivos lançamentos. Os nomes dos alunos selecionados foram substituídos por números.

Os resultados individuais dos testes foram devolvidos pessoalmente aos pais/responsáveis em cópias originais utilizando envelope lacrado e identificado.

Permaneceram em posse dos pesquisadores apenas os dados, que foram, então, transportados para uma planilha objetivando as análises estatísticas desse estudo.

A fim de uniformizar a população, estabeleceram-se como idade média para os alunos das segunda e quinta séries, respectivamente, sete e dez anos. Assim, foram utilizadas técnicas de estatística descritiva para reduzir a população excluindo aqueles cujas idades encontravam-se aquém ou além deste desvio.

A escolha da faixa etária baseou-se nos estágios de desenvolvimento creditados por Piaget e Gréco (1974). Para estes autores, o desenvolvimento humano obedece a certos estágios hierárquicos, que decorrem do nascimento e se consolidam por volta dos dezesseis anos. A ordem destes estágios seria invariável e inevitável a todos os indivíduos, entretanto, segundo os autores, dos sete aos onze anos a criança começa a construir conceitos, por meio de estruturas lógicas, consolida a conservação de quantidade e constrói o conceito de número. Este período foi chamado por eles de estágio operatório-concreto, previsto como adequado a exigências cognitivas inerentes ao material e contexto didáticos relacionados com o objetivo da presente pesquisa.

Como ferramenta estatística foi utilizado o Microsoft EXCEL® 2003 em português.

Em seguida, por meio de sorteio aleatório simples (retirada de nomes de uma sacola), foram selecionados 15 alunos de cada série, perfazendo um total de 30 alunos como amostra, em que foi aplicada a Bateria Psicomotora de Vítor da Fonseca (aqui chamado apenas por BPM, para efeito de simplificação), instrumento validado e já reconhecido (FONSECA,1995).

Essa bateria foi elaborada em 1995 e é composta por uma série de testes capazes de avaliar tonicidade, equilibração, noção de corpo, lateralização, estruturação espaço-temporal, praxia global e praxia fina. Sua mensuração é composta por fatores psicomotores nos quais cada tarefa realizada para avaliação deve ser pontuada de um a quatro, sendo que cada ponto classifica o nível de desempenho do testado.

Após conclusão da bateria de testes, identificaram-se quais atividades da BPM eram mais bioestruturais e quais eram mais bio-operacionais, separando-as para classificação em dois grupos independentes a serem testados. Em essência, os dois grupos de fatores incluíam tarefas consideradas como de baixa demanda cognitiva (bioestruturais) e de alta demanda cognitiva (bio-operacionais).

Como tarefas de baixa demanda cognitiva, foram aplicados os testes propostos na BPM de tonicidade, lateralidade e praxia fina, e, como tarefas de alta demanda cognitiva, os testes de equilibração, noção de corpo, praxia global e estruturação espaço-temporal.

Para aferir os resultados acadêmicos dos grupos estudados na disciplina Matemática, foram recolhidas as notas da primeira avaliação neste conteúdo específico.

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Os resultados de cada grupo foram obtidos por média aritmética e soma. Em atendimento aos objetivos do estudo, foi procedida uma correlação destes dados com os escores que os grupos obtiveram nos testes psicomotores, nas versões bioestrutural e bio-operacional de demandas cognitivas e com as notas da avaliação de Matemática.

Essa correlação foi aplicada tanto na avaliação dos alunos da segunda quanto na daqueles pertencentes à quinta série escolar. Os resultados das operações estatísticas, sobre os escores dos grupos, estão mostrados em sequência lógica de ocorrência. Em um primeiro momento, vê-se o procedimento descritivo associado às médias dos grupos em relação aos compêndios cognitivos bio-operacionais e bioestruturais das tarefas psicomotoras testadas tanto dos alunos da segunda série quanto dos alunos da quinta série (Tabelas 1 e 2).

Tabela 1. Escores dos alunos da segunda série nos testes psicomotores e suas respectivas notas em Matemática.

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Tabela 2. Escores dos alunos da quinta série nos testes psicomotores e suas respectivas notas em Matemática.

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Esses mesmos dados estão plotados na Figura 1, em função de facilitar, ao leitor, a interpretação dos resultados.

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Figura 1. Correlação de Pearson efetivada sobre os escores dos grupos nas tarefas de competências bioestrutural e bio-operacional e resultados das avaliações de Matemática, relativa aos dados dos alunos da segunda série escolar.

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Figura 2. Correlação de Pearson efetivada sobre os escores dos grupos nas tarefas de competências bioestrutural e bio-operacional e resultados das avaliações de Matemática, relativa aos dados dos alunos da quinta série escolar.

Foi realizada também a análise da correlação desses resultados, conforme mostram as Tabelas 3 e 4.

Tabela 3. Análise da Correlação de Pearson (BE x MAT e BO x MAT) para os alunos da segunda série.

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Tabela 4. Análise da Correlação de Pearson (BE x MAT e BO x MAT) para os alunos da quinta série.

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Conforme observado, Bio-Operacionalidade e Bioestruturalidade estão de fato associados e a atividade física depende dos dois. Entretanto, só houve correlação significativa entre os testes de Bio-Operacionalidade e Matemática nos alunos da quinta série.

Nos alunos da segunda série, cuja faixa etária de sete anos os coloca no início do estágio operatório-concreto criado por Piaget e Gréco (1974), observou-se essa não correlação, possivelmente devido ao fato de as crianças ainda estarem na fase inicial deste estágio, e, portanto, ainda não construíram capacidades cognitivas plenas para que sejam avaliadas adequadamente em Matemática.

Já os alunos da quinta série apresentaram forte correlação entre Bio-Operacionalidade e Matemática, o que era esperado, pois são mais maduros intelectualmente e já tiveram mais experiências, o que provavelmente contribuiu para a diferenciação do resultado. Esta faixa etária é muito próxima da faixa final do estágio operatório-concreto, que é de onze anos.

O desenvolvimento global da criança depende, portanto, do comportamento perceptivo-motor que, por sua vez, exige como condição determinadas oportunidades de aplicação à exploração lúdica e sistemática (FONSECA, 1995).

Aqui, chega-se a conclusão semelhante à obtida por um estudo desenvolvido por Huete e Bravo (2006) com alunos da rede pública de São Paulo, que demonstrou que o sucesso na aprendizagem escolar está de fato associado ao perfil psicomotor.

Existem atividades que exigem mais Bio-Operacionalidade que Bioestruturalidade e o raciocínio matemático foi, segundo visto na análise estatística da amostra, um bom exemplo de atividade que exige mais Bio-Operacionalidade. Isso corrobora com a afirmação de Fonseca (1995) de que, na criança dispráxica, as relações entre motricidade e a organização psicológica não se verificam harmoniosamente e sistematicamente, consubstanciando o papel da motricidade na preparação do terreno às funções do pensamento e da cognitividade.

A escolha das atividades da BPM aplicadas aos alunos durante a coleta também se mostrou adequada pois, por exemplo, nos problemas de instabilidade de atenção descobrem-se muitas vezes problemas de má lateralização que impede o acesso à aprendizagem escolar (FONSECA 1998).

Após a análise da correlação, foi utilizado o Coeficiente de Determinação para observar o efeito causal da Bioestuturalidade e Bio-Operacionalidade sobre o resultado das avaliações em Matemática.

Os gráficos a seguir ilustram esses resultados em percentuais:

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Figura 3. Coeficiente de determinação efetivado sobre os escores dos grupos nas tarefas de competências bioestrutural e bio-operacional e resultados das primeiras avaliações de Matemática, relativa aos dados dos alunos da segunda série escolar.

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Figura 4. Coeficiente de determinação efetivado sobre os escores dos grupos nas tarefas de competências bioestrutural e bio-operacional e resultados das primeiras avaliações de Matemática, relativa aos dados dos alunos da quinta série escolar.

Verificou-se pela coleta e análise desses resultados que, durante o processo de aprendizagem lógico/matemático, principalmente nos alunos de faixa etária condizente com o final da fase operatória-concreta, os elementos básicos da Psicomotricidade são utilizados com freqüência. O desenvolvimento do Esquema Corporal, Lateralidade, Estrutura Espacial, Orientação Temporal e Pré-Escrita é fundamental na aprendizagem e, assim, caso haja algum problema em um destes elementos prejudica-se a boa aprendizagem (LAVE; WENGER, 1991).

Também foi possível afirmar que, no período escolar correspondente aos primeiros estágios da educação básica, o desenvolvimento psicomotor deve ser aplicado em atividades que enriqueçam a aprendizagem, nas quais as crianças que têm um processo de aprendizado mais lento sejam favorecidas. Como entende Alves (2007), hoje a Psicomotricidade dá condições ao aluno de desenvolver as capacidades básicas, aumentando seu potencial motor, utilizando o movimento para atingir aquisições mais elaboradas, como as intelectuais, e, consequentemente, esses procedimentos ajudariam a sanar dificuldades que por ventura ocorressem. Alves (2007) ainda afirma que, quando o professor tem consciência de que a educação pelo movimento é uma peça mestra da área pedagógica e que permite à criança resolver mais facilmente os problemas de sua escolaridade, constata-se que esse material educativo é um meio insubstituível para afirmar certas percepções e desenvolver formas de atenção, pondo em jogo certos aspectos da inteligência.

Para utilizar como referência uma disciplina cujos processos cognitivos são ricamente solicitados, pode-se falar sobre a Matemática e a própria maneira como ela é ensinada nas escolas. Bassanezi (2006) diz que esta não deve ser considerada importante simplesmente por alguma definição arbitrária ou porque mais tarde ela poderá ser aplicada. Sua importância deve residir no fato de poder ser tão agradável quanto interessante.

Alguns autores como Matos (2002) sugerem, inclusive, que a disciplina de Matemática deve ser urgentemente eliminada dos currículos do ensino básico. Em vez da “disciplina de Matemática”, ele propõe a criação da disciplina de “Educação Matemática”, com o objetivo principal de contribuir para o desenvolvimento de um ponto de vista mais crítico e matemático sobre as coisas do mundo. Isto significa que, de forma natural, as crianças precisarão conhecer alguns fatos matemáticos, ou seja, o essencial da disciplina e a sua missão principal não será a Matemática, mas sim, o seu uso como um dos recursos estruturantes do pensamento, da ação e da reflexão do indivíduo.

A Matemática é uma disciplina com características muito particulares, utilizada em praticamente todas as áreas do conhecimento científico e, principalmente, no cotidiano da sociedade. Contudo, seu ensino nas escolas nem sempre ocorre de forma adequada, deixando a desejar, principalmente por existir uma nítida lacuna entre a Matemática ensinada em sala de aula, puramente abstrata, e a praticada no dia-a-dia (MARTINS, 2008).

Assim, os alunos que apresentam facilidade no aprendizado da Matemática são vistos pelos colegas como mais inteligentes. Já os que apresentam certa dificuldade de aprendizado nesta disciplina são condenados ao insucesso escolar. Agregando-se a este fato o alto índice de evasão escolar em que, segundo Martins (2008), a Matemática é a disciplina que contribui com maior peso para esse fenômeno.

Devido a esses fatores, foi observado que é permitido dizer que a criança com dificuldade de aprendizagem, principalmente em Matemática, pode modificar-se mudando a sua estrutura psicomotora e cognitiva e, com isso, melhorar a captação, a elaboração e a expressão da informação indispensável ao desenvolvimento desta disciplina e outras que envolvam linguagem. São nesses aspectos que o estudo da BPM de Vítor da Fonseca e dos conceitos teóricos que a cercam agregaram grande valor às pesquisas dos problemas de aprendizagem e de sua relação com os comportamentos motores vistos neste trabalho.

Analisando os resultados, observa-se que é de fato possível relacionar diretamente motricidade com aprendizado matemático por meio dos aspectos Psicomotores, principalmente em um período em que as crianças já possuem experiência suficiente e desenvolvimento cognitivo para compreender melhor a matemática e podem ser avaliadas de forma correta, mostrando que a análise da motricidade pode ser de suma importância na determinação de problemas referentes à aprendizagem. Confirma-se aqui a teoria defendida há mais de dez anos por Assman (1996), de que a aprendizagem valoriza a capacidade motora como facilitadora da parte cognitivista, pode-se então justificar a proposta de se fazer da Educação Física uma parceira na aprendizagem da Matemática quando esta se fizer mais necessária.

Como o propósito desse estudo era aferir se seria possível melhorar os aspectos cognitivos associados à Bio-Operacionalidade, pode ser observado que isso de fato ocorre de forma estatisticamente significativa nos alunos com faixa etária em torno dos dez anos. Portanto a hipótese é verdadeira sob este aspecto, ou seja, a atividade física trabalhada de forma direcionada e lúdica para melhorar a cognição é um fato.

A própria melhora bioestrutural também representa um ganho que não pode ser desconsiderado, pois ela é de grande relevância para o desenvolvimento do indivíduo, aperfeiçoando aspectos como coordenação motora e habilidades corporais que facilitarão sua integração e interação com o meio em que vive (ALMEIDA,2006).

De outro lado, este estudo servirá como exemplo a ser seguido pelos profissionais de educação não só de Matemática, mas também de diversas áreas do conhecimento, como o Português e todos os outros cujo desenvolvimento cognitivo é essencial, colaborando, como em uma via de mão dupla, com as atividades físicas.

CONCLUSÃO

A principal relevância deste trabalho se mostra em apontar a possibilidade de que sempre existe a relação entre disciplinas escolares. Especificamente, no caso da Matemática, percebe-se uma relação direta com a prática de atividades físicas elaboradas de forma a construir processos cognitivos que levem ao raciocínio lógico e à tomada de decisão. Assim, o gosto pela Matemática deve ser estimulado e desenvolvido nos alunos logo nas fases acadêmicas iniciais, visando derrubar ou impedir a formação de barreiras cognitivas.

A Matemática como ciência sempre foi considerada geradora de problemas de compreensão entre os alunos devido a alguns aspectos puramente abstratos com que ela lida e, por este motivo, acabou por constituir-se em uma preocupação para os estudiosos da área de educação no que concerne aos métodos de ensino.

Assim, a utilização da teoria pura no ensino da Matemática, sem contextualização, pode acabar complicando ainda mais a aprendizagem.

Qualquer outra forma de auxílio nesse caso é bem vinda e, pelo que é percebido neste estudo, a ajuda pode partir de uma disciplina considerada tão “oposta” por alguns, a Educação Física. Isso se deve ao fato de que, ao se partir da prática lúdica, os alunos tendem a ter mais facilidade em vencer tais obstáculos de aprendizagem.

A falta de competência dos alunos e a deficiência dos métodos já seriam fatores suficientes para gerar mudanças. Tanto os métodos de ensino quanto os de aprendizagem precisam mudar. Em outras palavras, os métodos de ensino precisam ser repensados e a questão da competência também.

A Educação Física, por sua vez, necessita ser tratada como algo mais do que recreação ou fortalecimento do corpo físico, pois, conforme visto neste estudo, ela representa um elemento da educação que deve empregar as atividades físicas conduzidas por processos didáticos e pedagógicos, com a finalidade de desenvolvimento completo do homem, consciente de si mesmo e do mundo em que vive.

É relevante frisar que a Educação Física praticada de forma multidisciplinar possibilita o crescimento do conjunto de habilidades, assim como desenvolve o entendimento e a reflexão sobre a cultura corporal, influenciando diretamente na formação do indivíduo. É por este motivo que se deseja que ela seja vista como parte pedagógica do currículo escolar, e não como algo à parte.

Uma vez que o profissional de Educação Física esteja consciente de suas atribuições, deve-se pensar numa interação completa dele com os professores das outras disciplinas, como, por exemplo, um trabalho em conjunto com a finalidade de desenvolver a Psicomotricidade, a fim de auxiliar o estímulo do raciocínio e a capacidade de assimilação da Matemática e de várias outras disciplinas (como o português, devido à linguagem).

NOTAS

* Universidade Castelo Branco, Rio de Janeiro, Brasil.

** Universidade Castelo Branco, Rio de Janeiro, Brasil.

*** Universidade Castelo Branco, Rio de Janeiro, Brasil.

**** Universidade Castelo Branco, Rio de Janeiro, Brasil.

MULTIDISCIPLINARITY IN PRACTICE: THE RELATIONSHIP BETWEEN MATHEMATICS AND PHYSICAL EDUCATION AND MUTUAL COLLABORATIONS IN COGNITIVE DEVELOPMENT SCHOOLS OF EDUCATION CHILD

ABSTRACT

This article derives from a qualitative and quantitative study involving a work camp with children students of the Rio de Janeiro´s west zone, where we used the scores of the mathematics tests and the Vítor da Fonseca´s Psychomotor Battery results trying to verify, through them, which motor activities are more closely related to the high cognitive demand of the battery, linking up with the learning of mathematics. This article proposes to verify a probabilistic interaction between the content of learning, skilful driving and mathematics. The results showed statistical tools defined by the existence of this relationship in children in the fifth series, but not in the second series.

KEYWORDS: Psychomotricity; Physical Activities; Mathematics

MULTIDISCIPLINARIEDAD EN LA PRÁCTICA: LA RELACIÓN ENTRE LAS MATEMÁTICAS Y LA EDUCACIÓN FÍSICA Y COLABORACIONES MUTUAS EN EL DESARROLLO COGNITIVO DE NIÑOS EN LA EDUCACIÓN INFANTIL

RESUMEN

Este artículo se deriva de un estudio cualitativo y cuantitativo con niños estudiantes de una escuela localizada en la zona oeste de Rio de Janeiro, donde se utilizaron los resultados de los exámenes de matemática y de las pruebas psicomotoras de Vítor da Fonseca, buscando medir cuales son las actividades físicas que están más estrechamente relacionadas a la alta demanda cognitiva de la batería, la vinculación con el aprendizaje de las matemáticas. Este artículo propone una probabilística para verificar la interacción entre el contenido de aprendizaje, habilidad de conducción y de las matemáticas. Los resultados mostraron por las herramientas estadísticas la existencia de esta relación en los niños en el quinto nivel, pero no en el segundo.

PALABRAS-CLAVE: Psicomotricidade; Educación Física; Matemáticas

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Recebido em: 10/06/2009

Revisado em: 16/06/2009

Aprovado em: 23/06/2009

Enderço para contato: vernonfurtado2005@yahoo.com.br.

Carlos Magno Monteiro
Universidade Castelo Branco - Campus Recreio
Laboratório de Neuromotricidade
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