O ENSINO DO ESPORTE COMO PROBLEMA MULTIDISCIPLINAR

JURACY DA SILVA GUIMARÃES1

RESUMO

O presente texto consiste no ensino do esporte enquanto problema de interesse multidisciplinar e parte da compreensão do esporte como uma construção histórica e social do homem moderno que vem sendo tematizada por professores de educação física em seus vários campos de atuação. Aponta, este texto, para certa “inconsistência” das análises feitas sobre o fenômeno esportivo constante das obras específicas da área de educação física e vislumbra a possibilidade de compreensão do “discurso” recorrente entre os professores de educação física, acerca do ensino dos esportes, a partir de pressupostos teóricos básicos da Sociologia. Indica, ainda, a necessidade de realização de estudos a partir deste viés epistemológico pouco desenvolvido no Brasil.

PALAVRAS-CHAVE: prática pedagógica – esporte – sociologia.

INTRODUÇÃO

O presente texto tem como eixo central a prática pedagógica do professor de educação física no que se refere ao ensino do esporte. A inquietação geradora das reflexões que são apresentadas a seguir tem relação com a forma como vem sendo ensinado o esporte nos vários campos de atuação do referido professor que parece caminhar na “contramão” da história das tendências pedagógicas ou abordagens de ensino da educação física. Isto é, ainda que estejamos presenciando a proliferação de publicações que apontam na direção da superação do modelo tradicional de ensino dos esportes nos vários segmentos organizados de nossa sociedade (escolas, clubes esportivos, organizações comunitárias, entre outros) a prática pedagógica do professor de educação física, em relação ao tratamento dado ao esporte, parece continuar se pautando em princípios, sentidos e significados de um esporte que seleciona, que discrimina e que confere “distinções” apenas aos vitoriosos; como, costumeiramente, vemos em eventos como nas últimas Olimpíadas realizadas em Atenas. Aliás, um evento que se caracterizou pela tentativa – mal sucedida em alguns aspectos2 – de resgate das tradições helênicas.

É importante destacar, desde já, que a referida manifestação do esporte enquanto expressão do alto rendimento e da excelência esportiva pode (e deve) ter o apoio e o destaque que merece tanto da mídia quanto das políticas públicas oficiais, pois constitui um patrimônio histórico e cultural da humanidade. O que significa qualificá-la também como uma manifestação legítima da cultura de um povo.

Neste sentido, o esporte aqui tratado é o esporte entendido enquanto fenômeno social construído histórica e socialmente pelo homem moderno e que vem sendo tematizado pelo profissional de educação física em suas várias frentes de atuação. Para efeito desta reflexão e respeitando os limites que são característicos de um artigo desta natureza tentarei me ater à manifestação do esporte que “acontece” no ou a partir do ambiente escolar.

Um esporte que transcende os limites do cotidiano escolar e permeia as relações sociais de grupos de crianças, jovens e adultos brasileiros. Um esporte que, mesmo com objetivos de alto rendimento previamente estabelecidos e rigorosamente verificados, apresenta nuanças de ludicidade e de criticidade.

Inicialmente com o objetivo de auxiliar no processo de compreensão do esporte como um fenômeno social dos tempos modernos, recorro ao estudo de Dunning e Elias (1992). Nesta obra, os autores buscam a identificação da gênese do esporte com o objetivo de relacioná-lo ao processo de civilização do homem durante sua história. Segundo os autores, o esporte moderno surgiu a partir da regulamentação ou esportivização de práticas físicas da burguesia inglesa em meados do século XVIII. Isto é, com o incremento do processo de industrialização e o surgimento dos movimentos “associacionistas” vários grupos sociais buscaram se organizar em torno de objetivos comuns.

Dentre estes objetivos Bourdieu (1983) destaca que a reunião de pessoas para a prática de jogos populares além de conferir a seus praticantes certa “distinção” dos demais participantes dos grupos sociais a que pertenciam, servia como importante elemento de socialização das normas e comportamentos que eram aceitos e legitimados pelo grupo social ao qual pertenciam.

Intencionalmente estabelecerei neste texto um “hiato” nesta breve revisão histórica sobre a gênese do esporte e o processo civilizatório da humanidade para que possa retomar a intenção inicial do mesmo – o ensino do esporte como um problema sociológico.

O PERCURSO E OS PERCALÇOS DO ESPORTE NA CULTURA DA EDUCAÇÃO FÍSICA BRASILEIRA

No interior da área da educação física brasileira, a partir de meados da década de 1980 – a exemplo do que acontecera com as demais áreas de conhecimento humano – ocorreu uma profunda crise de paradigmas e/ou de eixos norteadores do conhecimento e da prática pedagógica dos profissionais que atuavam no interior da instituição escolar.

A racionalidade técnica e a preparação de mão-de-obra para atender ao mercado de trabalho brasileiro, que se industrializava em ritmo crescente, passaram a ser questionadas enquanto finalidades principais do processo educacional e, por conseguinte, da educação física escolar.

O principal foco de resistência às inovações teórico-metodológicas nas aulas de educação física era representado pelo ensino do esporte dentro de uma perspectiva competitivista que, por sua vez, representava a maior expressão do modelo tecnicista de se pensar a formação do indivíduo. Até mesmo na regulamentação específica da educação física,3 a orientação a ser seguida pelos professores de educação física vinculava-se ao padrão de referência da aptidão física visando ao ensino de esportes.

A década de 1990, por sua vez, trouxe consigo a publicação de grande quantidade de obras que abordaram a questão do ensino da educação física e do esporte no interior da instituição escolar. Obras, estas, que partiam do questionamento do modelo tecnicista de ensino dos conteúdos da educação física escolar com especial destaque para a hegemonia do esporte.

Todas as publicações que abordavam esta hegemonia ou recorrência do esporte como conteúdo da educação física escolar apontavam na direção de que o mesmo deveria ser questionado, transformado, ressignificado ou até mesmo ser reinventado; sob pena de continuar a representar a reprodução, no interior das aulas, das desigualdades sociais evidenciadas pelo modelo capitalista da sociedade brasileira.

Nesta mesma direção, ou seja, em contraposição à hegemonia do esporte, foram elaboradas e publicadas na década de 1990 duas propostas de orientação crítica. A primeira, em 1992, recebeu o nome de Metodologia do Ensino da Educação Física e tinha como responsáveis pela publicação um Coletivo de Autores4 com base teórica no marxismo e apresentava como grande contribuição à sistematização do conhecimento de que deveria tratar o profissional de educação física sob a forma de uma “cultura corporal” na qual se incluíam conteúdos como os jogos, a dança, as lutas, as brincadeiras e o esporte. Essa Metodologia propunha, também, a flexibilização da organização do tempo pedagógico em ciclos de formação humana e não apenas em séries anuais como ocorria no sistema de ensino regular brasileiro.

A segunda proposta de orientação crítica, em 1994, publicada pelo professor Elenor Kunz, ampliou o conceito básico da proposta anterior para “cultura corporal de movimento” e propôs a transformação didático-pedagógica do esporte a partir da “didática comunicativa” extraída dos estudos de autores vinculados à Escola de Frankfurt, como Habermas, Adorno e Marcuse. Nesta obra, o autor brasileiro apresenta situações concretas de ensino na modalidade esportiva do atletismo e propõe, entre outras estratégias de ensino, a encenação como acontece nas peças teatrais.

Mais recentemente, Castellani Filho (1998) estabeleceu classificação para as Teorias da Educação Física em que destacou concepções pedagógicas Propositivas e Não Propositivas. Dentre estas, classificou as Sistematizadas e as Não Sistematizadas. O referido estudo centrou suas atenções nas concepções pedagógicas Propositivas e Sistematizadas, destacando duas. Uma que tem como eixo paradigmático de ação pedagógica a Aptidão Física e a que serve de referência para o trabalho do autor, a Crítico-Superadora.

Tal classificação – que recebeu visibilidade nos três últimos maiores congressos científicos da área em 1999 (Florianópolis-SC), 2001 (Caxambu/MG) e 2003 (Caxambu/MG) – serviu também para evidenciar as diferentes formas de apropriação das inovações teóricometodológicas que vêm sendo introduzidas na área escolar e não escolar.

Consolidou-se, então, no interior da educação física, a “cultura”5 de que o ensino do esporte de maneira tradicional representava a mais fiel reprodução dos valores da sociedade capitalista e que o professor que ensinava esportes em suas aulas estaria vinculado à perspectiva tecnicista6 de ensino.

A SOCIOLOGIA ADENTRANDO E AJUDANDO A COMPREENSÃO DO ESPORTE

De acordo com Marivoet (1998), a Sociologia busca compreender o fenômeno esportivo como um espaço social, produzido pelos indivíduos que lhe dão expressão e, ao mesmo tempo, analisa as ações destes mesmos indivíduos que lhe são impostas pelas estruturas sociais que se configuram em suas realidades sociais concretas. Ainda segundo o au-tor, o sistema desportivo constitui um espaço onde se afirmam interesses específicos, hegemonias e que comporta eixos de conflitualidade interna.

Desta forma – retornando às possibilidades de intervenção do conhecimento sociológico para a compreensão da história da educação física brasileira no que diz respeito ao ensino do esporte – parecia existir entre os profissionais de educação física o que Durkheim (1984) já havia chamado de coerção externa exercida por um fato social.

Para Durkheim (1984, p. 52), “é fato social toda maneira de agir fixa ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior”. Havia, portanto, de um lado, um grupo de professores que continuava a defender o ensino do esporte como forma legítima e preferencial de se educar e, de outro, um grupo de professores que não admitia mais o esporte como a única forma de se educar.

Durante a fase de análise dos dados coletados em um estudo realizado anteriormente (GUIMARÃES, 2002), senti a necessidade de extrapolar as fronteiras delimitadas pelas publicações da área da educação física para compreender melhor as questões relacionadas ao ensino do esporte no ambiente escolar. Era inadmissível, como professor de uma instituição formadora de mão-de-obra especializada para a área, simplesmente, identificar mais um problema com relação ao ensino do esporte. A partir desta constatação, optei por imergir no cotidiano da escola e dar centralidade ao depoimento de um dos principais atores sociais envolvidos no processo ensino/aprendizagem – o professor – para poder compreender como e por que esses professores ensinavam o esporte em suas aulas.

Ao analisar os referidos dados, nos foi possível evidenciar uma série de aspectos presentes no discurso dos professores pesquisados que se opunham ao que as publicações (citadas anteriormente!) indicavam sobre a prática pedagógica dos professores com as características apresentadas pelos referidos sujeitos de pesquisa.

O relato dos professores pesquisados destacou elementos que legitimavam a recorrência do esporte enquanto conteúdo privilegiado em suas aulas e preferência pelo modelo tradicional de ensino. Mas destacava, também, um movimento de “desconstrução” ou de “ressignificação” do modelo tradicional e apontava na direção de uma abordagem atualizada e mais sensível do modelo que fora tão combatido pela literatura das décadas de 1980 e 1990 já citadas. Dito de outra maneira, foi possível perceber que, mesmo condicionados por uma série de fatores do cotidiano escolar, os professores pesquisados buscavam a inclusão de todos os seus alunos através do conteúdo com o qual tinham mais familiaridade que era (é!) o esporte.

Resgatando as noções de cultura da escola e cultura escolar apresentada por Forquin (1993) e cotejando-as com os dados coletados na pesquisa citada anteriormente foi possível inferir que o esporte que vem sendo tematizado pelo professor de educação física no interior da instituição escolar tem sofrido influências significativas de elementos como currículo oficial, disponibilidade de material e infra-estrutura da instituição e certa cultura interna da área de conhecimento. Mais do que isso, foi possível apontar, assim como Vago (1996) o fez, que a escola não deve ser entendida como um local de transmissão e sim de produção de culturas e, por isso, lugar onde é possível a existência de uma cultura esportiva escolar.

Bourdieu (1983), dez anos antes, havia introduzido dois importantes conceitos para nos auxiliar a compreender a complexa teia na qual se embaraça o ensino do esporte em nossa sociedade. Para o autor, o professor constrói sua prática pedagógica a partir de conhecimentos adquiridos em várias etapas/momentos/estruturas de sua trajetória de vida. Especificamente no que diz respeito ao conceito de habitus do professor, o autor destaca o papel da formação inicial, dos saberes da prática, das condições de trabalho e das possibilidades de formação continuada como os principais agentes formadores.

Em outras palavras, o autor considera que o habitus constitui a forma individual (do professor!) de socializar conhecimentos, estratégias de ensino e experiências que julga corretas e recomendáveis para seus alunos.

Entretanto, depois de uma leitura mais aprofundada da produção de autores clássicos da Sociologia como Émile Durkheim, Norbert Elias e Max Weber, além de obras de autores contemporâneos como Michel Foucault e Pierre Bourdieu, é preciso perguntar se já não esgotamos todas as possibilidades de explicações e análises sobre o ensino do esporte a partir da produção teórica disponível no interior da área da educação física?

As produções teóricas publicadas nas duas últimas décadas criticaram, analisaram e propuseram mudanças em relação às várias abordagens da educação física/esporte e, ainda assim, estudos recentes como os de Borges (1998), Oliveira (1999), Faria (2001) e Guimarães (2002) apontam para o fato de que a prática pedagógica dos professores de educação física continua a priorizar o conteúdo esporte em sua prática cotidiana.

Penso que reside aí a principal razão de buscar no interior de outras áreas de conhecimento algumas explicações para a hegemonia do fenômeno esportivo enquanto conteúdo de ensino e enquanto manifestação da cultura de um povo.

Ao revisitar o estudo de Dunning e Elias (1992),7 quando os autores buscam a identificação da gênese do esporte moderno, deparei-me com a seguinte indagação dos autores:

¿En ese caso? no sería quizá preferible examinar la génesis y el ascenso de los deportes de nuestro tiempo; enfrentar el hecho de que los juegos que llamamos deportes, como las naciones-estados industrializadas en que se realizan, tienen ciertas características únicas que los distinguen de otros tipos de juegos, y comenzar la difícil tarea de estudiar y explicar la naturaleza de estas características distintivas?

Assim, ocorre que em seu desenvolvimento e expansão pelo resto do mundo, o fenômeno esportivo (mesmo relacionando-se com os contextos histórico e social de suas épocas) acabou por estabelecer cronologia própria, um conjunto de sentidos e significados próprios e criou um campo de profissionais em torno de sua prática que o distanciou de um mero passatempo como em sua origem ou de um simples conteúdo da cultura corporal de movimento como apontaram alguns autores brasileiros nas duas últimas décadas do século passado.

Tal crescimento fez surgir, também, várias formas de manifestação do mesmo fenômeno. Três delas se destacam atualmente no Brasil. A primeira delas relaciona-se com a ocupação do tempo livre sob a forma de lazer. A segunda, com a expressão do rendimento máximo do atleta em busca dos melhores resultados possíveis. A terceira, por sua vez, relaciona-se com o esporte que vem sendo ensinado nas aulas de educação física nas escolas brasileiras desde a década de 1950 quando da “importação” do método desportivo generalizado e persiste até os dias atuais sob as formas de iniciação desportiva generalizada para as séries iniciais do ensino fundamental e de treinamento desportivo especializado a partir da segunda etapa do ensino fundamental e por todo o ensino médio.

Num esforço de síntese para atender aos objetivos deste texto, pode-se dizer que os professores de educação física (que desempenham suas atividades profissionais no interior da instituição escolar ou não!) continuam priorizando o ensino do esporte em detrimento dos demais conteúdos de ensino da área e que tal ensino continua se pautando no paradigma da aptidão física, da performance esportiva ou do ensino do esporte enquanto elemento fomentador da saúde.

AFINAL DE CONTAS... O QUE NOS RESTA FAZER?

Uma pergunta persiste e insiste em não silenciar no meio acadêmico: Como o discurso do ensino do esporte com vistas ao rendimento e à exclusão dos “piores” em favor dos “melhores” vem sendo legitimado?

Aliás, este discurso vem legitimando práticas, caracterizando grupos e servindo como justificativa para a criação de associações representativas e/ou conselhos ao longo da história da educação física brasileira. Foucault (2003), ao analisar alguns aspectos do discurso presente nas várias áreas do conhecimento humano, identifica algumas formas de restrição e divulgação de determinado conjunto de idéias que parece se relacionar com o que vem ocorrendo entre os professores de educação física. Segundo o autor,

o ritual define a qualificação que devem possuir os indivíduos que falam (e que, no jogo de um diálogo, da interrogação, da recitação, devem ocupar determinada posição e formular determinado tipo de enunciado); define os gestos, os comportamentos, as circunstâncias, e todo o conjunto de signos que devem acompanhar o discurso (FOUCAULT, 2003, p. 39).

É certo que as restrições e/ou coerções exercidas pelos discursos não possuem mais o mesmo poder que tinham nos anos 50, 60 ou 70 do século passado na sociedade brasileira. Discursos médicos, religiosos, jurídicos e filosóficos do início do século passado determinavam práticas e comportamentos com muito mais rigor do que atualmente.8 Assim também parece ter ocorrido em relação ao ensino do esporte.

Mesmo levando em consideração a velocidade com que as informações e inovações teórico-metodológicas vêm surgindo e se manifestando em todas as áreas do conhecimento humano é importante notar a inexistência de estudos que, tendo partido da compreensão do esporte como problema sociológico, tenham buscado compreender como se produz, como são difundidos e como se legitimam os discursos sobre o ensino e a prática deste fenômeno tão importante na sociedade brasileira.

Ou seja, será que os professores de educação física reproduzem o discurso da importância do esporte para as aulas de educação física, para a promoção da saúde ou como remédio para a diminuição das mazelas sociais simplesmente em função de uma cultura específica da área?

Será que o fazem em função de uma herança histórica da área de conhecimento? Ou será, ainda, que o fazem para se sentirem como pertencentes a um grupo de profissionais com atitudes e comportamentos já legitimados socialmente?

Poderíamos ainda argumentar – em favor da recorrência deste discurso – que a própria legislação educacional brasileira fomentava e justificava por várias décadas atitudes e práticas pedagógicas pautadas na busca do rendimento técnico, da vitória e da conquista dos melhores resultados e que, somente a oito anos da promulgação de uma nova legislação, estejamos apenas no início de um processo de transformação didática e pedagógica do ensino dos esportes no Brasil. Assim como poderíamos argumentar – ainda em defesa da perspectiva tradicional de ensino dos esportes – que se trata de uma prática com legitimidade conquistada histórica e socialmente na cultura brasileira.

Entretanto, mesmo após a promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (que aponta para a tematização dos elementos da cultura corporal de movimento de forma inclusiva e respeitando a liberdade de acesso e permanência para todos os alunos nas práticas oferecidas pela escola; aí incluída a prática esportiva), não se pode afirmar que o “quadro” apresentado anteriormente tenha se modificado significativamente. Tais argumentações, portanto, apenas agudizam o complexo processo de ensino dos esportes por parte dos professores de educação física.

Desta forma, me parece necessário que sejam realizados estudos sobre o ensino do esporte que se apóiem nas teorias sociológicas (clássica e contemporânea), na história da educação física e, sobretudo, na realidade cotidiana do profissional de educação física que atua com o ensino do esporte em nossa sociedade.

Eis aí mais um desafio, mais um motivo para a luta continuar.

 

The teaching of sports as a multidisciplinary issue

ABSTRACT

The present text discusses the teaching of sports as an issue of multidisciplinary interest. It starts from the understanding of sports practice as a social and historical construction of modern man which has been discussed by physical education teachers in their many fields of work. This text points to a certain "inconsistency" found in the analises of sports as a phenomenon which is frequent in physical education literature, and it points to the possibility of understanding the "discourse" which is repetitive among physical education teachers on the teaching of sports, from the starting point of basic theoretical suppositions taken from Sociology. It also indicates the need to conduct further studies from such an epistemological viewpoint which has had little developed in Brazil.

KEY WORDS: pedagogical practice – sports – sociology.

 

La enseñanza del deporte como problema multidisciplinar

RESUMEN

El presente texto consiste en la enseñanza del deporte como problema de interés multidisciplinar y parte de la comprensión del deporte como una construcción histórica y social del hombre moderno que viene siendo tematizada por profesores de educación física en sus varios campos de actuación. Señala, este texto, para cierta "inconsistencia" de los análisis hechos sobre el fenómeno deportivo constante de las obras específicas del área de educación física y vislumbra la posibilidad de comprensión del "discurso" recurriente entre los profesores de educación física, acerca de la enseñanza de los deportes, a partir de presupuestos teóricos básicos de la Sociología. Indica, incluso, la necesidad de realización de estudios a partir de este canal epistemológico poco desarrollado en Brasil.

PALABRAS-CLAVE: práctica pedagógica – deporte – sociología.

NOTAS

1 Mestre em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, professor da Faculdade de Educação Física da Universidade Federal de Goiás e coordenador do Grupo de Estudos sobre o Esporte Escolar da Faculdade de Educação Física da Universidade Federal de Goiás.

2 Se levarmos em consideração que o estádio Panatenaico que foi o palco da chegada da maratona fica bem distante da cidade de Olimpia, onde os gregos realmente competiam, e o fato de ser decretado um armistício a fim de garantir a segurança de todos os participantes em contraposição aos atentados que continuaram a acontecer durante os últimos jogos.

3 O Decreto 69.450/71 que vigorou formalmente até a promulgação da nova LDB em 1996, regulamentava as especificidades da educação física a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 5692/71 (BRASIL, 1971).

4 Carmen Lúcia Soares, Celi N. Z. Taffarel, Elisabeth Varjal, Lino Castellani Filho, Michele Ortega Escovar e Valter Bracht. 5 Entendida aqui como o conjunto de ações características de um grupo social.

6 Sinteticamente entendida para efeito deste estudo como a perspectiva que pautava seus procedimentos metodológicos na racionalidade técnica instrumental para atingir seus objetivos.

7 Cf. Elias e Dunning, Deporte y ócio en el proceso de la civilizacion, 1992.

8 Como exemplos da influência de determinados discursos presentes na sociedade brasileira – que traduziam percepções coletivas e geravam ações posteriores – temos as concepções de moda, de casamento, de opção sexual, entre outras.

REFERÊNCIAS

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ELIAS, N.; DUNNING, E. Deporte y ocio en el proceso de la civilizacion. Tradución de Purificacion Jimenez. México, Madrid, Buenos Aires: Fondo de Cultura Econômica, 1992.

FARIA, E. L. O esporte na cultura escolar: usos e significados. Dissertação [Mestrado em Educação]. Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2001.

FOUCAULT, M. A ordem do discurso. (aula inaugural no College de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970) Trad. Laura Fraga de Almeida Sampaio. 9. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2003.

FORQUIN, J.-C. Escola e Cultura: as bases epistemológicas do conhecimento escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.

GUIMARÃES, J. da S. O esporte na cultura escolar -com a palavra o professor de educação física (Dissertação de Mestrado). Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte: UFMG, 2002.

KUNZ, E. Transformação didático-pedagógica do esporte. Ijuí, RS: Unijuí, 1994.

MARIVOET, S. Aspectos sociológicos do desporto. Lisboa, Portugal: Livros Horizonte, 1998.

OLIVEIRA, S. A. A reinvenção do esporte: possibilidades da prática pedagógica. Dissertação (Mestrado em Educação). Faculdade de Educação da Universidade Federal do Pernambuco, 1999.

VAGO, T. M. O esporte na escola e o esporte da escola: da negação radical para uma relação de tensão permanente. Revista Movimento. Porto Alegre, n. 5, p. 4-17, 1996.

Recebido: 30 de setembro de 2004
Aprovado: 20 de outubro de 2004

Endereço para correspondência:
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E-mail: juracy@fef.ufg.br

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